Na reportagem da Istoé de 14 de novembro, intitulada "Como funciona o serviço secreto brasileiro", vemos mais uma vez acontecer, em meio a uma série de imprecisões factuais, a recorrente "mistura" entre prerrogativas da Abin, em sua condição de órgão central da Inteligência de Estado, e aquelas de seus servidores. O jornalista trata destes como se não fossem, antes de tudo, trabalhadores iguais a todos os demais neste país, e lhes nega direitos políticos e sociais inalienáveis.
Na perspectiva da Aofi, Associação Nacional de Oficiais de Inteligência, esse talvez seja o erro mais grosseiro cometido pelo jornalista, pois é de ordem moral. Os demais, resultantes de seu desconhecimento dos meandros da atividade de Inteligência no país, como, por exemplo, a versão criada sobre o despacho do general José Elito Siqueira junto à Presidenta Dilma são, no melhor dos casos, má ficção.
A idéia, entretanto, de o jornalista aceitar de modo tácito que servidores, pelo simples fato de serem da Abin, não possam participar em lutas salariais e usufruir de direitos constitucionalmente reconhecidos, e, pelo mesmo motivo, não passam de infiltrados nos movimentos grevistas, é tão nefasto quanto aceitar que seja correto o acompanhamento pela inteligência de Estado desses movimentos, legitimados pela sociedade e pela lei. A condenação que já manifestamos, na Aofi, deste tipo de prática, no entanto, ironicamente, não parece capaz de suspender em momentos como este a desconfiança histórica que paira sobre a atividade de Inteligência no País. Mas, isso inicia outra discussão: a da ineficiência do próprio Estado, em tempos democráticos, em reestruturar a Inteligência.
Conforme descrita na reportagem, a Abin é ligada à estrutura do Gabinete de Segurança Institucional – GSI – que determina a missão da Agência em rigorosa cadeia hierárquica em cujo ápice, de direito, está a própria Presidenta da Nação. Assim, antes da perigosa assunção de que os funcionários da Abin não têm direito a pleitos trabalhistas, talvez deva-se levantar para a sociedade a discussão sobre o papel da Inteligência de Estado no País e sobre como deve ser estruturada para melhor servir à instância máxima de decisão.
Vale ressaltar que o surgimento de uma associação como a Aofi, no seu contexto, trouxe consigo dificuldades típicas da atividade de Inteligência, por vezes difíceis de conduzir em paralelo à participação política exigida pela ação associativa. Com semelhantes paradoxos, a Aofi tornou-se, em várias ocasiões, alvo fácil para insinuações maldosas como as feitas pela reportagem. Apesar de tudo, o risco já era conscientemente assumido pela categoria desde o início e nunca foi visto como motivo de fraqueza.
A Aofi, apesar de não representar todos os servidores da Abin – apenas os Oficiais de Inteligência –, abraçou desde sua criação todas as bandeiras que achou pertinentes não apenas à impulsão da qualidade e reconhecimento profissionais da Carreira, mas também à promoção da qualidade da atividade de Inteligência no Brasil como um todo. Por compreender a necessidade de reestruturação, a Aofi inaugurou sua trajetória com carta dirigida à Presidenta recém-empossada, demandando a desvinculação da Abin do comando militar protagonizado pelo GSI, fato que até hoje não ocorreu.
Assim, quando o jornalista assinala a participação dúbia de "entidades sindicais da agência" nos movimentos grevistas, fecha os olhos para os esforços da Aofi, uma dessas entidades, já há tempos à frente da luta pela transformação da Abin em órgão independente de interesses políticos e ligado diretamente a comando civil, como é o caso nas democracias modernas.
Vale ainda lembrar que, a despeito dos vícios, há também virtudes. A Abin, como parte da realidade democrática, há mais de quinze anos tem seus servidores admitidos mediante rigorosos concursos públicos, abertos a toda a sociedade. Seus profissionais, assim como quaisquer outros, buscam realização no trabalho e almejam influir positivamente nas perspectivas do País. Não há, portanto, expediente mais cruel a exigir-lhes do que estender o silêncio demandado pela profissão a seus direitos como cidadãos e a seus anseios de realização pessoal.
Para todos os efeitos, e apesar do ultraje mais uma vez despejado sobre esta categoria profissional, a Aofi reafirma sua disposição ao debate e aproveita para demandar que a direção da Abin se manifeste em relação ao conteúdo veiculado pela Istoé. Devemos lembrar que as melhorias que queremos para a Inteligência no Brasil não virão sem o debate e a superação dos contratempos.
Diretoria de Comunicação - Aofi
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