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Blog Comunica Tudo

3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.
Este blog foi criado em 2008 como um espaço livre de exercício de comunicação, pensamento, filosofia, música, poesia e assim por diante. A interação atingida entre o autor e os leitores fez o trabalho prosseguir. Leia mais: http://comunicatudo.blogspot.com/p/sobre.html#ixzz1w7LB16NG Under Creative Commons License: Attribution Non-Commercial No Derivatives

"Feminismo é um pecado mortal", diz acusação no caso da banda Pussy Riot

7 de Agosto de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários aindaJulgamento da banda punk expôs sistema jurídico parcial e grupos da sociedade conservadores e religiosos

Da Agência Efe. Lido no Opera Mundi

Integrantes da banda punk durante julgamento
Com frases como “o feminismo é um pecado mortal”, o julgamento da banda punk feminina Pussy Riot completou seu sexto dia e reabriu questionamentos sobre a imparcialidade da justiça, bem como do lado religioso e conservador da sociedade russa.

A Promotoria russa exigiu nesta terça-feira (07/08) uma pena de três anos de prisão para as integrantes da banda, sustentando que representam uma ameaça para a sociedade pela possibilidade de realizarem outros protestos no país. No último dia para as falas da acusação, as artistas foram denunciadas pelo crime de desrespeito à religião.

Os promotores e advogados de acusação sustentam que a apresentação da banda em uma Igreja Ortodoxa, em fevereiro desse ano, não constituiu uma ação política, mas sim de ódio religioso. Prova disso, afirmam eles, é que nenhum político foi citado na canção de nome “Virgem Maria, expulse Putin”. “Elas debocharam e humilharam as pessoas na Igreja”, disse o promotor Alexei Nikiforov. “Usar palavrões numa igreja é um abuso contra Deus”, completou ele.

Perguntas como “O que a religião ortodoxa significa para você?”, “As roupas delas eram apertadas?” e “O que te ofendeu com as máscaras que usavam?” foram feitas para as testemunhas da acusação, que estavam na Igreja no momento da intervenção artística. Uma delas se contradisse ao afirmar que escutou uma música na catedral, sendo que a banda acrescentou depois os instrumentos no vídeo divulgado no YouTube.
Baseando-se nas impressões de fiéis ofendidos com a performance das Pussy Riot, uma das advogadas da acusação chegou a afirmar que o feminismo é um crime. “Todas as rés declararam ser feministas e disseram que isso é permitido na Igreja Cristã-Ortodoxa”, disse Yelena Pavlova. “Isso não corresponde com a realidade. O feminismo é um pecado mortal”, completou.
“Elas tem de ser isoladas da sociedade”, afirmou Alexei Nikiforov que pediu três anos de prisão para todas as integrantes da banda pela apresentação. O promotor poderia ter exigido a condenação máxima de sete anos, mas parece ter seguido os conselhos do presidente russo. Vladimir Putin na semana passada (02/08) disse que as mulheres não “fizeram nada de bom”, mas não devem ser julgadas tão duramente.

Resistência

O presidente russo parece ter seguido o conselho do advogado de defesa, Mark Feigin, das Pussy Riot que alertou que uma condenação “romperia definitivamente as relações entre a sociedade e o governo russo”. O julgamento, assim com a marcha contra as eleições que reelegeram Putin, uniram grupos de oposição que sustentam que o governo russo persegue seus críticos.
Agência Efe
Manifestante russo é preso pela polícia em protesto pela libertação da banda

Segundo eles, as denúncias contra a banda punk fazem parte de um esforço de Putin para intimidar a sociedade e russa. “Eles declaram guerra contra nós!”, alertou o líder esquerdista Sergei Udalstov em protesto no final de julho pela libertação das músicas que reuniu milhares de pessoas. “Para a sua rejeição da lei, existe uma resposta da rua", disse Feigin.

Na sexta-feira (03/08), três homens escalaram as paredes do tribunal, utilizando gorros em suas caras como o das mulheres, e gritaram “Liberdade às Pussy Riot!” das janelas, informou o jornal britânicoThe Guardian. Segundo a correspondente do jornal em Moscou, outros atos semelhantes aconteceram em outras cidades do país.

