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‘Lula Skywalker’ e a microcefalia geopolítica

May 20, 2025 21:36 , par Altamiro Borges - | No one following this article yet.
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Foto: Ricardo Stuckert/Agência Brasil
Por Marcelo Zero, no site Viomundo:


Tem gente que vê o mundo de forma extremamente simplista e maniqueísta, assentada em imperativos morais frequentemente hipócritas.

De fato, certas “análises” geopolíticas parecem capítulos disparatados da saga Star Wars, ou algo assim, no quais os “bons”, os “cavaleiros Jedi”, lutam com seus saibros a lazer contra as forças do Império do Mal, onde se abriga o lado “escuro da força”.

Esse é esquema geopolítico maniqueísta e simplório que esteve presente na antiga Guerra Fria e que, agora, se repete, como farsa, na nova Guerra Fria, a qual divide o mundo entre as “democracias”, isto é, os aliados do EUA e do Ocidente, e as “autarquias, ou seja, ´aqueles países que não se alinham aos imperativos geopolíticos do Império”.

Segundo parte de nossa mídia, “Lula Skywalker” teria aderido ao lado escuro da força, pois participou das celebrações da vitória contra o nazismo na Grande Guerra Patriótica, promovidas por Darth Vader, mais conhecido por Vladimir Putin, um “ditador” que ameaça toda a galáxia Europa, após ter destruído o planeta Aldebaraan, conhecido também por Ucrânia, com sua terrível “Estrela da Morte”.

Segundo o geopolítico Yoda, que tem grande influência na mídia ocidental, “dominar a Europa Putin irá, pois prediz assim a dominó teoria”.

Lula Skywalker teria, portanto, de forma “infame”, desequilibrado a Força geopolítica do Universo.

Parece piada, mas é assim mesmo que boa parte da nossa mídia “analisa” os movimentos da diplomacia do Brasil.

Estranhamente, o encontro de Trump com o príncipe saudita bin Salman, comandante de uma monarquia absolutista e acusado de degolar jornalistas, não causa frisson ou incômodo democrático.

Análises racionais e realistas, com um mínimo de sofisticação, são flores em um deserto de ideias próprias.

Se quer se dão o trabalho de ler argumentos alheios realistas, amplamente difundidos, como os do Jeffrey Sachs, os de John Measrheimer, os de Yanis Varoufakis, etc. só para citar os mais populares.

O mundo, no entanto, é muito mais complexo que a imaginação binária e infantil que parece confundir boa parte de nossos “analistas” e “comentaristas”.

Em primeiro lugar, se fosse apenas uma questão de justiça histórica, todo o mundo que abomina o nazismo e o fascismo deveria ter ido às comemorações do 9 de maio.

Como se sabe à exaustão por que tem um mínimo de domínio sobre o tema, e como ignoram aqueles que acham que a derrota do nazifascismo começou com a invasão da Normandia, foi basicamente a União Soviética que pôs fim ao monstro hitlerista.

E isso a um custo de 26 milhões de vidas. Ao menos, o mundo e, especialmente a Europa, poderiam manifestar respeito por esse papel histórico, que salvou nossa civilização.

Preferem, no entanto, ignorar a História e a demonizar Putin e seu regime. Aliás, ignoram toda a História.

Fingem que a guerra na Ucrânia não tem nenhuma relação com a expansão da Otan em direção às fronteiras da Rússia, com o abandono, por parte dos EUA, dos tratados de mísseis nucleares, com a implementação de governo russofóbico e francamente nazistóide na Ucrânia e, ainda, com bombardeios constantes, pelas forças ucranianas, contra o Donbass russófono, por anos antes da intervenção militar russa.

Não, na realidade, para eles, tudo parece ter acontecido assim: Putin sonhou com Dugin, acordou de mau humor e resolveu que sua bílis negra só seria aplacada por uma bela invasão. Afinal, ele faz parte do “lado escuro da força.”

Brincadeiras à parte, Brasil e Lula condenaram a intervenção militar russa na Ucrânia, mas, desde o início da guerra, empenham-se, ao contrário de muitos, na busca de uma paz realista para um conflito muito perigoso para a Eurásia e o mundo.

Na viagem condenada como infame, Lula conversou com Putin, a pedido de Zelensky, para entabular negociações sobre um cessar-fogo, as quais, espero cheguem a bom termo.

Também ao contrário do que muitos pensam, as relações bilaterais entre Brasil e Rússia são antigas e começaram a se tornar muito densas, já no início deste século. Com efeito, as relações entre o Brasil e a Rússia foram alçadas ao patamar de parceria, em 2000. Em 2002, ainda no governo de FHC, os dois países estabeleceram “parceria estratégica de longo prazo”.

O potencial de intercâmbio em todas as áreas (energia, ciência e tecnologia, militar, comercial, alimentar) é enorme e ainda pouco explorado. São dois países enormes do Sul Global que não podem se dar ao luxo de não estreitar seus laços, ainda mais numa conjuntura na qual os EUA atacam o multilateralismo e tentam impor uma ordem hobbesiana, unilateralista e conflitiva ao planeta.

Embora Trump esteja recuando um pouco em seus desvarios protecionistas (muito mais por pressão interna que por qualquer outra coisa), ele continua a ter um efeito profundamente disruptivo na ordem comercial e geopolítica global.

No caso, da recente “trégua” de 90 dias com o China, é preciso lembrar que as tarifas, mesmo ao longo dessa trégua, permanecerão muito elevadas (30%), um aumento brutal, em relação as tarifas médias anteriores (2,5%).

O Brasil, que frequentemente é criticado, pelos liberais, por ter uma “economia fechada”, tem tarifas médias de apenas 12%.

No caso do acordo entre os EUA e o Reino Unido, embora esse último país tenha reduzido suas tarifas médias, com os EUA, de 3,5% para 1,8%, Trump fez questão, mesmo assim, de manter as tarifas mínimas de 10%, para a maior parte dos produtos britânicos.

Parece também pouco provável que Trump desista de sua agenda unilateralista e protecionista, embora possa moderá-la um pouco.

Trump realmente quer reindustrializar os EUA “na marra”, e também procura substituir o imposto de renda por tarifas de importação, com o intuito de agradar seus amigos bilionários. Para tanto, parece disposto a enterrar todas as regras internas e externas.

Nessas condições, a única saída é se aproximar mais dos dois gigantes euroasiáticos e tentar unir o Sul Global numa frente em prol do multilateralismo, da paz e da racionalidade.

É o que o Brasil está fazendo, para desgosto dos aliados trumpistas internos e dos microcéfalos que acreditam numa obsoleta Guerra Fria. É a coisa correta a fazer. É o lado factível e certo da História.

Se vivêssemos no universo imaginário da saga Star Wars, é o que os cavaleiros Jedi provavelmente fariam.

* Marcelo Zero é sociólogo e especialista em relações internacionais.
Source : https://altamiroborges.blogspot.com/2025/05/lula-skywalker-e-microcefalia.html