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Política, Cidadania e Dignidade

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April 3, 2011 21:00 , von Unbekannt - | No one following this article yet.

Milhares prometem "Cancelaço" se operadoras impuserem limite

April 17, 2016 9:51, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE



Luis Ushirobira/Info
Banda Larga
Banda Larga: polêmica começou quando a Vivo informou que os novos contratos de Vivo Internet Fixa virão com uma cláusula que estabelece o bloqueio após o limite atingido no mês
Luiza Belloni, doHuffPost Brasil
Os brasileiros não estão nada satisfeitos com a proposta das operadoras de impor uma franquia de consumo de banda larga fixa.
A polêmica começou quando a Vivo informou que os novos contratos de Vivo Internet Fixa virão com uma cláusula que estabelece o bloqueio após o limite atingido no mês, que varia entre 10 GB e 130 GB.
Em pouco tempo, foram criados grupos e petições nas redes sociais que são contra a nova medida. No Facebook, o grupo "Movimento Internet Sem Limites" e tem mais de 338 mil curtidas e o abaixo-assinado "Contra o Limite na Franquia de Dados na Banda Larga Fixa", petição online que será enviada às operados, à Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e aos Ministérios Públicos, conta com mais de um milhão de assinaturas.
A Proteste - Associação de Consumidores também lançou ontem uma petição online contra o limite de uso de dados de internet dos serviços de banda larga fixa.
Também no Facebook, o grupo "CANCELAÇO - Internet Fixa" está ganhando cada vez mais adeptos. O nome da página já deixa claro seu objetivo: um grande boicote às operadoras, caso permaneçam com a medida.
"Caso as operadoras de telefonia fixa não voltem atrás na imposição do limite de tráfego para banda larga, iremos todos cancelar os serviços contratados", diz a descrição do evento, que já conta com mais de 30 mil interessados e 22 mil confirmados. "Sem clientes, como vocês poderão nos sacanear?"
A ideia é cancelar todos os contratos com as operadoras no dia 1º de janeiro de 2017, dia em que a Vivo pretende implantar a franquia de dados. Segundo a empresa, apesar dos contratos mais recentes já virem com a cláusula que impõe limite à banda larga, estes consumidores terão "condições promocionais até 31/12/2016 de manutenção do serviço de internet sem bloqueio, mesmo após o término da franquia de dados contratada."
Vale lembrar, contudo, que o cancelaço pode não ser uma boa ideia para aqueles que contrataram a internet fixa da Vivo antes de 05 de fevereiro deste ano. Isso porque o limite de dados só é válido para os contratos firmados após esta data. Os contratos anteriores continuam com o uso ilimitado da internet fixa.
Ou seja, se você aderir ao evento e cancelar seu contrato, que foi firmado antes de 05 de fevereiro de 2016, você perderá o uso ilimitado da internet fixa, caso a Vivo não volte atrás e cancele a o uso de franquia de consumo da banda larga.
Se depender do Chief Revenue Officer da Telefônica Vivo, Christian Gebara, o limite será implantado. Em entrevista ao Tecnoblog, Gebara afirmou que impor limite à internet fixa é "um caminho sem volta, por ser uma tendência adotada mundialmente."



Audiência de custódia

April 17, 2016 9:21, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE



 A audiência de custódia pode se revelar uma forma de garantir maior seguridade contra o abuso policial e impedir prisões preventivas arbitrárias.
Em 1992 o Brasil ratificou a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica), que prevê que “toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”.
O Projeto de Lei nº 554/2001 do Senado Federal tem por objetivo alterar o artigo 306 do Código de Processo Penal para incorporar essa audiência.
No âmbito do Estado de São Paulo ela foi recentemente implantada pelo Provimento Conjunto 03/2015, editado pela Presidência do Tribunal de Justiça e pela Corregedoria Geral de Justiça aos 22/1/2015.
Isso significa que toda pessoa presa em flagrante deverá ser apresentada ao juiz em até 24 horas.
A iniciativa tem apoio do Conselho Nacional de Justiça. Isso porque existe um número considerável de pessoas presas provisoriamente, ou seja, sem condenação definitiva.
A audiência de custódia poderá ser dispensada a depender das circunstâncias, como por ex., se o preso estiver internado.
A entrevista com o preso servirá para que o juiz saiba mais sobre sua qualificação, estado civil, grau de alfabetização, meios de vida ou profissão, local da residência e lugar onde exerce sua atividade. Circunstâncias objetivas da prisão também serão exploradas.
Não se trata de antecipação do interrogatório previsto em lei para a fase final do processo. Não se discutirá o delito imputado.
O juiz terá condições de decidir pelo relaxamento da prisão em flagrante (no caso de detectar ilegalidade); pela sua conversão em prisão preventiva (para garantia da ordem pública, por ex.) ou pela concessão de liberdade provisória (quando a manutenção da prisão não for imprescindível).
Se houver suspeita de abuso policial ou necessidade de encaminhamento assistencial (novidade!), o juiz deverá requisitar exame clínico e de corpo de delito do autuado.
A audiência de custódia por ora não se realizará durante o plantão judiciário.
A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol) ajuizou a ação direta de inconstitucionalidade 5.240 para criticar a inovação. Argumenta que a audiência somente poderia ter sido criada por lei federal e jamais por provimento, o que, no seu dizer, configurou abuso de poder. Compreende-se a preocupação. Afinal, a polícia terá dificuldades para efetivar as apresentações, especialmente quando não puderem ser feitas de imediato, caso em que o preso terá de ser recolhido e apresentado assim que possível, mas dentro do prazo. Aliás, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro já relaxou prisão e determinou soltura pela falta de observância do prazo de 24 horas...
A Associação Paulista do Ministério Público também já peticionou contra o provimento, por entender que o Tribunal criou obrigação para os seus associados sem a devida base legal.
De qualquer forma, o Código de Processo Penal já autoriza, há décadas, que o juiz realize mais de um interrogatório, sempre que isso for necessário. E a polícia judiciária sempre foi auxiliar do juiz na promoção da justiça penal.
Não se discute que ainda existem muitos abusos e que a apresentação do preso facilitará a constatação e apuração deles, bem como a punição dos faltosos. Afinal, até então o juiz, via de regra, só tinha contato com o preso algumas semanas depois da prisão, quando vestígios de agressões, por ex., já não existiam.
Além do mais, o juiz terá muito mais condições de avaliar se a pessoa deverá ou não permanecer presa. “Quem vê cara não vê coração”, mas o contato pessoal, na maioria das vezes, facilita bastante essa avaliação. Em consequência, várias pessoas deixarão de permanecer presas por considerável tempo. E quiçá o juiz não solte quem soltaria sem esse contato...
É importante ressaltar que, ainda que tenha havido prisão em flagrante, a custódia antes da condenação definitiva deve ser excepcional. Muitas vezes até mesmo quando sobrevém condenação não se opta por prisão porque o sentenciado acaba tendo direito às chamadas penas alternativas.
Isso posto, antes de qualquer pronunciamento apaixonado do tipo “bandido não tem que ter direito”, “bandido bom é bandido morto”, é preciso que formemos a nossa convicção sobre a novidade com isenção, técnica e sem nos esquecermos de que o sistema punitivo é organizado e regulamentado... que o tempo do “olho por olho, dente por dente” já passou... e, principalmente, que preguiça não combina com justiça...
    Autor
  • Adriano Rodrigo Ponce de Oliveira

    Juiz de Direito - Professor no Unisalesiano - Lins(SP) - Ex-Delegado de Polícia - Mestre em Direito pela ITE - Bauru(SP) - Bacharel em Direito pela Fundação Univem (ficarei honrado se visitar meu blog www.direitoilustrado.blogspot.com, meu Facebook Adriano Ponce Jurídico e meus vídeos em www.youtube.com/adrianoponce10)

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)

OLIVEIRA, Adriano Rodrigo Ponce de. Audiência de custódia: benefícios e controvérsiasRevista Jus Navigandi, Teresina, ano 21n. 467115 abr. 2016. Disponível em: . Acesso em: 17 abr. 2016.



Decano não conhece MS que pedia para Eduardo Cunha não votar sobre pedido de impeachment

April 17, 2016 9:20, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Em decisão tomada na tarde deste sábado (16), o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), não conheceu pedido do deputado federal Jean Wyllys (PSOL/RJ) para que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, fosse impedido de votar na sessão que vai analisar a admissibilidade do pedido de impeachment contra a presidente da República, Dilma Rousseff, que acontece neste domingo (17). A decisão foi tomada na análise do pedido de liminar no Mandado de Segurança (MS 34139) impetrado na corte pelo parlamentar fluminense.

Ao pedir a concessão de medida liminar, com expedição de ofício ao presidente da Câmara dos Deputados para que ele se abstenha de manifestar voto, o autor do mandado de segurança frisou que os principais jornais do país publicaram matérias em que o deputado Eduardo Cunha revelou que vai votar sobre a admissibilidade do processo de impeachment. E, segundo Jean Wyllys, o artigo 17 (parágrafo 1º) do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, dispõe que o presidente da Casa não pode votar, a não ser em casos de escrutínio secreto ou para desempatar o resultado de votação ostensiva.

Em sua decisão, o ministro não conheceu do mandado de segurança e considerou prejudicado, em consequência, o pedido de liminar.

