Abastecimento humano de água é prioritário, mas é preciso pensar alternativas para evitar a escassez dos recursos hídricos.
December 5, 2014 7:24Entrevista especial com Javier Tomasella
“O problema do déficit hídrico acaba surgindo, porque naturalmente existe uma situação de deficiência hídrica e, somado a isso, há um evento climático extremo, o que faz com que esses problemas de certa forma se precipitem”, afirma o engenheiro.
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Foto: www.sjc.sp.gov.br |
“A lei de água estabelece que o abastecimento humano é prioritário”, lembra Javier Tomasella ao comentar o acordo assinado entre os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro para fazer a transposição do Rio Paraíba do Sul, localizado nos três estados, a fim de resolver a crise de abastecimento hídrico na região metropolitana de São Paulo.
O engenheiro civil explica que, tecnicamente, se “pegarmos a região metropolitana de São Paulo e dividirmos pelo número de habitantes, vamos notar que o déficit hídrico por habitante é superior inclusive ao semiárido brasileiro. Embora essa região tenha certa oferta de recursos hídricos, o fato de a população estar concentrada na região metropolitana faz com que a disponibilidade efetiva de água por habitante seja muito baixa. Então, tem uma situação de déficit hídrico que obriga importar água de outras bacias”.
Na avaliação dele, a transposição do Rio Paraíba do Sul terá impactos, porque toda obra hidráulica gera implicações ambientais. Contudo, não se pode comparar essa transposição à polêmica transposição do Rio São Francisco. “O que está projetado é uma pequena fração. É bom dizer que moro no município de Cachoeira Paulista, na Bacia do Paraíba do Sul, há mais de 20 anos; de certa forma sou parte do ecossistema. O que tem de ser pensado é quanto cinco metros cúbicos de água significam em termos de vazão do Rio Paraíba. O governo está falando em extrair ou desviar uma fração relativamente pequena de água. São apenas cinco metros sobre duzentos”, pontua, na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone.
Independente de a transposição ser feita, Tomasella sugere que um conjunto de medidas seja realizado. Uma das medidas diz respeito ao uso e reúso da água. “Muito se fala, na esfera acadêmica, sobre a necessidade de reúso, mas na prática nós vemos que os municípios utilizam muito pouco esse tipo de técnica. Logo, essa questão de uso e reúso não tem sido muito explorada, embora na Europa e nos Estados Unidos seja frequentemente comum. Além disso, a cultura brasileira é de que a água é um recurso infinito e abundante, mas essa visão precisa ser revista”, frisa. Outro ponto que deve ser analisado é a infraestrutura, por conta da perda de água. “Calcula-se que as perdas variam de 30 a 50% da água tratada, e essa é uma questão que precisa ser corrigida”. E acrescenta: “O tratamento do esgoto é o primeiro passo para garantir a qualidade da água. Não adianta dizer ‘vai faltar água’, mas não cuidar do pouco que se tem”.
Javier Tomasella é graduado em Engenharia de Recursos Hídricos pela Universidad Nacional Del Litoral, na Argentina, mestre e doutor em Engenharia Civil pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas. Atualmente é tecnologista doCentro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, onde realiza atividades de pesquisa e desenvolvimento.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Como o senhor recebeu a notícia de que os governos de São Paulo, Rio e Minas firmam acordo sobre transposição da bacia do Paraíba do Sul? Do ponto de vista da engenharia civil hidráulica, qual é a viabilidade desta obra?
Javier Tomasella – De fato, não foi surpresa, uma vez que a lei de água estabelece que o abastecimento humano é prioritário. De uma maneira técnica, se pegarmos a região metropolitana de São Paulo e dividirmos pelo número de habitantes, vamos notar que o déficit hídrico por habitante é superior inclusive ao semiárido brasileiro. Embora essa região tenha certa oferta de recursos hídricos, o fato de a população estar concentrada na região metropolitana faz com que a disponibilidade efetiva de água por habitante seja muito baixa. Então, tem uma situação de déficit hídrico que obriga importar água de outras bacias.
O que precipita esse problema é o fato de o Sudeste ter passado por uma seca histórica — há registros que falam na pior seca dos últimos 80 anos — e é evidente que diante dessa situação o problema do déficit hídrico acaba surgindo, porque naturalmente existe uma situação de deficiência hídrica e, somado a isso, há um evento climático extremo, o que faz com que esses problemas de certa forma se precipitem.
IHU On-Line - A transposição resolverá o déficit hídrico? Essa é a melhor alternativa?
Javier Tomasella – Várias medidas técnicas podem ser atacadas conjuntamente. Uma delas é o uso e reúso da água, que no Brasil ainda é pouco feito. Basicamente se trata o esgoto e se reutiliza o recurso hídrico. Muito se fala, na esfera acadêmica, sobre a necessidade de reúso, mas na prática nós vemos que os municípios utilizam muito pouco esse tipo de técnica. Logo, essa questão de uso e reúso não tem sido muito explorada, embora na Europa e nos Estados Unidos seja comum. Além disso, a cultura brasileira é de que a água é um recurso infinito e abundante, mas essa visão precisa ser revista. Até tenho uma ideia de como realmente fazer um processo educativo para as pessoas entenderem a necessidade de usar racionalmente a água. Também temos questões de infraestrutura, basicamente perdas na própria rede de condução da água, na rede de abastecimento. Calcula-se que as perdas variam de 30 a 50% da água tratada, e essa é uma questão que precisa ser corrigida; não adianta ficar só atacando. E, claro que, finalmente, a questão da transposição é também uma solução técnica, mas uma questão técnica que deve ser utilizada, uma vez que não pode faltar água na região metropolitana de São Paulo. Essa para mim é uma premissa básica.
“Se olharmos a questão de tratamento de esgoto em todos os estados do país, vemos que ainda há uma deficiência muito grande neste aspecto” |
IHU On-Line - Quais são as implicações da transposição especificamente para a bacia do Paraíba do Sul?
Javier Tomasella – O que está projetado é uma pequena fração. É bom dizer que moro no município de Cachoeira Paulista, na Bacia do Paraíba do Sul, há mais de 20 anos; de certa forma sou parte do ecossistema. O que tem de ser pensado é quanto cinco metros cúbicos de água significam em termos de vazão do Rio Paraíba. O governo está falando em extrair ou desviar uma fração relativamente pequena de água. São apenas cinco metros sobre duzentos.
A transposição feita no Rio de Janeiro com o desvio para o sistemaGuandu foi algo em torno de 100 ou 150 metros cúbicos por segundo. Nesse sentido, se é para colocar em perspectiva uma transposição e outra, a do Guandu é realmente muito mais impactante sobre o Rio Paraíba. Só que essa transposição foi feita em outra época, quando as questões ambientais não eram motivo de preocupação como são hoje em dia.
É claro que como a bacia tem usos múltiplos, a transposição terá algum impacto, inclusive em uma pequena queda na geração de energia, e essa é uma questão que ainda não foi analisada.
Foto: www.odiariodecampos.com.br |
IHU On-Line - Já existem estudos ambientais sobre como fazer a transposição? Que estudos deveriam ser feitos antes da transposição?
Javier Tomasella – Não conheço em detalhe o projeto para saber como a questão ambiental foi tratada; desconheço esse estudo, se é que ele existe. Mas imagino que a lei ambiental já estabelece uma série de requisitos e o governo do estado de São Paulo tem de atender a esses requisitos para realmente fazer esse tipo de obra. Mas, de um modo geral, existem outras medidas que temos de pensar, como, por exemplo, se há outro uso prioritário na região da bacia do Paraíba. Ou seja, nessa bacia se planta arroz irrigado, porque é uma cultura que tem a ver com a tradição, e também observamos uma grande expansão do plantio de eucalipto. Então, se a água se tornou uma questão estratégica por causa do Rio de Janeiro, por causa da região metropolitana de São Paulo, uma coisa que poderia se pensar é como nós tratamos o uso do solo dentro da Bacia do Paraíba.
Não estou dizendo que deve ser feito isso ou aquilo, mas que pelo menos devem ser discutidos os possíveis impactos de determinados usos, já que a região é altamente industrializada. Cito o exemplo do arroz porque, se colocarmos no contexto do Mato Grosso e do Rio Grande do Sul, por exemplo, que são grandes produtores de arroz, a quantidade de arroz que se produz na região do Paraíba é muito pouco significativa e não tem nenhum impacto sobre a produção nacional. Então, é o caso de rever como deve ser utilizada a bacia do Paraíba.
O projeto de transposição está discutindo cinco metros cúbicos por segundo, mas de repente uma mudança na terra dentro da bacia faz com que os cinco metros cúbicos que serão desviados sejam facilmente recuperados. Então, sempre existem prós e contras e é preciso pensar como é possível compensar certa quantidade de água que se perde.
O projeto de transposição está discutindo cinco metros cúbicos por segundo, mas de repente uma mudança na terra dentro da bacia faz com que os cinco metros cúbicos que serão desviados sejam facilmente recuperados. Então, sempre existem prós e contras e é preciso pensar como é possível compensar certa quantidade de água que se perde.
Voltando para a questão do uso, que para mim é muito importante, tem de se pensar na tarifa d’água. O problema é que sempre há aquele aspecto político toda vez que vem essa questão do uso racional da água — para evitar a palavra racionamento, que virou um palavrão nas ultimas eleições. Então, se nós percebemos que daqui para frente haverá com mais frequência eventos extremos — cheias, estiagens —, temos de pensar em estratégias futuras, como, por exemplo, a implantação da bandeira tarifária. O que isso significa? No período em que falta água, a geração de energia hidrelétrica diminui por conta da menor disponibilidade de água nos reservatórios, e para compensar isso é necessário aumentar a participação das térmicas na geração total de energia. Então, o que está sendo implantado é uma espécie de bandeira tarifária.
Esse princípio de bandeira tarifária poderia ser aplicado automaticamente também para o consumo de água. Agora, se tivéssemos uma lei federal sobre isso, dizendo que se a disponibilidade de água cair “x” é possível aplicar uma bandeira tarifária, de certa forma trataríamos a questão da falta d’água tecnicamente e a bandeira tarifária se aplicaria quase que automaticamente. Essa seria uma forma de evitar esse enorme desgaste em torno do aumento da tarifa por diversas razões. Se esse tipo de situação de estiagem estivesse previsto por lei, seria muito mais fácil resolver a questão.
