Carta do pai de Edward Snowden e seu advogado ao presidente Obama
Instamos o senhor a ordenar que o Promotor Geral abandone a queixa criminal contra Edward, e apoie a legislação para remediar os abusos de vigilância da NSA que ele revelou
29/07/2013
Caro Ilmo. Sr. Presidente:
O senhor esta extremamente ciente de que a história da liberdade é a história da desobediência civil à leis ou práticas injustas. Como Edmund Burke pregou, “O triunfo do mal despende unicamente de que os homens bons não façam nada.”
A desobediência civil não é a primeira, mas a a última opção. Henry David Thoreau escreveu com profunda resistência sobre a Desobediência Civil: “Se a injustiça é parte da fricção necessária da máquina do governo, que seja, deixe que passe: possivelmente ela irá se desgastar suavemente e certamente a máquina irá se desgastar. Se a injustiça tem uma fonte, ou uma polia, ou uma corda, ou uma manivela exclusiva, talvez então você deva considerar se o remédio será pior do que o mal; mas se for de tal natureza que requeira que você seja o agente da injustiça contra um outro, então, eu digo, viole a lei. Deixe a sua vida ser a contra-fricção que detém a máquina.”
A filosofia moral de Thoreau encontrou expressão durante os tribunais de Nuremburgo nos quais “cumprir ordens” foi rejeitado como uma argumento de defesa. Na verdade, a lei militar exige desobediência a leis claramente ilegais.
Um capítulo negro da história da Segunda Guerra Mundial na América não teria sido escrito se o então Promotor Geral dos Estados Unidos tivesse se demitido ao invés de participar dos campos de concentração racistas que aprisionaram 120.000 cidadãos Americanos Japoneses e estrangeiros residentes.
A desobediência civil do Ato do Escravo Fugitivo e as leis de Jim Crow provocaram o fim da escravidão e a revolução moderna por direitos civis.
Nós submetemos que as revelações de Edward J. Snowden sobre o arrastão de vigilância dos Americanos sob o § 215 do Ato Patriota, do § 702 do Ato de Vigilância da Inteligência Externa, ou que tenham sido sancionados pela honrosa filosofia moral de Thoreau e justificações pela desobediência civil. Desde 2005, o Sr Snowden trabalhava para a comunidade de inteligência. Ele se encontrou numa situação de cumplicidade com um segredo, espionando indiscriminadamente milhões de cidadãos inocentes o que é contrário ao espírito, senão à carta da Primeira e Quarta Emendas e a transparencia indispensáveis ao auto-governo. Membros do Congresso incumbidos com o descuido se mantiveram silenciosos ou Delficos. O Sr Snowden foi confrontado com a escolha entre a o dever cívico e a passividade. Ele pode ter recordado a injunção de Martin Luther King, Jr.: “Ele que passivamente aceita o mal esta tão envolvido quanto aquele que ajuda a perpetrá-lo.” O Sr Snowden escolheu o seu dever. A sua administração vingativamente respondeu com uma queixa criminal alegando violações do Ato de Espionagem.
Desde o início de sua administração, o sigilo dos programas de vigilância Orwelianos da Agencia de Segurança Nacional haviam frustrado a discussão nacional sobre a sua legalidade, necessidade e moralidade. Esse sigilo (combinado com a impraticabilidade congressional) provocou as revelações de Edward, que causou um debate nacional que o senhor tardia e cinicamente aderiu. A legislação foi introduzida no Parlamento e no Senado para limitar ou encerrar os programas da NSA [sigla em inglês da Agencia de Segurança Nacional], e o povo Americano esta sendo educado sobre as escolhas de políticas públicas disponíveis. A grande maioria hoje verbaliza suas preocupações sobre a vigilância de arrastão dos Americanos que foi exposta por Edward e que o senhor ocultou. Nos parece confuso que o senhor esteja processando Edward por ter conseguido o que o senhor disse ser urgentemente necessário!
O direito a não ser perturbado pela bisbilhotagem do governo – o direito mais valioso entre as pessoas civilizadas – é o pilar da liberdade, Robert Jackson, da Corte Suprema de Justiça, serviu como Procurador Chefe em Nuremburgo. Ele aprendeu as dinâmicas do Terceiro Reich que destruíram uma sociedade livre, e que oferecem lições para os Estados Unidos hoje.
Escrevendo em Brinegar v. Estados Unidos, Jackson elaborou:
A Quarta Emenda afirma: ” O direito à segurança pessoal dos indivíduos, de suas casas, papéis, e efeitos, contra buscas não justificadas e embargos, não devem ser violados, e nenhum mandato pode ser emitido sem uma causa provável, apoiados por Juramento ou afirmação, e descrevendo particularmente o local a ser revistado, as pessoas e coisas a serem apreendidas.”
