A nova batalha de Hugo Chávez
agosto 9, 2012 21:00 - no comments yet![]() |
Em luta contra câncer, presidente reúne e encanta multidões. Suas conquistas são inegáveis. Ele promete: “quando eu me for, serei vocês”. |
É a décima quarta. Desde qua ganhou sua primeira eleição presidencial, em dezembro de 1998, Hugo Chávez já submeteu-se – direta ou indiretamente – treze vezes ao sufrágio dos eleitores da Venezuela. Quase sempre, ganhou [1], em condições de reconhecida legalidade democrática, avalizada por missões de observadores enviadas pelas instituições internacionais mais exigentes (ONU, União Europeia, Centro Carter e outras).
O pleito do próximo 7 de outubro constituirá, pois, o décmo quarto encontro do mandatário com os cidadãos venezuelanos [2]. Desta vez, joga-se sua reeleição à presidência. A campanha eleitoral começou em 1º de julho, com duas singularidades notáveis em relação às votações anteriores. Primeiro, Hugo Chávez está saindo de treze meses de tratamento contra um câncer, detectado em junho de 2011. Segundo, a principal oposição conservadora aposta, desta vez, na unidade. Reagrupou-se no seio de uma Mesa da Unidade Democrática (MUD), que escolheu como candidato, por meio de eleições primárias (em 12 de fevereiro), Hugo Capriles Radonski, um advogado de 40 anos, governador do Estado de Miranda.
Filho de uma das famílias mais ricas da Venezuela, Henrique Capriles foi um dos artífices do golpe de Estado de 11 de abril de 2002 e participou, com um grupo de putschistas, no assalto à embaixada de Cuba em Caracas [3]. Embora tenha origem na organização ultraconservadora Tradição, Família e Propriedade [4] e seja apoaido pelos setores mais direitistas (entre eles, os meios de comunicação de massa privados, que continuam dominando amplamente a informação), Capriles faz campanha habilmente. Reivindica todas as conquistas sociais do governo bolivariano. E até jura que seu modelo político é o de esquerda, do ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva… [5] Mas aposta, sobretudo, no debilitamento físico do presidente Chávez [6].
Nisso, equivoca-se. O autor destas linhas, presente em julho passado na Venezuela, acompanhou as duas primeiras semanas de campanha do presidente, conversou várias vezes com ele, assistiu a alguns de seus extenuantes comícios para multidões. E pode testemunhar sua boa saúde e sua excepcional forma física e intelectual.
Desmentindo as falsas notícias que circularam em alguns meios de comunicação (Wall Street Journal e El País], segundo as quais devido a supostas “metástases nos ossos e na espinha dorsal” teria apenas “seis ou sete meses de vida”, Chávez – que completou 58 anos em 28/7 – afirmou, para consternação de seus adversários: “Estou totalmente livre da enfermidade; a cada dia, sinto-me melhor”.
E voltou a surpreender os que apostavam numa presença apenas virtual na campanha, anunciando sua decisão de “retomar as ruas” e começar a percorrer os rincões da Venezuela, para conquistar seu terceiro mandato. “Disseram de mim: ‘Ele estará trancado em Miraflores (o palácio presidencial), numa campanha virtual por twitter e vídeos’. Zombaram de mim como quiseram. Pois aqui estou de novo, retornando, com a força indômita do furacão bolivariano. Já sentia falta do cheiro das multidões e do rugir do povo nas ruas”.
Este rugir, poucas vezes ouvi tão poderoso e tão fervoroso como nas avenidas de Barcelona (Estado de Anzoátegui) e de Barquisimeto (Estado de Lara), que acolheram Chávez em 12 e 14 de julho, respectivamente. Um oceano de povo. Uma torrente escarlate de bandeiras, símbolos, camisas vermelhas. Um maremoto de gritos, cantos, paixões, arrebatamentos.
Ao longo de quilômetros e quilômetros, no alto de um caminhão colorado que avançava abrindo espaço entre a multidão, Chávez saudou sem descanso a centenas de milhares de simpatizantes que foram vê-lo em pessoa, pela primera vez desde sua doença. Com lágrimas de emoção e beijos de agradecimento para um homem e um governo que, respeitando as liberdades e a democracia, atenderam aos humildes, resgataram a dívida social e deram a todos, por fim, educação gratuita, emprego, previdência social e habitação.