Figuras importantes da arte na Rússia protestaram a favor das acusadas, como Petr Pavlesnky  que costurou sua boca em solidariedade à banda punk. A luta das artistas atravessou os oceanos e mobilizou diversos famosos, como Sting e Red Hot Chili Peppers e até Madonna que realiza shows no país nesta semana. 
“Em um primeiro momento, depois dos protestos contra Putin em dezembro, as autoridades se assustaram”, explicou o advogado de defesa Nikolai Polozov. “Agora, eles se recuperaram e começaram a reagir – o julgamento da Pussy Riot é claramente o primeiro passo”, acrescentou de acordo com o Guardian
Imparcialidade da justiça
Grupos russos e internacionais que apoiam a luta das artistas estão cada vez mais indignados com as atitudes da justiça na condução do processo. Enquanto todas as testemunhas de acusação foram autorizadas pela juíza Marina Syrova, apenas 3 das 13 testemunhas nomeadas pela defesa puderam ser interrogadas no julgamento. Syrova também foi responsável por permitir uma série de perguntas da acusação às testemunhas, mas vetou que a defesa realizasse as mesmas questões.
A justiça russa já recusou diversos pedidos judiciais da defesa, incluindo uma apelação para enviar o processo de volta à Promotoria já que não existem provas suficientes. Os advogados de defesa da Pussy Riot impetraram pedido no tribunal para chamar o representante da instituição religiosa a testemunhar no processo que foi negado, informou a rede Interfax. 
 “Mesmo nos tempos soviéticos, nos tempo de Stalin, os julgamentos eram mais honestos do que esse”, afirmou Polozov durante o tribunal. 




Todos falam do diploma de jornalismo

7 de Agosto de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda
Parece ser o assunto do dia: senado aprova a obrigatoriedade do diploma de jornalismo. Na verdade, o texto agora segue para a Câmara dos Deputados, onde já existe proposta semelhante. Muitos comemoram porque desejam a obrigatoriedade. Outros reclamam por achar que a obrigação é um atraso para a sociedade. 

Minha opinião? Em outros países, sou contra a obrigatoriedade, exatamente pelo papel social que o jornalismo exerce, entre outras questões. No Brasil? Tanto faz, por um motivo bem simples e já publicado neste blogue em 2009:

"Quem sabe o Brasil comece a diferenciar jornalista de assessor de imprensa (como no resto do mundo) ou siga o exemplo da Europa, onde jornalista econômico não pode fazer investimentos na Bolsa (por motivos óbvios). Nos EUA o diploma não é obrigatório, mas 80% dos jornalistas contratados são formados. No Brasil tomamos o caminho contrário: entre 2001 e junho/2009, quando o diploma ainda era obrigatório, nada menos que 14 mil cidadãos conseguiram registros jornalísticos sem precisar de diploma. Estima-se que mais da metade dos jornalistas em exercício não são formados, e esta estimativa é anterior à queda do diploma. Vamos repensar o Brasil (e o mundo)."

Leia mais: http://comunicatudo.blogspot.com/2009/10/jornalismo-do-brasil-e-do-mundo.html




Mensalão - a campanha no STF

6 de Agosto de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda


Ninguém mais acredita que o julgamento do tal “mensalão” terá qualquer resquício de imparcialidade. O clima turbulento do STF, similar ao dos plenários legislativos, evidencia pendores emocionais incompatíveis com a tecnicidade das questões em pauta.


O acusador é questionado por favorecer supostos criminosos. Um dos julgadores aparece como beneficiário do caixa dois tucano, origem do próprio caso agora sob sua análise. Outro tem ligações históricas com o PT. O relator e alguns colegas se desesperam para que o destino de trinta e seis réus seja decidido em apenas dois meses, garantindo assim os votos reconhecidamente favoráveis à condenação.

A coisa toda ganha ares kafkianos quando lembramos que há cerca de 46 mil processos aguardando decisão final do STF. E que o multimilionário “mensalão tucano” foi desmembrado para restar apenas Eduardo Azeredo como réu (outros dez puderam voltar à Justiça mineira, enquanto esse direito foi negado a trinta acusados no processo atual), sendo que mesmo o caso do ex-governador do PSDB não tem previsão de agendamento.

O que se passa no STF é um ritual político, organizado às pressas para coincidir com as eleições municipais. E o que se passa fora da corte é um circo de propaganda montado pela mídia corporativa, cujos comentaristas adicionam vernizes de imparcialidade “técnica” ao subtexto manipulador que a legislação eleitoral proíbe escancarar.