MB/LF



Novo CPC altera forma de cobrança das cotas condominiais em atraso

April 17, 2016 9:16, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

A natureza de título extrajudicial para as cobranças condominiais em atraso garante os princípios básicos de certeza, liquidez e exigibilidade, e asseguram, através da aplicação jurídica correta, a solução do conflito de maneira rápida e eficiente.
O novo Código de Processo Civil (CPC) começou a vigorar no último dia 18 de março e trouxe importantes alterações na forma de cobrança das cotas condominiais em atraso.
A mais importante delas é a que estabelece que as cotas passaram a ter natureza de título executivo extrajudicial, o que faz com que a cobrança ocorra judicialmente, através de execução, e torna o recebimento da dívida bem mais rápido.
De acordo com o Código Civil, é dever do condômino arcar com o pagamento do rateio das despesas ordinárias e extraordinárias, desde que aprovadas em assembleia. O provento desses custos é que dá origem à instituição do condomínio, com uma Convenção Condominial, onde todos possuem direitos e deveres.
No novo normativo, os condomínios não esperam mais pela fase de conhecimento – na qual se produzem as provas necessárias para que o julgador tenha elementos suficientes para proferir uma sentença –, pois, com a natureza de título extrajudicial, o crédito da taxa condominial passa a ser executado.
A partir da citação do devedor, haverá o prazo de três dias para a quitação da dívida ou a nomeação de bens que serão penhorados, sob o risco de que o imóvel que originou o passivo entre no rol empenhado.
Na prática, isso significa que, não ocorrendo o pagamento do saldo devedor no prazo de três dias, o Oficial de Justiça voltará à localização do condômino para lavrar a Ordem de Penhora – documento que informa que o bem servirá de garantia da dívida. Essa informação também constará na matrícula do imóvel e no atestado devolvido ao processo judicial para a continuidade do processo de cobrança.
Outra inovação do novo CPC é a autorização do Oficial de Justiça realizar a intimação do devedor através da entrega da correspondência ao funcionário da portaria. Este poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, a ausência do destinatário do documento.
A citação também poderá ser enviada por correio, bastando que o responsável pelo recebimento das correspondências assine o aviso remetido (A.R).

PRAZO PARA RECURSO

Com a junção da Ordem de Penhora ao processo, o devedor terá o prazo de 15 dias para ingressar com recurso. Neste, também existe uma importante mudança trazida pelo Código de Processo Civil: o embargo somente será recebido pelo juiz, se abordar questões técnicas, como excesso de execução ou erro de penhora; e não mais como uma simples defesa por parte do executado.
Passado o prazo para recurso, o devedor, mediante autorização judicial, poderá ter o nome incluído no Sistema de Proteção ao Crédito (SPC). O próximo passo será o leilão, cujo bem poderá ser vendido a qualquer preço, exceto se o valor for muito abaixo do praticado no mercado.

 DOCUMENTOS NECESSÁRIOS PARA A EXECUÇÃO

Para a petição inicial do processo de execução, é necessário anexar o título de propriedade, a ata de eleição do síndico, a planilha da dívida contendo o valor principal, juros, multa, correção monetária; e a ata com a previsão orçamentária e a devida divisão de valores para cada unidade, além da segunda via dos boletos não pagos.
Se a unidade devedora possuir fiador ou credor hipotecário ou usufrutuário, o mesmo também deverá ser intimado.
No caso de não haver a disponibilidade de todos os documentos citados acima, é possível ingressar com uma ação de cobrança de cotas do condomínio, ao invés da execução.
O que pode-se concluir é que a natureza de título extrajudicial para as cobranças condominiais em atraso garante os princípios básicos de certeza, liquidez e exigibilidade, e asseguram, através da aplicação jurídica correta, a solução do conflito de maneira rápida e eficiente.


Autor

  • Renato Savy

    Advogado formado pela Universidade São Francisco. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Metrocamp; e em Direito Civil e Processo Civil na Escola Superior de Direito - Proordem.
    Mestrado em Direito na Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep).
    Titular do escritório Ferraz Sampaio Consultoria e Assessoria Jurídica, em Campinas/SP




Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)




A mentira do réu e a dosimetria da pena

April 17, 2016 9:14, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Se o réu mentir em seu interrogatório, negando a prática do crime por ele cometido, ao apresentar, por exemplo, uma versão fantasiosa dos fatos, com o nítido propósito de obter uma injusta absolvição, deve o Juiz aumentar sua pena-base?
O Juiz, ao fixar a pena do réu, deve levar em consideração, inicialmente, as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, dentre as quais se encontra a valoração a respeito da personalidade do agente criminoso.
personalidade, por sua vez, está vinculada às qualidades morais, às distorções de caráter, à índole do sujeito, que são extraídos de sua forma habitual de ser, agir e reagir. GUILHERME NUCCI (in Individualização da pena, RT, 2005, p. 207) cita alguns exemplos de aspectos negativos da personalidade, que evidenciam o modo de ser de uma determinada pessoa, a saber: agressividade, frieza emocional, insensibilidade acentuada, passionalidade exacerbada, maldade, irresponsabilidade no cumprimento das obrigações, ambição desenfreada, insinceridade, desonestidade, covardia, hostilidade no trato, individualismo exagerado, intolerância, xenofobia, racismohomofobia, perversidade, dentre outros.
Dessa forma, se o réu mentir em seu interrogatório, negando a prática do crime por ele cometido, ao apresentar, por exemplo, uma versão fantasiosa dos fatos, a fim de obter uma injusta absolvição, justificado está o aumento de sua pena-base, com fundamento na personalidade negativa do acusado. Afinal, a insinceridade e desonestidade demonstrados perante o Juiz, revelam a distorção de caráter e a ausência de senso moral por parte do réu, que se utilizou da mentira – subterfúgio repugnado pela ética e pelo dever de lealdade – com o nítido propósito de tumultuar a instrução processual e induzir em erro, maliciosamente, o julgador, afrontando, assim, a dignidade da Justiça.
Neste ponto, é de se ressaltar a natureza jurídica do interrogatório que, consoante entendimento majoritário, constitui meio de defesa e de prova. Assim, por todos, é o ensinamento de FIGUEIREDO DIAS (in Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, págs. 442/443), ao consignar que o interrogatório é expressão do direito de defesa, mas, também, visa contribuir para o esclarecimento da verdade material, podendo, nesta medida, reputar-se legitimamente como um meio de prova.
Impende destacar, no entanto, que mesmo sendo o interrogatório um meio de defesa, é evidente que deve o réu respeitar as limitações impostas pelas “regras do jogo processual”, notadamente as decorrentes da lealdade, ética e boa-fé que devem sempre permear toda relação processual. Afinal, o processo, como instrumento para a realização do Direito, é dotado de uma série de formalidades – que são verdadeiras garantias para o réu, assim como para a própria sociedade (garantismo penal integral).
Segue-se que o réu que mente deliberadamente, manipulando os fatos para se beneficiar de sua própria torpeza, em verdadeira “litigância” de má-fé e deslealdade processual, extrapola os limites da sua autodefesa – quenão tem natureza absoluta, como, aliás, todos os direitos, ainda que fundamentais – e expõe a própria Justiça ao risco e vexame de proferir uma decisão equivocada e, portanto, injusta (erro judiciário).
Noutro vértice, por ser o interrogatório, também, meio de prova, com mais razão não se pode tolerar que o réu se valha de engodos, ardis e mentiras para se livrar de uma condenação justa. O acusado que age dessa maneira, distorcendo os fatos para se beneficiar e induzir o Juiz a erro, frauda a produção das provas e torna o processo uma chicana pessoal e egoísta, revelando, desse modo, uma personalidade dissimulada, amoral e um mau-caratismo, motivo pelo qual deve ser punido com uma pena mais elevada.
Ademais, se o leitmotiv do processo penal é a busca da verdade real (para alguns, verdade “processual”), a mentira do réu, a toda evidência, colide frontalmente com este escopo primordial do processo, de modo que não pode ser admitida pelo Estado-Juiz, muito pelo contrário, deve ser repreendida de forma severa. E, como em nosso sistema penal não existe o crime de perjúrio, deve o réu que mentir ser punido com uma pena mais alta, em razão da valoração negativa de sua personalidade, que deve ser feita por ocasião da fixação da pena-base (CP, art. 59).
Oportuno, neste ponto, transcrever a crítica de NELSON HUNGRIA (“A diagnose da mentira” in Novas Questões-Jurídico Penais, Editora Nacional de Direito, 1945, p. 233), que já asseverava, com grande veemência, “que, desgraçadamente, a mentira é um dos mais constantes fatores de perturbação da Justiça Criminal ou um dos mais eficientes recursos tendentes à impunidade dos que delinquem. Sempre foram fiéis aliados o crime e a mentira”.
Por outro lado, é certo que o direito ao silêncio, facultado ao réu a fim de evitar que se autoincrimine (nemo tenetur se detegere), encontra respaldo na Constituição Federal (CF, art. 5º, LXIII). Todavia, dele jamais se pode extrair o direito de mentir, pois a mentira representa verdadeira fraude processual, não podendo o Estado ser complacente com este tipo de comportamento vil e abjeto, que pode levar ao erro judiciário, desmoralizando, assim, a própria Justiça.
Nessa esteira preleciona FIGUEIREDO DIAS (in Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, p. 450), ao afirmar de forma contundente que o entendimento que defende ao acusado o exercício de um suposto direito de mentir deve ser repudiado. Afinal, nada existe na lei que possa fazer supor o reconhecimento de tal “direito”.
Acrescente-se, ainda, que o réu, em seu interrogatório, tem a livre autonomia para trilhar três caminhos. Pode ele confessar a prática do crime, contribuindo com a “busca da verdade real” e, consequentemente, com a Justiça, fato que implicará na redução de sua pena, por força da incidência da atenuante prevista no art. 65, III, “d”, do CP. Pode, também, ficar em silêncio, fato que não resultará em qualquer prejuízo para ele. No entanto, caso resolva falar perante o Juiz, jamais poderá mentir, pois a lei não lhe confere tal “direito”, cabendo a ele, tão somente, dizer a verdade, pois às partes é exigível o dever de lealdade processual. Dessa forma, caso opte pela mentira, com nítida intenção de induzir o julgador a erro, deve suapena-base ser majorada, com fundamento em sua personalidade negativa (CP, art. 59), pois reveladora de um caráter distorcido, de ausência de senso moral e de uma índole desviada.
Caso o Magistrado assim não proceda, estará incentivando o réu a sempre mentir, afinal, se sua mentira não lhe causa qualquer prejuízo, podendo, inclusive, livrá-lo de uma condenação justa, por que confessar um crime ou mesmo ficar em silêncio? Não punir o acusado mentiroso, aliás, viola o princípio da individualização da pena, pois equipara equivocadamente a situação do réu que fica em silêncio em seu interrogatório com a do que mente descaradamente, em verdadeira afronta à dignidade da Justiça, pois tem o único propósito de induzir esta a erro, minando, assim, sua credibilidade perante a sociedade.
Por fim, impende salientar que a jurisprudência alemã tem admitido a majoração da pena na hipótese aqui discutida, pois tem interpretado a mentira como indício da personalidade negativa do réu (cf. CLAUS ROXIN, Derecho Procesal Penal, Editores Del Puerto, 2003, p. 211 e THEODOMIRO DIAS NETO, “O Direito ao Silêncio – Tratamento nos Direitos Alemão e Norte-Americano” in Doutrinas Essenciais – Processo Penal, v. I, p. 933).
Na mesma linha do que foi aqui exposto, tem-se o magistério do Procurador da República VLADIMIR ARAS (“A mentira do réu e o artigo 59 do CP”, in Garantismo Penal Integral, Juspodivm, 2010, p. 264/265), do Procurador da RepúblicaANDREY BORGES DE MENDONÇA (Prisão e outras Medidas Cautelares Pessoais, 2011, Método, p. 194), do Juiz de DireitoLEANDRO JORGE BITTENCOURT CANO (Processo nº 224.01.2010.035865-0, Comarca de Guarulhos, no julgamento do famoso caso Mércia Nakashima e Mizael Bispo de Souza), do Promotor de Justiça CLEBER PEREIRA DEFINA (A mentira do réu como elemento relevante na dosagem da pena, Revista Jurídica ESMP-SP, v. 5, 2014: 117-144), dentre outros.
Em conclusão, a tese aqui sustentada é a de que, se o réu mentir em seu interrogatório, negando a prática do crime por ele cometido, ao apresentar, por exemplo, uma versão fantasiosa dos fatos, com o nítido propósito de obter uma injusta absolvição, deve o Juiz aumentar sua pena-base, com fundamento na personalidade negativa do acusado (CP, art. 59).

