Pesquisa eleitoral no Brasil é coisa séria?
November 14, 2012 22:00 - no comments yet![]() |
Pergentino acompanha as pesquisas eleitorais no Brasil há 55 anos |
Com o fim das eleições municipais, imprensa e eleitores tendem a um relaxamento do assunto, mas este Nota de Rodapé resolveu retomar o tema, dessa vez, tratando de uma nuance importante pouco conhecida do público, as pesquisas eleitorais. Afinal, elas são ou não são confiáveis? Existe manipulação? Como se faz pesquisa no Brasil?
Para analisar essas situações e o mercado dos institutos de pesquisas eleitorais, entrevistamos um dos maiores estudiosos e práticos do assunto, Pergentino Mendes de Almeida, professor convidado na pós-graduação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, conselheiro da Associação das Empresas de Pesquisas de Mercado, Opinião e Mídia (Abep) e vice-presidente da Associação Brasileira dos Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia. Ele é precursor das discussões em grupo no Brasil e foi pioneiro no uso de análises multivariadas nas pesquisas comerciais.
Há 55 anos militando na área de comunicação e pesquisas, Pergentino segue atuante. Trabalha na LPM – Levantamentos e Pesquisa de Marketing, empresa que fundou em 1969, ao lado da esposa Dilma Mendes de Almeida. Na entrevista, Pergentino fala dos problemas da rapidez na realização de pesquisas para atender demandas, dos erros de interpretação de pesquisadores e jornalistas, da visão distorcida das margens de erro e aconselha menos importância às pesquisas e marqueteiros.
Nota de Rodapé – Sobre capacidade profissional, organização e métodos, em que estágio o senhor, na média, vê o mercado de pesquisas no Brasil?
Pergentino Mendes de Almeida – Em média, as pesquisas de opinião no Brasil têm um nível comparável ao dos mercados mais desenvolvidos.
NR – Especificamente no segmento político-eleitoral, o nível é confiável?
PMA – De modo geral, sim. As grandes tendências do eleitorado têm sido apontadas com sucesso no Brasil na maior parte dos casos. Os institutos que trabalham regularmente nessa área e, muitos outros que fazem trabalhos específicos, não publicados, têm muito a perder se descuidarem da imagem de confiabilidade.
NR – Quais problemas destacáveis ocorrem na metodologia, aplicação, matemática, enfim, no processo de feitura das pesquisas?
PMA – Os maiores problemas que sinto ocorrerem nessa área são decorrência das circunstâncias em que as pesquisas eleitorais são feitas. A opinião pública frequentemente se revela volátil e inconstante. Como decorrência disso e da pressão dos candidatos e da própria mídia pela geração constante, repetida e urgente de novos resultados, o que se faz é um esforço enorme de boa vontade para adaptar a metodologia dita científica às condições práticas de trabalho, o que implica em riscos maiores de erros. O que favorece as pesquisas é a relativa robustez de resultados, em termos de tendências gerais. Mas, onde as atitudes do eleitorado são mais voláteis, essa robustez pode desmoronar.
NR – Como o senhor vê as margens de erro adotadas hoje?
PMA – Essas margens são mal interpretadas não só pelos jornalistas, como por muitos pesquisadores. Quando se diz que “esta pesquisa tem um erro de 3% para mais ou para menos” se está simplificando e distorcendo a versão original recomendada pela Esomar (Associação Internacional de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia) aos associados, nos anos 80 do século passado. A versão original era mais ou menos assim: “Uma amostra probabilística simples do tamanho desta amostra pode apresentar uma variação puramente casual de 3%, para mais e para menos, no máximo, a um nível de 95% de certeza (ou 90%, ou 97,5%, ou 99%, etc.)”. A intenção era apenas deixar claro para o público e para os jornalistas que o resultado de pesquisas por amostragem é sempre uma aproximação da realidade e não pode ser trabalhado como se fazia, como se fosse um número exato e preciso. Mas a explicação parece complicar ainda mais do que explicar, embora tenha servido ao propósito original. Uma pesquisa perfeita realizada por amostragem está sujeita a um erro puramente ao acaso e esse erro é tanto menos provável quanto maior ele for. Note que, para cada porcentagem de intenções de voto em cada candidato, haverá uma margem de erro diferente, dentro da mesma amostra. O erro casual de uma porcentagem de 45% é maior do que o de outra porcentagem de 35%, por exemplo. Isso, numa só pesquisa. Essa margem de erro é, na verdade, uma subestimativa da margem de erro real, no caso de amostras que não sejam estritamente probabilísticas simples.
