Passados mais de vinte anos do primeiro governo progressista assumir a gestão federal, a fome ainda existe no Brazilquistão.
Registro esse fato a partir da minha situação. Devido a graves problemas familiares e aos elevados custos das tarifas municipais de Morolândia, a começar pelos doze reais a cada deslocamento de ida e volta no transporte coletivo, tive que me mudar de cidade no início do último mês de setembro.
Como estou desempregado desde o final do ano de 2018 e precisei utilizar o restante das minhas reservas financeiras para providenciar um novo domicílio e me mudar, procurei o serviço de assistência social do meu novo município para aderir aos programas de assistência às pessoas em vulnerabilidade socioeconômica.
As respostas obtidas foram cruéis: há uma quantidade limitada de pessoas que moram sozinhas atendidas pelo Bolsa Família e, se eu tiver muita sorte para conseguir a assistência federal, ela será paga apenas a partir do próximo ano.
Assim, diante das restrições impostas pelas regras orçamentárias nacionais, a burocracia estatal está escolhendo quem passará fome e padecerá sem assistência financeira, apesar do discurso internacional da principal liderança governamental contra a desnutrição.
Essa escolha burocrática representa o agravamento das condições sociais no país, pois a fome gera doenças, revolta e violência.
Também indaguei se o município possui algum tipo de assistência para suplantar as deficiências dos programas estaduais e federais de assistência social, porém, estou sem respostas objetivas até no presente momento.
Na minha avaliação, essas circunstâncias permeiam a concretização do racismo de classe social, a começar pela omissão da classe média em relação às pessoas em vulnerabilidade socioeconômica. O discurso recorrente do setor financeiro pela austeridade fiscal e a postura da Ministra do Planejamento, que talvez conheça a população pobre apenas por fotografias, filhinha de um ex-Senador da República, sinalizam que a pobreza talvez exista em Marte, menos no Brazilquistão. Pela conduta dessa gente, parece mais fácil encontrar um alienígena no país do que alguém que esteja com dificuldades financeiras, como se vivêssemos nos países nórdicos.
A abertura de créditos suplementares nos orçamentos governamentais para atender as pessoas sozinhas em situação de vulnerabilidade socioeconômica pode significar uma economia de recursos nas áreas da Saúde e de Segurança Pública. Pois uma pessoa faminta gera despesas com tratamentos médicos, ela pode tentar o suicídio e também partir para a criminalidade, gerando elevados custos com processos judiciais e de custódia aos Poderes Públicos em relação a essa última possibilidade.
Nesse contexto, as pessoas que ainda exercitam a empatia nesse país precisam se mobilizar para cobrar providências urgentes contra a fome; do contrário, os casos de latrocínio e demais crimes poderão se elevar, gerando traumas sociais e emocionais infinitos.