Carlos Arthur Nuzman |
Gente, vamos focar e analisar a "figura" e a trajetória do cartola Nuzman. Esta pode ser dividida em duas fases/períodos:
- a primeira como dirigente máximo da Confederação Brasileira de Volei (CBV), de 1975 a 1997;
- a segunda como presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), de 1997 até 2012.
Êxitos
Os sucessos da primeira fase/período catapultaram seu nome para alçar-se à segunda. Vejamos abaixo.
1. Gestação de craques e forte apoio à estruturação de equipes e campeonatos: a ascenção gradual do vôlei como esporte nº2 do Brasil via estímulo e estratégia inteligente na construção de gerações sucessivas de talentos - Badalhoca, Bernard e Bebeto de Freitas (jogador) em Montreal/74 que somaram-se à Renan, Montanaro, William, Bernardinho (jogador), Amauri, Xandó e tantos outros na "geração de prata" de Los Angeles/84, ao mesmo tempo em que uma rara visão fez manter os estímulos da CBV às seleções de categorias de base (infantil, juvenil e sub-20) que colecionaram títulos e foram o alicerce da "geração de ouro" em Barcelona/92 com Maurício, Marcelo Negrão, Tande, Giovane e Paulão - esta prepararando o terreno para a "geração papa-tudo" de Giba, Ricardinho, Dante, Rodrigão, Serginho, Bruno e que foram o maior selecionado de voleibol do mundo. Ganharam TUDO sob o comando de Bernardinho (esta já sob a tutela dedicada do sucessor e reflexo de Nuzman na pres. da CBV, Ary da Graça). O vôlei feminino também cresceu de forma semelhante e chegou à medalha olímpica. Sorte momentânea em gerações sucessivas de talentos? Não, muito pelo contrário - e a prova está na comparação da ascensão do vôlei com a decadência do basquete nacional (que não repetiu a renovação das gerações talentosas de Oscar e Hortência, evidente no enorme "vácuo" entre esta, a geração de 60 bicampeã mundial (de Amaury, Rosa Branca, etc.) e a atual de Nenê, Leandrinho, Huertas, Splitter, Varejão (de nível NBA).
2. Implementação de gestão profissional nos clubes-empresas - Paralelo a isso, uma visão empresarial (primeiro na confederação e depois extendida aos clubes) foi estimulada por Nuzman - a equipe de Santo André era a Pirelli e a do Rio era a Atlântica Boavista, (depois Bradesco/Atlântica), tendo ainda o paulistano Banespa e o mineiro Minas Tênis/Fiat. A verba para as equipes vinha da nomeação e patrocínio de um esporte cada vez mais visto na TV e de cada vez maior resultado no cenário mundial.
3. Reconhecimento internacional - O Brasil em 1984 já era uma escola de vôlei própria, com seu estilo e padrão reconhecidos (internacionalmente) como uma fusão inteligente do volei-força europeu (polonês e russo) à escola de velocidade asiática (japonesa/coreana). Argentina, França e Iugoslávia (depois Sérvia/Croácia) são derivações claríssimas de nosso estilo de jogo.Outro detalhe: sabiam que o saque forçado "Viagem ao Fundo do Mar" (executado com um salto e "cortada") foi inventado por um jogador polonês em Montreal/74 mas não era prática largamente utilizada no jogo até sua aplicação estratégica (e bem sucedida) pelos brasileiros no Mundial de 1982? Nem a Rússia (a melhor seleção da época) a via como decisiva até ver William, Xandó e Renan fazê-la com bons resultados (já o saque "Jornada nas Estrelas" de Bernard era uma estravagância e não teve continuidade).
Resultado: o protagonismo do vôlei brasileiro e seus êxitos destacaram Nuzman e fizeram da gestão do volei nacional um case de sucesso que o referenciava no meio esportivo. Mas veio a 2ª fase dirigencial no COB e, aí, ficaram evidentes em Nuzman outras características (e vícios) do management esportivo tupiniquim:
1. Nada é de graça - tudo o que era concebido e implementado com sucesso no âmbito do vôlei produzia receita, com uma margem revertida a seu "mentor"; normal, pois em todo esporte brasileiro a cartolagem é assim. Isso garante prosperidade e apoio à perenidade no cargo (Havelange e Teixeira na CBF, Mamede no Judô, Farah na FPF, Caixa D'Água e Eurico Miranda no RJ, etc.).
2. Mais possibilidades ($$$) num cargo maior, mas menos sucesso - Mas o COB é maior e, embora com mais possibilidades, há mais conflitos e menos foco de receitas. A gestão Nuzman tinha de apostar o grosso das fichas no patrocínio governamental, via estatais (fora bancos, as únicas empresas de budget suficiente para arcar com os grandes custos de delegações olímpicas, estrutura física confederativa e, claro, o "percentual do empreendedor" - ou "taxa do cara").