Na Califórnia, que é uma região que episodicamente sofre estiagem, esse mecanismo já existe; por isso é uma sugestão para o Brasil. Não é uma proposta popular, mas nós temos de propor tecnicamente o que poderia ser uma solução. Então, de certa forma, esse tipo de mecanismo tarifário aumentaria a conscientização da população sobre a necessidade de se poupar água em períodos extremamente críticos que podem se apresentar e podem se repetir no futuro.
IHU On-Line - A transposição poderá causar algum impacto nos demais estados por onde passa o rio Paraíba, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais?
Javier Tomasella – Eu não tenho os cálculos exatos, mas a quantidade que está sendo desviada é pouco significativa para justificar impactos. O impacto maior seria no Rio de Janeiro, não em Minas Gerais, porque Minas de certa forma é cabeceira da bacia do Paraíba, por isso o efeito da transposição não teria impacto significativo. E no Rio de Janeiro o impacto seria muito pequeno. Por outro lado, o Rio também precisa fazer seu dever de casa. O desvio de água que se faz no Guandu está relacionado, em parte, à falta de tratamento de esgoto nos municípios que ficam no sistema Guandu, e por isso é necessário, de certa forma, ajudar a diluir e reduzir o custo do tratamento.
Se olharmos a questão de tratamento de esgoto em todos os estados do país, vemos que ainda há uma deficiência muito grande neste aspecto. Nesse sentido, a melhor forma de preservar os recursos hídricos é preservar a qualidade deles. E, nesse aspecto, a maioria dos municípios não faz o dever de casa.
No Vale do Paraíba Paulista, que acompanho, houve um avanço muito significativo no tratamento de água. Vários municípios já estão com 100% de esgoto tratado, e há outros municípios que ainda estão com 70-80% de esgoto tratado, mas o tratamento do esgoto é o primeiro passo para garantir a qualidade da água. Não adianta dizer “vai faltar água”, mas não cuidar do pouco que se tem.
IHU On-Line - Ou fazer a transposição e depois não aplicar outras medidas.
Javier Tomasella – Exatamente. Tem de haver o resgate da bacia como um todo, e pensar alternativas para ver como a bacia pode ser recuperada. Esse é um tipo de discussão que também existe na bacia do São Francisco. A priori não se cuida como a bacia está sendo utilizada e, no caso do Rio Paraíba, não está se dando toda atenção que merece, já que uma parcela significativa do PIB nacional se localiza nessa região.
IHU On-Line - A transposição do Rio São Francisco está sendo realizada desde 2008. É possível estimar qual será o tempo estimado para realizar a transposição do Rio Paraíba Sul?
Javier Tomasella – Falou-se que a transposição seria realizada em dois anos, com um custo de 500 milhões de reais. É preciso entender que essa obra é muito menor e menos complexa do que a obra de transposição do Rio São Francisco e relativamente muito mais simples, até porque a separação dos reservatórios é em torno de 15 quilômetros de distância. Então, as proporções entre uma obra e outra são muito diferentes, são obras de uma dimensão completamente contrastante.
“Parece que houve uma discussão muito mais apaixonada sobre essas questões da transposição, mas sem pensar muito tecnicamente o que poderia ter sido feito” |
IHU On-Line - Em que consiste seu projeto de pesquisa de desenvolver um sistema de previsão de enxurradas, inundações e movimentos de massa em encostas a fim de prevenir desastres naturais? Já existem projetos desse tipo em desenvolvimento e em atuação no Brasil? É possível comprovar a eficácia deles?
Javier Tomasella – Quando nós olhamos o número de mortes no país em decorrência de desastres naturais, vemos que é um número muito significativo. Claro que há episódios como o que aconteceu na região serrana do Rio de Janeiro, ou mesmo no Nordeste, em que realmente a destruição e o número de fatalidades são muito significativos. Portanto, a ideia que se tinha com essa iniciativa era tentar utilizar ferramentas de previsão que, de alguma forma, alertassem a ocorrência de determinado fenômeno, porque tanto deslizamento quanto enxurradas estão mais associados ao número de fatalidades. As cheias que são graduais, aquelas que ocorrem quando o rio sobe e desce mais suavemente, produzem um número maior de perdas materiais e afetam, percentualmente, uma população maior, mas normalmente não estão associadas a um número grande de mortes, por causa da característica e da dinâmica do fenômeno.
Então, a ideia era tentar estudar de que forma e que ferramentas podem ser utilizadas para antecipar esse tipo de evento. Nós estamos com duas linhas básicas. Uma linha tem como objetivo tentar apoiar a instrumentação de uma rede de monitoramento com o foco em bacias de pequeno porte, porque normalmente as enxurradas estão associadas a bacias de menor área de drenagem e com maior declividade. Esse tipo de bacia é que tem as cheias mais abruptas, que são as enxurradas. A ideia era estabelecer uma rede de monitoramento, já que esse tipo de bacia normalmente não é monitorado, porque a lógica da própria rede era monitorar bacias de grande porte por conta do potencial hidrelétrico. Então, as bacias de pequeno porte no país ainda são mal monitoradas. Assim, por um lado, tentamos estabelecer essa rede para começarmos a entender como esses fenômenos ocorrem para que tivéssemos informações básicas que nos permitam testar certo tipo de ferramenta para conseguir maior ou menor antecipação na emissão de alertas para esse tipo de evento.
Nós estamos criando uma rede de 115 estações em vários estados do país, especialmente concentradas na faixa leste do Brasil, onde estão as regiões mais vulneráveis. Também estamos explorando ferramentas de previsão usando modelos matemáticos. Criamos uma área piloto em Campos do Jordão, e a ideia era, com diferentes sensores, ver qual o mais adequado para monitorar encostas e com isso permitir que, posteriormente, sejam realizadas ações de evacuação.
IHU On-Line - Deseja acrescentar algo?
Javier Tomasella – Parece que houve uma discussão muito mais apaixonada sobre essas questões da transposição, mas sem pensar muito tecnicamente o que poderia ter sido feito. Essas questões de água sempre trazem - do mesmo jeito que a transposição do São Francisco - paixões muito fortes, e às vezes as soluções precisam ser melhor estudadas tecnicamente para evitar que haja uma confusão com relação a esse tipo de informação. Se eventos extremos se tornarem mais frequentes no país, é importante dizer que esse tipo de solução da engenharia pode se tornar mais frequente do que esperamos. Então é melhor desmistificar: qualquer obra de engenharia, qualquer barragem, tem um impacto. Não adianta imaginar que qualquer obra de engenharia só traz benefícios; trata-se sempre de um compromisso entre as vantagens e desvantagens em qualquer obra de intervenção.
Delação premiada na "lava jato" está eivada de inconstitucionalidades
December 5, 2014 7:20TRAIÇÃO BONIFICADA
Delação premiada: favor legal antiético
Delação premiada consiste na redução de pena (podendo chegar, em algumas hipóteses, até mesmo a total isenção de pena) para o delinquente que delatar seus comparsas, concedida pelo juiz na sentença condenatória, desde que sejam satisfeitos os requisitos que a lei estabelece. Trata-se de instituto importado de outros países[1], independentemente da diversidade de peculiaridades de cada ordenamento jurídico e dos fundamentos políticos que o justificam.
Por esse instituto premia-se o participante delator que trai seu comparsa, com a redução de um a dois terços da pena aplicada, ou, em alguns casos, podendo chegar ao perdão judicial.
Com efeito, a eufemisticamente denominada delação premiada, que foi inaugurada no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90, artigo 8º, parágrafo único), proliferou em nossa legislação esparsa, atingindo níveis de vulgaridade. Enfim, iniciou-se a proliferação da “traição bonificada”, defendida pelas autoridades como grande instrumento de combate à criminalidade organizada, que, finalmente, recebe sua definição legal com a Lei 12.850/2013.
O fundamento invocado é a confessada falência do Estado para combater a dita “criminalidade organizada”, que é mais produto da omissão dos governantes ao longo dos anos do que propriamente alguma “organização” ou “sofisticação” operacional da delinquência massificada. Na verdade, virou moda falar crime organizado, organização criminosa e outras expressões semelhantes, para justificar a incompetência e a omissão dos detentores do poder, nos últimos 20 anos, pelo menos.
Chega a ser paradoxal que se insista numa propalada sofisticação da delinquência; num país onde impera a improvisação e tudo é desorganizado, como se pode aceitar que só o crime seja organizado? Quem sabe o Poder Público, num exemplo de funcionalidade, comece combatendo o crime desorganizado, já que capitulou ante o que resolveu tachar de crime organizado; pelo menos combateria a criminalidade de massa, a criminalidade violenta, devolvendo a segurança à coletividade brasileira, que tem dificuldade até mesmo de transitar pelas ruas das capitais. Está-se tornando intolerável a inoperância do Estado no combate à criminalidade, seja ela massificada, organizada ou desorganizada, conforme nos têm demonstrado as alarmantes estatísticas diariamente.
Como se tivesse descoberto uma poção mágica, o legislador contemporâneo acena com a possibilidade de premiar o traidor — atenuando a sua responsabilidade criminal — desde que delate seu comparsa, facilitando o êxito da investigação das autoridades constituídas. Com essa figura esdrúxula o legislador brasileiro possibilita premiar o “alcaguete”, oferecendo-lhe vantagem legal, manipulando os parâmetros punitivos, alheio aos fundamentos do direito-dever de punir que o Estado assumiu com a coletividade.
Não se pode admitir, sem qualquer questionamento, a premiação de um delinquente que, para obter determinada vantagem, “dedure” seu parceiro, com o qual deve ter tido, pelo menos, uma relação de confiança para empreenderem alguma atividade, no mínimo, arriscada, que é a prática de algum tipo de delinquência. Estamos, na verdade, tentando falar da moralidade e justiça da postura assumida pelo Estado nesse tipo de premiação. Qual é, afinal, o fundamento ético legitimador do oferecimento de tal premiação?