Autor


Informações sobre o texto

Artigo publicado no suplemento Direito & Justiça do jornal Correio Braziliense, em 17 de agosto de 2015; no suplemento Justiça & Direito do jornal Gazeta do Povo, em 28 de agosto de 2015; no jornal Carta Forense, edição de agosto de 2015 e na Revista Consulex, Ano XIX, nº 444, 15 de julho de 2015

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)

REIS, André Wagner Melgaço. Mentira do réu influencia dosimetria da pena?Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 21n. 467014 abr.2016. Disponível em: . Acesso em: 17 abr. 2016.



Guia rápido para explicar a seus amigos/as por que o impeachment de Dilma seria um golpe

April 17, 2016 5:04, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


De fato, impeachment não é, necessariamente, golpe. Mas, o fato do estatuto do Impeachment ser previsto pela Constituição Federal não quer dizer que ele possa ser aplicado de qualquer jeito. O Impeachment de Dilma, tal como está sendo encaminhado, seria golpe por uma série de motivos. Confira um passo a passo didático de quais são eles


Por Vinicius Wu
Foto: Wilson Dias / Agência Brasil
Wilson Dias / Agência Brasil



Por Vinicius Wu

O debate está posto. Os esforços de alguns dos maiores apoiadores do impeachment e de setores da grande mídia para sustentar que o impeachment é um dispositivo constitucional legítimo e não fere a legalidade democrática não deixam dúvidas: a narrativa a respeito do impeachment está em disputa. Ninguém discute com fantasmas. A pecha de golpista incomoda e a questão está colocada. Foi golpe ou não? Eis o debate que vai organizar a disputa política no país após um eventual impedimento da Presidente Dilma.

De fato, impeachment não é, necessariamente, golpe. Mas, o fato do estatuto do Impeachment ser previsto pela Constituição Federal não quer dizer que ele possa ser aplicado de qualquer jeito. O Impeachment de Dilma, tal como está sendo encaminhado, seria golpe pelos seguintes motivos:

POR QUE o Brasil não possui um sistema parlamentarista: não vivemos numa republica parlamentarista, na qual o Congresso poderia votar uma moção de desconfiança e levar o chefe de governo a convocar novas eleições. Num sistema presidencialista, para haver impeachment é preciso a existência de um fato determinado, ou seja, que o Presidente esteja diretamente envolvido em ato ilícito, o que não é o caso de Dilma. Impopularidade, crise econômica, discordância com o estilo de governar não são suficientes para afastar um Presidente eleito democraticamente pela maioria da população. Se a simples existência de uma crise política ou econômica bastassem para afastar um Presidente, então, nenhum dos últimos Presidentes brasileiros teria completado seus mandatos. Todos enfrentaram crises econômicas ou políticas ao longo de seus governos;

POR QUE pedaladas fiscais não são suficientes para fundamentar o pedido de Impeachment: o pedido de afastamento da Presidente Dilma, que será votado nas próximas semanas pela Câmara dos Deputados, apresenta como motivação de um eventual crime de responsabilidade da Presidente a aplicação das chamadas pedaladas fiscais. Esse nada mais é do que um expediente contábil que, inclusive, vem sendo utilizado por vários governadores. Todos eles deveriam, então, ser impedidos caso a Câmara aprove o Impeachment de Dilma o que, obviamente, não ocorrerá. Portanto, o processo que Dilma enfrenta no Congresso não está acusando a Presidente de nenhum esquema de corrupção e nada tem a ver com a operação Lava Jato. Um artificio foi utilizado para a abertura do processo na Câmara e, caso seja aprovado o Impeachment, ele não terá nenhuma relação com os casos de corrupção na Petrobrás.

POR QUE a oposição jamais aceitou o resultado das urnas e sabota o país desde 2014: a oposição passou, desde o dia posterior à vitória de Dilma, a construir um ambiente de crise permanente e em momento algum aceitou o resultado das urnas. Adotou uma postura claramente golpista ao questionar, de todas as formas, a vitória da presidente eleita. Chegaram até mesmo à ridícula situação de questionar a lisura das urnas eletrônicas – as mesmas que são usadas para eleger governadores tucanos há vinte anos em São Paulo e que já estavam presentes nas eleições de FHC à presidência da República. Nenhum país democrático sério pode conviver com esse tipo de postura de uma oposição obcecada por retomar o poder a todo custo, prejudicando o funcionamento das instituições e trabalhando, incansavelmente, para paralisar o governo e o país;

POR QUE o atual processo de impeachment começou como um ato de retaliação do Presidente da Câmara: ou seja, um parlamentar investigado e denunciado por corrupção, utilizando-se do terceiro posto mais importante da República, abre um processo de impeachment, logo após o partido do governo votar a favor de investigações a respeito de suas atividades ilícitas. O fato do Presidente da Câmara possuir a prerrogativa de aceitar o pedido de Impeachment não anula o fato de que todo o processo passou a ter sua legitimidade abalada por esse episódio. Para se livrar de uma eventual cassação, o Presidente da Câmara resolveu “jogar no ventilador”, para sair do foco das investigações e da cobertura da grande mídia. E conseguiu.

POR QUE estamos diante um evidente aparelhamento de algumas instâncias do Ministério Público e do Judiciário – com apoio da grande mídia – comprometendo a isenção da justiça: em articulação com a grande mídia, agentes públicos – que deviam ter uma postura de neutralidade e isenção – tem demonstrado clara predileção por evidenciar apenas denúncias que envolvem o PT e apoiadores do governo. Sempre que as denúncias atingem setores da oposição são arrefecidas, relativizadas ou, simplesmente, omitidas. Isso fere preceitos constitucionais básicos, ilude a população e fere, profundamente, a legitimidade da própria operação Lava Jato.

Por esses e outros motivos que um número cada vez maior de juristas, intelectuais, artistas e representantes da sociedade civil estão denunciando a falta de legitimidade e a ilegalidade do processo de Impeachment contra a presidente Dilma. Da forma como está colocado, o Impeachment é, sim, um golpe contra a democracia.

As denúncias de corrupção devem ser apuradas, independente da filiação partidária dos envolvidos e os responsáveis punidos. A lei deve valer para todos sem distinção. Operações policiais devem ter isenção e respeitar a Constituição Federal. O Brasil precisa rever, por inteiro, seu sistema político, que favorece a corrupção ao permitir o financiamento de campanhas eleitorais por empresas.

E, acima de tudo, independente do juízo que façamos do atual governo, precisamos defender a democracia, conquistada com o sacrifício de milhares de brasileiros e brasileiras nas últimas décadas.

Golpes não constroem sociedades melhores, não resolvem os problemas enfrentados por um país e o que é pior: podem gerar uma situação de descontrole, aumento do conflito social e desrespeito sistemático às regras do jogo democrático. A democracia brasileira é um patrimônio do povo brasileiro e é hora de defende-la para além de diferenças conjunturais.




Presidente Dilma sanciona lei autorizando o uso da Fosfoetanolamina contrariando poderosos grupos farmacêuticos

April 15, 2016 8:13, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Por: Malu Aires



Dilma sanciona a lei número 13.269/2016, publicada hoje no Diário Oficial da União, autorizando o uso e a produção da fosfoetanolamina - substância para pacientes diagnosticados com neoplasia maligna (câncer).

A Globo foi a primeira a dar chilique e já tá pagando 60 conto mais 2 pães com mortadela e 'maonese' pros "especialistas" que preferirem a morte dos pacientes (com muita dor e sofrimento), ao invés do uso dessa substância desenvolvida no Brasil a quem já foi dado pra morte certa. 