"A função da pesquisa é documentar a dinâmica do processo por retratos sucessivos das mudanças até o desenlace nas urnas. É particularmente útil nessa documentação, não na capacidade de “acertar” o resultado final. Se se quiser antever o resultado futuro da campanha e não se estiver preparado para aceitar as limitações próprias do processo racional de pesquisa do real, recomendaria que se procure uma cartomante e não um instituto de pesquisas."
NR – De que forma pode ser explicada essa amostra?
PMA – Numa amostra probabilística simples você tem a lista de todos os eleitores e faz um sorteio, absolutamente ao acaso, de modo que cada um de todos os eleitores tenha a mesma chance de ser sorteado para responder ao questionário.
NR – E nas amostras por cotas, como é o procedimento?
PMA – Amostras por cotas são aquelas em que você pré-determina quem o entrevistador deve procurar, por sexo, classe social, região de moradia, etc., e deixa por conta dele achar uma pessoa assim. Supõe-se que você determina as cotas de acordo com dados confiáveis do Censo, do TSE, do TRE ou de outra fonte confiável e representativa da população da qual você quer tirar uma amostra. Amostras por cotas podem ser bastante representativas, mas o problema é que não há um modo simples de calcular a probabilidade de errar. Elas podem requerer um fator multiplicativo quase impossível de calcular. No caso de prévias eleitorais, realmente impossível de calcular.
NR – O senhor considera que os erros ocorridos afetam a credibilidade dos institutos de pesquisa?
PMA – Creio que afetam. Mas isso não prejudica os institutos especializados, uma vez que o público, a mídia, os governos, as empresas, os sindicatos, as empreiteiras e os políticos continuam dependentes e ávidos pelos números que eles oferecem.
NR – Os institutos acertam mais do que erram?
PMA – De modo geral, as pesquisas acertam mais do que erram. Isso permitiu a várias pessoas computarem todos os resultados eleitorais no Brasil, para verificar o grau de “acerto” das pesquisas, e concluírem que eles predominam e que os “erros” estão dentro da margem de 95% certeza. O problema que vejo aqui não é dos institutos ou das pesquisas. É a filosofia da coisa, por assim dizer. É o modo como as pessoas em geral e a mídia em particular encaram os resultados de pesquisas. A prévia eleitoral dará sempre um quadro aproximado da realidade instantânea, do momento. A campanha eleitoral é um processo dinâmico. A função da pesquisa é documentar a dinâmica do processo por retratos sucessivos das mudanças até o desenlace nas urnas. É particularmente útil nessa documentação, não na capacidade de “acertar” o resultado final. Se se quiser antever o resultado futuro da campanha e não se estiver preparado para aceitar as limitações próprias do processo racional de pesquisa do real, recomendaria que se procure uma cartomante e não um instituto de pesquisas.
NR – O senhor é a favor de fiscalização rigorosa nos institutos de pesquisa? Existe algo nesse sentido?