Convém destacar que, para efeito da delação premiada, não se questiona a motivação do delator, sendo irrelevante que tenha sido por arrependimento, vingança, ódio, infidelidade ou apenas por uma avaliação calculista, antiética e infiel do traidor-delator. Venia concessa, será legítimo o Estado lançar mão de meios antiéticos e imorais, como estimular a deslealdade e traição entre parceiros, apostando em comportamentos dessa natureza para atingir resultados que sua incompetência não lhe permite através de meios mais ortodoxos? Certamente não é nada edificante estimular seus súditos a mentir, trair, delatar ou dedurar um companheiro movido exclusivamente pela ânsia de obter alguma vantagem pessoal, seja de que natureza for.
Note-se que, ainda que seja possível afirmar ser mais positivo moralmente estar ao lado da apuração do delito do que de seu acobertamento, é, no mínimo arriscado apostar em que tais informações, que são oriundas de uma traição, não possam ser elas mesmas traiçoeiras em seu conteúdo. Certamente aquele que é capaz de trair, delatar ou dedurar um companheiro movido exclusivamente pela ânsia de obter alguma vantagem pessoal, não terá escrúpulos em igualmente mentir, inventar, tergiversar e manipular as informações que oferece para merecer o que deseja. Com essa postura antiética, não se pode esperar que o delator adote, de sua parte, um comportamento ético e limite-se a falar a verdade às autoridades repressoras; logicamente, o beneficiário da delação dirá qualquer coisa que interesse às autoridades na tentativa de beneficiar-se. Essa circunstância retira eventual idoneidade que sua delação possa ter, se é que alguma delação pode ser considerada idônea em algum lugar.
Na realidade, a praxis tem desrecomendado não apenas o instituto da delação como também as próprias autoridades que a têm utilizado, bastando recordar, apenas para ilustrar, a hipótese do doleiro da CPI dos Correios e do ex-assessor do atual ministro Palocci, que foram interpelados e compromissados a delatar, na calada da noite e/ou no interior das prisões, enfim, nas circunstâncias mais inóspitas possíveis, sem lhes assegurar a presença e orientação de um advogado, sem contraditório, ampla defesa e o devido processo legal.
Inversão na hierarquia do ordenamento jurídico
Ao longo do tempo temos denunciado que vivemos em um país onde há inversão total do ordenamento jurídico, na medida em que a Constituição Federal, para determinadas autoridades, não passa de peça puramente ornamental, sendo contrariada por leis ordinárias, decretos, resoluções, portarias, e, agora, até por acordo de “delação premiada”, eufemisticamente cognominada de “colaboração premiada” (Lei 12.850/13).
Nos últimos anos, o legislador contemporâneo tem demonstrado censurável desapreço pelas garantias constitucionais, e certa predileção em editar diplomas legais francamente inconstitucionais, e, particularmente, afrontadores de direitos fundamentais assegurados na própria Constituição. Na verdade, há uma “produção” excessiva de leis que, a pretexto de combater a impunidade, ignoram a existência de garantias fundamentais, e algumas até contradizem diretamente as previsões constitucionais, como ocorre, por exemplo, com a Lei 12.850/2.013.
No livro Comentários à lei de organização criminosa[2] em que abordamos a indigitada, imoral e antiética “colaboração premiada”, apontamos algumas nulidades; mas essas são nulidades e inconstitucionalidades que decorrem do próprio texto legal, confrontado com a nossa Carta Magna. No entanto, além dessas inconstitucionalidades textuais, a aplicação, in concreto, do instituto da “delação”, com certa deturpação interpretativa pode ampliar tais inconstitucionalidades, dependendo da forma como as autoridades colocam em prática a utilização do referido instituto.
Nesse sentido, pelas informações vazadas na mídia, essas nulidades e inconstitucionalidades são pródigas na “colaboração premiada” celebrada na “operação lava jato”, com o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Trata-se, a rigor, de um “acordo de colaboração premiada” eivado de nulidades, mas nulidades absurdamente grotescas, ou seja, decorrentes de negação de garantias fundamentais impostas pelo Ministério Público (negociador da delação) a referido réu e ao seu defensor!
Pelo que vazou, foram violadas, dentre outras, as garantais fundamentais da ampla defesa, do devido processo legal, do direito ao silêncio, de não produzir prova contra si mesmo, direito de não se autoincriminar etc. Ou seja, foi imposto ao “delator” que renunciasse {pode ?!} — a todos esses direitos constitucionais —, inclusive direitos de ações (afastando a jurisdicionalidade do cidadão). Afinal, desde quando as garantias fundamentais do direito de ação, do devido processo legal, da ampla defesa podem simplesmente ser renunciadas por alguém, ainda mais na imposição de uma delação premiada? Ora, se são garantias contra o poder estatal, são irrenunciáveis!
Vejamos algumas pérolas de nulidades e inconstitucionalidades flagrantes que, segundo nos consta, existem nesse “acordo de delação premiada”:
1)o delator tem que desistir de todos os habeas corpus impetrados;
2)deve desistir, igualmente, do exercício de defesas processuais, inclusive de questionar competência e outras nulidades;
3)deve assumir compromisso de falar a verdade em todas as investigações (contrariando o direito ao silêncio, a não se auto-incriminar e a não produzir prova contra si mesmo);
4)não impugnar o acordo de colaboração, por qualquer meio jurídico;
5)renunciar, ainda, ao exercício do direito de recorrer de sentenças condenatórias relativas aos fatos objetos da investigação.
Reconhecem que o colaborador tem direito constitucional ao silêncio e a garantia contra a auto-incriminação. Mas invocam o disposto no artigo 4°, parágrafo 14, da Lei 12.850/2013, para exigir a renúncia do colaborador nos depoimentos em que prestar. Em outros termos, invertem a ordem natural da hierarquia de nosso ordenamento jurídico, e, com um simples acordo, “revogam” a Constituição Federal.
Menos mal que o digno e culto ministro Teori Zavascki, ao homologar o acordo de delação, excluiu todas aquelas restrições que visavam afastar a jurisdicionalidade, que também é uma garantia de todo cidadão, em outros termos, assegurou-se o amplo de direito de ação.
Inconstitucionalidade textual: renúncia ao direito de silenciar (artigo 4º, parágrafo 14)
Uma vez iniciado o processo, sendo o colaborador, induvidosamente, parte no processo, goza de pleno direito ao silêncio. A lei incorrendo em graveinconstitucionalidade estabelece em seu parágrafo 14º do artigo 4º, que ocolaborador renunciará — utiliza-se voz cogente — ao direito ao silêncio, na presença de seu defensor. Ora, o dispositivo legislativo é claramenteinconstitucional enquanto obriga (ou condiciona, o que dá no mesmo) o réu a abrir mão de um direito seu consagrado não apenas na constituição, como em todos os pactos internacionais de direitos humanos, dos quais o Brasil é signatário. Afinal, o réu simplesmente não está obrigado a fazer prova contra si em circunstância alguma, mesmo a pretexto de “colaborar” com a Justiça, ou seja, na condição de colaborador. Afinal, lhe interessa muito mais (lhe é muito mais benéfico) uma sentença absolutória, que a aplicação dos benefícios decorrentes da colaboração.
Mas não para por aí a coleção de absurdos que emoldura o depoimento do colaborador em juízo. Com efeito, o parágrafo 12 do artigo 4º prevê queainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial. Essa disposição legal é de uma estupidez sem precedentes, além de absolutamente desnecessária.
Por um lado, porque repete a hipótese tecnicamente inviável do colaborador não ter sido denunciado, caso tenha cometido crime ou, de qualquer modo, concorrido para ele. Caso não o tenha, poderá sempre ser arrolado como testemunha, pelo que, a disposição é inútil.
Por outro, o perdão judicial se aplica, repetindo, por ocasião da sentença e, depois dela, não se pode mais produzir prova no processo! Ademais, estranhamente, se a regulamentação diz respeito a prova a ser produzida a respeito de outro processo, não há nenhuma necessidade de regulamentação, pois qualquer pessoa pode ser testemunha de quem quer que seja, em qualquer processo!
É pertinente e persistente a crítica doutrinária de que o Brasil vem legislando no processo penal de forma a desviar o foco da produção probatória através da investigação do fato, para concentrar-se na pessoa do próprio investigado como fonte de prova, transferindo-lhe obrigações — ou, no caso, estimulando-o — a reconstituição do fato[3]. Não deixa de ser uma forma indireta de o legislador burlar ou desrespeitar a garantia constitucional de o cidadão não produzir prova contra si mesmo.
Prende-se para investigar, prende-se para fragilizar, prende-se para forçar a confissão e, por fim, prende-se para desgastar, subjugar, ameaçar e forçar a “colaboração premiada”! Aliás, a própria autoridade repressora reconhece, oficialmente, em seu parecer, que esse é o objetivo maior das prisões e tem sido exitoso: arrancar a confissão e forçar a “delação”! Retornamos à Idade Média, quando às ordalhas e a tortura também tinham objetivo de arrancar a confissão, e também eram cem por cento exitosas! Só falta torturar fisicamente, por que psicologicamente já está correndo!
Essa admissão oficial do fundamento das prisões escancara a sua ilegalidade, a sua arbitrariedade e a sua ilegitimidade! Certamente, não resistirá ao crivo dos tribunais superiores! Ao menos, é o que se espera em um Estado Democrático de Direito, que consagra a prisão como última ratio!
[1] Código Penal espanhol, arts. 376 e 579, n. 3; Código Penal italiano, arts. 289bis e 630, e Leis n. 304/82, 34/87 e 82/91; Código Penal português, arts. 299, n. 4, 300, n. 4, e 301, n. 2; Código Penal chileno, art. 8º; Código Penal argentino, art. 217; Código Penal colombiano, arts. 413/418, entre outros.
[2] BITENCOURT, Cezar Roberto & BUSATO, Paulo César. Comentários à lei de organização criminosa – Lei 12.850/2013.
[3] A opinião é de SARCEDO, Leandro. “A delação premiada e a necessária mitigação do princípio da obrigatoriedade da ação penal”, in Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, vol. 27, Jan. 2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 192.
Cezar Roberto Bitencourt é advogado criminalista, professor do programa de pós-graduação da PUC-RS, doutor em Direito Penal pela Universidade de Sevilha, procurador de Justiça aposentado.
