“Destaco com preocupação o impacto dessas narrativas na credibilidade das instituições como o Exército, FAB, PRF e Ministérios, que são cruciais na resposta a emergências. A propagação de falsidades pode diminuir a confiança da população nas capacidades de resposta do Estado, prejudicando os esforços de evacuação e resgate em momentos críticos. É fundamental que ações sejam tomadas para proteger a integridade e a eficácia das nossas instituições frente a tais crises.”
“ Transformar medo em ódio é a alquimia que praticam explorando a dor que se espraia pelo país solidário com 1,5 milhão de pessoas diretamente atingidas pelas cheias em 428 municípios, entre elas mais de 170 mil desabrigados, quase 400 feridos, pelo menos 107 mortos e 136 desaparecidos. Em vez de ajudar, atrapalham.
Alguns nomes reluzem no horizonte da extrema direita brasileira, como Eduardo Bolsonaro, que mesclou posts de sua caravana golpista ao Congresso americano a falsas informações como esta, postada em seu perfil do Twitter no dia 6 de maio: “Sério mesmo que tem corpo de bebê boiando e a autoridade exigindo documentação para o povo pilotar bote de resgate? Alguém me diz que isso não é verdade?”. Não é, deputado, como você sabe. E certamente a informação falsa pode afastar outras pessoas interessadas em ajudar no resgate.
Mais profusos e ainda mais perniciosos foram os posts do influenciador Pablo Marçal, outro bolsonarista de carteirinha, que distorceu informações sobre atuação das instituições no resgate de mais de 67 mil pessoas, hoje abrigadas, e mentiu que caminhões estavam sendo barrados pela Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul, impedindo a distribuição de comida (o que já foi desmentido oficialmente).
Enquanto isso, mostrando claramente a que propósito servia sua campanha desinformativa, o coach/influenciador postava que um empresário bolsonarista – que participou ativamente do movimento golpista de bloqueio das estradas depois da eleição de Lula – teria cedido mais helicópteros do que a Força Aérea Brasileira para o resgate (na realidade, foram apenas dois, enquanto havia nove da FAB).
Como notou a Advocacia-Geral da União (AGU), que apresentou na quarta-feira uma ação contra Marçal, que tem mais de 8 milhões de seguidores no Instagram: “Não se questiona, portanto, a capilaridade nociva de que se reveste um vídeo com conteúdo de desinformação, especialmente se produzido por alguém a quem a sociedade reputa possuir uma maior confiabilidade, em razão da popularidade que possui”.
Entre os responsáveis pela tragédia no Rio Grande do Sul estão, sim, governantes como Eduardo Leite, do PSDB, que não tirou do papel o Plano de Prevenção de Desastres, de 2017, como revelou reportagem da AgênciaPública do ano passado, e mutilou a legislação ambiental do estado em 2019, e o prefeito bolsonarista Sebastião Melo (MDB), que não investiu um centavo na prevenção de enchentes do ano passado.
Também faz parte do problema o Congresso Nacional, onde tramitam 25 projetos de lei (PL) e três propostas de emenda à Constituição (PEC) que, se aprovados, de acordo com o Observatório do Clima, trariam danos irreversíveis aos ecossistemas brasileiros, ao clima e aos povos tradicionais – “pautas” da extrema direita, aliás. Como mostrou reportagem da Pública desta terça-feira, o PL mais danoso para o país – em especial para o Rio Grande do Sul, onde já existe legislação estadual nesse sentido – é o que institui o autolicenciamento ambiental, quase automático, sem nenhuma regulação dos órgãos ambientais.
O negacionismo diante da emergência climática e a tentativa de retirar todo e qualquer obstáculo ao desmatamento e à exploração de recursos naturais, bandeiras da direita, são os grandes responsáveis pela maior catástrofe climática do país, que infelizmente tende a se repetir, como explicou Giovana Girardi em sua coluna.
É por isso que seus representantes, como o vice-prefeito de Porto Alegre, que postou foto usando o bonezinho do negacionista Brasil Paralelo no meio da tragédia, precisam mentir para criticar os governos adversários sem apontar as verdadeiras razões para a catástrofe.