Somos de outra cepa: resistimos.
Resistimos nas ruas, nos bares, na noite, no escuro, no claro, na primavera e no verão, até no duro inverno que um dia sempre acaba.
Resistimos porque somos da solidariedade, da paz, da construção coletiva, do amanhecer cercado de luz e alegria.
Resistimos ao ódio, à intolerância, ao silêncio obrigado.
Resistimos à perda de direitos, às ameaças à democracia, aos golpes, às ditaduras de qualquer tipo.
Resistimos à canalhice, aos desmandos, à sem vergonhice, à desfaçatez, ao mau caratismo.
Resistimos às ditaduras, aos golpes de mão e aos golpes contra a democracia.
Resistimos porque temos ideias, porque sonhamos, temos utopias, temos esperança.
Resistimos aos podres poderes e ao império do mal.
Resistimos à barbárie e ao caos.
Resistimos aos gorilas de ontem. E sobrevivemos.
Resistimos porque somos feitos de carne, pele e osso e carregamos no nosso peito todas as dores do mundo.
Resistimos porque somos gente feita de palavra e versos, compromissos e canções, hinos e bandeiras, solidão e companhia.
Resistiremos aos gorilas de hoje. E sobreviveremos.
Resistimos ao pior poder, o Poder Judiciário e ao Sistema de Justiça, que não são democráticos, que (quase) só prendem e deixam mofar na cadeia pobres, pretos e putas, poder e sistema que não aceitam contestações, não são eleitos, não têm e não querem controle social, poder e sistema cheios de privilégios e mordomias.
Resistimos às tentativas de compra de nossas cabeças, corações e mentes.
Resistimos na Caatinga, no Cerrado, no Pampa, na floresta amazônica, no Semiárido, na selva urbana, na beira dos riachos, no sertão e no agreste, na confluência dos rios e nas coxilhas, debaixo do sol e em ao meio do frio e à geada.
Resistimos na educação popular, nas Comunidades de Base, nas escolas, nas igrejas e nos terreiros, na cidade e no campo.
Resistimos porque acreditamos, porque temos fé, porque somos da paz.
Resistimos porque não somos intolerantes, porque não cultivamos o ódio, não abominamos as diferenças, não nos dobramos à dor e ao sofrimento, não somos ilhas nem desertos.
Resistimos porque não somos da cobiça sem medida e sem caráter, não amealhamos barras de ouro, milhões ou bilhões nas Ilhas Cayman ou em qualquer outro paraíso fiscal.
Resistimos porque não somos bancos que apenas enxergam o lucro e o tilintar das moedas caindo no cofrão de luxo.
Resistimos porque amamos a vida, a democracia, o Bem Viver.
Resistimos nas ruas, nas greves, nas mobilizações, dentro e fora de casa, porque somos povo e somos da luta.
Resistimos porque amamos todos os serves vivos, as plantas, as flores e o Planeta Terra.
Resistimos ao medo, à intimidação, ao desrespeito, a criminalização, à hipocrisia.
Resistimos porque aceitamos as diferenças, os diversos modos de pensar e agir, as práticas de cada uma e de cada um, as diferentes formas de amar.
Resistimos porque somos humanos, profundamente humanos, somos irmãs e irmãos, companheiras e companheiros uns dos outros, umas das outras.
Resistimos à fome, ao preconceito, ao desprezo calhorda, à miséria material e humana.
Resistimos porque queremos igualdade, justiça, bem-querer, solidariedade e união entre povos e continentes.
Resistimos aos poderosos de ocasião e aos poderosos eternos, especialmente os da mídia, que pensam estar acima da lei e da verdade.
Resistimos porque não somos do dinheiro, da maracutaia e da cafajestice.
Resistimos porque não dobramos a espinha e o caráter.
Resistimos porque somos profundamente brasileiros, latino-americanos, caribenhos e africanos.
Resistimos porque não somos lixo descartável nem sobras do Mercado.
Resistimos porque somos do povo, dos lascados, dos oprimidos, da gente das calçadas, dos pobres deste mundo.
Resistimos porque nas nossas veias corre o sangue guerrilheiro daqueles que não se entregam nunca e sempre miram o horizonte da transformação.
Resistimos porque em vários momentos da História foi o que nos restou para não sucumbir, para manter a coragem e a honradez, e sermos donos do nosso nariz e das nossas escolhas.
Resistimos porque temos consciência e porque somos capazes de resistir, se for preciso, sofrer, se for preciso, morrer.
Resistimos porque acreditamos na vida, amamos as flores, as árvores e seus frutos.
Resistimos porque temos causas e não nos arrependemos de nossa resistência.
Resistimos porque somos Paulo Freire, somos Mandela, somos Rosa, somos Che.
Resistimos ontem, resistimos hoje, resistiremos amanhã e sempre.
Selvino Heck
Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990)
Em treze de outubro de dois mil e dezessete