(Publicado por GUILHERME SCALZILLI)




No coração do latifúndio, uma estaca quebrada

6 de Agosto de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Crianças que caminham quilômetros para ir à escola, falta de água e energia, famílias morando em barracos de lona porque não receberam verba para suas casas: a esperança vai sendo minada dia após dia, mês após mês, ano após ano

É noite ainda, mas na casa de Rosa Maria da Rosa todos se movimentam como se já fosse dia. Com a cara amassada de sono, esfregando os olhos e tossindo, o pequeno Abraão resmunga que está muito cansado. A mãe diz que é preciso ir, e o ajuda a colocar o casaco pesado. Depois, é a vez de pôr uma segunda calça sobre a primeira. Faz muito frio e nem é inverno – estamos na metade de maio. Daqui a algumas semanas será pior.


O menino quase dorme em pé enquanto escova os dentes e reclama da água gelada. Rosa tenta animá-lo. Encolhido e de chinelos, ele senta na beira do fogão à lenha, segue tossindo, boceja, espirra, bufa. Seu corpo de criança de 6 anos pede pra voltar pra cama.

Gabriela, a irmã mais velha, de 11 anos, vai se arrumando quase calada e sorri a cada vez que Abraão se queixa. É ela quem abraça Marta, a bebê de 3 meses, traz pro colo e beija. E com a boca roxa do gelo anuncia: – já são cinco e dezesseis!

Um cão insistente chora lá fora. Marta quer o peito agora, mas já não dá tempo. Enrolada no cobertor, ela vai para dentro do carrinho de bebê. A mãe fecha o cadeado na porta, Gabriela sem um casaco treme. Tudo é escuro no pampa gaúcho quando os quatro mergulham nas estradas de chão do Assentamento Caiboaté, município de São Gabriel, Fronteira-Oeste do Rio Grande do Sul.

São sete quilômetros de terra e geada até o cruzamento onde passa o ônibus escolar. O carrinho da bebê vai trepidando sobre as pedras enquanto Rosa dança desviando das maiores. O menino se esforça para acompanhar o passo. Quando fica para trás, corre. “Tem horas que me dá vontade até de chorar na estrada também, quando o Abraão chora. Porque ele é pequeno, dói as pernas. E a gente sabe que tem que forçar a ir”, desabafa a mãe. É difícil aceitar que os filhos sofram assim, já que a lei assegura o transporte escolar para que não caminhem tanto. “A única coisa que dizem é que não podem fazer nada. A Prefeitura (de São Gabriel) fala que dentro do assentamento é o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) que tem que resolver. O Incra diz que não tem dinheiro. Disseram para nós que depois que arrumassem as estradas o ônibus ia entrar pra pegar as crianças. Depois disseram que não podiam por causa da chuva. Fazem o contrário do que dizem. Às vezes dá até uma revolta na gente.”

Assim começa o jogo de empurra-empurra. A Prefeitura, responsável pelo transporte escolar, acusa o Incra de não melhorar as péssimas condições das estradas internas dos assentamentos, afirmando que os ônibus da sua frota não têm condições de trafegar. O prefeito Rossano Gonçalves (PDT) recorre a números para explicar o problema: “Temos 15 ônibus próprios e 14 terceirizados para o transporte de cerca de mil jovens do meio rural, percorrendo um total de 3,5 mil km diários”. Não há um que passe perto da casa de Abraão. “Para isso precisaria de veículos tracionados, que nós não possuímos”, afirma Gonçalves. O Incra informa que no planejamento dos assentamentos não há verba para resolver o problema do transporte escolar interno provisoriamente, e que a construção das estradas sofreu atraso, cortes orçamentários e problemas de execução.

No entanto, o que se passa com a família de Rosa é regra nos oito assentamentos do município. Algumas crianças caminham até 10 km para chegar ao ônibus escolar. A negligência se repete há três anos e meio, desde que as 125 crianças assentadas em idade escolar chegaram aos lotes do assentamento Conquista do Caiboaté.. Muitas famílias estão se separando dos filhos, deixando-os na casa de parentes ou amigos para que fiquem mais perto da estrada. Algumas não colocam os filhos na escola porque não conseguem levá-los até lá. O Conselho Tutelar pressiona as famílias para que ninguém falte às aulas, mas não se envolve com a solução do problema. E quando um assentado resolveu levar seus filhos de carroça, foi advertido pelo Conselho de que seria responsabilizado por qualquer acidente no trajeto.