3. Ambição desmedida - E o"cara" era caro e ficou ambicioso, ao ver no COI e FIFA as "possibilidades" do esquema. Aí, deixou de ser gestão esportiva com foco em resultados e passou a ser gestão com foco na mera alavancagem de receitas (independente de resultados apresentados, porque aí o "esquema" perde a vergonha).
Deu no que deu - mas a prática não é de hoje, nem criação ou exclusividade do Nuzman...
P.S.: Não quero dizer - com meu post - que sua atuação como dirigente esportivo seja justificável ou até mesmo perdoável (a sua permissividade/estímulo a malfeitos é evidente, tanto quanto o seu ganho pessoal indevido). Porém, não é inédita ou única, sendo apenas uma reprodução de um padrão de atuação tolerado por um traço cultural que nos remete à tão comentada e informal Lei Gérson ("levar vantagem em tudo, certo?"). Só vou citar um exemplo da disseminação dessa visão gerencial e empresarial do esporte que ultrapassou o vôlei: a gestão Parmalat no Palmeiras (de 1993 a meados de 1997), com ninguém menos do que José Carlos Brunoro (ex-técnico de vôlei da Pirelli) no comando. Hoje ele dirige o Pão de Açúcar E.C. na 2ª divisão, com foco só na formação de talentos para venda e lucro ao exterior.
waldyr.kopezkyNo Advivo
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Pede pra sair, Nuzman!
O Brasil, mais uma vez, vai micar. Já virou uma tradição – ou, numa expressão cara ao meu irmão Paulo, o triunfo da esperança. Olimpíadas têm, no mínimo, uma função importante: inspirar as pessoas a saírem do sofá e praticar esportes. Por que o país não evolui na competiçao? Bem, há muitas explicações. A principal delas nós sabemos: o Brasil não tem uma estrutura que proporcione o surgimento de atletas de outra modalidade que não seja o futebol. Além disso, não há renovação: Cesar Cielo, Fabiana Murer, Bernardinho, Marta, Daiane, Diego Hipólito etc etc. Nada de novo, a não ser na turma do judô e as meninas do handebol.
Mas há um nome que é o mais velho deles e deveria responder por esse desempenho. Aos 70 anos, Carlos Arthur Nuzman está há 17 no Comitê Olímpico Brasileiro, sem trazer resultados expressivos. O que explica esse apego? Em 2000, ele reclamou que não tinha verba e que, se tivesse, transformaria o país em potência olímpica. Bem, contou com 2 bilhões de reais, investidos na preparação para Londres. E aí?
Sim, ele teve um papel importante no fato do Rio de Janeiro ter vencido a disputa para sediar os Jogos de 2016. Mas o que isso faz dele? Organizador de festas? Em abril, ele foi reeleito até 2016. Foi o único a registrar uma chapa. Nuzman guarda alguma semelhança com Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF. Ambos são especialistas em se perpetuar nos cargos. Teixeira, porém, tem duas vantagens: 1; ele saiu; 2. apesar de tudo, ele entregou resultados importantes durante seu reinado.
Lorde Moynihan: espantado com o baixo número de atletas ingleses vindos de escolas públicas |
Nos Estados Unidos, o presidente do Comitê Olímpico é Stephanie Streeter, eleita em março de 2009. Seu colega chinês, Liu Peng, assumiu em 2008. O presidente do British Olympic Association, BOA, Lorde Moynihan, está lá desde 2005. Seu mandato expira este ano. A Grã-Bretanha deve terminar em terceiro lugar no quadro de medalhas. O Brasil provavelmente estacionará no 25º, atrás de Cazaquistão, Bielorússia, Coreia do Norte, entre outros.
Na semana passada, Moynihan declarou ser inaceitável a desproporção entre medalhistas oriundos de escolas públicas e privadas. Apenas 7% dos ingleses frequentam escolas particulares – mas metade das medalhas ganhas em Pequim pertencia a alunos dessas instituições. Até agora, o chamado Team GB faturou 14 ouros. Quatro são de gente de escolas privadas e um quinto é de um atleta que estudou na Alemanha. ”Nós teremos falhado se, em 2016, olharmos para trás e não acharmos que transformamos nossa paisagem esportiva. Os Jogos de 2012 têm de causar arrepios em cada uma das nossas crianças”.
Nuzman tem visto, provavelmente, as boas práticas em outros lugares. Há várias lições a aprender. Mas, talvez, a principal delas é a que ele jamais admitirá: quem perde há tanto tempo precisa sair. Pede pra sair, Nuzman.
Paulo NogueiraNo Diário do Centro do Mundo
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