"Nossas leitoras não querem saber disso." Essa foi a mensagem que, em 2015, uma ex-repórter de revistas femininas contou receber de seus editores sempre que sugeria uma pauta sobre assédio, violência doméstica ou qualquer coisa que fugisse de dicas de sexo, moda ou beleza. A mensagem é direta: os problemas das mulheres não interessam a ninguém – nem mesmo às próprias mulheres.
Quando me tornei repórter do Intercept Brasil, confirmei algo que já sabia: esses editores são estúpidos. Desde que cheguei aqui, meu foco tem sido as questões que atingem as mulheres e, acreditem, isso interessa demais aos leitores. O que o TIB me mostrou é que é possível fazer jornalismo com liberdade para pautar temas femininos com convicção, sem me omitir ou usar meias palavras.
Em pouco menos de um ano, escrevi sobre diversas formas de violência a que estamos sujeitas, a (falta de) autonomia sobre nossos corpos e a busca por libertação em uma sociedade tão machista quanto a que vivemos. Recentemente fiz um levantamento exclusivo e inédito sobre casos de estupro e abusos em hospitais. Em apenas dez estados brasileiros foi possível mapear mais de 3 mil casos.
Escrevo aqui do jeito que eu quero, usando a linguagem que eu quero. E, olha só, todos os textos foram muito lidos. Porque o tema é relevante e existem poucos lugares que estão dispostos a cobri-lo.
Aqui não só fui sempre incentivada a correr atrás das pautas feministas que tanto me interessam, como a apontar questões problemáticas em premissas, títulos ou textos de colegas e a expressar qualquer discordância, mesmo publicamente. Foi o que fiz em meu texto sobre feminismo de mercado, uma resposta ao artigo sobre feminejo das colegas Amanda Audi e Nayara Felizardo. Aqui a treta é livre!
Combatividade e sensibilidade são duas máximas que guiam nossa redação e todo meu processo de apuração. Outra premissa é procurar usar dados sempre que possível para mostrar a dimensão do problema em questão. Os números guiaram minha reportagem sobre o aumento misterioso das laqueaduras de urgência no SUS e foram o ponto de partida para investigarmos os estupros em transportes por aplicativo.
Mas não é o amplo espaço que tenho no Intercept para desbravar os problemas das mulheres que mostra que os editores daquela ex-repórter estavam enganados. É o fato de que leitoras e leitores querem sim conhecer essas realidades. Minha reportagem sobre médicos que cortam e costuram vaginas no parto para deixar as mulheres "aperta dinhas" para seus maridos foi um tremendo sucesso. O que a princípio parecia uma reportagem de nicho se tornou um dos textos mais lidos da história do Intercept Brasil e abriu a porta para que dezenas de mulheres compartilhem suas histórias de violência obstétrica nas redes sociais sempre que o texto vem à tona. É para isso que fazemos jornalismo.
Essa história das mutilações após o parto é um bom exemplo de como somos estimulados a fazer um jornalismo convicto e apaixonado no TIB. As mulheres sobre quem escrevo são seres completos, donas de suas histórias, e são apresentadas dessa forma. Meus editores não me cobram pressionar nenhuma delas se percebo que não estão prontas para falar. Nós sabemos que, para algumas mulheres, dar seu relato é um ato de libertação, para outras, é uma revitimização. E uma reportagem que pretende defender as causas das mulheres nunca deve contribuir para o sofrimento das sobreviventes.
Poder escrever e discutir temas tão caros às mulheres cercada por profissionais que entendem de verdade sua importância e com tempo para mergulhar em cada assunto é um privilégio. Em muitas redações Brasil afora, a realidade é bem diferente disso. E eu tenho ciência de que o Intercept só consegue fazer a ssim porque foi criado para funcionar de maneira absolutamente independente. O nosso compromisso aqui é direto com nosso leitores, sem intermediários, sem filtros e sem medo.
Se você acredita nesses valores, por favor, junte-se a nós e faça parte do Intercept. Nossa missão e independência dependem de você.
Veja artigo completo aqui no The Intercept.
Por Bruna de Lara.