Na tentativa de amenizar o sacrifício, as aulas acontecem apenas três vezes por semana. As Secretarias Estadual e Municipal de Educação tentaram estabelecer uma carga horária ampliada para atingir as 800 horas previstas no ano letivo, mas a falta de estrutura nas escolas não permitiu que as crianças usassem os dois turnos. Não havia espaço. Depois de um ano de insistência das escolas, a 18ª Regional do Conselho Estadual de Educação, responsável pelos alunos de São Gabriel, autorizou o descumprimento da carga horária mínima. Hoje, os alunos têm um déficit educacional de quase a metade do mínimo previsto em lei. “Fazer o quê? Eles têm que aprender, para terem um futuro melhor do que nós temos hoje”, diz Rosa.

Jacques Alfonsin, um Procurador do Estado aposentado e assessor jurídico de movimentos populares, entre os quais o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST/RS), diz que a situação só chegou a este ponto porque o próprio Conselho Superior do Ministério Público Estadual, em conjunto com a Secretária de Educação do governo Yeda Crusius (2007-2010), acabou com as escolas itinerantes dos sem terra, proibindo-as de funcionar nos locais onde a rede de ensino não está estruturada: “Para eles, era preciso acabar também com a possibilidade de essas crianças serem influenciadas por uma pregação ‘subversiva’, de ‘esquerda’, capaz de desviar suas mentes inocentes da devoção à lei, à ordem, à segurança, à liberdade, palavras costumeiramente pronunciadas de boca cheia por quem nunca teve a própria vazia”. Sobre a dificuldade dos estudantes, diz o advogado Alfonsin: “Se alguém pretendesse conhecer mais de perto a dura realidade das crianças assentadas em São Gabriel, constataria que muito bicho está sendo bem melhor tratado do que elas. Touros e cavalos de latifundiários, sem dúvida.”

Trabalhando noutras terras
Normalmente, o agricultor assentado chega ao seu lote totalmente descapitalizado. Foram anos de acampamento em que, se tinha alguma posse, foi preciso vender tudo para se manter durante o período de luta pela terra. E a terra necessita de tempo para dar retorno econômico ao agricultor. Mas sem equipamentos e recursos é quase impossível. Como não se consegue viver do próprio lote nos primeiros anos, a principal alternativa que resta aos assentados é buscar trabalho fora dos seus lotes.

Enquanto Rosa madruga com seus filhos para levá-los à escola em São Gabriel, seu companheiro Lori acorda a 560 quilômetros dali, em Vacaria, do outro lado do Estado. Ele tira o sustento da família da colheita da maçã, uma atividade altamente prejudicial à saúde por conta do uso extensivo de venenos aplicados nas árvores, inclusive na hora de colher as frutas do pé. São 60 dias direto dentro dos pomares, tendo para descansar apenas os alojamentos compartilhados. Rosa defende o trabalho do marido: “A maioria do pessoal aqui, se não sai pra trabalhar passa fome. O nosso plantio perdemos tudo. Plantamos com o recurso do meu marido no trabalho de Vacaria. Se não fosse ele, nós já tínhamos desistido. Quem está aqui ainda é por coragem mesmo ou porque não tem pra onde ir. O Incra nem sequer vem aqui”.

É também da colheita da maçã que Eleara Padilha traz para a família o dinheiro que lhes falta. Sem tradição na agricultura, a família está se adaptando à vida rural do jeito que pode. Mesmo depois de abandonar a periferia de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre, e passar pelos acampamentos de lona preta, a família aprendeu muito pouco sobre como manejar um lote agrícola. No assentamento, um lugar à beira da estrada RS-630 lhes proporcionou montar uma pequena oficina onde Dejair Machado (o Doca), companheiro de Eleara, constrói carroças, faz soldas, remenda pneus e conserta tudo o que aparecer: “Tenho essa renda do dia a dia, que nos ajuda a sobreviver, mas não é o suficiente. Só de luz, tem mês que pagamos R$ 100. E temos quatro filhos. Se fosse só para comer, minha renda daria, mas precisamos de roupa, calçados… Chegamos num dezembro, e já em janeiro a Eleara foi pra Vacaria para podermos comprar os materiais dos meninos, o nosso fogão e outras coisas para a casa, pois não tínhamos nada.”