Revista Consultor Jurídico
Insignificância não se aplica em casos de infrator contumaz
December 5, 2014 7:18ESTÍMULO AO CRIME
A incidência do princípio da insignificância não é admitida nos casos em que o agente é autor contumaz de crimes contra o patrimônio. Esse foi o entendimento da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao negar um pedido de Habeas Corpus de uma mulher condenada por furtar itens de uma drogaria que, juntos, foram avaliados em R$ 88,24 à época dos fatos.
A mulher foi condenada a cumprir pena de 2 anos de reclusão em regime semiaberto. Para o juiz, deixar de reprimir a acusada em virtude do “pequeno valor subtraído” seria “estimulá-la a constantes pequenas investidas contra o patrimônio alheio”.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou a sentença, mas modificou a pena para um 1 e 10 dias de reclusão, mantido o regime semiaberto. Para o TJ-MG, a aplicação do princípio da insignificância ao caso “certamente representaria um estímulo à delinquência e à reiteração criminosa da apelante”. Entretanto, a defensoria pública insistiu que fosse aplicado o princípio, dessa vez no STJ.

De acordo com o ministro Rogerio Schietti (foto), autor do voto vencedor na 6ª Turma, o princípio da insignificância é um “tema que desperta grande dificuldade ao operador do direito, quer para aceitar a incidência de tal princípio orientador da aplicação da lei penal, quer para lhe definir os contornos precisos”.
Segundo Schietti, o Supremo Tribunal Federal tem entendido que o princípio da insignificância qualifica-se como fator de descaracterização material da tipicidade penal.
Para o STF, “o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor — por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes — não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social”.
O STJ, nas 5ª e 6ª Turmas, tem decidido que, para delimitar o âmbito de aplicação da insignificância, o juiz deverá ponderar o conjunto de circunstâncias que rodeiam a ação, de modo a descobrir se, mesmo estando ela descrita em um tipo penal, não afeta de maneira relevante o bem jurídico que o tipo protege.
Para isso, Schietti elencou fatores que devem ser avaliados para saber se um comportamento formalmente típico deve ou não receber punição: “o valor do bem ou dos bens furtados; a situação econômica da vítima; as circunstâncias em que o crime foi perpetrado, ou seja, se foi de dia ou durante o repouso noturno, se teve o concurso de terceira pessoa, sobretudo adolescente, se rompeu obstáculo de considerável valor para a subtração da coisa, se abusou da confiança da vítima etc.; a personalidade e as condições pessoais do agente, notadamente se demonstra fazer da subtração de coisas alheias um meio ou seu estilo de vida, com sucessivas ocorrências (reincidente ou não)”.
Schietti destacou que a “simples existência de maus antecedentes penais, sem a devida e criteriosa verificação da natureza desses atos pretéritos, não pode servir de barreira automática para a invocação do princípio bagatelar”. Dessa maneira, o ministro ressaltou que os crimes cometidos anteriormente pelo agente devem ter alguma conexão comportamental com o crime patrimonial cometido para que a insignificância seja afastada. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Clique aqui para ler a decisão.
HC 285.180
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Critérios para analisar a razoável duração da prisão preventiva
December 5, 2014 7:15A TODA PROVA
O eventual excesso de prazo da prisão cautelar deve ser analisado de acordo com a razoabilidade, sendo permitido ao juízo, em hipóteses excepcionais, diante das peculiaridades da causa, a extrapolação dos prazos previstos na lei processual penal, não podendo o excesso decorrer de mero cálculo aritmético (Prova escrita objetiva do concurso público para provimento de vagas no cargo de juiz de direito substituto da carreira da Magistratura do Poder Judiciário do Estado do Amazonas).
É certo que privar da liberdade, por prazo desproporcional, pessoas cuja responsabilidade penal ainda não veio a ser declarada em definitivo viola os artigos 9(3) do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos[1], promulgado pelo Decreto 592/1992 e 7(5) da Convenção Americana de Direitos Humanos[2], internalizada no Brasil mediante o Decreto 678/1992.
Essas normas, contudo, só impõem a libertação da pessoa detida a partir do momento em que a constrição ultrapassa o limite do razoável. E embora o que pode ser plausível varie segundo as circunstâncias do caso concreto[3], a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos[4], no que é seguida pela do Supremo[5], entende que pelo menos três fatores devem ser considerados: (a) a complexidade da causa, (b) a atividade processual dos intervenientes e (c) a diligência do Juízo na condução do processo.
A complexidade da causa tem a ver com o número de réus, a quantidade de testemunhas a serem inquiridas, o montante de delitos imputados, a necessidade de expedição de cartas precatórias ou o volume de incidentes processuais[6]. A atividade processual dos intervenientes diz respeito ao exercício positivo ou abusivo de posições jurídicas pelo Ministério Público, pelo assistente ou pela defesa. A diligência da autoridade judiciária, por fim, surge com a ocorrência, ou não, de inércia a revelar desídia no desenvolvimento da marcha processual.
Um outro critério — pouco difundido entre nós — para aferir a razoabilidade do prazo da preventiva é o do cumprimento de dois terços da pena mínima cominada em abstrato para o crime imputado[7]. Elaborado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos a partir de uma análise das legislações penais do sistema, faz com que o prazo da prisão cautelar de uma pessoa acusada da prática de receptação qualificada, por exemplo, só seja considerado desarrazoado, em termos objetivos, caso venha a superar o lapso temporal de dois anos, presente a pena mínima de três anos, prevista no parágrafo 1º do artigo 180 do Código Penal.
Esse referencial, isoladamente considerado, evidentemente não autoriza o Estado a manter uma pessoa em prisão preventiva por todo o tempo nele previsto. Trata-se apenas de um limite, que superado, conduzirá a uma presunção relativa de excesso de prazo da custódia, a qual mesmo assim poderá persistir, desde que devidamente justificada. Não ultrapassado, tampouco legitima, por si só, a duração da medida, mas, conforme consignado, a subsistência dos fundamentos que a ensejaram deve ser examinada conjuntamente com as circunstâncias do caso concreto.
Seja como for, cumpre à defesa, independentemente da hipótese autorizadora, desincumbir-se do ônus de apontar a existência de uma situação incompatível com o direito a que a causa seja examinada em um prazo razoável, cotejando-o na forma da primeira parte do artigo 156 do Código de Processo Penal[8], com as particularidades do processo a que responde. A mera alegação de que houve o transcurso de prazos processuais, contados da data da efetivação da prisão, sem ter-se concluído o processo, não deve ser tida como bastante para revogar a determinação da custódia.
[1] “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade”.
[2] “Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo”.
[3] Comunicação 336/1988, N. Fillastre v. Bolivia (parecer adotado em 5 de novembro de 1991), in: Documento das Nações Unidas GAOR, A/47/40, p. 306, parágrafo 6.5.
[4] Caso Tibi v. Equador. Sentença de 7 de setembro de 2004 (Exceções Preliminares, Mérito, Reparação e Custas). Serie C, n. 114. parágrafo 175.
[5] Recurso em Habeas Corpus 122.462/SP, relatado pelo ministro Teori Zavascki na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 9 de setembro de 2014.
[6] Confiram com o Habeas Corpus 116.864/PR, relatado pela ministra Cármen Lúcia na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 15 de outubro de 2013, com o Agravo Regimental no Habeas Corpus 116.744/SP, relatado pela ministra Rosa Weber na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 4 de setembro de 2013, com o Habeas Corpus 104.849/RJ, relatado pelo ministro Gilmar Mendes na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 1º de março de 2011, com o Habeas Corpus 98.689/SP, relatado pelo ministro Ricardo Lewandowski na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 6 de novembro de 2009, com o Habeas Corpus 106.675/RJ, relatado pelo ministro Carlos Ayres Britto na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, com acórdão veiculado no Diário da Justiça de 14 de junho de 2011.
[7] Informe 86/09, Caso 12.553, Mérito, Jorge, José e Dante Peirano Basso, República Oriental do Uruguai, 6 de agosto de 2009, parágrafo 109.
[8] “A prova da alegação incumbirá a quem a fizer”.
Aldo de Campos Costa exerce o cargo de procurador da República. Foi advogado, professor substituto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, conselheiro da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, assessor especial do Ministro da Justiça e assessor de ministro do Supremo Tribunal Federal.
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Para Moro, só a suspeita sobre origem de dinheiro é suficiente para condenar
December 5, 2014 7:14LAVAGEM DE DINHEIRO
A simples suspeita a respeito da verdadeira origem dos recursos é, para o juiz Sergio Moro, elemento suficiente para condenar alguém pelo crime de lavagem. O magistrado, que está no centro das atenções por ser o responsável pelas ações decorrentes da operação “lava jato”, explicou que o desconhecimento é a justificativa mais usada pelos acusados para evitar a responsabilização.
Em palestra nesta quinta-feira (4/12), no I Seminário Nacional sobre Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, que acontece até essa sexta no Rio de Janeiro, Moro explicou que a lavagem ocorre sempre na sequência de outro crime.
A Lei 9.613/1998, que trata da matéria, vincula a responsabilização ao conhecimento do delito anterior, ao caracterizar a lavagem como a prática de “ocultar e dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal”. É o chamado dolo objetivo.
Contudo, vem ganhando força a tese do dolo eventual — ou seja, quando o acusado do crime de lavagem não tem conhecimento específico quanto à origem do dinheiro e ainda assim assumiu o risco ao aceitar geri-lo. No exterior, o ato foi batizado de ignorância deliberada e tem sido cada vez mais acolhido pelos tribunais na hora de condenar pessoas acusadas do crime de lavagem. No Brasil, a jurisprudência não é pacífica. “Às vezes se admite o dolo eventual, em outros casos a questão sequer é discutida”, afirmou Moro.
De acordo com ele, o Supremo Tribunal Federal chegou a analisar o tema no julgamento do mensalão, mas de forma incidental, pois as condenações ocorreram com base na tese do dolo objetivo. Moro é a favor da aplicação do dolo eventual quando verificado que o acusado suspeitava da origem criminosa do dinheiro e mesmo assim aceitou geri-lo sem buscar conhecer os fatos que envolvem aqueles recursos.
