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Daniela

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Crise no Paraguai e reflexos regionais

June 30, 2012 21:00 , by Unknown - 0no comments yet | No one following this article yet.
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Não podemos deixar o episódio passar sem uma resposta à altura porque, além de ser inaceitável, a ruptura democrática em um país vizinho e irmão constitui-se uma ameaça
A crise gerada pela deposição sumária do presidente Fernando Lugo e a ruptura da ordem democrática no Paraguai seguramente não ficará restrita ao âmbito interno e deverá respingar e impactar toda a região. A América Latina, que vive um grande momento de ascensão de governos democráticos e progressistas, também sente o golpe desferido e repudia de maneira unificada e integrada a destituição de um governo legítimo, eleito pelo povo.
Reforça essa posição a forma como se deu o processo de impeachment de Lugo. O golpe "constitucional", revestido de legalidade armado pelo Poder Legislativo, ocorreu em questão de horas, sem que Lugo tivesse o direito básico da ampla defesa. Para se ter uma ideia, o processo que destituiu o ex-presidente Fernando Collor no Brasil, desde sua abertura até o julgamento final, levou seis meses para ser concluído. A pressa em depor Lugo foi um sinal claro de que o ocorrido passou ao largo do que se entende por Estado Democrático de Direito.
O motivo apresentado pelo Congresso paraguaio para o julgamento e condenação de Lugo — o mau desempenho de suas funções, tendo como estopim um confronto sangrento entre exército e camponeses —, além da falta de provas e investigação, evidencia o absurdo de um golpe que já estava sendo articulado pelas forças conservadoras, que sempre se beneficiaram das atividades criminosas que Lugo vinha combatendo — notadamente, o comércio ilegal, o narcotráfico e a corrupção.
Infelizmente, a fragilidade interna vivida no cargo pelo presidente paraguaio — que enfrentava desde o início de seu mandado forte resistência às reformas sociais que tentava implementar e quase nenhuma sustentação política — impediu que a reação popular nas ruas tivesse forças para barrar o golpe em curso. A delegação de chanceleres da União das Nações da América do Sul (Unasul), enviada à capital paraguaia para tentar dissuadir os conspiradores, esforçou-se em interromper o levante, mas não encontrou nenhum interesse de diálogo.
A contestação da legitimidade do governo de Federico Franco — o vice-presidente que, "de bom grado", assumiu o poder — e as sanções diplomáticas que começam a ser impostas são as formas de resistência adotadas pelos países latino-americanos.
A suspensão da participação do Paraguai na Unasul e no Mercosul aguarda apenas ser ratificada. Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina, Uruguai, Peru, Brasil e Chile retiraram ou chamaram para consulta seus embaixadores em Assunção. El Salvador não reconheceu o novo presidente paraguaio e propôs que os países membros do Sistema de Integração Centroamericano (SICA) façam o mesmo. Sanções de limitação de comércio, como a interrupção do envio de petróleo anunciado pelo presidente venezuelano, Hugo Chávez, começam a acontecer.
Essas medidas são respostas à flagrante violação da ordem constitucional. O protocolo da Unasul prevê não só a suspensão do país que teve ruptura democrática do bloco, mas também o fechamento parcial ou total das fronteiras terrestres com o Estado afetado e a suspensão ou limitação do comércio, transporte aéreo e marítimo, fornecimento de energia, serviços e abastecimento. Mas não podemos nos esquecer de que restrições econômicas trazem graves repercussões para o povo paraguaio e não podemos castigá-lo ainda mais. Os cahanceleres dos países do Mercosul já sinalizaram que promoverão a suspensão do país do bloco, sem entretanto aplicar sanções econômicas.
Por outro lado, países como Alemanha, Espanha, EUA e Canadá estão classificando como "normal" o golpe e reconhecendo a legitimidade do novo governo paraguaio, talvez porque estejam a salvo dos reflexos mais diretos dessa situação, diferentemente do que acontece com os países da América Latina.
Para o nosso continente, não são apenas as implicações diplomáticas e econômicas que nos obrigam a redobrar a atenção quando governos democraticamente constituídos sofrem uma interrupção abrupta como a do Paraguai. Não podemos deixar o episódio passar sem uma resposta à altura porque, além de ser inaceitável, a ruptura democrática em um país vizinho e irmão constitui-se uma ameaça. Sabemos bem os riscos que enfrentaremos ao deixarmos uma lacuna nessa questão.
As reações favoráveis ao golpe de setores políticos conservadores no Brasil, Argentina, Bolívia, Chile, Equador e Venezuela, bem como o tom de apoio adotado por boa parte da grande imprensa desses países, são reveladoras. Acusações sem prova, como as que alijaram Lugo da Presidência, são usualmente utilizadas no discurso da oposição e da mídia latino-americanas. Bolívia, Equador e Venezuela, de formas distintas, foram vítimas de tentativas golpistas recentes, as quais, felizmente, não vingaram.
Uma postura incisiva, portanto, é crucial para impedir novos intentos antidemocráticos na América Latina. Não podemos ser coniventes com o que está acontecendo no Paraguai, sob o risco de que episódios semelhantes se alastrem pelo continente. A luta tão sacrificada dos povos latino-americanos pela conquista da democracia não pode ser pisoteada dessa forma.
José Dirceu, advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

Source: http://contextolivre.blogspot.com/2012/07/crise-no-paraguai-e-reflexos-regionais.html

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