Emerson Ricardo Coelho (conhecido como Faísca) conseguiu trabalho mais perto, na carvoaria vizinha ao assentamento Itaguaçu, onde trabalha– e respira a fumaça intoxicante – como diarista para ganhar uns trocados. Mas faz isso apenas esporadicamente. Entre os assentados, há muita concorrência por uma vaga nos fornos, mas a atividade não pode ser efetiva, porque é vetado que se assine carteira ou se trabalhe fora da sua terra por um período superior a 90 dias. Se isso acontece, o assentado perde o lote, que é colocado pelo Incra à disposição de outra família interessada, através de edital. “Minha família não quis vir, estão vendo o sofrimento que estou passando. Eu ligo e eles me conseguem alguma coisa de dinheiro. Não adianta, tá horrível mesmo. Eu só queria que o Incra nos enxergasse”, diz o agricultor. “Me sinto como se tivesse sido atirado aqui há quatro anos”. Ele diz que nunca recebeu um centavo de recurso público para estruturar uma produção.

Assim, muitos assentados muitas acabam indo trabalhar em grandes propriedades e outros negócios. Mas, para o Incra, não há contradição com a ideia essencial de reforma agrária – dar autonomia para as famílias. Diz o superintendente regional do Incra, Roberto Ramos: “Obviamente que a gente não vê isso com bons olhos, não recomenda. Mas se a realidade é esta, ninguém vai ficar passando fome à espera. Se as coisas estão atrasadas, estão demorando, tem que dar o seu jeito.”
Prometeram R$ 60 milhões, entregaram R$ 7
“Ao assentar aproximadamente 580 famílias [pelos dados do Incra foram mais de 700] numa das regiões mais pobres do Estado e dominada por latifúndios improdutivos, tinha-se a intenção de colocar ‘uma estaca no coração do latifúndio!’ O que presenciamos hoje é o descaso que fundamenta os argumentos dos latifundiários e seus defensores, que acusam os assentamentos de ‘favelas rurais’”, dizia um manifesto feito por assentados da região que ocuparam, em abril deste ano, a principal praça de São Gabriel para protestar contra o abandono.

Crianças que acordam de madrugada e caminham quilômetros para chegar ao ponto do ônibus, estradas precárias ou ainda no papel, falta de água potável e energia elétrica, lotes não demarcados por anos, famílias ainda morando em barracos de lona porque não receberam dinheiro para construir suas casas, atraso no repasse das verbas para a produção de alimentos. A lista de problemas é extensa. A esperança vai sendo minada, dia após dia, mês após mês, ano após ano. Em alguns assentamentos a desistência foi de 70% das famílias assentadas, que sem condições de permanência nos lotes voltaram para a periferia das cidades.

As famílias que permanecem esperam até hoje pelas promessas feitas em dezembro de 2008 pelos então presidente do Incra, Rolf Rackbart, e o Ministro de Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel (VEJA AQUI http://www.youtube.com/watch?v=65DMo2_l–U). Na cerimônia de transferência da posse, Cassel afirmou aos recém-assentados que haveria R$ 60 milhões de reais em investimentos num prazo de até três anos (completados em dezembro de 2011), o que transformaria a economia local. “Esta é uma região que precisa produzir mais, que precisa produzir mais alimentos. E sempre que a reforma agrária chega numa região, traz consigo desenvolvimento, acelera a economia, e é isso que a gente quer ter aqui em muito pouco tempo. Quero voltar aqui daqui um ano ou dois e ver isso aqui produzindo mais. Aqui era um grande latifúndio que faliu. Do ponto de vista econômico, prejudica o país. O que a gente quer é nessa área que está abandonada botar gente. Aqui, mais de trezentas famílias vão produzir, as pessoas vão ter trabalho, renda e toda a sociedade vai ganhar com mais produção de alimentos”, saudava Cassel na época.

Mas até agora foram aplicados apenas 7 milhões de reais. O prefeito de São Gabriel, Rossano Gonçalves, conhecido por estar politicamente no terreno oposto ao MST, critica o governo federal: “Por não terem a infraestrutura necessária, os assentados não conseguiram agregar nada economicamente ao município. Essas terras que foram desapropriadas eram produtivas para arroz, soja, trigo e pecuária. É natural que os assentamentos em construção e buscando emancipação tivessem dificuldades. Mas falta até para culturas de subsistência. Há muito pouca horta, criação de porcos e galinhas. Os assentados estão limitadíssimos”.

Se a reforma agrária agoniza, não está morta. Nacionalmente, mesmo com os parcos investimentos do governo para a distribuição de terras e concessão de créditos aos assentados (houve um contingenciamento de mais de 70% do orçamento do órgão este ano), o Incra já distribuiu, desde 1985, uma área entre 10 a 15% do território produtivo do país, e é responsável por políticas que atendem um milhão de famílias. Destas, pelo menos 300 mil foram assentadas como resultado de ações organizadas pelo MST.