Para tirar as esperanças da oposição, Chávez, nos longos discursos eleitorais que pronunciou sem dar sinais de cansaço, começou dizendo: “Sou como o eterno retorno de Nietzche, porque na realidade venho de várias mortes… Que ninguém se engane, enquanto Deus me der vida estarei lutando pela justiça dos pobres. Mas quando eu me for fisicamente, ficarei com vocês por estas ruas e sob este céu. Porque já não sou eu, sinto-me encarnado no povo. Chávez já se fez povo e agora somos milhões. Chávez é você, mulher. Chávez é você, jovem. Chávez é você, criança; é você, soldado; são vocês, pescadores, agricultores, camponeses e comerciantes. Ocorra o que ocorrer comigo, não poderão resistir a Chávez, porque Chávez agora é um povo invencível”.
Em suas intevenções, não hesitou inclusive em criticar duramente alguns governadores e prefeitos de seu próprio partido, que descumpriram compromissos com os eleitores. “Tornei-me o primeiro opositor”, declarou. Mas também advertiu: “Pode-se criticar a revolução, mas não se pode votar na burguesia. Isso seria traição. Às vezes, podemos falhar, mas temos no coração amor de verdade pelo povo”.
Orador incomum, seus discursos são amenos e coloquiais, ilustrados de histórias, rasgos de humor e até canções. Mas são também, mesmo que não pareçam, verdadeiras composições didáticas muito elaboradas, muito estruturadas, preparadas de maneira muito séria e profissional, com objetivos concretos. Trata-se, em geral, de transmitir uma ideia central, que constitui o tronco de seu percurso discursivo. Nesta campanha, vai expondo e explicando metodicamente seu programa [7].
Mas, para não cansar nem ser pesado, Chávez afasta-se amiúde deste tronco principal e realiza o que poderíamos chamar de excursões em campos anexos (histórias, recordações, chistes, poemas), que não parecem ter nexo com seu propósito central. Mas sempre têm. E isso permite ao orador, depois de ter aparentemente abandonado por bastante tempo seu curso central, regressar a ele e retomá-lo no ponto exato onde o deixou. O que produz, de modo subliminar, um prodigioso efeito de admiração no auditório. Esta técnica retórica permite-lher fazer discursos de enorme duração.
Em seus recentes discursos eleitorais, Chávez compara as políticas de demolição do Estado de bem-estar social, executadas em vários países da União Europeia (cita, em particular, os brutais cortes feitos por Mariano Rajoy, na Espanha), com as importantes conquistas sociais de seu governo, empenhado em seguir “construindo o socialismo venezuelano”.
Em seus catorze anos de existência (1999-2012), a Revolução Bolivariana conseguiu, em âmbito regional, avanços consideráveis: criação da Petrocaribe, da Petrosul, do Banco do Sul, da ALBA, do Sucre (Sistema Único de Compensação Regional), da Unasul, da Celac, ingresso da Venezuela no Mercosul. E tantas outras políticas, que fizeram da Venezuela de Hugo Chávez um manancial de inovações para avançar até a independência definitiva da América Latina.
Ainda que campanhas agressivas de propaganda afirmem que, na Venezuela bolivariana, os meios de comunicação estão controlados pelo Estado, a realidade – verificável por qualquer testemunha de boa-fé – é que apenas uns 10% das emissoras de rádio são públicas; as 90% restantes são privadas. E não mais que 12% dos canais de TV são públicos, ficando 88% em mãos privadas ou comuntárias. Entre os jornais impressos, os principais diários, El Universal e El Nacional, são privados e sistematicamente hostis ao governo.
A grande força do presidente Chávez é que sua ação concentra-se sobretudo no social (saúde, alimentação, educação, habitação), o que mais interessa aos venezuelanos humildes (75% da população). Consagra 42,5% do orçamento do Estado a inversões sociais. Reduziu à metade a mortalidade infantil. Erradicou o analfabetismo. Multiplicou por cinco o número de professsores nas escolas públicas (de 65 mil para 350 mil). A Venezuela à hoje o segundo país da região com maior número de estudantes matriculados no ensino superior (83%), atrás de Cuba mas à frente da Argentina, Uruguai e Chile; e é o quinto no plano mundial, superando Estados Unidos, Japão, China, Reino Unido, França e Espanha.
O governo bolivariano generalizou saúde e educação gratuitas. Multiplicou a construção de casas. Elevou o salário mínimo (o mais alto da América Latina). Concedeu aposentadorias a todos os trabalhadores (inclusive os informais e donas-de-casa) e todos os idosos, mesmo aqueles que nunca contribuíram. Melhorou a infra-estrutura dos hospitais. Oferece às famílias modestas, por meio do sistema Mercal, alimentos 60% mais baratos que nos supermercados privados. Limitou os latifúndios, multiplicando por dois a produção de alimentos. Assegurou formação técnica a milhões de trabalhadores. Reduziu as desigualdades. Rebaixou a pobreza a menos de 1/3. Reduziu a dívida externa. Acabou com a pesca de arrasto, antiecológica. Impulsionou o ecossocialismo…
Todas estas ações, desenvolvidas há 14 anos, explicam o apoio popular a Chávez, que promete, em sua campanha: “Tudo o que fizemos é pouco, comparado ao que faremos”.
