A incontestável capacidade de mobilização revelada no episódio paulistano indica, ademais, o nível de organização alcançado pela direita que já não esconde suas ligações internacionais, particularmente com a direita dos EUA em plena ascensão sob o protagonismo de Trump. A concentração do último dia 25 também pôs a nu o volume de recursos políticos, logísticos e financeiros que a direita pode mobilizar, impondo às esquerdas brasileiras, de há muito ausentes das ruas, uma necessária revisão de seu projeto político (qual é mesmo, hoje?) e uma reavaliação do papel até aqui desempenhado.
Não devemos subestimar o desafio político da direita, mormente quando estamos em face de uma articulação internacional que já viceja em nosso continente, com a derruição da democracia e as promessas de centro-esquerda. A ascensão de Javier Milei, na Argentina, é a mais recente advertência.
Em qualquer hipótese, o quadro visto do alto recomenda às esquerdas brasileiras )pôr as barbas de molho. Porque o que está em jogo é algo mais que o governo do presidente Lula.
No que nos diz respeito, o ponto de partida é considerar o fato objetivo, pesar sua importância real, esmiuçá-lo, compreendê-lo, e, afinal, construir a alternativa do enfrentamento necessário e inevitável, embora até aqui recusado. O largo campo das esquerdas brasileiras está sendo chamado a rever seu papel presente, de continuado recuo, diante do desafio organizacional e do proselitismo da direita, que mais avança na medida em que as forças progressistas renunciam à batalha ideológica. Essa renúncia, que vem de longe, é o ponto nodal do desafio que nos propõe o processo social.
O protofascismo não é fenômeno sem causa, nem hoje nem nos idos dos anos 1930, anos do fastígio do integralismo, de suas paradas e manifestações populares, até a tentativa de golpe de 1938, quando era, efetivamente, um movimento de massas.
No 8 de janeiro, em Brasília, as mesmas forças ideológicas intentaram o golpe por dentro do poder. Ao contrário de Getúlio Vargas em 1937, que soubera escolher seu estado-maior, a direita fracassou no projeto golpista de 2023, apesar da fragilidade do nosso governo, a ausência de mobilização popular, e a imobilidade dos partidos, que só vieram a se dar conta da real ameaça da intentona quando ela estava debelada, e o governo Lula, ainda assustado, saía de seu recesso tático. Como é sabido, nosso ministro da defesa, à hora dos saques, almoçava em um restaurante em Brasília, enquanto o general. Gonçalves Dias, ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional, perambulava, sem rumo, tropeçando nos escombros do palácio do planalto, que não soubera defender.
Sobrevive uma questão central: a ausência das esquerdas, que ficou evidente em todo o processo do 8 de janeiro, como se lhes tivesse sido dado o papel de simples plateia em momento gravíssimo da democracia. Trata-se de consequência do vazio cavado pela renúncia à ação militante, refletindo erros estratégicos das direções partidárias, a partir principalmente das eleições de 2002. Essas omissões explicam o terreno perdido na política, e pouco é o que podemos cobrar do governo Lula. O aggiustamento com setores da direita dita “civilizada”, se proporciona governabilidade, necessária nas circunstancias, limita sua liberdade de ação política – o que pode se mostrar fatal ali adiante.
A crônica dos últimos 11 anos é o fruto de longo processo social, que registra, entre seus muitos intervenientes, a recusa da esquerda de travar a batalha ideológica, de que resultou sua renúncia à organização popular e o fim da militância organizada; por fim, o que chamamos de abandono do chão de fábrica. Na ausência do discurso de esquerda, ou meramente progressista, cresceu a influência da direita sobre o pensamento e os preconceitos da classe-média, e, talvez principalmente, sobre as grandes massas que até há pouco se conheciam como redutos progressistas. .
A multidão levada para a avenida paulista, no último dia 25/02, atendia a evidentes necessidades políticas do ex-presidente, ao tempo em que sinalizava o grau de resistência, organização e mobilização a que chegaram as forças conservadoras e reacionárias brasileiras, mobilizadas pelo discurso da extrema-direita. Investigado em um sem-número de inquéritos policiais, já com a inelegibilidade decretada, Jair Bolsonaro precisava dar uma demonstração de força política a seus julgadores. E este objetivo foi claramente alcançado.
Quais serão os efeitos em face dos inumeráveis inquéritos a que responde por crimes políticos (tentativa de golpe de Estado) e comuns (peculato e apropriação indébita de bens da União), só a história em movimento nos dirá. Há, porém, um fato novo a registrar. Desta feita, no contrapelo de nossa tradição política, a ameaça judicial não se volta, tão só, contra meia dúzia de bagrinhos, pois as garras judiciais miram também poderosos generais que dividiam o Planalto e as maquinações golpistas com o ex-presidente. E Bolsonaro sabe que se está fechando o círculo policial-judicial que pode levá-lo, até, à prisão.