No Rio Grande do Sul, o superintendente do Incra/RS, Roberto Ramos sinaliza que, agora, os investimentos devem migrar da obtenção de novas áreas para melhorar os assentamentos que já existem. Ramos estima que já no final deste ano não haja mais famílias sob barracos de lona no Estado. Essa também é a expectativa do MST e a promessa do governador Tarso Genro – ele prometeu e acabar com os conflitos agrários no Estado até o final de seu mandato, assentando todas as famílias que ainda estão em beiras de estrada, que não chegam a mil.
A política do abandono
Ramos reconhece que o tempo ideal para construir a infraestrutura de um assentamento é de dois anos. Mas estima que os assentamentos de São Gabriel terão toda a infraestrutura depois de cinco ou seis anos. Ainda assim comemora, dizendo que na maioria dos casos é muito mais demorado: “Isso não é um demérito para a reforma agrária, é a dificuldade do nosso meio rural. Tem bolsões de miséria de agricultores familiares em varias regiões, ainda com dificuldade de saneamento, com falta de água, de luz elétrica.” No caso dos assentamentos, ele diz que a culpa é da burocracia. A primeira coisa a se fazer são as estradas, e todo o resto depende delas estarem prontas. Mas para que sejam feitas é preciso realizar antes o estudo da área com seus impactos ambientais e desenvolver o projeto de construção, depois vem a licitação, e ainda pode esbarrar na falta de recursos, o que aconteceu em 2011, por conta da mudança de governo.

O dirigente do MST Cedenir de Oliveira conta que, no Estado, há assentamentos com 20 anos que ainda não têm estradas e água encanada. Em São Gabriel, ao longo dos anos a pouca mão de obra usadas nas grandes propriedades esvaziou o campo, e toda a rede de serviços foi fechada ou precarizada – foi o que levou, por exemplo, à ausência de escolas.

Marcelo Trevisan, o coordenador do Instituto que há poucos meses é o responsável pelas demandas da região, diz que “do nosso ponto de vista, São Gabriel não é e não pode ser vista como símbolo de fracasso”: “A visão de acerto ou erro não está diretamente ligada à aplicação de mais ou menos recursos, mas sim a um cronograma de trabalho sério que está sendo feito, não só pelo Incra/RS, mas pelas famílias e os parceiros que temos”, diz ele, enquanto vai enumerando as equipes disponibilizadas pelo órgão estatal: duas equipes trabalhando estradas, uma equipe trabalhando os bueiros das estradas, duas equipes de demarcação, uma equipe de parcelamento, uma equipe rediscutindo e readequando o assentamento Madre Terra, outra trabalhando o parcelamento e demarcação do assentamento Cristo Rei (último a ser criado), funcionários das concessionárias de energia fazendo adequações nos assentamentos e equipes de assistência técnica circulando.

Visão completamente diferente tem Sérgio Pinto, presidente da Associação dos Servidores do Incra/RS e líder da greve iniciada em julho. “A reestruturação do Instituto é importante para atender estes assentamentos que estão aí praticamente no abandono, porque não tem servidor, não tem orçamento, e o corte de custeio impacta diretamente no atendimento. São Gabriel escancara tudo isso, as famílias estão mal assistidas”.

Em 2008, o ano das promessas, o Incra/RS criou um escritório que iria centralizar todas as ações para a região. “Hoje nós só temos um supervisor neste escritório, que atende a 700 famílias. Ele está sobrecarregado, é uma infinidade de problemas e os recursos não têm chegado porque o orçamento foi reduzido. E isso é uma regra geral”, garante Pinto.

Os servidores do Incra, em greve desde o início de julho, denunciam que entre 1985 e 2011 o órgão teve o número de servidores reduzido de 9 mil para 5,7 mil, enquanto sua atuação foi acrescida em 32,7 vezes – saltando de 61 municípios para mais de 2 mil, com um aumento de 124 vezes no número de projetos de assentamentos.

Até o superintendente regional, Roberto Ramos, faz coro à mobilização dos servidores: “O que queremos da reforma agrária? Se eu opto por não mais assentar famílias é porque o meu projeto de desenvolvimento não precisa de mais gente no meio rural. Então qual é a outra forma de inclusão? Não podemos admitir que se pare com a reforma agrária para dar Bolsa Família. Esta é a resposta que o governo ainda deve para os servidores do Incra e para sociedade como um todo: qual o espaço do Incra e da reforma agrária neste governo?”, desabafa.

