O Produto Interno Bruto (PIB) mundial em 2012 foi de 65 trilhões de dólares, enquanto os derivativos financeiros somavam algo próximo a 700 trilhões de dólares, segundo estimativas. Debater a financeirização extrema da economia e sociedades, no Brasil e no mundo, suas causas e alternativas, foi um dos objetivos do lançamento do livro A Internacional do Capital Financeiro, realizado nesta segunda-feira, 17, no auditório da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na capital gaúcha.
O livro é uma publicação conjunta da Carta Maior, Fundação Friedrich Ebert, e da Editora Fundação Perseu Abramo, e no lançamento no Rio Grande do Sul contou com debate entre o economista Ladislau Dowbor, o professor Marco Cepik e mediação do jornalista Joaquim Palhares, que abriu o evento, destacando a origem da ideia de transformar o tema da financeirização extrema do capital em debate. “Surgiu da necessidade de cobrir este espaço na imprensa brasileira, que não faz o debate da questão do capital financeiro internacional. Há uma crise que se espalha por todo o jornalismo brasileiro, e os veículos perdem qualidade e credibilidade, ao não trabalharem este tema”, destacou.
Na seqüencia, o economista e professor Ladislau Dowbor lembrou que uma das conseqüências diretas da financeirização é a ausência de uma discussão mais ampla sobre juros cobrados em diversas instâncias da vida econômica brasileira. “Os bancos hoje chegam a cobrar 50% de juros no Brasil. Não é possível fazer novas fábricas com 50% de juros, ninguém se desenvolve pagando 50% de juros”, afirmou o economista, exemplificando: “O banco HSBC em São Paulo cobra 65% de juros enquanto a mesma linha de crédito, do mesmo banco, em Londres, é de 5% apenas”.
A concentração de poder financeiro e oligopolização deste capital também foi ressaltada por Dowbor. “Nos paraísos fiscais temos 519,5 bilhões de dólares, mais ou menos 25% do PIB brasileiro, fruto dos mais diversos delitos. Hoje 147 grupos controlam 40% do sistema econômico mundial, sendo que 75% destes grupos são bancos. São sistemas financeiros, que estão obviamente ligados ao Brasil”, disse.
Segundo o economista, a financeirização é um processo com efeitos e relações globais, com implicações claras no Brasil. “Não estamos mais em um sistema de mais valia que a empresa explora os trabalhadores, é um processo social. É uma estrutura de poder mundial. Se tentar baixar a taxa Selic no Brasil, logo vem os economistas do setor financeiro falar que a inflação vai subir. A realidade é que a chantagem com a inflação funciona de maneira extremamente forte na população brasileira”.
Dowbor reforça este caráter global, lembrando que hoje há 192 bancos centrais, cada um fazendo o que pode, mas sem capacidade efetiva de controle deste capital. “Temos 1% de patrimônio que tem 50% da riqueza construída no mundo. Estes mecanismos estão permitindo esse tipo de apropriação”, ressaltou.
Já o professor da UFRGS e dirigente do Centro de Estudos Internacionais sobre o Governo (Cegov), Marco Cepik, frisou que o sistema financeiro não é apenas uma fusão do capital industrial, de produção. “A questão que se coloca nos últimos 40 anos é de um entranhamento entre o capital financeiro e capital industrial, e de uma subordinação e escala de penetração mundial que não existia antes”, explicou Cepik.
Para o professor da UFRGS, as crises mostraram que há custos muito claros no funcionamento desse sistema. “Com a financeirização do capital houve um aumento na desigualdade no mundo, aumento do autoritarismo como resposta às populações que perdem seus direitos, oligopolização e concentração de capital em grupos econômicos, e criação de vastas áreas cinzentas em torno da financeirização”.
Cepik cita dados mostrando que no fim dos anos 1990, o mercado diário de câmbio internacional era 81% maior do que o volume mundial de exportações anual. “Com isso tivemos algo que escapou de qualquer possibilidade de um indivíduo medianamente informado acompanhar o circuito, de entender como funciona a economia no mundo sensível.
Temos uma alavancagem financeira de uma ordem de grandeza de centenas de milhares de vezes”, afirmou.
Esta alavancagem e descolamento do capital financeiro da economia real traz, segundo Cepik, um risco sistêmico, pois não existe hoje um governo mundial ou qualquer possibilidade de controlar esse capital. “Não é um sistema fácil de desmontar, pois em alguma medida, vamos continuar precisando de capital financeiro”, destaca o professor.
Neste sentido, acrescenta, a solução depende de coordenação entre países, no plano internacional, coordenação e aliança social, inclusive com setores do capital, de minimização de externalidades geradas por este sistema, e exige clareza, do ponto de vista social, de quem deve arcar com os custos dessa tentativa de marcar minimamente um controle. “A resposta de esquerda é manter os investimentos em bem estar social e produtividade, para gerar bem estar econômico. É resposta é uma necessidade econômica e social, e neste sentido, é uma opção política”, concluiu.
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