Por Laura Lyrio para o blog do Levante Popular da Juventude DF
Na sociedade em que vivemos, as relações humanas estão mediadas pela propriedade privada dos meios de produção e da terra, estabelecendo uma hierarquia entre os seres humanos: no topo uma minoria proprietária de uma enorme quantidade de recursos econômicos que lhes conferem maiores oportunidades para experienciar uma vida plena, do outro lado, na base da pirâmide social, um enorme contingente de trabalhadores e trabalhadoras aviltados cotidianamente do acesso aos direitos sociais básicos como moradia, luz elétrica, água potável, saneamento básico, educação básica e superior, saúde, transporte público de qualidade. Milhões de pessoas encontram-se também excluídas dos benefícios do acesso à tecnologia, internet e meios de comunicação alternativos. A realidade nos indigna, temos como transformá-la?
Este processo de hierarquização social não deve ser visto por nós como algo natural, mas, pelo contrário, como uma forma de organização coletiva desigual construída pelas sociedades ao longo da história e que não convém para a nossa emancipação posto que oprime todos e todas nós injustamente e restringe nosso acesso aos direitos sociais de acordo com aquilo que temos e não de acordo com um princípio libertário de que o acesso aos direitos deve ser universalizado.
Uma vez que este processo não é natural, significa que não precisa continuar sendo assim para sempre, de modo que nós podemos nos organizar politicamente para lutar pela igualdade de oportunidades rumo à liberdade humana. A esta tarefa chamamos luta de classes, uma luta legítima das trabalhadoras e dos trabalhadores marginalizados e excluídos da democratização do acesso aos benefícios do desenvolvimento das forças produtivas e da técnica, afinal se o conhecimento e os objetos necessários para nossa existência são socialmente produzidos por todos nós porque não podem ser democraticamente distribuídos e aproveitados? Acreditamos que é possível, por meio de nossa organização política, construirmos a igualdade!
Nos deparamos todo dia com informações que estimulam o consumo como se fosse possível conquistar o sentimento de realização na vida por meio da aquisição de mercadorias, como se as coisas que possuímos definissem quem somos. Surgem padrões e estereótipos sobre o que é ser bem sucedido em nossa sociedade de acordo com nossa capacidade de consumo, isso nos leva a entrar numa lógica consumista e degradante pois ao colocar as mercadorias como prioridade em nossas vidas somos neutralizados a nos indignar com as situações de violação da dignidade humana. Mas sabe de uma coisa: acreditamos que os seres humanos são mais importantes que acumular objetos e privilégios em detrimento da qualidade de vida de todo nosso povo, portanto, nossa luta é popular, para democratizar o acesso às oportunidades de crescermos livres e felizes, tendo nossos direitos sociais fundamentais respeitados.
Somos cotidianamente julgados pelas roupas que vestimos, pelos aparelhos eletrônicos que possuímos, pela quantidade de anos que conseguimos estudar, pelo tipo de trabalho que realizamos, porém, em primeiro lugar, merecemos respeito e direito de voz e expressão. Acreditamos que é possível construir um mundo de justiça social em que toda forma de preconceito seja abolida, sendo a luta pela socialização dos meios de produção e da terra parte fundamental deste processo coletivo.
Já que nosso desafio histórico é uma verdadeira jornada coletiva, precisamos envolver o máximo de companheiras e companheiros que queiram caminhar conosco, assim, acreditamos que o feminismo também é elemento fundamental para nosso movimento social, pois esta luta é de tod@s nós e o feminismo é a ideia radical de que as mulheres possuem os mesmos direitos dos homens, isto é: todas as mulheres devem ser respeitadas para se sentirem confiantes para fazer política e viver com autonomia!
