Enfim, terminou 2017. Um ano em que o retrocesso foi a marca para o povo brasileiro em todas as áreas. Essa volta à décadas atrás é obra de um governo ilegítimo, totalmente descompromissado com as necessidades da Nação e com uma pauta que não passou pelo crivo eleitoral da sociedade, até porque não foi eleito por ela. O caminhar para trás, objetivo da proposta ultraliberal, imposta pelo “Senhor Mercado”, que banca esse governo, busca desfazer o pouco obtido pelo povo brasileiro, principalmente nos últimos anos, aumentando os ganhos do grande capital internacional e reduzindo direitos e o pouco ganho financeiro da classe trabalhadora. Isso pode ser facilmente notado em áreas como a dos direitos trabalhistas, previdenciários e sociais, de trabalhadores privados e públicos, rurais e urbanos, mais a juventude estudante (ou a que pretende estudar). Em parte dessa pauta o “Mercado” atende a interesses de setores da classe dominante nacional, em especial o sistema financeiro e outros grupos corporativos para pô-los cada vez mais a serviço do Capital internacional. Assim, entorpecem o empresariado nacional, mantendo-os dóceis e colaborativos.
Alguns pontos dessa grande reforma no Brasil do Século XXI a caminho do início do Século XX merecem destaque, lembrando que estão todos interligados.
Alteração da legislação trabalhista.
A flexibilização de direitos dos trabalhadores e de obrigações patronais, facilitando para os patrões a contratação temporária, intermitente (rotativa), mais a terceirização e a “pejotização”, além da demissão com pouquíssimo ônus, ou até nenhum, em certos casos, isenta de quaisquer responsabilidades os empresários, deixando praticamente toda a responsabilidade e o ônus para os trabalhadores, inclusive os decorrentes de acidentes de trabalho, adoecimento, entre outros.
Para que os trabalhadores tenham menos condições de se organizarem, questionarem e de reverterem esse processo de retirada de direitos e de condições de trabalho, o projeto global também busca o enfraquecimento das entidades sindicais. Para isso, a alteração da legislação propõe o estrangulamento do financiamento e a dificuldade de organização das entidades, se utilizando para isso das novas formas de contratação e de relações de trabalho, como a “pejotização” e a terceirização, por exemplo. Dificultar, ou até mesmo impedir a organização, a manutenção e o fortalecimento das entidades sindicais é de fundamental importância no grande projeto de reforma do Estado brasileiro.
Com essas alterações na legislação o resultado imediato para os trabalhadores é de novas formas de contratação que, se agora legais, são imorais e até desrespeitosas com a dignidade humana. Busca-se cada vez mais as baixas remunerações, sem garantias para o trabalhador, como a contratação intermitente, precária, por produção e, logicamente, a consequente redução do emprego formal, impedindo os trabalhadores de manterem vínculo empregatício e de cumprirem as cada vez maiores exigências para acesso ao sistema previdenciário público, gerando menor desembolso do sistema previdenciário público.
Com o desmonte do serviço público (como veremos adiante), em especial a educação pública, fica cada vez mais difícil, nesse caso, o acesso a programas de formação e qualificação profissional. Isso impede o trabalhador de baixa renda (quando empregado) de investir na melhoria de sua formação e de obter possíveis ocupações melhores no tão restrito mercado de trabalho. O resultado, óbvio, é a reserva dos melhores postos para os poucos que tenham condições de acesso, inclusive pagando por uma melhor formação escolar e acadêmica, o que não seria o caso dos mais necessitados.
Ainda em relação ao mundo do trabalho, temos a destacar mais um ponto que favorece empresários, principalmente os ligados a grandes grupos, quer na atividade urbana, quer no campo. Trata-se das já reduzidas condições de fiscalização e de controle pelo Estado, tanto na área tributária quanto na trabalhista (parte também do desmonte do serviço público). Esta situação, que já vem favorecendo a sonegação de tributos e o descumprimento de obrigações legais (as que ainda permanecem), além da exploração de mão de obra em subemprego ou em condições de escravidão que tendem a aumentar. Essa redução das condições de fiscalização e controle vem através da ausência total de investimentos em órgãos responsáveis por essas atividades, como a Receita Federal e o Ministério do Trabalho, incluindo a não recomposição e atualização da força de trabalho dessas instituições. Isso pode ser verificado na Lei Orçamentária Anual para 2018 que não prevê nenhuma criação de novos cargos nessas áreas, assim como limita muito a reposição de servidores que venham a se aposentar ou falecer.