A briga que Dilma comprou com esta sanção, não é só contra a ANVISA, grupos farmacêuticos e escravos do capital da morte. É uma briga por 1,5% do PIB global. É contra a cifra de US$ 2 trilhões que o câncer gera por ano, à industria farmacêutica. 

Se há alguma coisa nesse mundo que vale mais que a vida na Terra, é o maligno dinheiro. Pelo dinheiro, por US$ 2 trilhões ao ano, vale derrubar qualquer presidente desse mundo. Golpistas apostam em 7,6 milhões de mortes por ano, no mundo. Onde vemos morte, dor e sofrimento, o golpismo vê lucro.
A Fosfoetanolamina foi sintetizada, pela primeira vez, em 1970 por Emile Cherbuliez. No Brasil, uma versão sintética da fosfoetanolamina foi desenvolvida pelo químico Gilberto Chierice, professor do Instituto de Química de São Carlos (IQSC), no final da década de 1980. 

A Fosfoetanolamina é um composto químico orgânico presente naturalmente no organismo de diversos mamíferos. Como nutriente, ela está presente na composição natural do leite materno humano, sendo o mais importante aminoácido fosfórico consumido por bebês em fase de amamentação.

A Fosfoetanolamina orgânica tem a função estrutural de formar a membrana celular e informar o organismo de algumas situações que as células estão passando.

Pesquisas demonstraram a relação da variação da concentração da fosfoetanolamina em doentes de alzheimer, isquemia, epilepsia e câncer.
Se o câncer tem cura, o Brasil será o primeiro país do mundo a descobrir isso.



Consumidor pode mover ação por impostos indevidos em conta de energia

April 15, 2016 5:10, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

PESQUISA PRONTA



Consumidor pode propor ação por cobrança de impostos não devidos em caso de energia elétrica não utilizada. Esse é o novo tema da ferramentaPesquisa Pronta, do Superior Tribunal de Justiça.
Segundo o entendimento dos ministros, o consumidor tem legitimidade ativa para buscar o ressarcimento de impostos pagos que não eram devidos. Em relação ao fornecimento de energia elétrica, diversos consumidores questionam, principalmente, os valores pagos a título de Encargo de Capacidade Emergencial, instituído pela Lei 10.438/02.
Muitos casos chegam ao STJ com decisões de primeira e segunda instâncias não reconhecendo o direito do consumidor de ingressar com esse tipo de demanda, ou seja, a ação é trancada antes mesmo do julgamento do mérito.
Além de reconhecer o direito do consumidor e da possibilidade de pleitear a repetição de indébito, o usuário pode questionar “qualquer outro tipo de ação contra o poder público de cunho declaratório, constitutivo, condenatório ou mandamental, objetivando tutela preventiva ou repressiva, que vise a afastar a incidência ou repetir tributo que entenda indevido”.
Vale lembrar que o reconhecimento do direito é apenas quanto à possibilidade de questionar a cobrança de impostos. O entendimento do STJ não implica direito automático ao ressarcimento, apenas firma a capacidade de ingressar com a ação. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Clique aqui para acessar a página Pesquisa Pronta.

Revista Consultor Jurídico



AS VERDADEIRAS RAÍZES DA CORRUPÇÃO NO BRASIL

April 15, 2016 5:06, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Capitanias - BRASIL ESCOLA
Imagem: Mapa Histórico das Capitanias Hereditárias

Autor: Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.

I – INTRODUÇÃO
Existem várias formas de manter o poder, mas o mecanismo mais comum é a apropriação dos modos de produção de ideias, pensamentos, vivências, identidades. É a obstrução dos mecanismos pelos quais interpretamos o mundo e construímos a nossa história.
Limitar os campos de interpretação, transformando a vida num universo sem crítica, sem diferença e, principalmente, sem história, é uma estratégia de domínio imposta por aqueles que não pretendem ver transformações de status.
Vários são os autores da sociologia que tentam desafiar esses processos, desde Marx e Weber, passando por Gramsci, Foucault, Bourdieu e Habermas. O certo é que o conflito entre estruturas e a vida efetivamente vivenciada estão no centro da obra destes autores, razão pela qual sempre buscamos refúgio no conhecimento por eles produzido para interpretar fatos e condições que envolvem o poder concentrado.
Para Marx, a principal forma poder está na dominação dos modos de produção e reprodução, motivo pelo qual dá especial atenção à atividade primária da sobrevivência que é a produção dos meios de vida, num processo que é contínuo, essencialmente histórico, e que não pode ser analisado no estreito espaço do tempo presente.
Weber, por sua vez, busca aprofundar a análise das formas de dominação, e vai buscá-las no carisma, na ação tradicional, e na ação racional-legal. Mas o próprio mestre alemão destaca que estes são tipos ideais. Logo, é possível a existência de outras formas simples ou combinadas de dominação.
A dominação pelo carisma é comum nas relações políticas, a tradicional, nas relações religiosas, de assenhoramento e familiares. Já a dominação racional-legal, é aquela derivada dos mecanismos racionais de poder, incluindo-se, aí, a ciência e o direito.
Já Gramsci segue a tradição marxista, mas se aprofunda na teoria de estado e nos mecanismos de construção da ideologia. Demonstra que na sociedade moderna o poder de Estado é limitado pelas organizações da sociedade. Vê na sociedade civil uma força poderosa, capaz de construir formas de interpretação do mundo através da ideologia. Estado = política + sociedade civil, uma síntese combinada de consentimento e repressão.
Para Foucault, na sua microfísica, o poder não existe. O que existe são relações de poder. Ele observa o exercício das relações poder além da verticalidade das estruturas, mas assentadas no tempo, na vida e no próprio corpo, através da disciplina, criando corpos submissos, exercitados e dóceis para quem exerce o poder.
Pierre Bourdieu demonstra a existência de estruturas nas nossas próprias formas de sentir, pensar e agir. O habitus é uma espécie de roupagem incorporada pelos indivíduos, e que é utilizada nos momentos em que estes se relacionam com o mundo. É uma disposição prática, automática, costumeira. É uma espécie de lei social incorporada.
Jurgen Habermas, por fim, é herdeiro da Escola de Frankfurt, e retoma importantes elementos da discussão weberiana sobre racionalidade. Demonstra a existência de uma estrutura intermediária que faz a mediação entre o estado e o espaço privado do mundo da vida, a chamada “esfera pública”. A esfera pública surge com a invenção da tipografia e da imprensa, criando um espaço de diálogo e de construção de consensos.
O aumento na forma de produção de informações transforma a sociedade e cria a necessidade de maior transparência. Isso não quer dizer que os diálogos estabelecidos na esfera pública sejam totalmente isentos, razão pela qual existem divergências entre as informações apresentadas na esfera pública e o mundo efetivamente vivenciado, o mundo da vida.
É por este motivo que Habermas propõe a ação comunicativa em oposição à ação racional instrumental, na medida em que é possível a construção de diversas formas de tradução do mundo da vida, através de uma espécie de razão comunicativa, que vai além da concepção padronizada e única defendida pelo pensamento positivista. O próprio direito sai do “mundo do dever ser, positivista” e passa a ser concretizado apenas no mundo vivido (mundo do ser).
Este breve extrato de teorias sociológicas demonstra o quão complexas são as relações de poder e a forma como estas se manifestam. O poder não necessariamente ocupa os espaços formais e, muitas vezes, está assentado em locais distantes do controle social, onde predomina a ausência de transparência.
A leitura estática dos fatos, sem elementos de consubstanciação, é prejudicial para qualquer interpretação séria da realidade e prejudica a nossa visão crítica. E aqui eu me afasto dos excessos de relativização da realidade, comuns a algumas teorias pós-modernistas, na medida em que levam a perspectivas excessivamente individualistas do mundo, abdicando da essência coletiva da organização da sociedade.
Portanto, quando buscamos analisar a preocupação dos meios de comunicação com determinados assuntos, é necessário observar até que ponto tais órgãos tem uma real preocupação com a verdade, com a verdadeira informação, ou buscam, simplesmente, manipular informações com objetivos próprios.
Por que um canal de televisão tenta colocar a culpa da falta d’água em São Paulo na derrubada de árvores na Amazônia, quando toda a bacia hídrica do Estado Bandeirante nasce no próprio sudeste? Ou por que determinados grupos de comunicação colocam a corrupção financeira como pauta de agenda, restringindo o número de réus entregues ao julgamento dirigido da chamada “opinião pública”, ou eliminando dados factuais e históricos que comprometeriam a vida dos próprios grupos?
As ciências sociais já nos proporcionam ferramentas suficientes para confrontar as técnicas adotadas pelos meios de comunicação para formar ideias e concepções de mundo, que vão desde o materialismo histórico até a análise de símbolos e imagens pelo estruturalismo e pela semiótica.
Neste ensaio apresentamos pelo menos cinco pontos que devem ser analisados por quem realmente pretende enfrentar a corrupção e que, curiosamente, não são vistos nas colunas e boletins das principais empresas de comunicação brasileiras.
Evidentemente, o estudo deve ser focado exclusivamente nos elementos materiais, evitando-se o generalismo e a rotulagem de pessoas, o que sempre promove distorções e injustiças, posto que não pretendemos, com o nosso trabalho, apresentar os mesmos resultados da mídia oligopolista. Ao contrário, o que se pretende demonstrar aqui é que os fatos devem sempre ser analisados de forma contextualizada, e com fundamentação histórica e crítica.

