Expandir a utilização das tecnologias livres é o caminho que precisaríamos percorrer para a soberania tecnológica e o próprio desenvolvimento do Brasil e dos países depende disso
Por Thiago Zoroastro – Imagem retirada do blog Paraná Brasil (http://paranabrasil.blogspot.com.br/)
A História
O que começou há exatos 30 anos atrás com um anúncio público de que vários programadores estavam dispostos a continuar programando pelas práticas anteriores ao conceito de software proprietário, está hoje conhecido como “Revolução de Compartilhamento”. O que a grande maioria das pessoas não sabe é que aquela noção de compartilhamento presente no Facebook e na concepção geral de internet e das redes tem origem obscura neste mundo de mídias equivocadas que não conseguem transmitir o conhecimento aprofundado por não terem conhecimento específico sobre a história da computação.
Richard Mathew Stallman anunciou o Free Unix em um contexto de apropriações dos programas que já existiam. Ele anunciou, em 27 de Setembro de 1983, o Projeto GNU (significa GNU's Not Unix (GNU Não é Unix, do acrônimo recursivo G=GNU's Not Unix e assim por diante) surgiu oficialmente em 1984 para agregar todos os programas de computador desenvolvidos livremente. Logo a seguir, em 1985, é oficializada também a Free Software Foundation (Fundação Software Livre), que visa proteger, captar fundos e colaboradores para o desenvolvimento de softwares livres.
Difundir o Software Livre é importante para expandir o conhecimento público sobre as práticas de comunidades de usuários que ajudam-se mútuo-colaborativamente com os outros para resolver problemas compartilhando conhecimento. A proposta de Richard Stallman também era não quebrar a solidariedade entre os desenvolvedores e que os programadores continuassem “se ajudando” na elaboração de programas e sistemas operacionais de computador e o desenvolvimento dos softwares fosse livre. Isto foi persistentemente construído ao longo de 30 anos, tendo ganhado até o filme Revolution OS de referência. Tanto deu certo que as “práticas de compartilhamento” foram sendo utilizadas inclusive por pessoas que jamais acreditariam que o compartilhamento de material fosse tão importante e digno de louvor.
O Movimento Software Livre nasceu com dificuldades de se expandir porque o capitalismo impunha suas ordens para distribuir software proprietário de código-fechado e as noções eram de “competição desregrada” entre as empresas desenvolvedoras. As mídias, influenciadas pelos interesses do capital, difundiam apenas a existência dos sistemas operacionais que convinha a eles, influenciando todo o mundo a oferecer apenas software proprietário para os utilizadores de computadores domésticos, públicos e educacionais.
De acordo com os dicionários, Redenção significa “ato de redimir”, um “conceito religioso ligado ao fim dos pecados”, que também está relacionado ao “Resgate da humanidade pela morte de Jesus Cristo”. Por que redenção, então? Porque quando começaram o Movimento Software Livre, ninguém acreditava que isso fosse dar certo, e hoje vemos sua força por conta da solidariedade entre pessoas para desenvolverem sistemas operacionais sem pagar licenças obrigatórias, uma vez que não é contra a obtenção de dinheiro por colaboração espontãnea, de dinheiro e trabalho. Meu trabalho para expandir o Software Livre é, na verdade, a minha forma de contribuir com todo o trabalho, então em troca de poder instalar livremente tudo o que quiser, posso também contribuir para a comunidade no desenvolvimento dos sistemas operacionais da forma que eu puder e, no caso de um leigo em programação como eu, ajudar a expandir o número de utilizadores.
O que eles começaram a fazer era exatamente o que faziam no meio acadêmico antes de surgir o conceito e a licença de software proprietário. E ainda viam a questão ética do código-fonte ter de ser aberto para que pudessem analisá-lo. Hoje em dia, existe esta revolução avançando questões sobre Dados Abertos porque ter Governos Abertos é uma das formas de combater a corrupção e abrir as governanças para intervenções participativas nas decisões que tangem o poder público.
O Movimento e os Movimentos
O Movimento Software Livre segue a passos lentos contando que o ditado “a verdade tarda mas não falha” prevaleça, porque não se trata apenas de uma metodologia, mas o ethos (que do Grego significa hábito e costume) das comunidades que carregam o flavor revolucionário. E muito a ensinar! O que falta aos Movimentos é a vontade de colaborar mutuamente, entre indivíduos, grupos de rede-trabalho (NetWork) locais com outros locais, e também entre os tipos de movimentos sociais que envolvem objetivos de mudanças sociais e libertadoras. Porque isso desenvolve as questões de cada um e cria formas de superar as dificuldades que esses movimentos tem para conseguir alcançar os objetivos, emancipando tecnologicamente e trazendo-os para estruturas e plataformas de colaboração por compartilhamento.