Merece destaque na desestruturação nas áreas de fiscalização e controle, a desestruturação da fiscalização do Ministério do Trabalho, onde a fragilidade operacional já existente, com poucos auditores-fiscais e a quase inexistente estrutura dificulta a identificação e o combate, além da sonegação de verbas trabalhistas, como o FGTS, também o combate às diversas formas de precarização das relações de trabalho, como a exploração de trabalhadores em condições de efetiva escravidão. Não bastasse esse quadro, que favorece à exploração de estrangeiros, (principalmente sul americanos em condições irregulares de imigração) nas grandes cidades brasileiras, assim como migrantes das áreas mais carentes do país para o trabalho forçado no campo. Ao invés de investir no combate à essa situação, o atual governo, na busca por apoio no Congresso Nacional, editou uma portaria flexibilizando as regras de fiscalização do trabalho escravo, tirando da área técnica do Ministério do Trabalho a decisão de inclusão e publicação dos exploradores de mão de obra escrava na “lista suja” do trabalho escravo. Pauta defendida por empresários e parlamentares principalmente ligados à atividade rural. Essa atitude, combatida com veemência por diversas organizações de direitos humanos, além das próprias entidades sindicais representativas dos auditores-fiscais do Trabalho, também favorece a manutenção da prática de muitas confecções de roupas ligadas a grandes e famosas marcas do ramo, chegando a 37 marcas de grifes e varejistas do ramo da moda envolvidas com trabalho escravo nos últimos oito anos.
Reforma previdenciária, com dois objetivos:
Redução de gastos, se é que deve se chamar de “gasto” devolver parcela a quem por muitos anos trabalhou, ou ainda trabalha e contribuiu com parte de seus salários por anos, ou ainda contribui. É o mínimo direito ter acesso a algum amparo em caso de velhice, ou impedimento temporário de trabalhar. Para a redução de “gastos”, a reforma apresentada busca dificultar a possibilidade de um trabalhador cumprir as exigências, cada vez maiores, para a obtenção de benefícios, ou mesmo impedir o acesso a esse direito.
Aumento de ganhos, apenas para o sistema financeiro privado, nacional e internacional. No caso de aposentadoria, ou outro benefício de caráter previdenciário e de amparo aos mais idosos, a decisão foi a entrega para o sistema financeiro, fazendo crescer os planos privados de previdência, que nada são além de meros programas de poupança sem nenhuma solidariedade, como seria na previdência pública. Aliada às alterações na legislação trabalhista e de terceirização, dificultando a contribuição regular para a previdência pública, a proposta de reforma previdenciária praticamente obriga os trabalhadores que tiverem algum rendimento a correrem para as instituições financeiras, objetivando receber algum valor na velhice, já que no sistema público se torna quase impossível. Claro que, sendo um sistema privado de previdência, há o risco de quebra de instituições, deixando o usuário a ver navios.
Uma outra evidência de serem apenas os dois motivos acima (gastar menos e lucrar mais) que movem a proposta de reforma da previdência, foi a inexistência total de proposta de melhoria nas condições de fiscalização, autuação e cobrança de débitos, em especial de grandes grupos empresariais sabidamente grandes devedores e sonegadores da Previdência Social. Assim como a fiscalização nas áreas tributária e do Trabalho, a arrecadação previdenciária carece de atualização, modernização de estrutura e de sistemas, bem como de recomposição do quadro funcional nessas áreas. No entanto, ao invés de investir em formas de reduzir a sonegação e aumentar a cobrança de dívidas, o que o governo apresenta são propostas de refinanciamentos, empurrando para frente a possibilidade de melhorar a arrecadação previdenciária. Isso, aliado ao permanente desvio de verbas previdenciárias para outras áreas do governo.
Desmonte do serviço público.
Também parte intrínseca da grande reforma proposta (a volta ao liberalismo), é fundamental a redução da estrutura do Estado. Em algumas áreas a reforma objetiva a simples transposição de atividades do Estado para a iniciativa privada, como saúde, educação, previdência, objetivando lucro. Outras visam apenas a retirada do Estado, como as ações sociais, como bolsa família, Minha Casa Minha Vida, e outros programas de assistência básica, buscando a “redução de despesas”. Há ainda a redução no controle e fiscalização, facilitando a atuação, quase nunca republicana de grandes grupos empresariais, conhecidos por não cumprirem suas obrigações tributárias e trabalhistas, mas que são grandes financiadores de projetos e de campanhas dos que detêm o poder.
Óbvio para os promotores da reforma do Estado brasileiro a necessidade de redução de gastos com despesas públicas, como as das áreas de perfil mais voltado para a parcela mais carente da sociedade são gastos que necessitarem ser contidos. Da mesma forma, a despesa de pessoal da administração pública, como remunerações e benefícios também devem ser reduzidas. Além, é claro das despesas com a gestão, investimento e administração da máquina pública. Até porque, tendo menos atribuições, a máquina pública naturalmente custaria menos em todas as áreas. Evidente que em todos os casos o governo precisa gerar um robusto superávit primário, totalmente destinado a pagamento de amortizações e serviços da dívida pública (leia-se dinheiro público para banqueiro privado). Além do mais, a redução da estrutura do Estado cumpre um outro objetivo, que é alijar a parcela mais carente do processo produtivo. Daí a Emenda Constitucional nº 95, que limita a despesa primária e impõe um teto de gastos congelado por 20 anos.