Segundo o juiz, o dolo eventual faz sentido em um mundo onde a lavagem de dinheiro tem sido terceirizada — ou seja, nem sempre é praticada pelo autor do crime que deu origem aos recursos.

“Nesse mundo a regra é ‘você não me fala, eu não te pergunto’. Mas se conseguimos provar que ele [o acusado] tinha conhecimento ainda que provável do crime e que ele poderia ter se aprofundado mais, ele não deveria ser responsabilizado? Não vejo nisso problemas jurídicos nem morais. Ele se colocou nessa situação de ignorância deliberada”, afirmou Moro (foto).
E acrescentou: “Se não admitirmos a figura do dolo eventual, teremos dificuldade para responsabilizar esses profissionais [da lavagem]. Dolo eventual não é culpa, nem negligencia. É um agir intencional”.
Sem entrevistas
Com todos os holofotes voltados para si por conta dos processos da “lava-jato”, Moro chegou à sala onde ocorria o seminário blindado pelos organizadores do evento. Ele não quis falar com a imprensa sobre os rumos das ações que tratam da corrupção na Petrobras. Inclusive um dos organizadores pediu aos jornalistas que lotaram o local, logo a palestra do juiz, para que não o cercassem “como de costume” ao final do evento.
Giselle Souza é correspondente da ConJur no Rio de Janeiro.
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Uso de equipamento de proteção individual (EPI) pode afastar aposentadoria especial
December 5, 2014 7:12O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu hoje (4) o julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 664335, com repercussão geral reconhecida, e fixou duas teses que deverão ser aplicadas a pelo menos 1.639 processos judiciais movidos por trabalhadores de todo o País que discutem os efeitos da utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) sobre o direito à aposentadoria especial.
Na primeira tese, os ministros do STF decidiram, por maioria de votos, que “o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial”.
A outra tese fixada no julgamento, também por maioria de votos, é a de que, “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria”.
O julgamento foi retomado na sessão desta quinta-feira (4) com o voto-vista do ministro Luís Roberto Barroso. Por unanimidade de votos, o Plenário negou provimento ao recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que questionava decisão da Primeira Turma Recursal da Seção Judiciária de Santa Catarina, segundo a qual, mesmo que o uso de EPI elimine ou reduza a insalubridade, a circunstância não afasta a contagem do tempo de serviço especial se houve exposição ao agente nocivo.
No Supremo, o INSS alegou que a decisão violaria os artigos 201 (parágrafo 1º) e 195 (parágrafo 5º) da Constituição Federal, que tratam da aposentadoria especial e da necessidade de haver fonte de custeio para a criação, majoração ou extensão de benefício ou serviço da seguridade social.
Segundo o INSS, se a nocividade dos agentes presentes no ambiente de trabalho é eliminada ou reduzida a níveis toleráveis pela utilização de EPI eficaz, com a correspondente desoneração da contribuição previdenciária destinada ao custeio do Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) – que é paga pelo empregador –, não há direito à aposentadoria especial.
Embora o argumento do INSS tenha sido abrangido pela primeira tese fixada pelo STF, o Plenário negou provimento ao recurso porque, no caso dos autos, o trabalhador é um auxiliar de produção que trabalhou, entre 2002 e 2006, no setor de usinagem de uma empresa de Chapecó (SC), onde era exposto, de modo habitual e permanente, a ruídos que chegavam a 95 decibéis. Essa circunstância está abrangida pela segunda tese fixada pelo STF na sessão desta tarde.
VP/FB
Leia mais:
22/06/2012 – Descaracterização do tempo de serviço especial pelo uso de equipamento de proteção é tema com repercussão
Processos relacionados ARE 664335 |
Fim do auto de resistência.
December 4, 2014 17:07 Opinem nela. Acessem o link da votação que ela traz e votem não.
Vote SIM aqui: http://bit.ly/12k47f8
(Reprodução do site da Câmara:)
Câmara lança enquete sobre projeto que exige rigor para apurar violência policial
Está no ar nova enquete da Câmara dos Deputados, sobre o Projeto de Lei (PL) 4471/12, que cria regras rigorosas para a apuração de mortes e lesões corporais decorrentes das ações de agentes do Estado, como policiais, e acaba com a possibilidade de serem justificadas como auto de resistência.
Atualmente, no caso de resistência à prisão, o Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/41) autoriza o uso de quaisquer meios necessários para que o policial se defenda ou vença a resistência, e determina que seja feito um auto assinado por duas testemunhas.
Já a proposta apresentada pelos deputados Paulo Teixeira (PT-SP), Fábio Trad (PMDB-MS), Delegado Protógenes (PCdoB-SP) e Miro Teixeira (Pros-RJ) estabelece que, sempre que a ação resultar em lesão corporal ou morte, deverá ser instaurado imediatamente inquérito para apurar o fato, e o autor ainda poderá ser preso em flagrante. Ministério Público, Defensoria Pública, órgão correcional competente e Ouvidoria deverão ser comunicados imediatamente da instauração do processo.
O projeto está pronto para ser votado pelo Plenário da Câmara, e, no último dia 19, mães de pessoas mortas em ações policiais e representantes do movimento negro entregaram ao presidente Henrique Eduardo Alves um abaixo-assinado com mais de 30 mil assinaturas pela votação da proposta. Em audiências públicas, parlamentares ouviram denúncias de que, na prática, os autos de resistência funcionam como uma espécie de licença para matar, principalmente negros e pobres.
Um dos autores do projeto, Paulo Teixeira lembra que a maioria das mortes identificadas como auto de resistência não resulta de um confronto entre policiais e suspeitos, mas de execuções. "Os estudos demonstram que 60% desses autos de resistência são execuções. Não há resistência à ação policial. Mas essas execuções são como se tivesse havido resistência, que eles chamam de resistência seguida de morte. Estamos pedindo que elas sejam investigadas, ou seja, toda atividade policial, quando levar à morte do cidadão, tem que ser investigada", ressalta.
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), porém, já fez críticas à proposta, argumentando que não é justo manter um policial preso por ter matado um criminoso em defesa da sociedade: "A primeira vez que o policial militar bater de frente com o marginal, e não com criança, não, com o marginal, ele já corre o risco seríssimo de responder em preventiva. A segunda vez, com toda a certeza, ele vai responder em prisão preventiva, não interessa quem foi abatido do outro lado da linha."
Falta de combustível para viaturas da PM prejudica vigilância em Minas
December 4, 2014 15:38Gabriela Sales - Hoje em Dia
Wesley Rodrigues/Hoje em Dia

A falta de combustível para manter as viaturas da Polícia Militar já prejudica as vigilâncias ostensiva e preventiva em Minas Gerais. No interior, o problema afeta pelo menos três batalhões há cerca de duas semanas. Na capital, a corporação atua há pelo menos seis dias em esquema de rodízio ou racionamento: algumas guarnições recebem, no máximo, 20 litros para rodar por semana.
Essa quantidade é insuficiente para o serviço de segurança pública em Belo Horizonte, segundo a Associação dos Praças da PM (Aspra). Algumas viaturas chegam a percorrer até 400 km por semana. Um Fiat Palio, muito comum na frota da polícia, roda até 12 km/litro na cidade, por exemplo. Com a quantidade de gasolina fornecida, atingiria, no máximo, 240 km de distância.
Na última quarta-feira (3), os policiais do Batalhão de Choque, no bairro Gameleira, não tiveram como reforçar a Operação Natalina, realizada nos principais centros comerciais da capital. Isso porque a unidade foi escolhida para o rodízio. As viaturas permaneceram no pátio e até o ônibus utilizado para o deslocamento da tropa não saiu do local.
Na última segunda-feira, o rodízio atingiu o 34º Batalhão, no bairro Caiçara. “A ordem é conter os gastos operacionais. Sem gasolina, o pátio ficou lotado de viaturas”, conta um sargento, que pediu para não ter o nome revelado.
Policiais ouvidos pelo Hoje em Dia garantem que os chamados de emergência (190) ainda não foram prejudicados. A forma encontrada para economizar combustível foi diminuir o patrulhamento nas ruas. “Não tinha como rodar”, disse um cabo do 34º Batalhão, em referência à região Noroeste na segunda-feira passada.
Em nota, a Superintendência Central de Imprensa do Governo de Minas (Secom) negou a falta de abastecimento e informou que as viaturas dos órgãos de segurança pública do Estado estão circulando normalmente.
“Não existe limitação no abastecimento de combustível, que é feito normalmente e de acordo com a capacidade do tanque de cada viatura. A recomendação de uso racional de insumos é praxe na administração pública estadual, dentro de uma política de uso eficiente de recursos públicos – sem qualquer impacto sobre a atuação dos órgãos de segurança pública”, informou a nota.
Sem informar a vigência ou os valores pagos, o governo disse que há um contrato para fornecimento de combustível feito por meio de licitação com a Ipiranga Distribuidora.
Abastecimento
A Polícia Militar possui, atualmente, 56 postos de combustíveis em Minas Gerais, sendo 15 na Região Metropolitana de BH e o restante no interior do Estado.
O combustível é adquirido no atacado e armazenado nas unidades da PM, Corpo de Bombeiros e Polícia Civil, que possuem postos próprios de abastecimento. Essa é a primeira vez que não há combustível para as viaturas da polícia, segundo a Aspra.
O coordenador do Centro de Pesquisa em Segurança Pública da PUC Minas, Luis Flávio Sapori, acredita que a situação influencia diretamente no aumento da criminalidade. “Esse cenário irá favorecer a elevação de roubos, furtos e homicídios, além da sensação de insegurança da população”, afirmou.
Batalhões
A mesma restrição foi encontrada nas unidades do 16º Batalhão, no bairro Santa Tereza, região Leste de BH, e no 5º Batalhão, no Gameleira, região Oeste, além das unidades de Betim e Contagem (RMBH).
“Sem viatura, não temos como fazer patrulhamento. Os deslocamentos também ficam restritos por causa da pouca gasolina”, salientou um cabo, que pediu para não ser identificado.