Testemunhei que milhões de pessoas humildes o veneram como um santo. Ele – que foi garoto pobre, vendedor ambulante de doces, nas ruas de sua cidade – repete com calma: “Sou candidato dos humildes, e me consumirei a serviço dos pobres”. Seguramente irá fazê-lo. Certa vez, a escritora Alba de Céspedes perguntou a Fidel Castro como pôde ter feito tanto por seu povo. Ele respondeu simplesmente: “Com grande amor”. A respeito da Venezuela, Chávez poderia dizer o mesmo. E que pensarão os eleitores venezuelanos? Respostas em 7 de outubro.
[1] Perdeu apenas, por margem ínfima, o referendo de 2 de dezembro de 2007, sobre um “projeto de reforma constitucional”.
[2] Além de Hugo Chávez, outros seis candidatos disputam as eleições de 7 de outubro: Henrique Capriles Radonski, pela Mesa da Unidade (MUD); Orlando Chirinos, pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSL); Yoel Acosta Chirinos, pelo partido Vanguarda Bicentenária Republicana (VBR); Luís Reyes Castillo, pela Organização Renovadora Autêntica (ORA); María Bolivar, pelo Partido Democrático Unidos pela Paz e Liberdade (PDUPL) e Reina Sequera, pelo Partido Poder Popular (PP).
[3] Leia-se, de Gilberto Maringoni, “En Venezuela, Chávez sigue favorito”, Le Monde Diplomatique em espanhol, maio de 2012. Leia-se também, de Romain Mingus, “Henrique Capriles, candidat de la droite décomplexée du Venezuela”, Mémoire des luttes, 28/2/2012.
[4] Foi co-fundador de seu braço venezuelano.
[5] Lula enviou a Chávez, em 6 de julho, uma mensagem pública em que lhe manifestou pleno apoio na caompanha eleitoral, afirmando: “Tua vitória será nossa vitória”.
[6] Em meados de julho, as principais pesquisas de opinião davam a Chávez uma vantagem entre 15 e 20 pontos percentuais sobre Henrique Capriles.
[7] Propuesta del candidato de la patria Comandante Hugo Chávez para la gestión bolivariana socialista 2013-2019, Comando de Campanha Carabobo, Caracas, junho de 2012.
Ignacio Ramonet | Tradução: Antonio MartinsNo Outras Palavras
Que há de escandaloso no escândalo LIBOR?
agosto 9, 2012 21:00 - no comments yetO que se chama de “escândalo” é, na verdade, o coração do sistema
Desde 4 de julho, lemos nos maiores jornais do mundo e nas declarações de deputados, dirigentes de bancos centrais e autoridades judiciais que há um “escândalo” a envolver uma coisa chamada LIBOR. Antes disso, poucas pessoas, para além do grupo que se interessa por bancos, tinham ouvido falar da LIBOR. Subitamente, disseram-nos que os maiores bancos da Grã-Bretanha, dos Estados Unidos, da Suíça, da Alemanha, de França, e provavelmente de um grande número de outros países, estavam envolvidos em ações supostamente “fraudulentas”.
Além disso, explicaram-nos que não se tratava de uma questão de centavos. Derivados financeiros de centenas de biliões (trillions) de dólares baseiam-se na taxa LIBOR. A acusação era de que os bancos “manipulavam” esta taxa, obtendo não só lucros astronómicos; só que, por outro lado, as pessoas que estavam a pagar hipotecas e empréstimos, ou os estudantes a pagar empréstimos, pagaram mais do que deveriam. Resumindo: os bancos obtiveram, de facto, lucros enormes à custa de outros, que tiveram perdas pesadas.
Tudo isso suscitou muitas questões. (1) Como foi isto possível? (2) Por que as autoridades reguladoras não interromperam uma prática que agora dizem ser tão fraudulenta; ou seja: quem sabia o quê e quando? E (3) alguma coisa pode ser feita para garantir que isto não aconteça novamente?