PMA – Depende do que você chama de “rigorosa”. Já existem regulações suficientes na lei, algumas até contraproducentes. Por exemplo, a burocracia exigida para realizar-se uma pesquisa eleitoral, que será eventualmente publicada depois de feita, é exemplar, é como se um protocolo do TSE pudesse garantir a confiabilidade do trabalho. A publicação (e interpretação equivocadas) das tais margens de erro é do texto da lei. A exigência de registro de estatístico habilitado, isso é, “estatístico de carteirinha”, em nada contribui para a qualidade das pesquisas, serve mais para defender interesses corporativos e para o bolso dos portadores das ditas carteirinhas. Pelo lado positivo, a lei faculta aos partidos, candidatos e eleitores o direito de exigir explicações e detalhes da metodologia e da realização da pesquisa, podendo mesmo conferir fisicamente os registros originais dos dados. O problema é que isso leva tempo e a campanha não espera. As coisas não funcionam exatamente como idealizadas na lei. Quando você fala em “fiscalização rigorosa”, fico com medo da interferência de agentes “isentos”, de fora do instituto de pesquisa, nos processos internos de controle e realização de um trabalho que deve ser ao mesmo tempo eficiente e confiável. Quanto mais se complicar a coisa, pior fica. E existem também órgãos representativos dos pesquisadores, que subscrevem um Código de Ética e cujos membros sujeitam-se à fiscalização do órgão. Pode-se recorrer à Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas de Mercado, Opinião e Mídia (Abep) e Associação Brasileira dos Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM).
NR – Em Atibaia e Bragança, no interior de São Paulo, os vitoriosos nas urnas estiveram, durante toda a campanha, coisa de 15%, 20% longe dos primeiros colocados nas pesquisas. Por que algumas distorções chegam a números tão alarmantes, tão distantes do resultado final?
PMA – Como não acompanhei as campanhas de Atibaia e Bragança e não tenho familiaridade com o contexto político dessas cidades, só posso responder em tese. Os números que você mencionou realmente são díspares. Pode-se pensar na existência ou não existência de má fé. Vamos supor que não houve uma distorção deliberada de mentir, pois aí nada teria a acrescentar. No caso de ausência de má fé, uma primeira hipótese é a de um erro amostral. É possível um erro de amostragem, aleatório, tecnicamente compreensível e aceitável, dessa magnitude? A resposta é sim, embora pouco provável, se for uma amostragem probabilística, com sorteio aleatório de entrevistados. O problema nesses casos é que o método de amostragem em prévias eleitorais é o de cotas, mais ou menos sem controle dos indivíduos escolhidos para responder dentro de cada cota de trabalho dada ao entrevistador. É o problema da urgência e dos custos dos resultados, pois só assim os pesquisadores podem atender às demandas dos partidos e da mídia. Nesse caso, é impossível medir o erro amostral e estimar intervalos de confiança.
"Se me coubesse dar conselho de como remediar a situação ou proteger-se, diria: preste mais atenção àquilo que o candidato representa e ao que ele se propõe, mais do que aos resultados de pesquisas. Aconselharia aos candidatos tomarem posições mais claras e firmes em torno de propostas substanciais e a dar menos importância às pesquisas e marqueteiros. Diria também aos jornalistas que invistam mais na compreensão e na crítica do fundo político em jogo do que nas apostas na cosmética e nos números da roleta."
NR – Mas, o senhor tem exemplos históricos de situações que tenham apresentado divergências tão gritantes com o resultado real?
PMA – Não me recordo assim de imediato, mas existem precedentes. Aliás, diferenças entre prévias e eleições são mais frequentes do que se pensa. Até quando o instituto “acerta” o vencedor, já que neste caso ninguém reclama mesmo que os resultados das urnas sejam muito diversos dos da pesquisa.
NR – O que pode gerar a situação de um mesmo instituto, no caso, o Ibope, em Bragança Paulista, fazer duas pesquisas, praticamente com os mesmos dias de campo, e uma apontar 14% de diferença entre primeiro e segundo colocados e a outra só 4%?