No caso da educação, a redução, ou mesmo a privatização de diversos cursos universitários, além da total ausência de investimentos em educação básica e média, fazendo com que o baixo nível escolar cresça, principalmente nas camadas mais carentes, estuda quem pode pagar. Consequentemente, são impedidos de terem acesso a formação justamente os que mais necessitam. Claro está que, afastados da necessária formação, passam a gerar mão de obra mais barata, até pela pouca qualificação acadêmica e profissional. o que também dificulta a formação de um contingente que entende, analisa e questiona. O que, obviamente, não interessa à classe dominante. Esse processo retrógrado na educação, no sentido mais amplo, gera terreno fértil para o desenvolvimento de pensamentos mais conservadores, como preconceitos e discriminações de gênero, etnia, além de homofobia, xenofobia, social, entre outros.
Servidores públicos
Como já mencionado, a proposta de redução do serviço público em diversas áreas também significa alteração do quadro funcional da administração pública. Não se vislumbra mais a necessidade de investimento em formação e qualificação da força de trabalho no serviço público. Para isso, o governo desenvolveu um projeto completo que envolve desde o PDV – Programa de Demissão Voluntário (já comprovadamente fracassado – 76 adesões, quando o governo esperava pelo menos 5.000), o congelamento de salários, adiamento de reajustes já aprovados em lei (em litígio no judiciário), a alteração da alíquota de contribuição previdenciária, a redução de benefícios e aquilo que o atual governo chamou de estruturação de carreiras, onde é proposta a redução do piso salarial da maioria das carreiras e o alongamento das tabelas de progressão e de promoção, determinando que os servidores só atinjam o teto de suas carreiras após 30 anos de serviço, independente de qualificação.
Evidente que o governo aguardava um posicionamento firme da representação sindical dos servidores, com mobilização, manifestações e campanhas de esclarecimento junto aos parlamentares e ao conjunto da sociedade. Aproveitando a falência da campanha governamental pela malfadada reforma previdenciária e na sanha de atacar o funcionalismo, que se posicionava claramente contra as propostas do governo, o governo apontou suas baterias contra os servidores, primeiro os colocando como se fossem os culpados pelo falso déficit da previdência. Não satisfeito, o governo vetou integralmente o Projeto de Lei nº 3831/2015, que trata da normatização da negociação coletiva no serviço público federal, estadual e municipal. Projeto de autoria do Senador Anastasia (PSDB/MG). NA argumentação do veto o governo comete duas falhas gritantes. A primeira foi alegar inconstitucionalidade, com invasão de competência. Declaração típica de quem não leu e não entende o que diz a Constituição Federal. A outra foi ignorar que o Brasil é signatário da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho, que trata do mesmo assunto, onde o PL, aprovado por unanimidade, tanto no Senado quanto na Câmara dava continuidade ao que determina a Convenção da OIT. É claro que tudo o que o atual governo consegue com atitudes como essas é o aumento da mobilização e da atuação do funcionalismo contra o conjunto de propostas de reforma apresentados.
2018
O que resta para o primeiro período de 2018 é a continuidade dos embates iniciados no ano que passou e que devem atravessar todo o ano, principalmente por ser 2018 um ano eleitoral, com campanhas nacionais para a presidência da República, Senado, Câmara Federal, governos estaduais e assembleias legislativas. É óbvio que os temas mais candentes do debate, como as propostas de reforma serão pauta presente. É também natural que as organizações sociais, como entidades sindicais, estudantis, comunitárias e toda a sorte de organização da sociedade atue em defesa dos seus direitos, tanto os que pretende manter quanto os que necessita recuperar.
Uma das palavras de ordem deve ser a da defesa e garantia do emprego em tempos de crise. Outra obrigatória é a da defesa da previdência pública e não à reforma proposta. Da mesma forma a volta dos direitos trabalhistas retirados, a não privatização e o necessário investimento no serviço público, visando um melhor atendimento das necessidades da população, especialmente a mais carente. Isso significa investimentos e não o corte nas áreas de saúde, educação e outras de cunho social. A recuperação do poder de compra dos trabalhadores em geral. Também deve ser ponto forte da pauta de lutas para 2018, o fortalecimento do serviço público nas áreas de fiscalização para o combate e a efetiva punição aos grandes devedores, sonegadores e exploradores do trabalho em condições precárias ou de escravidão.
Também é necessário o combate firme a todo tipo de preconceito e atraso social, bem como o fim a perseguição às minorias sociais e o direito a todo tipo de manifestação artística e cultural. Só assim podemos vislumbrar uma sociedade a caminho do desenvolvimento efetivo e sustentável, da efetiva independência internacional.
Necessita também estar na pauta o fortalecimento e o efetivo direito a organização e à atuação das entidades sindicais, privadas e públicas, com a efetivação de um sistema de negociação coletiva para os trabalhadores no serviço público.
Todo esse debate deverá estar pautado pelo Congresso Nacional no seu último ano da atual legislatura, bem como nos debates objetivando as eleições de outubro de 2018. Daí é possível vislumbrar um necessário novo perfil dos parlamentares para a o período que se inicia em 2019. Evidente que as entidades representativas da sociedade em todos os seus segmentos deverão acompanhar o debate dentro e fora do parlamento brasileiro. Afinal, esse é o tema para o novo ano que desponta: Defender o Brasil em tempos de crise.