II – O ESTAMENTO BUROCRÁTICO
A tradição patrimonialista na formação do estado brasileiro é representada nas obras de vários autores, como Victor Nunes Leal no seu “Coronelismo, Enxada e Voto”, Sérgio Buarque de Holanda com “Raízes do Brasil”, Caio do Prado Júnior, em diversos livros, e Raymundo Faoro, no seu notável “Os Donos do Poder”.
Pois é exatamente nesta última obra que Faoro apresenta o conceito de “estamento burocrático”. Trata-se de uma ideia com forte inspiração weberiana, que serve para traduzir as relações patrimonialistas de mando e compadrio que ainda se manifestam em diversos setores da sociedade brasileira.
Conforme Faoro,
o estamento burocrático desenvolve padrões típicos de conduta ante a mudança interna e no ajustamento à ordem internacional. Gravitando em órbita própria não atrai, para fundir-se, o elemento de baixo, vindo de todas as classes. Em lugar de integrar, comanda; não conduz, mas governa. Incorpora as gerações necessárias ao seu serviço, valorizando pedagógica e autoritariamente as reservas para seus quadros, cooptando-os, com a marca de seu cunho tradicional. O brasileiro que se distingue há de ter prestado sua colaboração ao aparelhamento estatal, não na empresa particular, no êxito dos negócios, nas contribuições à cultura, mas numa ética confuciana do bom servidor, com carreira administrativa e curriculum vitae aprovado de cima para baixo”.
O “estamento burocrático” utiliza-se do poder do estado para impor sua vontade à conduta alheia, ora por meio da violência (ditadura militar), ora através das relações de mando senhorial (república velha), ora das relações de compadrio (nepotismo), ou, ainda, simplesmente por meio da corrupção.
A origem do poder estamental de determinados setores da burocracia do estado está assentada no processo de colonização imposto ao nosso território, que deixou uma pesada herança na organização estatal, incluindo a concessão de privilégios e vantagens a determinados grupos. A propriedade, por exemplo, foi uma concessão do Governo Português aos Donatários da Coroa, garantindo, assim, uma predominância das relações de interesse entre os representantes do poder concedente e seus beneficiários, dentro da lógica daquilo que Weber chamou de dominação tradicional.
Os traços do patrimonialismo foram mantidos durante todo o período colonial e transpostos para a organização da República Velha. Da venda de títulos de nobreza, à grilagem de terras realizada com a anuência da ditadura militar, a organização administrativa do estado foi fragilizada por um regime de troca de favores, que somente foi encontrar limites em 1988 com a determinação de acesso exclusivo as carreiras públicas por meio de concurso, conforme disciplina imposta pela Constituição de 05 de outubro do referido ano.
Todavia, até mesmo a ação moralizadora da nova Carta Constitucional de 1988 encontrou uma barreira numa medida típica do modelo patrimonialista adotada por alguns constituintes, que foi a incorporação, com estabilidade, de milhares de empregados públicos que ingressaram na administração, em todos os níveis, sem concurso público.
Foi a última dilapidação que o movimento chamado “Centrão” provocou na Carta de 1988, e até hoje, de certa forma, o custo é pago por todos. A base desse era composta por vários constituintes herdeiros da ditadura militar e alguns outros representantes da tradição conservadora.
Na prática, apenas quem ingressou na máquina pública depois de 1988 e, especialmente, depois do Regime Jurídico Único dos servidores (Lei 8.112/1990), teve como exigência o concurso público. Ainda hoje milhares dos trabalhadores que ingressaram na administração sem concurso, e sem nenhuma estratégia de profissionalização, e que receberam estabilidade na carreira por meio de uma manobra tipicamente golpista de alguns constituintes, ocupam cargos no serviço público em todas as esferas, inclusive com poder de mando.
Assim, não causa estranheza que um dos assuntos de pauta das eleições presidenciais de 2014 tenha sido a construção de um aeroporto nos terrenos que pertenciam ao tio do ex-candidato e atual Senador pelo PSDB/MG Aécio Neves. Trata-se de uma típica relação de poder patrimonialista, assentada em laços tradicionais de compadrio.
Também não é estranho que o pivô do escândalo de corrupção na Petrobrás, Paulo Roberto Costa, seja um funcionário que entrou na estatal em 1978, ou seja, sem concurso público, e que desde 1995 (início do Governo de Fernando Henrique Cardoso) ocupe cargos de direção na referida empresa, chegando a dirigir a GASPETRO de 1997 a 2000.
A rigor, o esquema de corrupção do qual Paulo Roberto Costa (vinculado ao Partido Progressista – PP), existe desde 1997, bem na época dos escândalos de privatização do Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Mas dado o nome dos envolvidos, é bem provável que este seja um problema mais antigo.
Outro pivô do escândalo, Nestor Cerveró, é funcionário da Petrobrás desde 1975, e figura frente nos cargos de direção da empresa na época do governo de FHC. Já Pedro Barusco, afirma ter acumulado mais de US$ 100 milhões de reais em propina desde 1996, ou seja, durante o governo do PSDB.
Já Alberto Yousseff, doleiro ligado a Paulo Roberto Costa, também apareceu em escândalos da década de noventa no estado do Paraná, notadamente no caso do BANESTADO.
Ou seja, há inequívoco predomínio de um grupo de pessoas que exerce poder e defende os seus interesses na máquina do estado há muito tempo, ocupando espaços estratégicos na administração pública, vários dos quais incorporados aos quadros administrativos do estado pelo movimento do “Centrão” e outros grupos conservadores na Constituinte, e que permitiu a estabilidade para servidores que ingressaram na administração sem concurso público no período pré-Constituição/88. Tais vantagens também beneficiaram empregados públicos de empresas estatais e que hoje são citados em esquemas de corrupção, como Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa. Trata-se, de fato, do chamado “estamento burocrático”.
A criação do concurso público para acesso aos cargos públicos, imposta pela nova Ordem Constitucional, permitiu uma democratização do ingresso nestes postos, que passaram a ser ocupados por pessoas de todos os extratos sociais.
Até então, os cargos na administração pública, pelo menos os de maior envergadura, eram considerados como postos destinados aos filhos da elite social e econômica, especialmente os cargos de altos dirigentes do governo, da diplomacia, da advocacia e dos comandos militares. Assim, este tipo de organização estatal está muito longe da lógica racional-legal weberiana, mas dentro daquilo que o mestre alemão chama de dominação tradicional.
Em qualquer análise política mais séria, e sem nenhuma ingenuidade, é impossível não considerar o poder e a influência destes servidores do alto escalão governamental. Todos possuem grande espaço de decisão ocupado ao longo da sua atuação na máquina administrativa, espaços estes que permitem um contato permanente com várias empresas.
Estes espaços historicamente foram dotados de pouca transparência, de mecanismos de controle social, participação ou governança, liberdade permitiu aos agentes responsáveis pelas negociações e gestão de contratos com valores muito elevados a possibilidade de comprar apoios, negociar favores, vender vantagens, dentre outras premissas que, curiosamente, são simplesmente omitidos pelos grandes meios de comunicação.
Desta forma, não há como se falar em corrupção, no Brasil, sem considerar o papel deste influente extrato de servidores e empregados públicos, e que exercem o papel de um verdadeiro “estamento burocrático” dentro da administração.

III – A ESCOLA DA MAGISTRATURA
Durante as décadas de 80 e 90 do século passado o movimento estudantil universitário criou uma série de projetos de cursos populares preparatórios para o vestibular, gratuitos, e destinados a garantir o acesso de estudantes sem condições financeiras ao ensino superior.
Embora a grande maioria dos estudantes que ministravam os cursos também tenha origem em grupos menos privilegiados economicamente, as aulas eram atividades de militância e não remuneradas, e os resultados obtidos permitiram o ingresso de milhares de estudantes das camadas mais pobres nas universidades públicas.
Trata-se de uma iniciativa importante de um movimento social visando promover a inclusão social e o combate aos privilégios de grupos dominantes. A universalização do acesso ao ensino público e laico, bem como aos cargos públicos, é uma condição essencial para a existência da Democracia, e deveria ser sempre um objetivo do Estado.
Ocorre que esta não foi uma iniciativa seguida por todas as categorias sociais, e muitos setores da sociedade ainda se utilizam dos espaços privilegiados ocupados para manter determinados postos no serviço público como núcleos destinados aos filhos da elite econômica e social.
Esta última postura comunga com a tipologia do “estamento burocrático” e com a perpetuação do patrimonialismo. Distante da realidade da maioria dos brasileiros, está a grande maioria das Escolas da Magistratura, instrumento que poderia contribuir para garantir o acesso aos cargos de juízes e que, na prática, funcionam como mecanismo destinado à manutenção de privilégios.
Se no início, a primeira destas escolas contava com o serviço não remunerado de quadros da judicatura, hoje todos os juízes-professores são remunerados pelas diversas escolas do gênero implantadas em todo o país.
Uma das consequências é o elevado valor dos cursos ofertados por estas instituições de “excelência”, cujo custo ultrapassa a faixa de 12 salários mínimos em média, o que torna os mesmos proibitivos para a maior parte da população. Pior do que isto: apesar de mantidos por associações de juízes, os cursos contam pontos nas provas de títulos para os concursos da magistratura, conforme Resolução nº 75, de 12 de maio de 2009 do Conselho Nacional de Justiça.
Trata-se de privilégio incomum, e exclusivo das associações representativas de servidores que compõem a estrutura de um dos Poderes da República. As associações dos magistrados são, na verdade, o equivalente aos sindicatos de outras categorias, pois representam os interesses dos referidos profissionais frente ao estado.
Nenhuma outra entidade representativa de categoria profissional ou de servidores públicos possui um poder tão grande para influenciar nos resultados dos concursos públicos como a dos magistrados. Senão vejamos: a) as associações de magistrados participam da definição dos critérios de seleção dos concursos; b) os cursos de formação mantidos pelas associações de magistrados contam pontos para os títulos dos referidos concursos; c) os magistrados, notadamente os desembargadores, são responsáveis por firmar as interpretações jurisprudenciais, numa rara capacidade de estabelecer e ministrar o conteúdo do objeto dos concursos; e d) muitas das escolas de magistratura funcionam e se utilizam das estruturas físicas dos próprios Tribunais.
Embora não seja possível afirmar que há intencionalidade na fixação destas vantagens como mecanismo para diminuir o acesso de determinados grupos sociais ao Poder Judiciário, é inegável a existência de privilégios em favor das associações de magistrados e daqueles que ingressam nos cursos mantidos por essas instituições.
Mesmo entendendo que boa parte dos juízes e professores das Escolas atua com sincera intenção de aperfeiçoar o conhecimento jurídico e de forma honesta, a manutenção dos privilégios das associações de magistrados não pode ser aceita de forma acrítica, sob o risco de convalidar a perpetuação de uma situação tipicamente patrimonialista e com duvidosa constitucionalidade.