PMA – Nos casos de Atibaia e Bragança Paulista o problema parece maior, pelo que me foi narrado, devido ao fato de as pesquisas terem sido feitas pouco antes do dia da eleição. Eu me pergunto se haveria alguma tendência de mudança já em curso anteriormente, durante a campanha, qual o grau de volatilidade nessas cidades, número dos indecisos, e como essas situações evoluíram até o dia da eleição. Ademais, quais os procedimentos específicos de amostragem? Qual o grau de controle em campo? Sabemos que, nas condições apressadas da realização de prévias, a verificação posterior das respostas trazidas pelos entrevistadores é falha, quando não impossível, como no caso de entrevistas feitas com transeuntes na rua. O Ibope, ao que me consta, faz entrevistas em domicílio, o que facilita o controle. Entre as centenas ou milhares de prévias feitas no Brasil, muitas divergem do resultado das urnas. Algumas divergem bastante. Mas a maior parte acerta, pelo menos no atacado. Cada caso é um caso. Ou seja, deve ser possível alguma explicação, antes de se admitir, de um lado, ou a hipótese de manipulação dos dados, por má fé, ou, por outro lado, a de variação amostral aleatória, com uma probabilidade quase etérea, embora real.
NR – O candidato vitorioso a prefeito em Bragança, pelo PT, disse que pesquisas são ótimas, que usou as internas do partido como medição e elas foram muito úteis, mas se sentiu prejudicado com publicações de alguns estudos. Entre a realização e a divulgação das pesquisas pode haver distorção?
PMA – Normalmente, os problemas entre realização e divulgação de pesquisas são muitos e intensos. Afora uma possível distorção deliberada do meio, ocorrem distorções de boa fé. Aprendi, na eleição da Luíza Erundina para a Prefeitura de São Paulo (em 1988) que os dados obtidos em campo frequentemente falam mais verdades do que a interpretação, quer pela mídia, quer pelo próprio instituto. Um primeiro problema é quando um resultado é inesperado ou mesmo surpreendente. A prudência quase que força o pesquisador a “corrigi-lo”. Aí ele pode se enroscar. Outro problema é a interpretação do resultado, que é função do jornalista. Ele pode ver implicações e consequências equivocadas, que vão orientar a notícia que o leitor receberá.
NR – O senhor tem sugestões para aperfeiçoar o processo e diminuir os erros?
PMA – Não tenho uma fórmula mágica que salve a pátria de todos os perigos. Mas o chamado “problema das pesquisas”, que volta a ser levantado em cada eleição, não é um problema das pesquisas. É, principalmente, um problema da mídia e também dos políticos, dos partidos, dos financiadores, de quem “usa” a pesquisa. Os políticos e a mídia dão uma importância exagerada aos resultados das pesquisas. Os políticos, para se promoverem junto aos financiadores de campanha ou para desdenhar as pesquisas. A mídia, para gerar notícias e “repercutir”. Como dizem os jornalistas, isso vende. Os chamados marqueteiros ganham um bom dinheiro dando orientação aos políticos, com base em pesquisas. E os candidatos estão cada vez mais parecidos com embalagens de sabonetes e as propostas são comerciais de TV. Se a mídia americana continuar sendo, como sempre foi, um modelo precursor de muito do que se faz no Brasil, vamos ver cada vez mais uma disputa cosmética entre candidatos, com pretensas, porém vistosas “pesquisas” no ar, para saber instantaneamente “quem ganhou o debate”. Se for assim, a pesquisa vai cair cada vez mais de qualidade, acompanhando os partidos e os candidatos. E os índices crescentes de abstenção vão crescer ainda mais. Se me coubesse dar conselho de como remediar a situação ou proteger-se, diria: preste mais atenção àquilo que o candidato representa e ao que ele se propõe, mais do que aos resultados de pesquisas. Aconselharia aos candidatos tomarem posições mais claras e firmes em torno de propostas substanciais e a dar menos importância às pesquisas e marqueteiros. Diria também aos jornalistas que invistam mais na compreensão e na crítica do fundo político em jogo do que nas apostas na cosmética e nos números da roleta.
Moriti Neto, jornalista, mantém a coluna mensal Escarafunchar No Nota de Rodapé
Nota do PT sobre a Ação Penal 470
November 13, 2012 22:00 - no comments yet
Rui Falcão (D), presidente nacional do PT,junto com o secretário de Comunicação, André Vargas (PT-PR)
Foto: Luciana Santos/PT
Foto: Luciana Santos/PT
O PT, amparado no princípio da liberdade de expressão, critica e torna pública sua discordância da decisão do Supremo Tribunal Federal que, no julgamento da Ação Penal 470, condenou e imputou penas desproporcionais a alguns de seus filiados.