Vamos começar com a definição da taxa Libor. É uma abreviação de London Interbank Offered Rate (Taxa Interbancária Praticada em Londres). Não é muito antiga: a versão definitiva é de 1986. Na época, a British Bankers Association (Associação dos Banqueiros Britânicos) pediu que os “maiores bancos” compartilhassem informação diária sobre as taxas de juros que pagariam, se tomassem empréstimos de outros bancos. Depois de eliminados os valores extremos, determinava-se uma taxa média, modificada diariamente. A ideia era que, se os bancos se sentissem confiantes sobre o estado da economia, a taxa seria mais baixa; se estivessem inseguros, a taxa seria mais alta.
Quando a imprensa mundial usou a palavra “escândalo” para falar sobre a Libor, ficou claro que o tema tinha sido debatido muito antes, em ambientes menos visíveis. Parece que o Wall Street Journal tinha divulgado um estudo, em 29 de maio de 2008 (sim, em 2008!), sugerindo que alguns bancos estavam a subestimar os custos dos empréstimos. Outros imediatamente disseram que o estudo era impreciso ou, se correto, que os bancos tinham agido de forma inadvertida. Análises académicas subsequentes sugeriram, contudo, que a acusação de subestimação dos custos era de facto verdadeira.
A questão é que quando um banco está a lidar com 50 biliões de dólares em valores teóricos, uma pequena subestimação de taxas gera imediatamente um aumento significativo dos lucros. Assim, a tentação era óbvia. Acontece que, já no início de 2007, tanto o Federal Reserve quanto o Banco da Inglaterra suspeitaram dessa subnotificação. Nenhum fez muita coisa.
Agora dizem-nos que essas taxas, longe de serem confiáveis ou estáveis, são na verdade meras “suposições”. Desde que o Lehman Brothers entrou em colapso, os bancos em todo o mundo deixaram de realizar empréstimos entre si. Como disse o New York Times, num artigo de 19 de julho de 2012: “As taxas precisas têm pouca base real”. Em 2011, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos começou uma investigação criminal. Graças a fugas de informação, sabemos agora que houve trocas de e-mails entre banqueiros que falavam alegremente da subestimação das taxas, e encorajavam a fazê-lo. Por que não? Estavam a ganhar muito dinheiro.
No meio disto tudo, o Independentpublicou uma reportagem de duas páginas sobre os paraísos fiscais, e a quantidade incrível de dinheiro que sai dos países do Sul global para esses lugares, privando-os assim de valores que provavelmente seriam mais que suficientes para financiar as transformações económicas e a redistribuição de rendimentos que estes países afirmam querer pôr em prática. Ao contrário das manipulações da LIBOR, os paraísos fiscais são perfeitamente legais.
Então, onde está o escândalo? As duas práticas – manipulação da LIBOR e transferência de dinheiro para os paraísos fiscais – são absolutamente normais numa economia-mundo capitalista. A finalidade do capitalismo, afinal de contas, é a acumulação de capital – quanto mais, melhor. Um capitalista que não maximiza os ganhos, de uma forma ou de outra, será mais tarde ou mais cedo eliminado do jogo.
O papel dos Estados nunca foi controlar ou limitar estas práticas, mas fazer vista grossa pelo máximo de tempo possível. Uma vez ou outra, as práticas – dos capitalistas e dos Estados – são momentaneamente expostas. Algumas pessoas vão para a cadeia, ou são forçadas a devolver os lucros tecnicamente ilegais. E os políticos falam de reformas – procurando adotar, com grande alarde, o nível mais baixo de “reforma” que puderem.
Mas isto não é um escândalo, porque o que se chama de “escândalo” é, na verdade, o coração do sistema. Algum dia vai isto mudar? Sim, claro. Um dia, o sistema deixará de existirá. Claro que isso abre outra questão. O próximo sistema será melhor? É possível, mas não é certo.
Enquanto isso, chamar a manipulação da LIBOR de escândalo é desviar as atenções do facto de que se trata de mais uma forma normal de acumular capital. Em 1992, James Carville, estrategista da campanha do então candidato Bill Clinton à Presidência dos EUA, saiu-se com um dito que ficou famoso: “É a economia, estúpido”. Frente aos chamados escândalos, deveríamos dizer “É o sistema, estúpido”.
Immanuel Wallerestein, sociólogo e professor universitário norte-americano.Tradução, revista pelo autor, de Luis Leiria.
No Esquerda.net
Uruguai propõe estatizar produção e comércio de maconha para controlar o consumo
agosto 9, 2012 21:00 - no comments yetBrasília – O governo do presidente do Uruguai, José Pepe Mujica, encaminhou ontem (9) ao Congresso um projeto de lei para que o Estado passe a controlar e regulamentar a importação, produção, compra, comercialização e distribuição de maconha. O secretário adjunto da Presidência da República do Uruguai, Diego Cánepa, disse que o objetivo é reduzir o tráfico de drogas no país e controlar o consumo da erva.