IV – O PODER ECONÔMICO E OS PROCESSOS ELEITORAIS
Outra herança inequívoca do patrimonialismo no Brasil é o financiamento privado das campanhas eleitoras. Uma leitura simples e rápida dos principais escândalos de corrupção do país, identificaremos sempre a presença de dois fatores: a) o financiamento realizado por empresas; e b) a participação de servidores e empregados públicos que ocupam cargos de alto escalão, o chamado “estamento burocrático”, na articulação dos financiamentos.
O tema do financiamento de campanhas eleitorais por empresas é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4650 que tramita no Supremo Tribunal Federal movimentada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde são questionados dispositivos da atual legislação que disciplina o financiamento de partidos políticos e campanhas eleitorais por essas empresas (Leis 9.096/1995 e 9.504/1997).
O processo já conta com o voto de seis Ministros favoráveis ao pedido que consideram inconstitucional o financiamento de campanhas eleitorais por empresas, mas o processo está suspenso em virtude de pedido de vista feito pelo ministro Gilmar Ferreira Mendes, o que prejudica a efetiva transformação do financiamento dos processos eleitorais.
Na prática, o financiamento privado de eleições por empresas acaba resultando no domínio do poder econômico sobre a definição da agenda política. Tal situação, somada às eleições com listas abertas, resulta em campanhas eleitorais caras e com o predomínio de uma visão personalista e patrimonialista da coisa pública.
O mandato de um parlamentar, por exemplo, acaba sendo visto como um patrimônio pessoal do candidato eleito, e não como o resultado de uma luta política de uma coletividade, o que resulta da colocação de temas de interesse social ou coletivo, como a proteção do meio ambiente e a defesa dos direitos humanos, dentre outros, em segundo plano.
O financiamento privado de campanhas eleitorais desequilibra a defesa de ideias, coloca o interesse do capital em primeiro plano em relação à cidadania, e acaba facilitando o exercício da corrupção.
Uma votação favorável ao pedido da ADI nº 4650 no STF, declarando a inconstitucionalidade do financiamento empresarial em campanhas eleitorais seria um duro golpe ao abuso do poder econômico em eleições. É exatamente por isso que é necessário um acompanhamento mais cuidadoso da população na relação entre a demora no voto do Ministro Gilmar Mendes, e a tramitação da PEC da “Contra-Reforma Política”. Tal Proposta de Emenda Constitucional é conduzida pelo atual Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e conta com o apoio de partidos de direita, como o DEM e o PSDB, e está sendo acelerada no Congresso Nacional. Apenas o PT e o PSOL se posicionaram claramente contra o golpismo e caráter patrimonialista da proposta.
A PEC 352, conhecida como “PEC da Contra-Reforma Política” ou “PEC do Capital”, sustenta o patrimonialismo do financiamento privado de campanhas e a criação do voto distrital que enfraquece os partidos e favorece a visão personalista dos mandatos parlamentares. Ou seja, é uma forma de mudar não mudando, mantendo a influência do poder econômico nas eleições.

V – A ORGIA DAS PRIVATIZAÇÕES
De acordo com a Revista Carta Maior, estudos indicam que 1996 à 2002, no auge das privatizações do Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), cerca de US$ 126 bilhões foram desviados para o exterior pelo esquema do Banco do Estado do Paraná – BANESTADO. Destes, apenas US$ 2,2 milhões foram repatriados pela Advocacia Geral da União.
Os números do BANESTADO são uma parcela ínfima de todas as denúncias de corrupção que circularam no Brasil na década de noventa durante a orgia privatista de FHC e Cia.. Com certeza, nessa época tivemos o ápice da corrupção do país, com a omissão, velada dos órgãos de controle, e explícita dos meios de comunicação. Muitos dos problemas ainda hoje enfrentados são frutos de esquemas criados naquela época, inclusive com os mesmos protagonistas.
O caso dos ataques à Petrobrás é o exemplo mais gritante de todos, na medida em que falamos de uma organização criminosa que admite atuar no submundo da administração pública, pelo menos, desde 1997, com fortes indícios de atuação anterior, e com maiores ramificações.
Já o caso da Ação Penal nº 470, conhecido popularmente como “mensalão”, é mera continuidade de esquema criado em Minas Gerais, também no governo tucano. Para evitar a cassação do mandato, e a continuidade do processo no rito sumaríssimo do Supremo Tribunal Federal, o ex-Governador de Minas Gerais  Eduardo Azeredo (PSDB) renunciou ao cargo que ocupava no Senado.
Alberto Yousseff, transformado em herói pela mídia oligopolista, também era figura presente no escandaloso caso do BANESTADO. Mas as investigações sobre os esquemas no Banco Paranaense foram abafadas pelos mesmos grupos de comunicação que hoje cobram investigações, o que, por si só, é prova flagrante de suspeição das referidas empresas. Aliás, é a mesma mídia que hoje fecha os olhos para o escândalo do HSBC, banco beneficiado pelo financiamento do PROER, durante o Governo de FHC, quando adquiriu a parte do capital do extinto Bamerindus.
Segundo estudos realizados por pesquisadores da CEPAL, cerca de 12,3% do PIB na época, ou R$ 111,3 bilhões, foram utilizados para cobrir gastos com o PROER, o que incluiu, em menor monta, a recapitalização do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, e de alguns bancos estaduais em virtudes das cíclicas crises cambiais do Plano Real.
Deve ser destacado que o PROER não foi a primeira operação de salvamento financeiro de Bancos realizadas no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Antes disso, tivemos o escândalo envolvendo os Bancos Marka e Fonte-Cindam, que receberam cerca de R$ 1,6 bilhão do Banco Central durante a desvalorização do real. O caso resultou até na prisão do ex-presidente do Banco Central, Chico Lopes, e do famoso banqueiro de cidadania italiana, Salvatore Cacciola.
Outro exemplo problemático é o da privatização do sistema de telecomunicações. Além dos questionamentos sobre os valores e sobre os procedimentos, temos o caso da divulgação de gravações de conversas telefônicas entre o ex-ministro das Comunicações, Luis Carlos Mendonça de Barros (PSDB), e presidente do BNDES no governo de FHC, André Lara Resende, onde ambos articulam o apoio a Previ, fundo previdenciário dos funcionários do Banco do Brasil, para beneficiar o consórcio do banco Opportunity, vinculado ao tucano Pérsio Arida. A negociata envolvia o módico valor de R$ 24 bilhões de reais.
Mas o caso mais gritante de todos, e inquestionavelmente o mais representativo da orgia das privatizações envolve a maior empresa mineradora da América Latina, e uma das maiores do mundo (a segunda mais lucrativa em escala global), a Companhia Vale do Rio Doce.
Em leilão realizado em 1997, 33% das ações de uma empresa avaliada em R$ 90 bilhões de reais foram arrematados pelo Consórcio Brasil por apenas R$ 3,3 bilhões de reais, o que permitiu ao mesmo assumir o controle acionário da empresa estatal. O consórcio vencedor era formado pela privatizada Companhia Siderúrgica Nacional, pela Bradespar/Bradesco, e pelo fundo de investimentos do funcionários do Banco do Brasil, o Previ.
Além da onipresença do Previ, envolvida em diversos processos de corrupção, parte dos recursos utilizados na compra da Vale do Rio Doce foram obtidos por meio de empréstimo junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), resultando em indícios de direcionamento do certame.
Resta destacar que, além das negociações de bastidores e da utilização contínua de dinheiro público nas privatizações, as duas principais justificativas adotadas pelo tucanato para realizar tais ações não se justificaram.
Primeiro, a dívida pública, que deveria sofrer abatimento com a utilização dos créditos das vendas, não reduzir, ao contrário, mais do que triplicou nos oito anos de governo tucano, fruto de uma política fiscal e financeira truculenta e confusa.
Segundo, conforme destaca Aloísio Biondi na ótima obra “O Brasil Privatizado”, o país arrecadou cerca de R$ 85,2 bilhões de reais com as privatizações, mas perdeu mais de R$ 87,6 bilhões de reais com a receita das empresas vendidas que não ingressaram nos cofres públicos, especialmente da Vale. Assim, o resultado da orgia privatista foi um saldo líquido negativa de R$ 2,4 bilhões de reais, que foram transferidos do patrimônio público para o capital financeiro.