1. O STF não garantiu o amplo direito de defesa
O STF negou aos réus que não tinham direito ao foro especial a possibilidade de recorrer a instâncias inferiores da Justiça. Suprimiu-lhes, portanto, a plenitude do direito de defesa, que é um direito fundamental da cidadania internacionalmente consagrado.
A Constituição estabelece, no artigo 102, que apenas o presidente, o vice-presidente da República, os membros do Congresso Nacional, os próprios ministros do STF e o Procurador Geral da República podem ser processados e julgados exclusivamente pela Suprema Corte. E, também, nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os ministros de Estado, os comandantes das três Armas, os membros dos Tribunais superiores, do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática em caráter permanente.
Foi por esta razão que o ex-ministro Marcio Thomaz Bastos, logo no início do julgamento, pediu o desmembramento do processo. O que foi negado pelo STF, muito embora tenha decidido em sentido contrário no caso do “mensalão do PSDB” de Minas Gerais.
Ou seja: dois pesos, duas medidas; situações idênticas tratadas desigualmente.
Vale lembrar, finalmente, que em quatro ocasiões recentes, o STF votou pelo desmembramento de processos, para que pessoas sem foro privilegiado fossem julgadas pela primeira instância – todas elas posteriores à decisão de julgar a Ação Penal 470 de uma só vez.
Por isso mesmo, o PT considera legítimo e coerente, do ponto de vista legal, que os réus agora condenados pelo STF recorram a todos os meios jurídicos para se defenderem.
2. O STF deu valor de prova a indícios
Parte do STF decidiu pelas condenações, mesmo não havendo provas no processo. O julgamento não foi isento, de acordo com os autos e à luz das provas. Ao contrário, foi influenciado por um discurso paralelo e desenvolveu-se de forma “pouco ortodoxa” (segundo as palavras de um ministro do STF). Houve flexibilização do uso de provas, transferência do ônus da prova aos réus, presunções, ilações, deduções, inferências e a transformação de indícios em provas.
À falta de elementos objetivos na denúncia, deducões, ilações e conjecturas preencheram as lacunas probatórias – fato grave sobretudo quando se trata de ação penal, que pode condenar pessoas à privação de liberdade. Como se sabe, indícios apontam simplesmente possibilidades, nunca certezas capazes de fundamentar o livre convencimento motivado do julgador. Indícios nada mais são que sugestões, nunca evidências ou provas cabais.
Cabe à acusação apresentar, para se desincumbir de seu ônus processual, provas do que alega e, assim, obter a condenação de quem quer que seja. No caso em questão, imputou-se aos réus a obrigação de provar sua inocência ou comprovar álibis em sua defesa—papel que competiria ao acusador. A Suprema Corte inverteu, portanto, o ônus da prova.
3. O domínio funcional do fato não dispensa provas
O STF deu estatuto legal a uma teoria nascida na Alemanha nazista, em 1939, atualizada em 1963 em plena Guerra Fria e considerada superada por diversos juristas. Segundo esta doutrina, considera-se autor não apenas quem executa um crime, mas quem tem ou poderia ter, devido a sua função, capacidade de decisão sobre sua realização. Isto é, a improbabilidade de desconhecimento do crime seria suficiente para a condenação.
Ao lançarem mão da teoria do domínio funcional do fato, os ministros inferiram que o ex-ministro José Dirceu, pela posição de influência que ocupava, poderia ser condenado, mesmo sem provarem que participou diretamente dos fatos apontados como crimes. Ou que, tendo conhecimento deles, não agiu (ou omitiu-se) para evitar que se consumassem. Expressão-síntese da doutrina foi verbalizada pelo presidente do STF, quando indagou não se o réu tinha conhecimento dos fatos, mas se o réu “tinha como não saber”...
