Luiz Inácio Lula da Silva subiu ao palco montado no gramado do Estádio de Pituaçu, em Salvador, por volta de 21h20 desta quinta-feira, 15. Era o fechamento do ato promovido pelos organizadores do Fórum Social Mundial, que ocorre este ano pela primeira vez na capital baiana. O líder político do Partido dos Trabalhadores (PT) está na encruzilhada do seu destino, com o judiciário, a imprensa e a elite brasileira, todos unidos para calar sua voz, apagar sua história, impedí-lo de continuar influenciando o destino do País. Uma suposta prisão prenunciada para antes do final deste mês poderia abalar seus ânimos, embargar sua voz. Não foi o que presenciei.
Desde 1989, quando Lula disputou a presidência do Brasil pela primeira vez, presencio seus discursos, a maioria das vezes em campanhas políticas. O penúltimo momento foi em Porto Alegre, no último 24 de janeiro, quando um clube de amigos celebrou a sentença facciosa do herói fake do Brasil, Sérgio Moro. Na noite de ontem, nunca o tinha visto tão sereno, tão senhor de si, em um discurso sem ódios, sem rancores, mas firme. Deu nome aos bois e aos inimigos, celebrou amigos e velhos companheiros, saudou a heroína que caiu assassinada no dia anterior, Marielle Franco, e a nova liderança presente ao seu lado, Manuela D´Ávila, pre candidata a presidente pelo PCdoB.
Lula precisou de menos de trinta minutos para atravessar quinhentos anos de história do Brasil e da América Latina. Citou as conquistas das esquerdas desde a vitória de Daniel Ortega, na Nicarágua, em 1980, e chegada ao poder dele próprio, em 2002, Os Kirchner na Argentina, Eduardo Correa, no Equador, Bachelet no Chile, e enfatizou Evo Morales, primeiro índio a governar a Bolívia.
O ex-presidente criticou as elites brasileiras, ao dizer que a pequena República Dominicana criou sua primeira universidade em 1538, enquanto no Brasil ela só chegou quatrocentos anos depois. Segundo Lula, a Universidade Brasil foi criada às pressas em 1920, “porque o rei da Bélgica vinha aqui e precisavam lhe dar um título de Doutor Honoris Causa”. Lula declarou que durante o seu governo foram criadas mais vagas universitárias do que os outros governos em quinhentos anos. “Não é pouca coisa um candidato que não tem diploma universitário passar para a história como o presidente que mais fez universidades neste País”, sentenciou o líder petista.
Em um dos momentos mais comoventes do seu discurso, Lula mencionou a iminência de seus algozes decretarem sua prisão. “Querem me prender, para calar a minha voz? Eu falarei pela voz de vocês! Querem me prender numa cela, para eu não poder andar? Eu andarei pelas pernas de vocês! Querem me prender para minha cabeça não emitir pensamentos? Não tem problema, eu pensarei pela cabeça de vocês! Querem me prender para eu não continuar na luta? Vocês continuarão a minha luta!”
É difícil analisar como se constrói um grande líder, até mesmo definir o que é um grande líder, mas eu não tenho dúvidas de que estava ali, diante da maior liderança política brasileira dos últimos anos. Não sei se maior ou menor que Getúlio Vargas, até porque não vivi sua época para comparar. É difícil também imaginar como ele suporta o fardo, aos 72 anos, depois de ter realizado o maior ciclo de mudanças no Brasil em 8 anos de governo, e ver sua honra achincalhada diuturnamente por uma elite que revela sua hipocrisia a cada gesto, ter perdido sua Marisa na forma que perdeu, ver seu legado triturado dia após dia por um governo corrupto e golpista, ver um judiciário fantoche querer justiçá-lo, como já antes fizeram com Tiradentes, Lampião, Conselheiro, e tantos outros.
Talvez as respostas claras não existam. Talvez seja necessário recorrer ao imaterial, ao metafísico, para explicar Lula. Eu devo me sentir feliz por ter estado tão próximo dele, te-lo visto e ouvido com meus próprios olhos e ouvidos. Não creio que ainda viverei para ver outro líder tão completo.
Adolpho Loyola.