VI – O PODER DA MÍDIA OLIGOPOLISTA
A Constituição Federal garante imunidade tributária para livros, jornais, revistas e para o papel onde estes materiais são impressos. Em tese, o objetivo desta medida é permitir uma democratização do acesso à informação, à produção científica e à cultura.
Ocorre que o sonho da democratização da informação pela produção de informações por uma “imprensa livre”, não se consolidou. Nem jornais, nem revistas e, muito menos livros, com raras exceções, possuem preços acessíveis à maioria da população. Uma das poucas exceções são as publicações de baixa qualidade destinadas às massas, em tabloides como “Notícias Populares” e “Diário Gaúcho”, ambas publicações com desenho editorial baseado em notícias sobre fofocas de televisão, esporte e violência, baseados no marketing de comércio do vazio informativo e da ideologia dos grupos proprietários dos jornais.
A simples publicação de um Edital ou de aviso de interesse público num jornal de grande circulação em São Paulo ou Rio de Janeiro chega a custar a bagatela de R$ 10 mil reais, tornando esses espaços inacessíveis para as organizações da sociedade civil. Por outro lado, todos os jornais e revistas reservam grande parte do seu espaço para a publicidade. Em algumas “revistas” temos a impressão de que existe mais espaço publicitário do que material de comunicação.
Se a situação é grave na mídia impressa, muito pior é o resultado observado no rádio e, especialmente, na televisão. Curiosamente, ambas as formas de comunicação são derivadas de concessões públicas.
Os grandes grupos de comunicação também são detentores de excelentes espaços para a publicidade e, como consequência, são um grande negócio. Em regra, articulam mídia impressa, radiofônica, televisiva e, mais recentemente, eletrônica, o que permite um domínio das informações e das rendas publicitárias, inclusive de fontes públicas de patrocínio.
E aqui começa um grande problema. Se rádio e televisão são concessões, ou seja, serviços públicos, por que não existe nenhum mecanismo de controle público ou social sobre o financiamento destas empresas? Mais do que isto, qual é o motivo de tamanha resistência das principais redes de comunicação contra a presença de qualquer tipo de controle sobre as suas fontes de financiamento?
Talvez a resposta possa ser observada na guerra instaurada pelas Organizações Globo em relação ao direito de transmissão dos jogos do campeonato de brasileiro, da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Apenas em 2012, a Globo pagou para os 12 maiores clubes do futebol brasileiro mais de R$ 939 milhões de reais como direitos de transmissão. Este dado foi obtido com base na publicação dos balanços financeiros dos clubes, pois os contratos firmados pela Rede Globo com os clubes de futebol gozam de questionável cláusula de confidencialidade.
Ao todo, estima-se que a empresa de comunicação tenha efetuado o pagamento aos clubes da primeira divisão do campeonato brasileiro em 2012 mais de R$ 1,326 bilhão de reais apenas em direitos de transmissão do campeonato brasileiro. Não constam neste inventário as despesas com o custeio da programação e, muito menos, o lucro obtido pela Rede Globo com um dos principais atrativos da sua grande de comunicação.
Estes dados demonstram que as empresas de comunicação são grandes negócios, e para exercer as suas atividades se utilizam de concessões públicas sem nenhuma, ou praticamente nenhuma, retribuição à população.
Diferentemente do que ocorre nas concessões de transporte, energia elétrica, água, telefonia, dentre outras, não existe transparência nas planilhas de serviços, muito menos espaço para que cada cidadão ou cidadã, verdadeiros detentores dos direitos das concessões, possa saber o resultado obtido pelas empresas. Não se verifica o pagamento de outorga, ou ainda o cumprimento de cláusulas de oferta mínima de conteúdo de produção nacional.
A falta de transparência domina o mercado da comunicação, uma verdadeira “Caixa de Pandora”, permite vários tipos de vantagens, inclusive a possibilidade de compra de matérias e de notícias. Nunca poderemos esquecer dos mecanismos utilizados por Assis Chateaubriand, o “Chatô”, para condicionar os fabricantes de fósforos a patrocinar os seus jornais, através de uma verdadeira chantagem jornalística por meio de matérias que afirmavam o perigo que representava a utilização do produto fabricado por estas empresas, matérias que, por sinal, sumiram dos jornais quando do fechamento dos acordos de publicidade.
Por fim, não podemos esquecer que a mídia representa muito mais do que dinheiro sem transparência no uso e nas fontes de financiamento, mas grande poder de influência. Vários dos ocupantes de assentos no Parlamento ou são donos, filhos, ou parentes de donos de redes de televisão, como Aécio Neves (PSDB), por exemplo, ou funcionários das empresas de comunicação.
No Rio Grande do Sul, dois dos três Senadores, Ana Amélia Lemos (PP) e Lasier Martins (PDT), são funcionários da Rede Brasil Sul – RBS, uma das afiliadas da Rede Globo, e o maior grupo de comunicação do sul do país.
Portanto, é necessário criar mecanismos para diminuir o poder que os meios de comunicação exercem sobre a população, e o primeiro passo poderia ser dado com a regulação e transparência do financiamento da mídia.
O segundo, já pensando adiante, poderia se basear na restrição da publicidade pública às grandes redes, criando-se mecanismos como a divulgação de matérias de utilidade pública nos referidos meios.
Garantir a transparência do financiamento das redes de comunicação é, sim, um instrumento fundamental para enfrentar a corrupção econômica e política.

VII – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A verdadeira origem da corrupção no Brasil, como vemos, está muito longe do conteúdo dos noticiários de televisão. Ela se encontra entranhada em processos que são apresentados como normais, na garantia de privilégios estamentais, na influência do poder econômico nos processos eleitorais, no monopólio das informações, e na ausência de transparência e de mecanismos de controle social em determinados setores.
Se nenhum destes problemas for realmente enfrentado pela sociedade, não haverá verdadeiro combate à corrupção, mas simples demagogia ou golpismo, especialmente a atual prática da mídia oligopolista brasileira.

Fonte: https://sustentabilidadeedemocracia.wordpress.com/2015/02/23/as-verdadeiras-raizes-da-corrupcao-no-brasil/



Mais poder para a PM

April 15, 2016 4:50, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Crédito: Marcelo Ferreira/CB
CRÉDITO: MARCELO FERREIRA/CB
O procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bessa, vai comunicar o comando da Polícia Militar do DF de que a corporação está liberada a lavrar Termos Circunstaciados de Ocorrência, desde que estejam em questão crimes de menor potencial ofensivo, como contravenções penais, injúrias, brigas de vizinhos e ameças de rua. A Polícia Rodoviária Federal também passa a desempenhar essa função.
Na prática, a medida, autorizada pelos procuradores que integram as câmaras revisoras de atuações na área criminal, dá a policiais militares e rodoviários o poder de ir além da abordagem inicial de suspeitos nas ruas.
O policial militar poderá interrogar e registrar esses crimes, sem passar por uma delegacia de Polícia Civil. Em comunicado interno, os promotores de Justiça foram orientados nesta semana a receber esses termos circunstanciados para embasar as ações penais.
Projeto piloto
O chefe do Ministério Público do DF, Leonardo Bessa, deve se reunir com o comando da Polícia Militar nos próximos dias para definir uma área piloto de atuação.

O argumento dos defensores da medida é de que apenas crimes sem desdobramentos investigativos, que não exijam, por exemplo, perícias técnicas, fiquem sob a responsabilidade de policiais militares. Seria uma forma de liberar delegados a se dedicarem a investigações de crimes mais graves, como latrocínios, homicídios, roubos e furtos.
Medida judicial
A recomendação do Ministério Público do DF provocou reação.

O presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do DF (Sindepo), Benito Tiezzi, já acionou a assessoria jurídica da entidade para ingressar com uma ação que tenha efeito de suspender a medida.
O advogado do Sindepo, Juliano Costa Couto (foto), presidente da OAB-DF, vai cuidar do caso. De acordo com delegados, policiais militares não têm competência constitucional para atuar nessa seara.
A preocupação é que a investigação fique a cargo de instituições militares, sem um controle direto da Polícia Civil. A orientação do Sindepo é de que delegados autuem PMs por abuso de autoridade, sempre que lavrarem Termos Circunstanciados.

Fonte: http://blogs.correiobraziliense.com.br/cbpoder/mais-poder-para-pm/



STF derruba pagamento de pensão vitalícia para ex-governadores do Pará

April 14, 2016 20:17, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Benefício criado pela Constituição do estado foi suspenso por ministros.
Outras dez ações tramitam para derrubar pagamento em outros estados.

Renan Ramalho
Do G1, em Brasília
O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira (9) suspender o pagamento de uma pensão vitalícia concedida a ex-governadores do Pará. Para a maioria dos ministros, o benefício é inconstitucional e deve, por isso, ser interrompido.

A pensão foi instituída na própria Constituição do Pará e o valor correspondia ao salário de um desembargador do Tribunal de Justiça do estado. A ação para derrubar o pagamento foi proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e teve o julgamento iniciado em 2011.

A entidade alegava que, além de não estar previsto na Constituição Federal, a medida contrariava os princípios da impessoalidade e da moralidade na administração pública.

Na ocasião, a relatora do processo, ministra Cármen Lúcia, votou pela suspensão, argumentando que quem não trabalha mais não teria por que ser remunerado.

Na retomada do julgamento, nesta quinta (9), somente o ministro Dias Toffoli votou pela continuidade do pagamento, desde que houvesse comprovação da necessidade e que o valor fosse menor que o salário do governador em exercício.

Os demais ministros que participaram - Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski - acompanharam Cármen Lúcia para decidir pela suspensão do pagamento. Parte deles considerou que, em tese, a Constituição não proíbe esse tipo de benefício, mas que no caso do Pará o pagamento não se justificava.

"O fundamento de ter sido governador do estado não me parece suficiente para tratamento privilegiado de uma pensão especial", disse Barroso, acrescentando que poderia haver outros motivos para a pensão.

"Eu concordo com a tese do ministro Dias Toffoli, secundada pelo ministro Barroso, de que não se pode acoimar de inconstitucional de toda e qualquer norma que assegure uma pensão, desde que tenha motivo razoável, justificação suficiente. Penso que até se poderia cogitar independente da necessidade econômica, podia ter outra causa a justificar", completou depois Zavascki.

A decisão desta quinta vale somente para o Pará e poderá servir de referência para outros casos. Ao todo, tramitam no STF onze ações que visam derrubar pensões concedidas a ex-governadores. Além do Pará, atingem os estados do Acre, Amazonas, Mato Grosso, Rondônia, Rio de Janeiro, Paraíba, Rio Gande do Sul, Piauí, Sergipe e Paraná.



