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A obra monstruosa que a direita ergueu durante a longa piscada do PT

noviembre 18, 2018 17:13 , por Correio do Brasil - | No one following this article yet.
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Apesar da retórica petista, na década passada, quando o país era governado pelo ‘cara’; com pleno emprego e programas sociais dos mais diversos, o Brasil está longe ainda de ser um país desenvolvido.

 

Por Gilberto de Souza – do Rio de Janeiro

 

Quiçá os mais de 50 milhões de brasileiras e brasileiros que votaram no governo eleito pudessem perceber o quão impressionante e profundo é o retrocesso social a que o país foi submetido. Para tanto, bastaria uma análise breve e desapaixonada mas, agora, isso parece impossível. Os atritos gerados com os BRICS, em nome da submissão completa à política persecutória de Washington, sob a égide de Donald Trump; sem contar a má vontade com os países muçulmanos, na decisão de mudar a embaixada brasileira para Jerusalém; estes são apenas indícios dos solavancos à frente.

Dilma piscou e a direita a retirou do poder em um golpe de Estado, com apoio da mídia e do JudiciárioDilma piscou e a direita a retirou do poder em um golpe de Estado, com apoio da mídia e do Judiciário

O fim de metade do programa Mais Médicos, com a retirada de mais de 8 mil profissionais cubanos, abre um hiato perigoso para a saúde pública brasileira já a partir dessa semana. Consultas e internações canceladas, falta de acompanhamento clínico nas situações em curso; desassistência generalizada na maioria dos municípios que integram a iniciativa da presidenta deposta Dilma Rousseff (PT). Vai morrer gente. E tudo isso, pela mera teimosia ideológica da ultradireita, serve apenas de entrada ao teatro dos horrores que se prenuncia para os próximos anos.

Apesar da retórica petista, na década passada, quando o país era governado pelo ‘cara’; com pleno emprego e programas sociais dos mais diversos, o Brasil está longe ainda de ser um país desenvolvido. Comprava-se geladeiras, máquinas de lavar, passagens aéreas, automóveis e muito mais, com empréstimos a juros escorchantes; mas o número de livrarias permaneceu o mesmo. Afinal, quem precisa ler os clássicos, quando se tem a Globo, a Record e a Band?

A novela, na telinha da TV — agora moderna, fininha e parcelada em 48 meses — continuou mostrando o pobre que, em um passe de mágica do destino, vira milionário; casa-se com uma paulista quatrocentona e é aplaudido na alta sociedade da Avenida Paulista. Não importa se a realidade é outra, pois a então mandatária reforçava esse roteiro ao declinar de um convite do governo russo para um lugar de honra, na comemoração pela vitória sobre os nazistas, ao se vestir de fada-madrinha para um casamento chique na pauliceia desvairada. Foi vaiada ao chegar e na saída.

Erro crasso

Aquelas vaias prenunciavam os movimentos financiados pela escória do capitalismo mundial, e terminariam por marcar mais um golpe de Estado na História brasileira. Para uma parcela da esquerda no poder, o discurso de ódio ao PT e a tudo o que ele significa não passava de um zumbido. Bolsonaro era aquele parlamentar estúpido, amigo do Eduardo Cunha (MDB-RJ); que defendia a volta da ditadura, da tortura, da segregação racial e, imaginavam os áulicos ululantes em cargos novinhos em folha, que nunca passaria de um mero bufão. Erro crasso.

Sequer perceberam que, na Câmara, um movimento surdo, movido a zilhões de dinheiros imundos para um número expressivo de parlamentares, tornaria possível o impedimento contra a poltrona, representante do ‘cara’. O fato de algum dia ter sido presa e torturada, nos porões da ditadura, não era mais uma credencial para mantê-la no poder, mas o oposto. E Dilma tremeu. Ao custo de mais alguns milhões de dólares, desta vez pagos por fundações norte-americanas até mesmo para aqueles formadores de opinião supostamente de esquerda – da esquerda cheirosa, limpinha e desamarrotada – milhões foram às ruas, vestidos de verde-amarelo, dizer que “nossa bandeira jamais será vermelha”.

E ficou por isso mesmo. O sentimento nos partidos e movimentos sociais progressistas era de pasmo, incredulidade, estupefação. Ainda que estivesse claro o papel da mídia conservadora na mobilização de significante parcela da sociedade, o governo petista mantinha firme o repasse mensal de milhões de reais aos cofres do cartel midiático, enquanto simplesmente ignorava aqueles que, hoje, dizem com pesar: “Eu avisei”.