Os assentados, claro, apoiam as reivindicações dos funcionários: “Não tem como viabilizar a reforma agrária se não viabilizar um órgão governamental que dê conta de assumir a responsabilidade. No momento que a gente se mobiliza e o governo diz ‘certo, vamos atender a pauta de vocês’, mas as condições são estas, e na prática não revigora o Incra, o governo simplesmente está dizendo que as coisas vão andar no ritmo deles e não no ritmo da nossa necessidade”, aponta Isaias Darlan, um dos coordenadores do assentamento Madre Terra, informando que, no papel, os planos de desenvolvimento preveem que cada assentamento receberia verba para habitações, estradas, transporte escolar e três parcelas de fomento liberadas até o final de um ano.

Ramos garante que sozinho o Incra não tem condições de fazer tudo. “Ou outras instituições, órgãos públicos e ministérios se aliam para contribuir com a melhoria da qualidade (de vida) das famílias assentadas, ou acontece também o que está acontecendo lá. O Incra não tem instrumentos, não tem gente e nem recurso pra fazer num curto espaço de tempo tudo o que é necessário”.

Trevisan, o coordenador do Instituto na região, completa: “É o Incra que tem que resolver o problema das escolas? Quem é responsável por colocar a escola e o transporte escolar são as secretarias municipais e estaduais de educação. É interessante, eu estive esses dias no assentamento Itaguaçu. Antes, diziam (a Prefeitura) que não podiam entrar dentro do assentamento, não tinha condições do transporte escolar entrar em nenhuma parte. Todo mundo tinha que ir até o inicio do assentamento pra pegar o ônibus. Após uma audiência pública convocada pelo Ministério Público Estadual (MPE/RS) estão fazendo o trajeto interno. Se pode hoje, então por que não podia há dois meses atrás?”, deixa no ar a questão.

O chamamento do MPE/RS a que Trevisan se refere ocorreu depois que representantes da Procuradoria Geral do Estado, da Procuradoria da República, de Secretarias do Estado, do município de São Gabriel, da Promotoria de Justiça local, representantes do Incra, MST, ONGs e o deputado federal Dionilso Marcon (PT-RS) – ele também um assentado – realizaram uma visita de inspeção no dia 4 de junho.

Com o diagnóstico da situação de emergência e afronta aos direitos fundamentais, o procurador geral do Estado, Eduardo de Lima Veiga, conduziu três audiências em Porto Alegre, entre 25 de junho e 30 de julho. “Foram reuniões em que se poderia sair com todos os problemas resolvidos. Estavam ali quem tem o dinheiro, quem pode operacionalizar, quem libera para abrir mão de licitação, nós que poderíamos nos organizar para ajudar”, diz Cedenir, o dirigente estadual do MST, que estava presente no encontro.

Lisiane Vilagrande, a promotora de Justiça de São Gabriel para Infância e Juventude pensa que o problema é anterior: “Me parece evidente a afronta aos direitos fundamentais, do ponto de vista da dignidade da pessoa humana. A questão é: como se permite a colocação dessas pessoas num local sem a mínima estrutura? Eu critico a decisão de se autorizar isso. Me parece que não se poderia permitir a presença de pessoas num projeto de assentamento e, sim, num assentamento. Essas pessoas deveriam ter vindo para cá já com água, luz, com acesso ao crédito, coisa que muitos estão obtendo só agora, três anos depois, e de forma insuficiente”.

As reuniões, até agora, conseguiram apenas informar um órgão ao outro o que este poderia estar fazendo. O Ministério Público Estadual fez uma recomendação de emergencialidade ao governador do Estado e ao Tribunal de Contas para que a Secretaria de Educação do Estado pudesse imediatamente construir escolas dentro dos assentamentos. Mas pra isso dependeria do INCRA terminar a abertura das estradas e fornecer o transporte interno aos alunos, já que a Prefeitura diz que não pode buscar as crianças dentro das áreas porque não tem os veículos adequados aos terrenos. E o INCRA saiu da última audiência apenas afirmando que vai avaliar a possibilidade de usar recursos de contratos de transporte que já existem, para oferecer às crianças. “Se alguma obra da Copa do Mundo ficar com alguma dificuldade de operação, você tenha a certeza que aquele mesmo grupo ali reunido resolve o problema”, diz Cedenir.

* Jornalistas independentes e fundadores da Cooperativa Catarse – Coletivo de Comunicação.  Esta reportagem foi realizada através do Concurso de Microbolsas de Reportagem da Pública.  Outras reportagens financiadas pelo concurso – com o apoio da Fundação Ford – serão publicadas durante este mês.