Ao admitir o ato de ofício presumido e adotar a teoria do direito do fato como responsabilidade objetiva, o STF cria um precedente perigoso: o de alguém ser condenado pelo que é, e não pelo que teria feito.
Trata-se de uma interpretação da lei moldada unicamente para atender a conveniência de condenar pessoas específicas e, indiretamente, atingir o partido a que estão vinculadas.
4. O risco da insegurança jurídica
As decisões do STF, em muitos pontos, prenunciam o fim do garantismo, o rebaixamento do direito de defesa, do avanço da noção de presunção de culpa em vez de inocência. E, ao inovar que a lavagem de dinheiro independe de crime antecedente, bem como ao concluir que houve compra de votos de parlamentares, o STF instaurou um clima de insegurança jurídica no País.
Pairam dúvidas se o novo paradigma se repetirá em outros julgamentos, ou, ainda, se os juízes de primeira instância e os tribunais seguirão a mesma trilha da Suprema Corte.
Doravante, juízes inescrupulosos, ou vinculados a interesses de qualquer espécie nas comarcas em que atuam poderão valer-se de provas indiciárias ou da teoria do domínio do fato para condenar desafetos ou inimigos políticos de caciques partidários locais.
Quanto à suposta compra de votos, cuja mácula comprometeria até mesmo emendas constitucionais, como as das reformas tributária e previdenciária, já estão em andamento ações diretas de inconstitucionalidade, movidas por sindicatos e pessoas físicas, com o intuito de fulminar as ditas mudanças na Carta Magna.
Ao instaurar-se a insegurança jurídica, não perdem apenas os que foram injustiçados no curso da Ação Penal 470. Perde a sociedade, que fica exposta a casuísmos e decisões de ocasião. Perde, enfim, o próprio Estado Democrático de Direito.
5. O STF fez um julgamento político
Sob intensa pressão da mídia conservadora—cujos veículos cumprem um papel de oposição ao governo e propagam a repulsa de uma certa elite ao PT - ministros do STF confirmaram condenações anunciadas, anteciparam votos à imprensa, pronunciaram-se fora dos autos e, por fim, imiscuiram-se em áreas reservadas ao Legislativo e ao Executivo, ferindo assim a independência entre os poderes.
Único dos poderes da República cujos integrantes independem do voto popular e detêm mandato vitalício até completarem 70 anos, o Supremo Tribunal Federal - assim como os demais poderes e todos os tribunais daqui e do exterior - faz política. E o fez, claramente, ao julgar a Ação Penal 470.
Fez política ao definir o calendário convenientemente coincidente com as eleições. Fez política ao recusar o desmembramento da ação e ao escolher a teoria do domínio do fato para compensar a escassez de provas.
Contrariamente a sua natureza, de corte constitucional contra-majoritária, o STF, ao deixar-se contaminar pela pressão de certos meios de comunicação e sem distanciar-se do processo político eleitoral, não assegurou-se a necessária isenção que deveria pautar seus julgamentos.
No STF, venceram as posições políticas ideológicas, muito bem representadas pela mídia conservadora neste episódio: a maioria dos ministros transformou delitos eleitorais em delitos de Estado (desvio de dinheiro público e compra de votos).
Embora realizado nos marcos do Estado Democrático de Direito sob o qual vivemos, o julgamento, nitidamente político, desrespeitou garantias constitucionais para retratar processos de corrupção à revelia de provas, condenar os réus e tentar criminalizar o PT. Assim orientado, o julgamento convergiu para produzir dois resultados: condenar os réus, em vários casos sem que houvesse provas nos autos, mas, principalmente, condenar alguns pela “compra de votos” para, desta forma, tentar criminalizar o PT.
Dezenas de testemunhas juramentadas acabaram simplesmente desprezadas. Inúmeras contraprovas não foram sequer objeto de análise. E inúmeras jurisprudências terminaram alteradas para servir aos objetivos da condenação.
