O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, reafirmou nesta sexta-feira (3), durante julgamento do chamado mensalão, a existência do esquema de distribuição de dinheiro que, segundo ele, foi o “mais atrevido e escandaloso caso de corrupção e desvio de dinheiro público” da política nacional. Para justificar a falta de provas contra José Dirceu, disse que o crime organizado possui métodos sofisticados de ação e o ex-ministro seria o mentor intelectual do grupo.
“O autor intelectual age entre quatro paredes, em conversas restritas com os cúmplices. Quase sempre não fala ao telefone, não manda mensagens virtuais e não movimenta contas bancárias", declarou.
No entanto, concordou que há provas pouco robustas contra quem chamou de “principal figura de tudo que apuramos” e “o grande protagonista” do mensalão, mas atribuiu o fato ao papel de liderança que Dirceu exercia. “Como quase sempre ocorre com chefes de quadrilha, o acusado não aparece nos atos de execução do esquema”, justificou.
Na primeira metade de sua sustentação, no Supremo Tribunal Federal (STF), Gurgel citou o papel de cada integrante do esquema, sempre dando destaque à atuação do ex-ministro chefe da Casa Civil José Dirceu, que, de acordo com o procurador, era o "mentor" da ação.
Acusou Dirceu de usar laranjas e não se relacionar com os membros secundários da quadrilha. Por isso, segundo ele, não deixa rastros de sua ação.
"Por isso, as provas contra Dirceu não viriam de perícias, mas da prova testemunhal que teriam, segundo Gurgel, a mesma capacidade probatória das demais. “Essas provas [testemunhos] são contundentes na atuação de Dirceu como líder criminoso do grupo”, completou Gurgel.
O procurador citou depoimentos do publicitário Marcos Valério, que disse na ocasião que Dirceu sempre soube das ações e que garantiria os empréstimos dos acordos. Nada aconteceria sem a aprovação de Dirceu, incluindo reuniões com parlamentares sobre o suposto esquema comandadas por José Genoino e Delúbio Soares.
Gurgel apontou, ainda, que depoimentos de Emerson Palmieri e Valdemar da Costa Neto comprovam que as reuniões para suposta compra de apoio do PP ocorriam na residência de Dirceu: “A ascendência dele como chefe do grupo foi cabalmente provada, pois ele tinha conhecimento dos acordos mediante ao pagamento e participou das negociações com o PP diretamente.”
Sobre a suposta compra de apoio do PTB, afirmou que Genoino era o representante nas negociações com Roberto Jefferson. Jose Dirceu homologava, no entanto, todos os acordos por telefone.
A montagem do esquema, segundo Gurgel
Segundo o procurador, o mensalão foi montado em 2003, logo no início do primeiro mandato do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para cooptar apoio político. Gurgel disse que a base do esquema constituía na captação de verbas por parte do publicitário Marcos Valério, a mando da cúpula do PT, para distribuição entre parlamentares da base aliada.
O procurador tem direito a cinco horas para falar sobre os 38 réus, uma média de oito minutos para cada um. Na primeira parte de sua apresentação, ele optou por dar destaque a José Dirceu, primeiro da sequência acusatória, a quem dedicou quase 30 minutos de sua fala.
Ainda no núcleo político (os réus foram divididos em três núcleos: político, operacional e financeiro), Gurgel citou o ex-presidente do PT José Genoíno, o ex-secretário-geral do partido Silvio Pereira e o ex-tesoureiro da legenda Delúbio Soares, além dos parlamentares dos partidos beneficiados pelo esquema – PL (hoje PR), PTB e PP.
Do núcleo publicitário-financeiro, o destaque foi para Marcos Valério. “Dirceu foi o mentor do esquema enquanto Marcos Valério foi seu executor”, sintetizou Gurgel. O interesse desse núcleo, segundo o procurador, era se aproximar do governo a fim de obter vantagens em contratos publicitários e desvio de verba em benefício próprio.
Ainda segundo Gurgel, o núcleo financeiro – formado por dirigentes do Banco Rural à época – aceitou entrar no esquema para obter vantagens em transações envolvendo instituições financeiras. Segundo a denúncia, o grupo forjou empréstimos que não ocorreram na realidade, dissimulando a origem ilegal da verba. O procurador lembrou que representantes do Banco BMG não estão na ação penal do STF porque o caso está sendo tratado em outro processo, que tramita na Justiça de primeiro grau.
Na segunda fase da exposição, Gurgel passou a tratar dos crimes imputados a cada um dos réus e as provas que sustentam as acusações. Os crimes citados na denúncia – variáveis para cada réu – são formação de quadrilha (um a três anos de prisão), corrupção ativa e passiva (dois a 12 anos cada), peculato (dois a 12 anos), evasão de divisas (dois a seis anos), gestão fraudulenta de instituição financeira (três a 12 anos) e lavagem de dinheiro (três a dez anos).
No Vermelho
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