O fim de um ciclo político
Ottobre 13, 2012 21:00 - no comments yetSemanas atrás escrevi sobre o fim da geração das diretas, o grupo que, a partir de São Paulo, dominou a cena política nacional, através do PSDB e do PT.
Do lado tucano, Covas, Fernando Henrique, Sérgio Motta, entre outros; do lado petista, Lula, Dirceu, Mercadante, Suplicy, Martha. Do lado dos peemedebistas históricos, Ulisses e Tancredo.
De certo modo, foram desbravadores da democracia brasileira, conseguindo definir um padrão de governabilidade que permitiu ao ornitorrinco voar.
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Saía-se da ditadura praticamente sem sociedade civil. Os partidos políticos dividiam-se entre posições muito simplórias: contra ou a favor do regime anterior. Não havia maiores definições programáticas. E o equilíbrio do Executivo era constantemente bombardeado pela instabilidade econômica e por dois tipos de demanda: a do Congresso e a da mídia.
Não era tarefa fácil equilibrar a estabilidade democrática em meio a ventos tão implacáveis.
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De Sarney até FHC, o único instrumento de pacificação política foram os pacotes econômicos, mirabolantes, mas que, de tempos em tempos, conferiam algum fôlego político aos governantes. Foi assim com os sucessivos planos econômicos do governo Sarney, Collor, até o derradeiro, o Plano Real.
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A partir daí, consolidava-se a dualidade PSDB-PT paulistas, comandados pelos personagens das diretas-já. E, em cada partido, conviveram dois personagens: o líder (simbólico ou real) e o que botava a mão na massa.
Um conjunto de circunstâncias jogou o PSDB nas mãos de FHC, o líder simbólico, e de Sérgio Motta, o que botava a mão na massa. Figura generosa, impulsiva, Motta era o motor do partido, o que sujava as mãos (como no caso da votação da reeleição), acolhia os desabrigados, mantinha a chama acesa - ao lado do governador Mário Covas, em São Paulo.
Pouco antes de morrer, conhecendo o caráter de FHC, Motta deixou o bilhete histórico, pedindo que não se apequenasse. Apequenou-se. Tornou-se refém dos financistas do partido, abraçou o neoliberalismo mais desbragado, abandonou o discurso social-democrata e deslumbrou-se definitivamente com os salões.
Com isso, escancarou uma rodovia para que entrasse o discurso social do PT.
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Do mesmo modo que no PSDB, no PT havia o líder, Lula, e o que botava a mão na massa, José Dirceu.
Coube a Dirceu o papel fundamental de consolidar o arquipélago de tendências do PT, muitas vezes com uma objetividade dura que deixou ressentimentos, mas que liberou Lula para montar as estratégias maiores do partido.
Eleito Lula, Dirceu teve papel central na transição. Comandou intenso processo de negociação com o governo que saía, incluindo um pacto de não agressão que varreu para baixo do tapete inúmeros episódios obscuros do governo anterior.
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Tentou, depois, absorver toda a tecnologia de governabilidade do governo que saía, incluindo operadores, lobistas e tudo isso em um momento em que, com os principais quadros do partido indo para o governo, o PT viu-se meio acéfalo.
Mas não foi seguida a principal lição de FHC - aliar-se a um grande partido ônibus, como o PMDB, assim como o PSDB se aliou ao DEM.
O desafio de administrar o varejo acabou resultando no mensalão.
O "mensalão" foi um divisor de águas. E é interessante entender como se comportaram os atores políticos depois dele.
O pós-mensalão e Lula - 1
No início do governo, Lula teve que enfrentar uma enorme crise de mercado, com o dólar explodindo, o aumento da inflação e a inexperiência do novo partido com o poder. Foi nesse período que o trabalho de José Dirceu, junto ao meio político, e Antonio Palocci, junto ao mercado, foi fundamental para garantir a governabilidade. Passada a crise, o poder de Dirceu acabou sendo incômodo para o próprio Lula.
O pós-mensalão e Lula - 2
O "mensalão" acabou provocando a saída de Dirceu e dos demais companheiros que haviam carregado o piano do jogo pesado inicial. A luta pela sobrevivência política exigiu tudo de Lula. E aí apareceu o político fulgurante em sua plenitude. De um lado, passou a colher os frutos das políticas sociais do início do governo. De outro, precisou dar um impulso gerencial sem precedentes ao seu governo.