Em meio às hierarquias de classe existem também outras formas de preconceito que precisam ser combatidas, dentre elas as hierarquias de gênero, entre homens e mulheres. A opressão contra a mulher existe há muito tempo, muito antes do surgimento do capitalismo, engendrando uma cultura machista em que o homem se afirmou como superior à mulher consoante mitos de que seria o tipo de ser humano mais forte, inteligente e dinâmico em detrimento da mulher, definida como seu oposto e renegada a um papel de complemento do sexo masculino. Durante muito tempo, por causa destas crenças equivocadas, a mulher foi vista como um ser humano que precisava ser tutelada por seus pais, maridos e filhos e foi impedida de exercer seus direitos políticos como estudar, votar, candidatar-se a cargos públicos de representação política, participar de assembleias e debates, falar e posicionar-se expressando suas opiniões em lugares públicos. A mulher foi historicamente confinada ao espaço privado da casa, enquanto os homens se apropriaram dos espaços públicos, excluindo suas companheiras, mães, irmãs, esposas e filhas dos mesmos direitos dos quais usufruíam livremente. A este processo de exclusão também se somou outras formas de controle da mulher, como a opressão de sua sexualidade, de seu modo de se vestir e comportar.
Os homens então, dentro da cultura machista, gozaram sempre de maior liberdade para se realizarem como seres humanos e desenvolverem suas capacidades imaginativas, intelectuais, políticas e econômicas, enquanto às mulheres foi reservado um papel de apoio ao desenvolvimento do sexo masculino. A estes papéis hierarquizados atribuídos culturalmente de acordo com o sexo dos seres humanos chamamos gênero, que definiu padrões do que é ser homem e o que é ser mulher. Por exemplo, dentro da cultura machista a mulher é sensível, nasceu para ser mãe, é mais habilidosa para trabalhar dentro de casa, deve cuidar mais de sua aparência física, devem servir aos homens, só teriam capacidade de sair da casa de sua família se fosse para morar com seu marido. Muito acreditam que oferecer tal tratamento às mulheres é uma forma de dever, de cuidado e proteção, porém trata-se de uma forma de reprodução da lógica da tutela machista que em nada contribui para o fortalecimento das mulheres como sujeito de suas próprias histórias – todas nós podemos conquistar nossos direitos lutando por nossa própria autonomia!
Todos estes papéis e capacidades atribuídos separadamente para homens e mulheres são construções sociais também equivocadamente construídas para dominar as mulheres e precisam ser desmistificadas para que mulheres e homens tenham oportunidades iguais de se desenvolverem, se expressarem e viver a vida de acordo com suas personalidades próprias e interesses particulares, independente do sexo com o qual nasceram e/ ou escolheram ter ao longo da vida.
Quando as hierarquias de classe criadas pelo capitalismo se uniram às hierarquias de gênero entre homens e mulheres, o sistema de opressão do patriarcado se transforma e se aprofunda, constituindo as bases culturais que até hoje justificam processos de exploração mais acirrados por sobre a mulher trabalhadora, que é duplamente oprimida por ser de classe socialmente desvalorizada em nossa sociedade e pelo simples fato de ser mulher. Até hoje muitas mulheres não podem trabalhar fora de casa e seu trabalho doméstico não é socialmente reconhecido como trabalho, de modo que sua força produtiva foi sempre historicamente invisibilizada. Quando a mulher entra no mercado de trabalho passa a receber menor remuneração que os homens mesmo quando desempenha as mesmas funções, além de cumprir com duplas e triplas jornadas de trabalho, quando além de sua jornada de trabalho ainda tem que cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos, em sua maioria, sozinha, sem apoio de seus maridos, filhos, irmãos e companheiros.
Também é importante ressaltar que é por causa do patriarcado que todo tipo de trabalho de cuidados em nossa sociedade é subvalorizado, posto que são profissões majoritariamente ocupadas por mulheres, como os trabalhos ligados à agricultura voltada à soberania alimentar das famílias, educação e saúde - nas quais suas profissionais deveriam receber maiores remunerações além de maior atenção de políticas públicas e investimentos do governo.
Trata-se de um mito a ideia de que os homens são superiores às mulheres, mito este que é utilizado para dar seguimento a uma série de violências contra a mulher: controle de seu corpo e tratamento penal ao aborto com consequente criminalização da mulher, transformação das mulheres em mercadoria nos meios culturais (músicas, filmes, novelas), nas propagandas e meios de comunicação, feminicídios, estupros, espancamentos, violência psicológica e institucional, entre outras.
Toda forma de violência contra a mulher e toda forma de preconceito devem ser combatidas a partir do reconhecimento social justo do valor do trabalho da mulher na sociedade e do incentivo à participação das mulheres nos espaços políticos. No Levante Popular da Juventude do DF e Entorno acreditamos que sem feminismo não há socialismo, e o socialismo está na pauta do dia! Pátria Livre!
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