Alguns ministros procuraram adequar a realidade à denúncia do
Procurador Geral, supostamente por ouvir o chamado clamor da opinião pública, muito embora ele só se fizesse presente na mídia de direita, menos preocupada com a moralidade pública do que em tentar manchar a imagem histórica do governo Lula, como se quisesse matá-lo politicamente. O procurador não escondeu seu viés de parcialidade ao afirmar que seria positivo se o julgamento interferisse no resultado das eleições.
A luta pela Justiça continua
O PT envidará todos os esforços para que a partidarização do Judiciário, evidente no julgamento da Ação Penal 470, seja contida. Erros e ilegalidades que tenham sido cometidos por filiados do partido no âmbito de um sistema eleitoral inconsistente - que o PT luta para transformar através do projeto de reforma política em tramitação no Congresso Nacional - não justificam que o poder político da toga suplante a força da lei e dos poderes que emanam do povo.
Na trajetória do PT, que nasceu lutando pela democracia no Brasil, muitos foram os obstáculos que tivemos de transpor até nos convertermos no partido de maior preferência dos brasileiros. No partido que elegeu um operário duas vezes presidente da República e a primeira mulher como suprema mandatária. Ambos, Lula e Dilma, gozam de ampla aprovação em todos os setores da sociedade, pelas profundas transformações que têm promovido, principalmente nas condições de vida dos mais pobres.
A despeito das campanhas de ódio e preconceito, Lula e Dilma elevaram o Brasil a um novo estágio: 28 milhões de pessoas deixaram a miséria extrema e 40 milhões ascenderam socialmente.
Abriram-se novas oportunidades para todos, o Brasil tornou-se a 6a.economia do mundo e é respeitado internacionalmente, nada mais devendo a ninguém.
Tanto quanto fizemos antes do início do julgamento, o PT reafirma sua convicção de que não houve compra de votos no Congresso Nacional, nem tampouco o pagamento de mesada a parlamentares. Reafirmamos, também, que não houve, da parte de petistas denunciados, utilização de recursos públicos, nem apropriação privada e pessoal.
Ao mesmo tempo, reiteramos as resoluções de nosso Congresso Nacional, acerca de erros políticos cometidos coletiva ou individualmente.
É com esta postura equilibrada e serena que o PT não se deixa intimidar pelos que clamam pelo linchamento moral de companheiros injustamente condenados. Nosso partido terá forças para vencer mais este desafio. Continuaremos a lutar por uma profunda reforma do sistema político - o que inclui o financiamento público das campanhas eleitorais - e pela maior democratização do Estado, o que envolve constante disputa popular contra arbitrariedades como as perpetradas no julgamento da Ação Penal 470, em relação às quais não pouparemos esforços para que sejam revistas e corrigidas.
Conclamamos nossa militância a mobilizar-se em defesa do PT e de nossas bandeiras; a tornar o partido cada vez mais democrático e vinculado às lutas sociais. Um partido cada vez mais comprometido com as transformações em favor da igualdade e da liberdade.
São Paulo, 14 de novembro de 2012.
Comissão Executiva Nacional do PT.
Sobre JB para a presidência da República
November 13, 2012 22:00 - no comments yetMais cedo ou mais tarde, JB tinha que entrar nos sonhos do Perfeito Idiota Brasileiro
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Nosso Batman, aspas |
Presidente Joaquim Barbosa.
Juro. Como eu gostaria de ver Joaquim Barbosa ceder à tentação e concorrer à presidência em 2014.
Teríamos uma real oportunidade de ver o quanto a voz rouca das ruas verdadeiramente admira o nosso Batman, aspas.
Era previsível que a candidatura de JB fosse ventilada e desejada pelo PIB, o Perfeito Idiota Brasileiro. Aos antigos heróis do PIB — Ali Kamel, Reinaldo Azevedo, Jabor, Dora Kramer, Augusto Nunes, Merval Pereira, Ricardo Setti e semelhantes – somou-se agora, em seu uniforme de Batman e seu palavreado pernóstico, Joaquim Barbosa.