Os Movimentos poderiam se fortalecer muito com a infra-estrutura que o Movimento Software Livre oferece. No último FISL (Fórum Internacional de Software Livre), havia até cartaz com “Nós somos os 0,20 centavos” e costumeiramente vejo vente publicando e-mails nas listas de e-mails dizendo “aqui estão meus dois centavos”. O espírito de solidariedade deveria tomar conta de todos e a nação se unir para não precisar de recorrer mais às opções da zona de conforto.
Juntar o Movimento Software Livre aos Movimentos Sociais e Estudantis poderiam significar justamente o que mais precisamos: força de trabalho para mudar a situação de nosso país. Sem essa ligação consciente, jamais seremos capazes de ter tecnologias livres sendo utilizadas por uma larga quantidade de pessoas, porque soberania tecnológica significará estrutura comunicacional para o desenvolvimento de nosso país. E isto significa não apenas programas e sistemas operacionais de computador, mas também as opções que dispomos em redes sociais e formas de inovações democráticas e de organização das ideias propostas pelos próprios movimentos.
O Movimento Estudantil, por exemplo, precisa que seus militantes em ciências da computação proporcionem o espaço de construção do conhecimento, organização das ideias e desenvolvimento de debates fortuitos para o próprio fortalecimento do Movimento Estudantil. Infelizmente dependemos daquela rede nefasta para nos comunicarmos com os outros, não havendo qualquer noção de que o nosso território possibilitaria uma melhor organização, desenvolvimento dos pontos de pauta, compartilhamento de demandas, evolução horizontal das pessoas participantes. Quando algum deles me diz “mas já tem Facebook” me dá desgosto de ter alguém com o poder que tem e não ter noção do que fazer, e a solução seria justamente fornecer um exemplo concreto para eles entenderem que não se trata de mídia social, mas de democracia horizontal e compartilhamento das pautas por todos os lugares que existir alguém associado e em contato com a estrutura, que poderia ser uma rede social em Noosfero ou até mesmo um fórum de internet.
Ainda hoje vemos o predomínio da influência dos softwares proprietários. Na semana passada, saiu a notícia que a secretaria de educação do Governo de SP comprou licenças da Microsoft para instalar o programa Office. Neste contexto, sabe-se a importância de investir em alternativas de softwares pelo que Hugo Chávez chamou de “independência científica tecnológica”. Ele foi um, senão o maior dos entusiastas de software livre na América Latina, contribuindo enormemente para a aplicação de programas com a licença GNU GPL (General Public Licence), a licença do Projeto GNU e originadora de todos seus programas computacionais.
Inovações tecnológicas em software livre para a democracia
E isto fica tudo a perder se continuamos sob dependência tecnológica, porque o não-poder escolher está deixando as pessoas irritadas nesta “democracia”, e se há algo que não estamos escolhemos é forma da estrutura que nos orgnanizamos online. As estruturas são muito importantes porque nos colocam sobre quais opções dispomos para nos organizar, comunicar, compartilhar, agir.
Tal estrutura depende muito do software que utilizamos, e utilizar as estruturas certas fará com que consigamos obter melhores resultados de mudanças em nosso país. Pois o trabalho em rede ou rede de trabalho (do inglês NetWork) funciona muito melhor sobre estruturas feitas para tal finalidade do que com uma péssima estrutura que nem aquela em que as pessoas estão distraídas.
Os problemas são, dentre eles, a falta de reconhecimento público pela falta de conhecimento em história da computação e seus preconceitos aos sistemas operacionais ditos “não-amigáveis”, que não servem a usuários comuns e somente para servidores de internet; a insistência nos softwares proprietários pelos governos e escolas; o oportunismo de vários sites e redes sociais de aproveitarem a metodologia do compartilhamento sem fazer referências a quem criou isso; a falta de vontade das pessoas em descobrir o novo e superar desafios utilizando GNU/Linux; e de várias dificuldades que ainda dificulta o avanço cada vez mais progressivo da implementação de software livre nas casas domésticas e nas outras aplicações, como no governo e nas empresas.
Existe, no Governo Federal, iniciativas que são importantes para a soberania tecnológica brasileira. O Programa de Apoio Tecnológico para os Municípios Brasileiros, 4CMBr – Comunidade, trabalha com Conhecimento, Colaboração e Compartilhamento dos municípios Brasileiros. Existem vários avanços sendo encaminhados no sentido de aplicação do software livre, mas por enquanto visto apenas como “alternativa” e não como poderia ser. O e-cidade e tantos outras criações não podem correr o risco de serem esquecidas porque as pessoas são viciadas em rede social de status, com pessoas acomodadas naquilo e opinando equívocos sobre qual e o que é certo a se fazer nas redes.