Pela proposta, ficam mantidos os termos de um decreto de 1974, que proíbe a venda de maconha sem a interferência do governo. O novo texto estabelece que o Estado controla a importação, produção, compra, comercialização e distribuição da substância. Segundo o secretário, a expressão importação é aplicada apenas para as sementes da erva.
Integrantes do governo Mujica acreditam que, com o Estado no controle da produção e do comércio da maconha, não somente haverá a redução do tráfico como também deve diminuir a dependência do álcool, tabaco e drogas em geral. "Não há dúvida de que o álcool e o tabaco são prejudiciais. Porém, não são proibidos, o que se faz são campanhas de conscientização para tentar reduzir os danos”, disse Cánepa.
O secretário disse que a proposta não é defender a maconha, mas estabelecer uma nova política pública de combate ao tráfico e controle do uso da erva. "Ninguém está dizendo que a maconha é boa”, disse ele. "Acho que a decisão do presidente de ter a audácia ao dar esse passo permitirá ao governo promover um amplo debate.” Mais detalhes da proposta estão na página da Presidência da República do Uruguai.
O texto enviado ao Parlamento reúne análises de vários órgãos do governo e especialistas uruguaios e estrangeiros. O ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso é citado como um dos defensores da proposta apresentada pela Comissão Mundial sobre Políticas de Drogas. Também são mencionados o ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas Kofi Annan e o escritores Mario Vargas Llosa e Carlos Fuentes.
A comissão observa a necessidade de se rever a política sobre drogas. "A pior coisa é cair em uma discussão com slogans, preconceitos, sem um debate claro e verdadeiro”, disse Cánepa. "Há problemas com o abuso de álcool e alcoolismo em si, mas ninguém em sã consciência pensaria em proibir álcool. Vimos o que aconteceu com a proibição nos Estados Unidos, que foi uma grande derrota das políticas proibicionistas ", disse o secretário.
Renata GiraldiNo Agência Brasil
O Cantor Demóstenes
agosto 9, 2012 21:00 - no comments yetFossem outros os tempos, e o ex-senador Demóstenes Torres estaria em casa, meditando sobre as inconstâncias do destino e as escolhas políticas e morais de seu passado. Os homens costumam errar por boa fé, é certo, quando buscam uma bandeira. Deixam-se iludir por certas doutrinas, para, mais tarde, descobrir que se haviam sacrificado para nada, ou quase nada, como os sedentos que buscam miragens no deserto. Mas o senador por Goiás, enquanto se fazia, com falsas catilinárias, o paladino da ética, agia mancomunado com os corruptores e corrompidos.
Como vivemos tempos modernos, o ex-senador esteve na noite de segunda-feira no emblemático – e eclético – Restaurante Piantella, de Brasília, cumprimentando efusivamente os advogados que atuam na defesa dos réus da Ação 470, no STF. Para o incômodo de nós, mineiros, a causa está amarrada a Belo Horizonte, onde atuaram algumas de suas personalidades principais, como Marcos Valério.
O Piantella é uma espécie de consulado de Minas, aberto a todos os brasileiros, uma vez que dois mineiros são seus proprietários, Marco Aurélio Costa, de Itambacuri, e o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, de Patos de Minas. Demóstenes estava, como diriam os franceses, a son aise, como se fosse um anônimo burguês em noite de sábado. Tanto se sentia tranqüilo e sem cuidados, que fez questão de pedir ao pianista os acordes de Let me try again, que a voz de Frank Sinatra imortalizou, e, com voz desafinada, a entoou, em discutível inglês. Um mineiro, que se distanciava do grupo de advogados, aos quais se incorporara o político goiano, lembrou o jornalista e acadêmico conterrâneo José Bento Teixeira de Salles, biógrafo de Milton Campos, e sua frase predileta para definir qualquer e eventual adversário político: além de mau cantor, vilão.
À margem do inusitado da cena, que surpreendeu os calejados observadores da vida política, o episódio evoca o mal-estar do homem comum, em nosso país e em outros países, com a crescente erosão dos sentimentos de responsabilidade política. O ex-senador goiano não percebeu que a sua presença em lugar público confrangia quase todos os que ali se encontravam. Ou, o que é ainda pior, mesmo sabendo disso, ousou afrontar os seus possíveis críticos, com a arrogância do gesto, coroado com o pedido, que o título da música indica, de que o deixem tentar outra vez.
Não há saída para os desajustes da política que não seja, e a cada vez mais, a ação política dos cidadãos. Só a política pode salvar a política.