Política de uma nota só

5 de Agosto de 2012, 21:00, por Desconhecido - 0sem comentários ainda

Por Vladimir Safatle na Carta Capital . Lido em Tecedora.

Há várias maneiras de despolitizar uma sociedade. A principal delas é impedir a circulação de informações e perspectivas distintas a respeito do modelo de funcionamento da vida social. Há, no entanto, uma forma mais insidiosa. Ela consiste em construir uma espécie de causa genérica capaz de responder por todos os males da sociedade. Qualquer problema que aparecer será sempre remetido à mesma causa, a ser repetida infinitamente como um mantra.

Isto é o que ocorre com o problema da corrupção no Brasil. Todos os males da vida nacional, da educação ao modelo de intervenção estatal, da saúde à escolha sobre a matriz energética, são creditados à corrupção. Dessa forma, não há mais debate político possível, pois o combate à corrupção é a senha para resolver tudo. Em consequência, a política brasileira ficou pobre.
Não se trata aqui de negar que a corrupção seja um problema grave na vida nacional. É, porém, impressionante como dessa discussão nunca se segue nada, nem sequer uma reflexão mais ampla sobre as disfuncionalidades estruturais do sistema político brasileiro, sobre as relações promíscuas entre os grandes conglomerados econômicos e o Estado ou sobre a inexistência da participação popular nas decisões sobre a configuração do poder Judiciário.

Por exemplo, se há algo próprio do Brasil é este espetáculo macabro onde os escândalos de corrupção conseguem, sempre, envolver oposição e governo. O que nos deixa como espectadores desse jogo ridículo no qual um lado tenta jogar o escândalo nas costas do outro, isso quando certos setores da mídia nacional tomam partido e divulgam apenas os males de um dos lados. O chamado mensalão demonstra claramente tal lógica. O esquema de financiamento de campanha que quase derrubou o governo havia sido gestado pelo presidente do principal partido de oposição. Situação e oposição se aproveitaram dos mesmos caminhos escusos, com os mesmos operadores. Não consigo lembrar de nenhum país onde algo parecido tenha ocorrido.

Uma verdadeira indignação teria nos levado a uma profunda reforma política, com financiamento público de campanha, mecanismos para o barateamento dos embates eleitorais, criação de um cadastro de empresas corruptoras que nunca poderão voltar a prestar serviços para o Estado, fim do sigilo fiscal de todos os integrantes de primeiro e segundo escalão das administrações públicas e proibição do governo contratar agências de publicidade (principalmente para fazer campanhas de autopromoção). Nada disso sequer entrou na pauta da opinião pública. Não é de se admirar que todo ano um novo escândalo apareça.

Nas condições atuais, o sistema político brasileiro só funciona sob corrupção. Um deputado não se elege com menos de 5 milhões de reais, o que lhe deixa completamente vulnerável -para lutar pelos interesses escusos de financiadores potenciais de campanha. Isso também ajuda a explicar porque 39% dos parlamentares da atual legislatura declaram-se milionários. Juntos eles têm um patrimônio declarado de 1,454 bilhão de reais. Ou seja, acabamos por ser governados por uma plutocracia, pois só mesmo uma plutocracia poderia financiar campanhas.

Mas como sabemos de antemão que nenhum escândalo de corrupção chegará a colocar em questão as distorções do sistema político brasileiro, ficamos sem a possibilidade de discutir política no sentido forte do termo. Não há mais dis-cussões sobre aprofundamento da participação popular nos processos decisórios, constituição de uma democracia direta, o papel do Estado no desenvolvimento, sobre um modelo econômico realmente competitivo, não entregue aos oligopólios, ou sobre como queremos financiar um sistema de educação pública de qualidade e para todos. Em um momento no qual o Brasil ganha importância no cenário internacional, nossa contribuição para a reinvenção da política em uma era nebulosa no continente europeu e nos Estados Unidos é próxima de zero.

Tem-se a impressão de que a contribuição que poderíamos dar já foi dada (programas amplos de transferência de renda e reconstituição do mercado interno). Mesmo a luta contra a desigualdade nunca entrou realmente na pauta e, nesse sentido, nada temos a dizer, já que o Brasil continua a ser o paraíso das grandes fortunas e do consumo conspícuo. Sequer temos imposto sobre herança. Mas os próximos meses da política brasileira serão dominados pelo duodécimo escândalo no qual alguns políticos cairão para a imperfeição da nossa democracia continuar funcionando perfeitamente.