O Software Livre é uma área em que investir no desenvolvimento dos programas gera benefício para todos: o investidor, os desenvolvedores e para os usuários, quando estes mesmos são os próprios investidores espontâneos. Pagar licenças para software proprietário é uma atitude que não agrega desenvolvimento ao Brasil porque é disperdiçar dinheiro por algo que não deveria ser cobrado. As “alternativas” que desenvolvem software pelas práticas históricas anteriores à existência do software proprietário são, na verdade, a primeira opção, e todo país que quiser se desenvolver, terá que criar mecanismos e incentivos para o desenvolvimento de software nacional e regional, tanto sistemas operacionais, quanto programas de computador e redes sociais locais.
Ninguém é obrigado a ter conta numa rede social de código-fechado que tem, por intuito, colocar o mundo inteiro ali dentro, gerando dependência tecnológica em todos. Isto atrasa o desenvolvimento dessas estruturas nacionais, força as pessoas a terem conta naquilo e tapa os olhos até de gente das Universidades de que estruturas próprias para Comunicação Universitária é um fator de organização e democratização das decisões, proporcionando não apenas vantagens no fator administrativo, mas também possibilitando a socialização do conhecimento e o debate público online sobre os temas abordados.
Debian GNU/Linux e derivados são mais fáceis que Windows
O Projeto GNU, sendo o primeiro projeto de desenvolvimento do software livre, desenvolvera aplicativos desde 1983 até que em 1991, Linux Torvalds compartilhara seu kernel livre do Unix. As esquerdas autorais permitiam o compartilhamento dos códigos, de modo que surgiam outros sistemas operacionais derivados daqueles anteriores. Entre as inumeráveis distribuições diferentes de GNU/Linux, ambientes gráficos diversos e a pluralidade no desenvolvimento, é claro que algumas iniciativas iriam seguir para direcionamentos distintos.
Na busca por um substituto de facilidades ao Windows, pode haver distribuições de GNU/Linux tão fáceis quanto Windows. Neste quesito, acredito que seja Debian, mas das outras raízes da árvore de distribuições, Slackware e Red Hat, neste assunto abordado em questão, o importante é focar em “algum” que seja aceitável para usuários comuns, e mostrar que é tão fácil e até mais fácil que Windows. Não é nada contra aqueles que gostam de ter o sistema operacional 100% manual, porque eu também gosto, mas não é o caso.
As pessoas precisam e tem direito a um sistema operacional fácil e com recursos para configuração 100% em gráfico e janelas, porque não são obrigadas a aprender comandos de terminal. Software Livre está na liberdade para usar os programas que você precisar segundo as suas necessidades, então difundir que “você pode instalar qualquer programa que você quiser no GNU/Linux sem dificuldades” é uma grande e poderosíssima propaganda.
O Ubuntu é derivado de Debian, mas assim como todos os outros precisa afirmar suas raízes e humanizar no trato com as fontes. Existe uma questão de justiça em lembrar a todos que o Debian é a distribuição que originou aquele tão popular. Humanidade com os outros é também lembrar e fortalecer suas raízes. As facilidades no sistema operacional é o que garantirá mais usuários e é preciso que o Ubuntu, com toda sua popularidade conquistada, reverencie suas raízes para que várias distribuições de GNU/Linux possam ganhar mais adeptos usuários e também participantes das comunidades. Divulgar e propagar o GNU/Linux como um ser plural.
Debian GNU/Linux é mais fácil que Windows porque não apenas pode remover programas facilmente, como no sistema operacional de Bill Gates, mas também pode instalar programas no seu computador livremente e sem restrições de licenças. Com a Central de Programas, tão como já faz o Synaptic, será possível incrementar seu sistema operacional tão facilmente que a não-existência de vírus poderia se tornar apenas “um detalhe”. O Software Livre não é difícil, depende da distribuição que a pessoa utiliza. A maior dificuldade é, no entanto, o próprio desenvolvimento dos programas, que é lento porque depende da colaboração e cooperação entre programadores, com incentivo financeiro espontâneo.
Referências:
Manifesto GNU. Em português brasileiro: https://www.gnu.org/gnu/manifesto.pt-br.html
Hugo Chávez dizendo sobre "independência científica tecnológica": http://www.youtube.com/watch?v=c8bRKoi4riU
Leituras recomendadas:
STALLMAN, Richard. Software libre para una sociedade libre. https://www.gnu.org/philosophy/fsfs/free_software.es.pdf
AMADEU, Sérgio. Software livre: A luta pela liberdade do conhecimento. http://www2.fpa.org.br/uploads/Software_livre.pdf
Filmes recomendados:
Revolution OS - https://www.youtube.com/watch?v=plMxWpXhqig
O Código Linux - https://www.youtube.com/watch?v=7z2utlmkREA
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