Uma breve pausa para risos.
Na falta de candidato forte, com o sepultamento das esperanças em Serra, ele próprio um PIB, o Perfeito Idiota Brasileiro se agarraria a qualquer esperança que aparecesse, como doentes terminais que correm a cirurgias mediúnicas na busca do milagre.
O que o PIB não percebe é que JB é um problema e não uma solução. Qualquer candidato que queira ser viável no Brasil contemporâneo tem que ser versado em justiça social.
(Leia mais: Os ternos da Three Day Suit de Joaquim Barbosa)
Em todo o mundo civilizado, e o Brasil não é exceção, o maior desafio dos homens públicos é enfrentar a brutal concentração de renda ocorrida nas últimas décadas – e a abjeta iniquidade decorrente dela.
Romney perdeu de Obama, mesmo com os Estados Unidos numa crise econômica que em geral derruba presidentes em busca de segundo mandato, porque Obama explorou nele o símbolo da desigualdade americana, um magnata que despreza os pobres e paga impostos ridiculamente baixos.
François Hollande bateu Sarkozy também porque os franceses viram em Sarkozy o representante do 1% cada vez mais rico à custa dos 99%. Na Venezuela, Caprilles se apropriou dos programas sociais de Chávez, que ele desprezara antes como assistencialistas, e ainda assim foi derrotado por ampla margem porque Chávez vem tendo um enorme sucesso na redução da miséria venezuelana.
Na China, a troca de poder que está se fazendo agora depois de dez anos, como tem acontecido lá, a expressão mais utilizada é “justiça social”. O governo chinês entende que o maior desafio, para o futuro, é evitar que a sociedade se divida entre poucos ricos e muitos pobres, porque isso significa riscos para a coesão do país.
Na Inglaterra, hoje mesmo, os presidentes das filiais de três grandes multinacionais – Google, Starbucks e Amazon – estão explicando ao Parlamento por que suas empresas pagam tão pouco imposto. “É como se as multinacionais pagassem impostos voluntariamente”, disse um parlamentar.
Também por trás desse movimento (que se vai internacionalizando) de cerco a grandes corporações que fazem todos os truques possíveis para evitar impostos está a busca de justiça social.
Dentro deste mundo novo, a figura engalanada de Joaquim Barbosa surge absurdamente deslocada. É um heroi apenas para ele, o nosso PIB, o Perfeito Idiota Brasileiro.
Paulo NogueiraNo Diário do Centro do Mundo
"Nós não somos racistas"
November 13, 2012 22:00 - no comments yetColunista político de “O Globo”, Jorge Bastos Moreno recorreu ontem ao Twitter para manifestar espanto com o excesso de maquiagem utilizado pelo apresentador Heraldo Pereira, do “Jornal Nacional” (imagem da esquerda): “Gente, mostrem o Heraldo Pereira como ele é: negro, lindo e competente. Perto dele, pintado de branco, Patrícia Poeta é a mulatinha”, escreveu Moreno (a imagem da direita é de uma antiga aparição de Heraldo na bancada do JN).
Pereira está substutindo William Bonner no comando do noticiário. As maiores críticas de Moreno referem-se à aparição do jornalista na edição de segunda-feira (12/11). Depois do programa de terça (13), o colunista do “Globo” observou: “Hoje, excepcionalmente, o Heraldo tá menos branco. Ontem, ele tava a cara do Falabella.”
Vários outros comentários semelhantes apareceram na rede: ““Impressão minha ou o Heraldo Pereira tá da mesma cor da Patrícia Poeta?” “Embranqueceram o Heraldo Pereira.” “O Heraldo Pereira é ‘branqueado’, de alguma forma? Maquiagem?” “O Heraldo Pereira está mais branco que o William Bonner. Que que é isso?”
Consultada pelo blog, a Globo não se manifestou. Jornalistas da emissora ouvidos especulam que houve algum erro na tonalidade do pó facial normalmente utilizado em quem aparece no vídeo.
Mauricio StycerNo Aposentado Invocado