No interior
Em algumas unidades do interior, o policiamento também está comprometido devido à falta de combustível. Em Conselheiro Lafaiete, região Central de Minas, os militares do 31º Batalhão estão limitando o serviço. “Parte do patrulhamento está sendo feito a pé, isso quando é possível. Mas permanecem os deslocamentos para atendimentos de urgência e emergência. Por enquanto, o serviço está sendo prestado, resta saber até quando”, descreveu um sargento, que solicitou sigilo do nome.
Na 13ª Região da Polícia Militar, em Barbacena, na Zona da Mata, a restrição preocupa os militares responsáveis pelo serviço de prevenção à criminalidade. “Quero ver quando tivermos que perseguir algum bandido e faltar gasolina para o cerco. Como vamos manter a segurança da população se não temos viaturas?”, indagou um sargento que atua na região, que também pediu anonimato.
Por duas semanas, a unidade do 50º Batalhão de Polícia Militar de Montes Claros, no Norte de Minas, teve que limitar o uso da gasolina nas viaturas. “As bombas estavam no limite e, para não ficarmos sem combustível, a quantidade disponível foi reduzida. O problema é que nosso patrulhamento preventivo ficou comprometido”, conta um cabo, que não quis se identificar. A Aspra informa que o problema afeta também o pleno funcionamento do Corpo de Bombeiros.
Escassez de combustível atinge também a Civil
Nas unidades da Polícia Civil também há escassez de combustível para as viaturas. Para abastecer os veículos, a corporação utiliza as bombas localizadas na garagem da unidade que fica no bairro Santa Efigênia, na região Leste da capital, e em postos de combustíveis conveniados espalhados pela região Centro-Sul de Belo Horizonte. No interior, grande parte desse abastecimento é feito por meio de convênios com postos.
Na última segunda-feira, os policiais receberam a informação de que teriam que economizar gasolina durante as diligências. “Fui abastecer a viatura e colocaram apenas 30 litros. Não deu para percorrer nem a metade do percurso que minha equipe tinha para o dia. O que mais me espantou foi saber que a quantidade era para a semana toda”, conta um investigador, que solicitou anonimato.
A Assessoria da Polícia Civil reconheceu que houve a recomendação para a economia no abastecimento dos veículos, porém disse que o caso foi pontual e que não comprometeu o serviço da corporação.
Com uma frota de 4.342 veículos em todo o Estado, a Polícia Civil informou que não houve nenhuma interrupção no deslocamento das viaturas da unidade.
Porém, a informação de que o problema foi solucionado é contestada por quem realiza o trabalho de investigação. “Estamos proibidos de abastecer nos postos conveniados porque a parceria foi suspensa. E a bomba que temos dentro da corporação está no limite”, contou um agente da polícia, que também solicitou anonimato.
Apenas as operações previamente programadas estão sendo realizadas no Estado. “Como existe essa recomendação de economia de combustível, as prioridades são as operações policiais que já estavam previstas em cada departamento”, explica outro investigador.
Para o Sindicato dos Policiais Civis de Minas Gerais (Sindpol), a falta de gasolina compromete a conclusão das investigações. “É o colapso da segurança pública em Minas. Isso afeta as diligências, os processos de apuração e investigação até nos resultados das operações que levam meses para serem elaboradas. Um trabalho jogado fora”, avalia o presidente do Sindpol, Denilson Martins. (G.S.)
Unidades ambientais adaptam atividades de preservação
Na última terça-feira, o Hoje em Dia noticiou que a falta de combustível atinge veículos que atendem à manutenção e preservação de parques estaduais em Minas.
Há mais de dez dias, as unidades de conservação adaptam as atividades. Em alguns parques, até as marcações de visitas começaram a ser reduzidas por falta de estrutura.
A reportagem procurou novamente a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) para comentar a situação, mas até o fechamento desta edição não havia recebido retorno.
Pimentel mexe no primeiro vespeiro
December 4, 2014 13:54Três secretarias são as mais estratégicas e as mais delicadas na montagem da administração estadual, tidas como verdadeiro “vespeiro”. Estão nessa categoria a Fazenda estadual, a de Planejamento e a Defesa Social, para a qual o governador eleito Fernando Pimentel (PT) antecipou a indicação do deputado federal Bernardo Santana (PR). O próprio indicado se disse “surpreso” depois de ter avisado à família, dias antes, que não iria ser secretário, muito menos desse que é um dos mais complexos setores do Estado. O deputado comentou com um aliado que recebeu mensagem por whatsapp de Pimentel minutos antes de ser anunciado durante encontro com os delegados da Polícia Civil. “Vou te anunciar como secretário agora”, teria dito o petista antes do eufórico discurso.
O anúncio, da forma como foi feita, entre policiais civis, deixou em polvorosa os policiais militares, que trocaram mensagens, também por whatsapp, durante todo o dia de ontem, preocupados com o “desprestígio”. Se a reação ainda é de inquietação na segurança pública, especialmente entre os policiais militares, na Assembleia Legislativa os deputados da futura base aliada manifestaram perplexidade. “Fazer o quê”, dizia um deles, reconhecendo que o “secretariado é do Fernando”.
Delegados querem subsídios
A razão maior do apoio dos delegados novos da Polícia Civil ao governador eleito é uma promessa feita durante a campanha eleitoral. Eles reivindicam ganhar subsídios a exemplo dos promotores e juízes, hoje,na casa dos R$ 20 mil. A proposta é de risco, pode rachar a própria Polícia Civil e quebrar a isonomia com a Polícia Militar. A partir de 1º de abril próximo, o piso salarial das duas polícias será de R$ 4 mil, com o pagamento da última e quarta parcela do reajuste setorizado de 15%. Os novos delegados ganharão como major, R$ 11 mil.
Os delegados mais antigos não aprovam a instituição dos subsídios, que impõe teto e limita gratificações como quinquênios e trintenários, podendo elevar os ganhos a R$ 29 mil para quem está em fim de carreira.
Ao contrário dos promotores e juízes, que integram poderes independentes e autônomos, delegados compõem carreira dentro do Executivo. Se o futuro governador tentar alterar o quadro, estará mexendo em um vespeiro ainda maior.
Orion Teixeira
Assembleia de SP aprova proibição do uso de bala de borracha em protesto
December 4, 2014 10:40Repórter do jornal “Folha de S.Paulo” foi atingida no olho por uma bala de borracha durante protesto em 2013
Foi aprovada na noite desta quarta-feira (3), no plenário da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), a proibição do uso de bala de borracha pela polícia em manifestações.
A proposta, apresentada pelo líder da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) na Alesp, João Paulo Rillo, segue agora para a sanção ou veto do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).
“É a maior conquista dos movimentos sociais nos últimos anos. O direito à livre manifestação é um imperativo da lei. O fato de jornalistas perderem a visão durante as manifestações de junho obrigou a Casa a dar uma resposta à altura”, disse Rillo.
A decisão ocorre um mês depois que uma liminar do Tribunal de Justiça, que já proibia o uso do artefato, foi derrubada. No início de novembro, o desembargador da 3.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça Ronaldo Andrade, cassou a liminar que proibia a Polícia Militar de São Paulo usar balas de borracha durante manifestações.
À época, o comandante-geral da PM, coronel Benedito Roberto Meira, concordou com a decisão do TJ. Segundo relato do coronel em novembro, a bala de borracha é uma ferramenta que não oferece riscos à integridade física das pessoas.
Bol Noticias
Denúncia de esquema de corrupção de emendas parlamentares para prefeituras envolve Senador Romero Jucá
December 4, 2014 10:361ª Turma mantém decisão de determinou desmembramento de inquérito contra Romero Jucá
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal desproveu recurso (agravo regimental) interposto pela Procuradoria Geral da República contra decisão monocrática do ministro Marco Aurélio que determinou o desmembramento do Inquérito (INQ) 2116, mantendo no STF apenas a parte relativa ao senador Romero Jucá (PMDB-RR). O inquérito investiga suposto desvio de verbas federais em obras municipais.
A PGR alegava a conexão entre as condutas dos investigados no esquema, supostamente operacionalizado pelo senador, que teria elaborado emendas parlamentares com a finalidade de transferir recursos federais ao Município de Cantá (RR). Segundo a Procuradoria, há evidências de que o prefeito de Cantá, Paulo Peixoto, teria realizado licitações superfaturadas e repassado ao senador parte das verbas, a título de comissão pela apresentação das emendas. A manutenção do desmembramento poderia comprometer a eficácia da aplicação da lei penal e, como a investigação tramita há dez anos, haveria ainda risco concreto de prescrição em caso de remessa à instância inferior.
O ministro Marco Aurélio, relator do inquérito, reiterou os fundamentos da decisão monocrática em que assentou a incompetência do STF para a supervisão do inquérito em relação a Paulo Peixoto. “O Supremo atua a partir do que delimitado pela Constituição Federal, e sua competência está definida de forma exaustiva na Carta da República”, afirmou. “Normas instrumentais comuns, como as alusivas à conexão probatória e a continência, não podem aditar a Carta Federal”.
O relator afastou também a alegação do risco prescricional. “O que se articula sobre a prescrição, além da irrelevância – ante o fato de o fenômeno poder ocorrer estando a investigação agrupada ou não –, é incapaz de alterar a conclusão a respeito da incompetência do Supremo, que é absoluta”, concluiu.
A decisão unânime foi tomada na sessão desta terça-feira (2). O ministro Luís Roberto Barroso declarou-se impedido e não participou do julgamento.
Diga NÃO à revogação do Estatuto do Desarmamento
December 4, 2014 7:14Quanto mais armas em circulação, maior o número de homicídios. O deputado Peninha Mendonça propôs um projeto de lei para revogar o Estatuto do Desarmamento. Isso não pode acontecer! Com a derrubada da lei a vida dos brasileiros é colocada em risco.
Diga NÃO à revogação do Estatuto do
Desarmamento. #MenosArmasMaisVidas

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Suspenso julgamento sobre responsabilidade civil do Estado por superpopulação carcerária
December 4, 2014 5:59Pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso suspendeu, na sessão plenária desta quarta-feira (3), no Supremo Tribunal Federal (STF), o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 580252 em que se discute a responsabilidade do Estado por danos morais decorrentes de superlotação carcerária. O RE teve repercussão geral reconhecida e a decisão se refletirá em pelo menos 71 casos sobrestados em tribunais de todo o país. O julgamento foi interrompido após o voto do relator, ministro Teori Zavascki, que considerou haver responsabilidade civil do Estado por não garantir as condições mínimas de cumprimento das penas nos estabelecimentos prisionais. O entendimento foi acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes.