O pós-mensalão e Lula - 3
Finalmente, o enorme desgaste produzido pelo episódio impulsionou a renovação do PT. A cara do partido não podia ser mais a dos pioneiros, os que ajudaram no trabalho hercúleo de criar um partido nacional. É nesse contexto que a intuição política de Lula leva à indicação de Dilma Rousseff para presidente e de Fernando Haddad para concorrer à prefeitura de São Paulo. Além da aproximação com Eduardo Campos.
O pós-mensalão e FHC - 1
Caminho inverso percorreu FHC. Sem Mário Covas, tornou-se a única referência do PSDB. Sua falta de vontade de governar, a falta de visão de futuro (ao não perceber o tempo social sucedendo o tempo da estabilização), a escassez de ideias (que o levou a adotar acriticamente o receituário neoliberal), e o neodeslumbramento da mídia (para caracterizá-lo como o antiLula) cobraram sua conta.
O pós-mensalão e FHC - 2
Mais e mais, FHC imbuiu-se do discurso moralizante, de uma retórica que, embora não tão grosseira quanto a de José Serra, empurrava para o conflito. Nas palestras e, principalmente, nos artigos para o Estadão e o Globo, não conseguia desenvolver mais do que bordões soltos, sem nenhuma profundidade. Mais que isso, não preparou o partido para a renovação, para o aparecimento de novos quadros.
O pós-mensalão e FHC - 3
Chega-se, ao final do longo processo político, que vem da redemocratização até os dias atuais, com os resultados conhecidos. No campo das lideranças, Lula conseguiu não apenas reeleger o sucessor como reestruturar o partido; já FHC saiu derrotado do governo e deixa um partido em ruínas. Mas a história há de se lembrar dos construtores, os que colocaram a mão na massa e pagaram por isso: Sérgio Motta e José Dirceu.
Luis NassifNo Advivo
A mesada e o mensalão
Ottobre 13, 2012 21:00 - no comments yetA mentira foi a geradora de todas as verdades, meias verdades, indícios desprezados e indícios manipulados que deram a dimensão do escândalo e o espírito do julgamento do "mensalão".
Por ora, o paradoxo irônico está soterrado no clima odiento que, das manifestações antidemocráticas de jornalistas e leitores às agressões verbais no Supremo, restringe a busca de elucidação de todo o episódio. Pode ser que mais tarde contribua para compreenderem o nosso tempo de brasileiros.
Estava lá, na primeira página de celebração das condenações de José Dirceu e José Genoino, a reprodução da primeira página da Folha em 6 de junho de 2005. Primeiro passo para a recente manchete editorializada - CULPADOS -, a estonteante denúncia colhida pela jornalista Renata Lo Prete: "PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson". O leitor não tinha ideia de que Jefferson era esse.
Era mentira a mesada de R$ 30 mil. Nem indício apareceu desse pagamento de montante regular e mensal, apesar da minúcia com que as investigações o procuraram. Passados sete anos, ainda não se sabe quanto houve de mentira, além da mensalidade, na denúncia inicial de Roberto Jefferson. A tão citada conversa com Lula a respeito de mesada é um exemplo da ficção continuada.
A mentira central deu origem ao nome - mensalão - que não se adapta à trama hoje conhecida. Torna-se, por isso, ele também uma mentira. E, como apropriado, o deputado Miro Teixeira diz ser mentira a sua autoria do batismo, cujo jeito lembra mesmo o do próprio Jefferson.
Nada leva, porém, à velha ideia de alguém que atirou no que viu e acertou no que não viu. A mentira da denúncia de Roberto Jefferson era de quem sabia haver dinheiro, mas dinheiro grosso: ele o recebera. E não há sinal de que o tenha repassado ao PTB, em nome do qual colheu mais de R$ 4 milhões e, admitiria mais tarde, esperava ainda R$ 15 milhões. A mentira de modestos R$ 30 mil era prudente e útil.
Prudente por acobertar, eventualmente até para companheiros petebistas, a correnteza dos milhões que também o inundava. E útil por bastar para a vingança ou chantagem pela falta dos R$ 15 milhões, paralela à demissão de gente sua por corrupção no Correio. Como diria mais tarde, Jefferson supôs que o flagrante de corrupção, exibido nas TVs, fosse coisa de José Dirceu para atingi-lo. O que soa como outra mentira, porque presidia o PTB e o governo não hostilizaria um partido necessário à sua base na Câmara.
Da mentira vieram as verdades, as meias verdades e nem isso. Mas a condenação de Roberto Jefferson, por corrupção passiva, ainda não é a verdade que aparenta. Nem é provável que venha a sê-lo.
