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Dimas Roque

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Maria e o Cangaço

13 de Abril de 2025, 18:54 , por Dimas Roque - | No one following this article yet.
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Quando surgiram as primeiras notícias sobre uma minissérie focada na vida de Maria Gomes de Oliveira — a icônica Maria Bonita, a cangaceira mais famosa da história —, confesso que fiquei apreensivo. Principalmente ao descobrir que Isis Valverde, uma atriz de pele branca e sotaque carioca (daqueles que "chiam" como panela de pressão diante de um "s" e "i" seguidos), interpretaria a protagonista. Não me culpe: no Nordeste, terra de tantas artistas com a tonalidade de pele e o sotaque autêntico de Maria, escolher alguém tão distante desse universo parecia, no mínimo, um tiro no pé. 

Nascido e criado em Paulo Afonso, Bahia — cidade onde Maria Bonita veio ao mundo, no sertão que beira o Raso da Catarina, região inóspita onde o bando de Lampião sobreviveu às perseguições da volante —, cheguei à minissérie com os dois pés atrás. Pronto para criticar cada detalhe mal representado. 

Mas eu estava errado.

Assisti hoje à produção da CineFilm para o Disney+ e, surpreendentemente, o trabalho me conquistou. O roteiro, assinado por Sérgio Machado, Armando Praça, Letícia Simões e Sandra Delgado (com colaboração de Juliana Antunes), aliado à direção de Machado, Thalita Rubio e Adrian Teijido, consegue algo raro: hipnotizar o espectador do primeiro ao último minuto. A escolha de não retratar a morte de Maria e Lampião foi magistral, focando em suas vidas em vez do clichê sangrento. 

Claro, há ressalvas. As roupas dos soldados lembram uniformes nazistas de filmes hollywoodianos, e a casa de tijolos onde Maria nasceu na série destoa da realidade — até hoje, sua residência original no Povoado Malhada da Caiçara mantém paredes de barro. Mas esses deslizes são secundários diante do conjunto, que captura o imaginário do cangaço com respeito. 

E Isis Valverde? Aquela "branca criada no Danone", de sotaque carioca? Ela simplesmente surpreende. A atriz mergulhou no papel: estudou trejeitos, domou cavalos como uma verdadeira sertaneja e imprimiu à Maria Bonita uma emoção crua que me fez esquecer, em vários momentos, do sotaque "chiado". O esforço para modular a fala nordestina é visível — e, mais importante, funciona. Sua interpretação é a melhor de sua carreira, até agora. 

Reconheço: julguei precipitadamente. A série, apesar de falhas pontuais, honra a história de Maria Bonita com sensibilidade. E Isis, longe de ser uma escolha equivocada, entrega uma performance que merece aplausos. Vida longa ao trabalho da equipe e, principalmente, à coragem de revisitar nosso sertão com tanto cuidado. 

Ah, e vida longa à Isis Valverde. O Nordeste agradece.


Fonte: http://www.dimasroque.com.br/2025/04/maria-e-o-cangaco.html

Dimas Roque

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