No caso concreto, a Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul (DP-MS), em favor de um cidadão condenado a 20 anos de reclusão, cumprindo pena no presídio de Corumbá (MS), recorreu contra acórdão do Tribunal de Justiça local (TJ-MS) que, embora reconheça que a pena esteja sendo cumprida “em condições degradantes por força do desleixo dos órgãos e agentes públicos”, entendeu não haver direito ao pagamento de indenização por danos morais.
Da tribuna, o representante da Defensoria Pública sustentou que, ao não garantir as condições necessárias para o cumprimento da pena, fato que violaria o princípio da dignidade humana, o Estado passa a ter responsabilidade objetiva pela situação. Também da tribuna, o procurador de Mato Grosso do Sul reconheceu as más condições do presídio de Corumbá, mas alegou que o pagamento de indenização não seria razoável, pois comprometeria recursos que deveriam ser utilizados para melhorar o sistema penitenciário.
Em seu voto, o ministro Teori Zavascki destacou não haver qualquer controvérsia quanto aos fatos narrados na ação, nem quanto à configuração do dano moral. Lembrou ainda que o próprio acórdão do TJ-MS, que negou o pagamento da indenização, deixa claro ser “notório que a situação do sistema penitenciário sul-mato-grossense tem lesado direitos fundamentais, quanto à dignidade, intimidade, higidez física e integridade psíquica”.
O ministro enfatizou que a discussão no RE que chegou ao STF refere-se unicamente à responsabilidade civil do Estado de responder sobre ação ou omissão de seus agentes, conforme preceitua o artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal. Segundo o relator, o dispositivo constitucional é auto aplicável, não sujeito a intermediação legislativa ou a providência administrativa, bastando apenas que tenha ocorrido o dano e seja demonstrado o nexo causal com a atuação da administração pública ou de seus agentes para que seja configurada a responsabilidade civil. Para o ministro, não há dúvida de que o Estado é responsável pela guarda e segurança das pessoas submetidas a encarceramento enquanto permanecerem detidas.
“E é dever do Estado mantê-lo em condições carcerárias de acordo com mínimos padrões de humanidade estabelecidos em lei, bem como, se for o caso, ressarcir os danos causados que daí decorrerem”, acentuou o relator.
O ministro observou também que a jurisprudência do STF já deixou claro, em mais de uma ocasião, haver responsabilidade objetiva do Estado pela integridade física e psíquica sobre aqueles que estão sob custódia estatal.
O relator ressaltou ser necessária a adoção de políticas públicas sérias para eliminar ou, ao menos, reduzir as violações à integridade e à dignidade das pessoas dos presos, mas isso não significa que as atuais violações causadoras dos danos morais ou pessoais aos detentos devam ser mantidas impunes, sobretudo quando o acórdão recorrido admite que a situação do sistema penitenciário sul-mato-grossense tem lesado direitos fundamentais relativos à intimidade e à integridade física e psíquica.
Lembrou, ainda, que as violações aos direitos fundamentais dos detentos não podem ser ignoradas sob o argumento de que as indenizações não resolveram o problema global das más condições carcerárias.
“Esse argumento, se admitido, acabaria por justificar a perpetuação da desumana situação que se constata em presídios. Ainda que se admita não haver o direito subjetivo individual de deduzir em juízo pretensões que obriguem o Estado a formular e implementar política pública determinada, certamente não se pode negar ao indivíduo encarcerado o direito de obter, inclusive judicialmente, pelo menos o atendimento de prestações inerentes ao que se denomina mínimo existencial”, afirmou.
O ministro assinalou que não se pode excluir das obrigações estatais em matéria carcerária a de indenizar danos individuais de qualquer natureza causados por ação ou omissão do Estado a quem está submetido a encarceramento por seu comando.
“A invocação seletiva de razões de Estado para negar especificamente a uma categoria de sujeitos o direito à integridade física e moral não é compatível com o sentido e alcance do princípio da jurisdição, pois estaria se recusando aos detentos os mecanismos de reparação judicial dos danos sofridos, deixando-os privados de qualquer proteção estatal, numa condição de vulnerabilidade juridicamente desastrosa”, sustentou.
- Leia a íntegra do voto do relator, ministro Teori Zavascki.
PR/FB
Processos relacionados RE 580252 |
Se “todos” são corruptos, eu também...
December 4, 2014 5:57Diante de escândalos tsunâmicos como o da Petrobra$, que desnudam em toda sua inteireza o lado canalha de alguns membros da classe dominante (a canalhice, de qualquer modo, não é apanágio exclusivo dessa classe), uma das coisas que mais impressionam é o discurso legitimador da canalhice (sobretudo quando ela é engendrada por uma poderosíssima organização criminosa), verbalizado de forma plácida e diáfana, para não dizer macunaímica (herói malandro), no sentido de que a corrupção (a sonegação, o malfeito, a malandragem) se trata de algo “natural”, “comum”, algo enraizado na “tradição” e nos “costumes” do povo brasileiro. Lula, em 1995, quando eclodiu o mensalão do PT (depois do mensalão do PSDB), reagiu (em Paris) dizendo que todos os partidos políticos fazem caixa 2; a corrupção é coisa da “nossa cultura” (José Eduardo Cardozo); “Não há no Brasil um gestor público que não tenha um processo” (Dalva Dias, PDT-SC).
02. Nunca antes neste país se tornaram tão necessários dois esclarecimentos: (a) a corrupção não é apenas um problema individual (pessoal, ético), mas é, antes de tudo, isso; (b) a corrupção, sobretudo daqueles que dominam/governam a nação, é uma canalhice maligna de magnitude hecatômbica porque afeta também (1) o mercado e a economia (mascara a concorrência e bilhões de reais são desviados do crescimento do país), (2) a política e a democracia (tornando-a ilegítima), (3) a Justiça e o império da lei (assim como a força das instituições) assim como (4) a própria sociedade (canaliza a riqueza para os mais ricos e desmorona o chamado “capital social”, fundado na confiança necessária para o bom funcionamento societal).
03. Das nefastas consequências da corrupção (para a economia, política, império da lei e sociedade) vamos cuidar em outro artigo. Dela, como problema, desde logo, individual (ético), vamos tratar em seguida, pedindo licença para revisitar algumas noções elementares de ética e de moralidade transmitidas pelos professores da área. Triste e degenerada é a sociedade em que um político ou administrador público afirma que o malfeito e a corrupção é coisa de “todo mundo”, é da tradição, dos costumes. Para começar: não é verdade que “todo mundo” seja corrupto. Toda época tem sua estrutura moral (Aranguren), ou seja, suas pautas de conduta, seus ideais, seus fins, seus valores. A vida, ainda que marcada por debates e embates, não pode se desconectar de algumas margens limitadoras, sob pena de se embrenhar para o mundo da corrupção, do mau-caratismo, da malandragem, da desonestidade, enfim, da falta de moral (e de ética). Em nenhum instante da nossa vida, mas sobretudo quando participamos da vida política da cidade ou do país (da “polis” ou da res pública), podemos admitir a mancha ou a mácula do mau-caratismo, do canalhismo.
04. A corrupção é generalizada no nosso país (isso é verdade: FHC, por exemplo, admitiu numa entrevista à Folha que houve corrupção para aprovar a Emenda da Reeleição, em 1996), mas nem todo mundo é corrupto (Renato J. Ribeiro); de outro lado, ninguém é obrigado a se sujeitar a padrões nitidamente podres ou canalhas (recorde-se que um dos sentidos da palavra corrupção é descrever um fruto podre). Ao “clube” dos empreiteiros (para se citar um exemplo), que agora andam dizendo que foram “extorquidos”, faltou precisamente uma postura ética firme contra a tradição, o costume, a cultura. Por força da ética, não somos obrigados a seguir os costumes imorais (a canalhice) enraizados em algumas práticas econômico-financeiras, por exemplo, muito menos na tradição política imoral do nosso País. Existiria por acaso alguma força sobrenatural com poder para levar a maioria dos agentes econômico-financeiros, políticos e públicos (há exceções, claro) a se comportarem (quase sempre) de maneira irregular? Não.
05. Todas as vezes que nos deparamos com uma tradição ou costume ou com uma ordem externa, devemos prestar atenção no seu conteúdo e na sua natureza. Não podemos concordar muito menos praticar a canalhice. A Ética diz respeito ao foro interno da nossa vontade (e liberdade). Somos livres (em geral) para decidir pelo bem ou pelo mal (pelo certo ou pelo errado – veja Savater). Podemos dizer “sim” ou “não” (veja Octávio Paz). O preço que pagamos por contarmos com essa liberdade é a responsabilidade. Pelos atos que praticamos devemos ser sempre responsáveis. E nesse caso nem a ordem externa nem a tradição nem os costumes nos absolve. Nós, seres humanos, somos distintos dos animais (das plantas e dos minerais) porque contamos (dentro de certas medidas) com o que se chama liberdade (ainda que condicionada, mas liberdade). O ato de corromper ou de ser corrompido (que é uma canalhice) é fruto dessa liberdade, por isso que a corrupção é, antes de tudo (mas não somente), um problema ético e moral. Se cada um de nós elevássemos o padrão ético (como os suecos fizeram em 1841, por exemplo), teríamos (com certeza) menos corrupção e menos violência no país.
Saiba mais:
06. Os animais não podem alterar seus códigos biológicos (são o que são e não conseguem alterar o seu caminho). Fazem somente o que estão programados naturalmente para fazer. As formigas são da forma que são e não é facultado a cada uma delas alterar sua natureza. Os animais não podem ser reprovados porque não sabem se comportar de outro modo (Fernando Savater). Ou seja: não contam com autodeterminação (capacidade de entender e de querer). Os seres humanos também somos programados (biologicamente), mas conjuntamente com a constituiçãobiológica também contamos com uma programação cultural, que é guiada, em grande parte, pela nossa autodeterminação. Por isso é que “sempre podemos optar finalmente por algo que não esteja no programa. Podemos dizer “sim” ou “não”, quero ou não quero. Nunca temos um só caminho a seguir. Temos vários” (Savater).