É irrelevante discutir se eram 100 mil ou 70 mil pessoas na avenida. Relevante é que ficou à mostra que a extrema-direita age sob comando unificado, desfruta de capacidade organizativa e dispõe de base financeira para operar. A extrema-direita falou no dia 25. Esperemos o que nos dirão o governo e as organizações de esquerda.
O domingo na Paulista deixou claro que a peçonha está viva, bem cevada e pronta para picar, uma vez mais, os aprendizes da política real. Muitos sucumbem por ignorar o adversário; são fortes candidatos à derrota, mesmo antes de a disputa ser travada. E há os que, por mecanismo de defesa, insistem em desqualificar o adversário e sua letalidade política. O que não é visto é dado como inexistente. Nosso ponto de partida é o reconhecimento de que a direita mobilizou sua base e, a partir de São Paulo, disse à nação que, ademais de organizada, reconhece a liderança do ex-capitão. Assim, permanece em ofensiva política, de prontidão para o confronto.
De outra parte, enquanto o reacionarismo toma as ruas (após controlar o Congresso), a esquerda, silente e recolhida, afasta-se da arena e deposita suas expectativas de enfrentamento da extrema-direita nas mãos da institucionalidade, de quem passa a depender: espera que a polícia federal, o poder judiciário, o ministério público enfrentem seus adversários para então entrar na liça. Trata-se de erro político sob todos os ângulos observáveis, pois significa a renúncia à política, e um desserviço à educação das massas.
A extrema-direita, em si um arcaísmo, é, entretanto, a um só tempo, velha e moderna, e assim se tem revelado, em seu proselitismo, no absoluto controle dos meios de comunicação, desde sempre aparelhos ideológicos da classe dominante.
Velha como pensamento, a direita é igualmente moderna, no que diz respeito à manipulação das ferramentas sociais. Enquanto a esquerda parecia assustada com os novos meios de comunicação, a direita os dominou no processo eleitoral de 2022 e continua utilizando-os, inclusive logrando utilizar a “mídia alternativa” e seus simpatizantes como correia de transmissão.
Na contramão dos fatos, nosso governo investe e muito nos veículos tradicionais da comunicação, minguantes e de eficiência contestada, enquanto deixa ao relento os chamados meios eletrônicos, a chamada mídia eletrônica, e a chamada mídia alternativa, por simplesmente não ter, ainda!, definida, sua política de comunicação, de que igualmente carecem os partidos de nosso campo.
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No Gueto de Gaza - Após o Massacre da Farinha, ocorrido ontem, quando forças israelenses, completando o rol dos crimes de guerra, alvejaram palestinos que faziam fila para receber mantimentos, aguarda-se um pedido de desculpas do boquirroto presidente do Senado ao presidente Lula.
Jornalismo sabujo - Enquanto o genocídio se desenrola sob as barbas de uma "comunidade internacional" inerte e cúmplice, os grandes grupos de comunicação brasileiros, que já se prestavam a contribuir com o esforço de guerra da OTAN na Ucrânia, agora disputam entre si pelo troféu da cobertura mais canalha do holocausto palestino.
Marielle Franco – Afinal, quando saberemos quem mandou matar a vereadora do PSOL?
Mailson – Uma das jaboticabas brasileiras é o culto ao fracasso. Uma ilustração é o prestígio do Sr. Mailson da Nobrega, presença quase diária na imprensa quando o tema é economia. Quando esse senhor assumiu o ministério da Fazenda, no último ano do governo Sarney, a inflação anual girava em torno 366%. Quando nos deixou, no final de 2002, a inflação alcançara a astronômica marca de 1.782%.
A sombra da história – O presidente Lula confunde o recurso à informação histórica com remoer o passado. Parece não entender que conhecer o passado é o melhor método para evitar a repetição dos erros. A sociedade tem o direito de ver apurados os crimes cometidos pela ditadura militar. O Estado não pode fugir a esse dever, sobretudo em um governo de centro-esquerda.
A escola de sargentos – Nosso governo anuncia recursos para uma gigantesca escola de sargentos, no Nordeste, certamente pensando em agradar à caserna, mas ignorando que ela retoma a velha preocupação do Pentágono com o “Nordeste vermelho”, que, para os norte-americanos, é a região brasileira destinada à insurreição comunista. Como ressalta o professor Manuel Domingos Neto, essa decisão reforça a opção da caserna por combater brasileiros em detrimento da capacidade aeronaval, mais adequada à guerra contra o estrangeiro.
Por: Roberto Amaral.
Com a colaboração de Pedro Amaral.