MAIS DEDUÇÃO
Em sua mais recente dedução para voto condenatório, o presidente do Supremo, Ayres Britto, deu como certo que as ações em julgamento visaram a "continuísmo governamental.
Golpe, portanto, nesse conteúdo da democracia que é o republicanismo, que postula renovação dos quadros de dirigentes".
Desde sua criação e no mundo todo, alcançar o poder, e, se alcançado, nele permanecer o máximo possível, é a razão de ser dos partidos políticos. Os que não se organizem por tal razão, são contrafações, fraudes admitidas, não são partidos políticos.
Sergio Motta, que esteve politicamente para Fernando Henrique como José Dirceu para Lula, informou ao país que o projeto do PSDB era continuar no poder por 20 anos.
Não há por que supor que, nesse caso, o ministro Ayres Britto tenha deduzido haver golpe ou plano golpista. Nem mesmo depois que o projeto se iniciou com a compra de deputados para aprovar a reeleição.
Janio de FreitasNo Falha
Haddad vs. Serra
Ottobre 13, 2012 21:00 - no comments yetVai recomeçar!
Segunda feira, a mãe de todas as batalhas eleitorais deste ano será reiniciada em São Paulo.
Na verdade, havia sido retomada desde a noite do domingo passado, enquanto os resultados do primeiro turno ainda estavam sendo processados. Ao agradecer a votação e cumprimentar os eleitores, José Serra (PSDB) e Fernando Haddad (PT) já indicavam o que diriam a seguir.
De amanhã em diante, o grande enfrentamento que fazem volta à televisão. Sem desmerecer as outras cidades em que os eleitores terão que votar de novo, é o único confronto realmente importante.
O maior vencedor do primeiro turno foi o PT. Obteve o maior volume de votos. Entre os cinco maiores partidos na eleição de 2008, só ele aumentou o número de prefeituras conquistadas (enquanto diminuíam as do PMDB, do PSDB, do DEM e do PP). Fez mais vereadores que qualquer um. Venceu na maior quantidade de cidades médias. Contando seu desempenho com o dos partidos coligados, saiu-se melhor nas capitais.
Somente dois partidos médios, o PSD e o PSB, tiveram performance comparável.
Em função disso, é o mais bem posicionado para as eleições legislativas de 2014. É razoável supor que elegerá uma bancada maior de deputados federais, pois terá bases municipais mais amplas. Pelo mesmo motivo, é provável que eleja mais deputados estaduais.
Mas falta o duelo paulista.
Serra e Haddad terminaram o primeiro turno empatados, com pequena diferença na votação obtida.
O que é mau para o tucano.
É a segunda vez seguida que experimenta grandes dificuldades frente a candidatos lançados por Lula, os dois sem experiência eleitoral. Em 2010, perdeu para Dilma, quando acreditava que seu currículo seria suficiente para elegê-lo. Bastava que fingisse ser o “Zé que vai continuar a obra do Lula”, como dizia em um inesquecível comercial de campanha.
Não colou.
Agora, está sem esse argumento para derrotar Haddad.
Pensando bem, não tem nenhum, salvo o esforço de fazer com que a cidade acredite em sua nova história: que a eleição de prefeito diz respeito a “valores”, como vem afirmando, com ar compungido, desde o domingo. Que é melhor que Haddad por “motivos éticos”.
Não é impossível que vença a eleição, assumindo o lugar de porta-voz do conservadorismo mais extremo. Outros políticos já fizeram isso com sucesso em São Paulo.
Mas parece que terá um árduo caminho pela frente. Considerando as pesquisas disponíveis, só está conseguindo agregar pouco ao que obteve no primeiro turno. Haddad, ao contrário, mostra capacidade de crescimento bem superior.
Com 10 pontos a menos que o petista, o que resta a Serra? Pouca coisa, além de rezar para que seus amigos na imprensa e em igrejas conservadoras lhe deem alento.
Melancólico momento para um político a quem muitos admiraram. Com a rejeição estratosférica que tem, sua única aposta é tentar puxar o adversário para baixo.
Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox populi
Palavra (En)cantada
Ottobre 13, 2012 21:00 - no comments yetEm um país com forte cultura oral como o Brasil, a música popular pode ser a grande ponte para a poesia e a literatura. A reflexão sobre esse tema é o ponto de partida do filme de Helena Solberg. Palavra (En)cantada tem a sua narrativa construída na costura de depoimentos, performances musicais e bela trilha sonora.