07. "Somos indivíduos livres e nossa liberdade nos condena a tomarmos decisões durante a nossa vida” (Sartre). Premissa básica da convivência humana é que não podemos fazer tudo que queremos. Por mais poderoso que alguém seja, a vida não pode seguir os seus caprichos. Não existe liberdade sem limites e sem responsabilidade. Embora dentro de certos parâmetros, podemos inventar e eleger (em grande parte) nossa forma e nosso estilo de vida. Mas também podemos nos equivocar (isso é certo – errare humanum est). A essa arte de viver bem (com expurgo da canalhice) chamamos de ética que, na verdade, não significa apenas a “arte de viver bem”, senão a “arte de viver bem humanamente” (respeitando nossos semelhantes, ou seja, ou ostros caminhantes, os direitos humanos, os valores básicos de convivência etc.). Tratar nossos semelhantes (os outros caminhantes) como “insetos” (ou ignorá-los completamente, como é a postura da indiferença) significa ferir profundamente os preceitos éticos que norteiam nossa existência.
08. Uma coisa é lutar pela sobrevivência, estando isolado em uma ilha (como foi o caso de Robinson Crusoé, criado por Daniel Defoe, em 1719). Outra bem distinta é viver em sociedade (ou seja: “con-viver” com seus semelhantes, com os outros caminhantes). Defoe (pelo que consta na Wikipedia) “inspirou-se na história verídica de um marinheiro escocês,Alexander Selkirk, abandonado, a seu pedido, numa ilha do arquipélago Juan Fernández, onde viveu de 1704 a 1709. Robinson Crusoe herda desta história o mito da solidão, na medida em que vive sozinho durante vinte e cinco anos, antes de encontrar a personagem Sexta-Feira. O romance simboliza a luta do homem só contra a natureza, a reconstituição dos primeiros rudimentos da civilização humana, testemunhada apenas por uma consciência e dependente de uma energia própria”.
09. A partir do momento em que outro ser humano aparece na nossa “ilha” (que não é a mesma de Robinson Crusoé), não há como não tratá-lo como semelhante (como outro caminhante). Nesse caso, surge mais uma premissa básica de convivência: jamais podemos fazer aos outros o que gostaríamos que não fizessem conosco (no mundo oriental, fala-se no princípio da “ahimsa”). A Ética, a partir do momento em que temos que conviver com outros caminhantes (semelhantes), evolui da “arte de viver bem” para a “arte de viver bemhumanamente”. É que temos que viver com os outros ou contra os outros, porémhumanamente (ou seja: entre seres humanos, como diz Savater). O que transforma nossa vida em vida humana é que, não estando nós numa ilha isolada, como Robinson Crusoé, somos todos compelidos a passar todos os dias da nossa vida em companhia de outros seres humanos, interagindo com eles, falando com eles, negociando com eles, amando, construindo sonhos ou castelos, fazendo projetos, jogando, discutindo, concordando, discordando, debatendo etc. Mas todos somos seres humanos (e como humanos todos devemos ser tratados).
10. Cada dia fica mais claro no nossoo país que nem o Estado, nem o mercado, nem o capitalismo egoísta/selvagem, nem os políticos, muito menos os partidos, ou seja, nem o sistema político nem o sistema econômico está cumprindo o que deveria ser feito, ao contrário, a desconfiança é generalizada porque no lugar do que deveriam fazer eles incrementam cada vez mais a desigualdade, a concentração do poder e da riqueza, a contaminação, a destruição do meio-ambiente, o desemprego, a má-qualidade do serviço público, a corrupção, a violência, os desmandos e, o que é mais importante, “a degradação dos valores que sustentam a sociedade, onde tudo é aceitável e ninguém é responsável” (Stiglitz). O “cada cabeça um voto” (eixo da democracia representativa clássica) se transformou em cada voto um dólar. Daí todo questionamento que se faz frente à democracia vigente, marcada pelo compadrismo espúrio entre a economia corrupta e a política assim como entre a política e a governança. O mau-caratismo (a canalhice – um mal de todos os tempos) só pode ser combatido com a Ética e a cidadania.
11. A corrupção sórdida que invadiu até às vísceras a Petrobra$ equivale no plano esportivo a fazer um gol com a mão. Trata-se de um comportamento imoral ou antiético. Gilberto Freyre, em 1938, falou da habilidade dos mulatos brasileiros no futebol, da astúcia, da espontaneidade individual (veja Ronaldo Helal, O Globo de 02.11.12, p. 19). Na cultura brasileira, a partir daí, fala-se no jogador competente, regular, esforçado, assim como no astuto, no malandro. Ambos possuem espaços na cultura brasileira (tal qual bem notou Antonio Cândido, com sua crítica à “dialetica da malandragem”). Também há quem admira heróis malandros (Macunaíma dá bem a ideia disso). Isso, aliás, explicaria a atitude daqueles que apoiam o gol feito com as mãos. Mas há atos, costumes, convenções, regras e convicções gerais que podem ser imorais (ou más ou erradas). Por mais que da nossa cultura faça parte o herói malandro, é claro que não podemos concordar com a malandragem, com o engodo, com o errado. Daí censurarmos o gol feito com a mão, que é, antes de tudo, imoral. Ninguém pode se beneficar da malandragem.
12. Os humanos, diz o filósofo Savater (Ética de urgência, p. 119), “somos maus o quanto nos deixam ser. Se alguém acredita que pode fazer algo e alcançar alguma vantagem, se está completamente seguro de que nada vai ocorrer, pois o fará”. Se o mal (a canalhice) e a malandragem não são censurados, reprovados, tudo continua como está. Não é verdade que a ética só vale para alguns momentos, podendo ser suspensa em outros. Ela nos vincula para toda a vida. Nos concretos atos da nossa vida, quando em jogo está o (superior) plano ético, você não tem que perguntar a ninguém o que deve ser feito: pergunte a você mesmo (Savater). E mais, não vale ser ético somente durante um trecho da sua vida. Por quê? Como bem disse, com toda sabedoria e sensatez, a ministra do STF, Cármen Lúcia: “A vida é igual a uma estrada. Não adianta você dizer que foi na reta certinho mil quilômetros e depois você entra na contramão e pega alguém. É a mesma coisa. Você tem que ser reto a sua vida inteira. Independente do que o outro fizer, independente de o outro atravessar a estrada. Se você estiver certo, você terá contribuído para o fluxo da vida ser mais fácil. Isso no serviço público muito mais”.
P. S. Participe do nosso movimento fim da reeleição (veja fimdopoliticoprofissional. Com. Br). Baixe o formulário e colete assinaturas. Avante!
Professor
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). [ assessoria de comunicação e imprensa +55 11 991697674 [agenda de palestras e entrevistas] ]
Lei Antifumo entra em vigor em todo o país
December 4, 2014 5:52A partir de (3), passa a valer em todo o país a chamada Lei Antifumo que proíbe, entre outras coisas, fumar em ambientes fechados públicos e privados. A estimativa é que as novas regras influenciem os hábitos de 11% da população brasileira, composta por fumantes.
Aprovada em 2011, mas regulamentada em 2014, a Lei 12.546 proíbe o ato de fumar cigarrilhas, charutos, cachimbos, narguilés e outros produtos em locais de uso coletivo, públicos ou privados, como halls e corredores de condomínios, restaurantes e clubes – mesmo que o ambiente esteja parcialmente fechado por uma parede, divisória, teto ou toldo.
Em caso de desrespeito à norma, os estabelecimentos comerciais podem ser multados e até perder a licença de funcionamento.
Entre os frequentadores de bares e restaurantes, a lei não é unanimidade. A estudante Fábia Oliveira, 18 anos, disse ser a favor de leis mais rigorosas contra quem fuma em ambientes fechados. “É um desrespeito com quem não gosta de cigarro. A pessoa que fuma prejudica todos que estão à sua volta. Você acaba se prejudicando, contra a sua vontade, pela escolha dos outros. Ninguém é obrigado a sentir o cheiro de cigarro”, acrescentou.
O supervisor Diego Passos, 31 anos, é contra a lei e acredita que a norma não surtirá efeito. “Quem fuma dentro de um bar, por exemplo, vai continuar fumando. Não poderei ir a uma boate, a um bar porque fumo? Nenhuma lei é capaz de fazer uma pessoa parar de fumar. Além do mais, não há fiscalização”, disse.
A norma que entra em vigor hoje extingue os fumódromos e acaba com a possibilidade de propaganda comercial de cigarros, mesmo nos pontos de venda, onde era permitida publicidade em displays. Fica liberada apenas a exposição dos produtos, acompanhada por mensagens sobre os males provocados pelo fumo.
Além disso, os fabricantes terão que aumentar no próprio produto os espaços para avisos sobre os danos causados pelo tabaco. Pela nova regra, a mensagem deverá ocupar 100% da face posterior das embalagens e de uma de suas laterais.
Será permitido fumar em casa, em áreas ao ar livre, parques, praças, áreas abertas de estádios de futebol, vias públicas e tabacarias, que devem ser voltadas especificamente para esse fim. Entre as exceções estão também cultos religiosos, onde os fiéis poderão fumar caso faça parte do ritual.
Para o presidente da regional de São Paulo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Percival Maricato, o dia a dia de bares e restaurantes deve mudar pouco, uma vez que a lei já vem sendo cumprida pela maior parte dos estabelecimentos mesmo antes da regulamentação.
“A meu ver, não vai mudar coisa alguma. Já estava proibido fumar em locais fechados. Mas achamos que a lei é um tanto leonina. Há excessos visíveis. O infeliz do fumante é tratado como um leproso na idade média”, disse.
Para Marciato, as novas normas representam uma espécie de regulação que vem sendo imposta ao setor. “Daqui a pouco, bares e restaurantes vão parecer uma repartição pública, com cartazes e dizeres. E estamos falando de um local onde as pessoas vão para descontrair. Há cada vez mais intervenção do Estado, dizendo o que o indivíduo pode ou não pode fazer e limitando a liberdade.” Ele lembrou que a fiscalização nos bares e restaurantes ficará a cargo dos Procons regionais.