Parvos

Mesmo depois do golpe de Estado, já sob as unhas afiadas de Michel Temer, os atores dos movimentos progressistas que poderiam liderar um levante, ainda que fosse nessa campanha eleitoral inconsistente e absurda, mantiveram-se embasbacados pela tese do republicanismo naïf. Acreditaram tanto nos poderes e nas instituições, que “funcionam perfeitamente” em meio a um golpe, escancarado, que entregaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à sanha do juiz Sérgio Moro, ora ministro de uma Justiça partidarizada e brutal. Corre o sério risco de morrer na cadeia.

Se seus algozes não forem de todo parvos, o manterão vivo a qualquer custo. Um mártir, a essa altura dos acontecimentos, serviria de alento para uma possível reflexão nacional quanto ao retrocesso imposto ao país desde seu encarceramento, para que não concorresse ao Planalto. O fantasma de Lula tenderia a incomodar mais do que sua simples ausência no cenário político, nesta idílica temporada na cadeia; entre livros, a TV de 24 polegadas e uma esteira ergométrica, tipo aquelas dispostas para os ratinhos, nos laboratórios dos vilões de desenho animado.

Lendas e mitos têm o condão de ser mais atraentes ao gosto popular do que a dura realidade. Assim acontece quando se presume que os valores intrínsecos ao modelo que se quer destronar possam servir de condutor à transformação pretendida. Pior. Quando nem mesmo fica claro que transformação seria essa. Um capitalismo mais humano, talvez. Ou um socialismo nem tão exagerado, pode ser. Alguma coisa que, desde a Coluna Prestes, a esquerda não consegue desenhar.

Ficam regurgitando, desde Getúlio, o discurso morno e intragável que, ao longo de 15 anos do PT no poder, resultou apenas em uma nova queda fragorosa. Sem consistência teórica ou ideológica, fizeram uma torta de gosto duvidoso, com muitos espaços vazios; onde proliferaram os fungos da distopia, entre cânticos de louvor ao deus Mercado e continências à bandeira norte-americana. Os esporos do autoritarismo, rapidamente, tomaram as redes sociais. Dispostos em notícias falsas, as mais absurdas, de forma correlata e nos programas adequados, dissiparam-se velozmente via WhatsApp. A posse de uma arma então, do nada, passou a ser mais importante e relevante do que saúde e bem estar social.

Neofascista

Trata-se aqui, portanto, de assertivas quanto ao óbvio: quem visa empoderar o trabalhador não deve servir ao patrão. Menos, ainda, ao sistema educacional que incute nos pobres e desvalidos os valores da subserviência às castas que nos dividem em classes A, B ou C. Ou aos mecanismos de dominação social, a exemplo do que ocorre com os padrões erguidos pela mídia conservadora. Quem dirá aos bancos, que terminam o serviço ao concentrar, brutalmente, a renda nacional.

Assim, por imaginar possível uma sociedade amorfa, fundada nas sapatas do consumismo e dos valores capitalistas, de um lado; desmobilizada para a luta de classes e os interesses estrangeiros, de outro; a campanha levada a termo pela esquerda teve sua solução de continuidade na derrota para um movimento neofascista, claro e específico. Ainda que destrutivo e nauseante.

Na realidade, a esquerda como um todo piscou. Imaginava conversar com alunos da Universidade de São Paulo (USP) enquanto o público é bem outro. O país não dispõe sequer de esgoto e água encanada para mais de 130 milhões de habitantes; nem trata 50% do esgotamento sanitário disponível. O analfabetismo ainda é um suplício que atinge mais de 100 milhões de adultos; entre aqueles que não assinam e os outros que chegam, no máximo, a desenhar as letras do próprio nome. É deles que se alimenta a cadela do fascismo, citada por Bertold Brecht; pois são eles que dependem do Estado para, literalmente, viver.

Essa nova inclinação no eixo das políticas interna e externa do país tem força para atirar ao desterro qualquer um que defenda a inclusão na vida nacional dos pobres, pretos, mulheres e, principalmente, os jovens desses extratos. Estes últimos perdem qualquer chance de se desenvolver, cultural e socialmente, em um país agora voltado para a minoria de brancos, ricos, misóginos e racistas que ascende ao governo. Quando estes eleitores, iludidos pelas bravatas de ‘um Brasil que vai pra frente’, perceberem a dimensão do erro cometido, terá sido tarde demais.

Aí, haja repressão para evitar que as pedras atinjam o imenso telhado de vidro deste castelo de cartas construído, em tempo recorde, durante a longa piscada da esquerda nacional.

Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do Correio do Brasil.


Origen: https://www.correiodobrasil.com.br/obra-monstruosa-direita-ergueu-longa-piscada-pt/

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