Esses, eu protesto, não são meros direitos secundários mas pertencem ao catálogo das liberdades indispensáveis. Entre as privações de direitos, nenhuma é tão eficiente em intimidar a população, esmagando o espirito do indivíduo e colocando o terror em cada coração. A busca e apreensão descontrolada é uma das primeiras e mais eficientes armas no arsenal de todo governo arbitrário. Tudo que um individuo necessita é ter convivido e trabalhado entre pessoas dotadas de muitas qualidades admiráveis mas privadas desses direitos para saber que a personalidade humana deteriora e a dignidade e auto-confiança desaparecem onde lares, pessoas e possessões são sujeitas a qualquer momento à buscas e apreenções não anunciadas pela polícia.
Nós, portanto, acreditamos que o zelo com que a sua administração esta punindo o Sr. Snowden, por cumprir com a sua responsabilidade cívica, para proteger os processos democráticos e garantir a liberdade, é injusto e indefensável.
Estamos também chocados com o desdenho da sua administração pelo direito, as leis, a justiça e presunção da Inocência com relação a Edward.
No dia 27 de junho de 2013, o Sr. Fein escreveu uma carta ao Promotor Geral afirmando que o pai de Edward estava substancialmente convencido de que ele iria retornar aos Estados Unidos para enfrentar as acusações que foram feitas contra ele, se houvessem três garantias legais fundamentais. A carta não era um ultimato, mas um convite a discussão dos imperativos de um julgamento justo. O Promotor Geral foi desdenhado na abertura com um silencio estudado.
Nós, portanto, suspeitamos que a sua administração deseja evitar um julgamento devido á dúvidas constitucionais sobre as aplicações do Ato de Espionagem nessas circunstancias, e às obrigações de revelar ao publico informações classificadas potencialmente embaraçosas sob o Ato dos Procedimentos de Informação Classificada.
A sua decisão de forçar uma companhia aérea civil, que transportava o presidente boliviano Evo Morales, a aterrizar na esperança de sequestrar Edward, também não inspira a confiança de que o senhor esta comprometido em oferecer a ele um julgamento justo. Nem tampouco a sua recusa em lembrar o povo Americano e os eminentes Democratas e Republicanos no Parlamento e no Senado como também o Porta Voz da Casa John Boehner, a Congressista Nancy Pelosi, a Congressista Michele Bachmann, e a Senadora Dianne Feinstein que Edward desfruta da presunção de inocência. Ele não deveria ser condenado antes do julgamento. E ainda assim o porta voz Boehner denunciou Edward como“traidor.”
A Sra Pelosi pontificou que Edward “violou a lei quando liberou aqueles documentos.” A Sra Bachmann pronunciou que, “Isso não foi um ato de um patriota; isso foi uma ato de um traidor.” E a Sra Feinstein decretou que Edward era culpado de “traição” que é definido no Artigo III da Constituição como uma “declaração de guerra” aos Estados Unidos, “ou a aderir aos seus inimigos, dando a eles auxílio e conforto.”
O senhor permitiu essas quatro afrontas ao devido curso do processo, passarem sem repreensão, enquanto o senhor menosprezou Edward como um “hacker”, espalhando difamações sobre as suas motivações e talentos. O senhor esqueceu o gospel da Corte Suprema em Berger v. Estados Unidos em que os interesses do governo ” em um processo criminal não são vencer o caso, mas que a justiça seja feita?”
Nós também achamos repreensível a sua administração processar Edward por Ato de Espionagem, pelas suas revelações, sem distinção daqueles que rotineiramente entram no domínio publico através dos seus indicados do alto escalão, com o objetivo de adquirir vantagens políticas partidárias. Detalhes classificados dos protocolos do seu predador drone, por exemplo, foram compartilhados com o New York Times impunimente, para reforçar as suas credenciais de segurança nacional. A justiça, observou Jackson na Railway Express Agency, Inc. v. New York: “Os autores da Constituição sabiam, e nós não deveríamos esquecer hoje, que não há maior garantia prática e efetiva contra governos arbitrários e insensatos do que exigir que os princípios da lei que oficiais fossem impor sobre a minoria, devam ser impostos em geral.”
Sob a luz das circunstâncias amplificadas acima, nós instamos o senhor a ordenar que o Promotor Geral abandone a queixa criminal contra Edward, e apoie a legislação para remediar os abusos de vigilância da NSA que ele revelou. Tais diretivas presidenciais iriam marcar o seu momento constitucional e moral mais importante.
Atenciosamente,
Bruce Fein, conselheiro de Lon Snowden
e Lon Snowden
Tradução: Ana Amorim
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