A Vila Poty, que ainda mantém esse nome até hoje por causa do cimento, tinha ruas sem calçamento, diferente dos dias de hoje em que temos asfalto. Mas era nelas que todas as noites as crianças, incluindo eu, brincávamos de se esconder, rouba-bandeira, garrafão e tantas outras brincadeiras que nos faziam perder a noção do tempo.
No entanto, bastava um animal ser avistado à distância para que o medo tomasse conta de todos que estavam nas ruas. E quando uma carroça puxada por burros, o que era muito comum, passava pelas proximidades, as ruas ficavam desertas imediatamente.
Minha mãe contava que um certo homem foi visto se esfregando ao meio-dia no mesmo lugar onde uma burra havia feito o mesmo. Dizia-se que quem fazia isso estava destinado a se tornar um bicho nas noites de lua cheia. Até conseguíamos ouvir os urros nessas noites.
Coitado daquele senhor que era apontado como o Homem que Virava Bicho por onde passava. Ainda me recordo das crianças gritando para ele com palavras que, hoje, percebo que deviam machucá-lo muito. Às vezes, somente hoje percebo isso, ele passava com a cabeça baixa, conduzindo sua burra pelas ruas da cidade em busca de algum trabalho para ganhar a vida.
Em outras ocasiões, ele era visto com a esposa e os dois filhos. Era a família que se transformava em bicho. No interior, os medos, a imaginação e as ações nem sempre são as melhores com o passar do tempo, mas deixam memórias que viverão para sempre.