O policial não necessariamente necessita ser um jurista

April 14, 2016 18:18, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

NATUREZA DA FUNÇÃO




Tramitam no Congresso Nacional alguns projetos com este objetivo, dentre eles as PEC 73 e 51, que visam transformar as carreiras policiais. Por oportuno é de gizar a recente edição da Lei 13.047/2014 que veio contraditar estas duas propostas.
Antes de adentrar-se no mérito da questão da carreira única, deve-se analisar a questão da polícia judiciária sobre dois dispositivos do artigo 144 da Constituição Federal. A disciplina da Polícia Federal prevê um órgão estruturado em carreira, sem menção ao cargo de Delegado de Polícia (§1º), do que se pode pressupor, com bastante tranquilidade, essa possibilidade, inobstante a edição da recente lei 13.047/2013 que prevê o delegado de polícia federal como cargo de natureza jurídica e policial.
Já no âmbito das polícias civis, de forma residual, estas devem ser dirigidas por delegados de polícia de carreira (§4º).
Não obstante esta distinção, e possíveis obstáculos, estes podem ser sobrestados por emendas constitucionais, como as aludidas 51 e 73.
Mas a polêmica deve ser analisada não sob o ponto corporativista dos cargos, ou sob aspectos de estrita “legalidade/constitucionalidade”, mas sim de interesse social e otimização dos serviços policiais.
Se de um lado delegados refutam esta ideia, Ministério Público a vê com bons olhos. Mas quem tem razão? Quem não quer perder o “poder” do Inquérito Policial ou quem quer arvorar-se sobre a investigação policial? Cautela é necessário.
A Associação Nacional dos Procuradores da República já apresentou Nota Técnica favorável a instituição de uma carreira única, destarte, persistam nuances, por vezes, de lutas corporativas que escondem não só os interesses dos delegados, mas do Ministério Público.
Insisto em desvelar ambos interesses, para que a sociedade seja a verdadeira destinatária dos serviços policiais; diga-se de segurança pública que não se confunde com a pura juridicidade que se quer dar a um cargo ou uma função. Escondem-se por trás da juridicidade, muitas vezes, questões de poder e de composição remuneratória.
Em síntese, muito embora interesses corporativos estejam por trás das duas defesas (Ministério Público e delegados), a ideia da carreia única visa aprimorar a proposição, para um ingresso único na carreira policial, disciplinando o ingresso e a progressão na carreira de maneira uniforme, estabelecendo concurso público como porta de entrada única, e sistema de promoção que privilegie, ao mesmo tempo, a experiência, a atualização profissional e o merecimento.
Trata-se de combater as múltiplas “portas” de ingresso no serviço policial, criando-se uma carreira única desde o ingresso até o último posto/função, já que na pratica, todos exercem o mesmo múnus policial.
As entidades representativas dos delegados de Policia repudiam esta mudança, que alegam tratar-se de uma “tentativa canhestra da associação classista dos Procuradores da República que, de maneira torpe e corporativista visa tão somente buscar a exclusividade absoluta do poder investigatório criminal, atribuído constitucionalmente à Polícia Judiciária (Federal e Civil).”, o que pode ser uma verdade.
Inferem que o cargo de delegado de Polícia é um instituto centenário do sistema jurídico brasileiro, o qual exerce função essencial à Justiça, sendo o primeiro garantidor dos direitos fundamentais do cidadão. Neste ponto a afirmação merece reflexão histórica; senão vejamos:
Uma breve retrospectiva nos permite relembrar que o cargo de delegado de polícia foi criado no ano 1.841 através da lei 261, e a escolha recaia entre desembargadores e juízes, tendo por exercício no município da corte e nas províncias, refletindo uma tendência de polícias municipais. À época foi extinta a Intendência Geral de Polícia e, instituído o cargo de Chefe de Polícia, sendo que Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso foi o escolhido para sua ocupação, no município da Corte, tendo na hierarquia, os delegados e subdelegados, bem como, em cada Província, um Chefe de Polícia e os respectivos auxiliares, os quais eram nomeados pelo Imperador ou pelos presidentes da respectiva Província. Na forma desta lei 261/1.841 e do decreto 120/1.842, as atividades de Polícia Judiciária foram subtraídas das responsabilidades dos Juízes de Paz, passando para as Autoridades Policiais, definindo as funções de Polícia Administrativa e Judiciária, tendo como chefe máximo, neste segundo momento, o Ministro da Justiça[1].
Essa é a percepção histórica que se deve ter do “cargo” de delegado de Polícia que não foi instituído como cargo, e sim como “função”. Ademais, o atual código de processo penal não indica ser autoridade policial o delegado de Polícia. São nuances importantes a destacar para que se possa compreender não só a “legalidade”, mas o histórico do cargo/função delegado de Polícia.
Diferentemente de algumas carreiras que devem ser estritamente jurídicas, como a magistratura, ministério público e procuradorias/defensorias (advocacia pública), em razão da própria natureza da função (eminentemente jurídicas), o policial não necessariamente necessita ser um jurista, mas sim um técnico multidisciplinar em razão das várias áreas que envolvem a investigação policial e a persecução penal, o que inclui, por óbvio, o direito, mas não com a exclusividade de uma carreira, unicamente jurídica.
Destarte, com a promulgação da lei 13.047/2014 cria-se o primeiro óbice infraconstitucional para a efetivação de uma carreira única, pois o referido diploma legal defere aos delegados de Polícia Federal um múnus de natureza jurídica e policial (art. 2º-A, § único). E vai mais longe, ao estabelecer requisito para ingresso no cargo de três anos de atividade jurídica (em analogia a magistratura e ministério público) ou policial (art. 2º - B).
Por outro lado, também é de se dissentir que as polícias estão vinculadas e baseadas na hierarquia e disciplina (ao contrário das demais carreiras puramente jurídicas), o que ficaria mais reforçado com uma carreira única, em que a ascendência deixasse clara esta distinção hierárquica.
Os argumentos de que a unificação da carreira está sendo propalado pelos procuradores da República como meio de apropriarem-se da investigação criminal também deve ser visto com bastante atenção, pois isso não deve ser aceito. A busca deve ser justamente ao contrário, no sentido de deixar tão somente ao encargo das polícias a investigação policial, estruturada em uma carreira única, dotada de independência funcional, administrativa e financeira, capaz de ficar alheia aos comandos de chefes do Poder Executivo, dando liberdade para que todos sejam investigados em igualdade de condições, e não com os atuais “privilégios” que os apadrinhados e apaniguados recebem das chefias indicadas por partidos políticos.

[1] SICHONANY Jr., Wilson Klippel e outros. Direitos Humanos sob a matriz da evolução histórica da sociedade Brasileira. In Abordagens Atuais em Segurança Pública. Org. Rodolfo Herberto Schneider. EDIPUCRS. 2011.
 é nestre em Direito Uniritter, especialista em Segurança Pública (PUC-RS), especialista em Gestão de Segurança Pública (ULBRA), SWAT Instruction. Indianapolis Police Departament (Advanced Firearms) - Estados Unidos.

Revista Consultor Jurídico



Redes sociais mostram que brasileiros não sabem o que é ser de direita e esquerda.

April 14, 2016 17:43, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Por Patrycia Monteiro


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A jornalista Patrycia Monteiro Rizzotto, autora do texto a seguir, trabalhou como repórter nos jornais Brasil Econômico e Gazeta Mercantil e na revista Forbes Brasil.
Por Patrycia Monteiro Do DCM
Além da polarização política entre os eleitores brasileiros, algo ficou evidente no atual debate ideológico nas redes sociais do país: os equívocos conceituais sobre o que é ser de direita, de esquerda e o que é o nazismo. O PT, principal partido no olho do furacão dos debates, por exemplo, é acusado de ser de direita por seus críticos à esquerda — que argumentam que a legenda coaduna com o capital –, enquanto alguns críticos à direita chegam ao cúmulo de afirmar que o partido tenta instaurar uma ditadura comunista-esquerdista no Brasil. Diante da vala comum em que foram jogados todos os partidos e políticos brasileiros, como defini-los do ponto de vista ideológico?
“Chamar o PT de comunista revela desconhecimento sobre o real significado do termo. Faz parte do jogo político rasteiro de desqualificar o adversário e amedrontar os incautos. Essa retórica foi usada no Estado Novo, na ditadura militar e está sendo usada novamente agora. De comunista o PT não tem absolutamente nada. A experiência do partido no governo mostrou seu apego pela economia de mercado e pela conciliação dos interesses das classes sociais”, afirma o sociólogo Wagner Iglecias, professor da Universidade de São Paulo (USP), explicando que o comunismo é um sistema político e econômico que faz parte da utopia de esquerda, sendo uma etapa posterior ao Socialismo, no qual os meios de produção seriam coletivizados, existindo somente uma classe social (a classe trabalhadora) e o Estado deixaria de ser necessário.
Para Iglecias, as principais características do pensamento de esquerda são a defesa da igualdade social e a crítica radical e profunda ao sistema capitalista. “As esquerdas, em geral, baseiam sua visão de mundo e sua atuação política tendo como princípio a igualdade entre os indivíduos. Esse é um objetivo impossível de ser atingido, em seus variados aspectos, em um regime capitalista, onde a mola mestra é a distribuição desigual e progressivamente concentrada dos frutos do trabalho humano. Não garantida a igualdade, para as esquerdas a própria concepção de liberdade fica seriamente ameaçada. Segundo esta perspectiva, não é possível ser livre num sistema onde não se garante sequer as mínimas condições de igualdade”, afirma.
Por outro lado, o professor da USP explica que a liberdade e a propriedade privada são as principais premissas do pensamento de direita. “Para liberais como Mises ou Hayek, a garantia dos direitos do indivíduo, especialmente o de cooperar com os semelhantes, empreender e conquistar e manter a propriedade privada, é o pilar fundamental para se construir uma sociedade próspera e livre”, diz.
Entre os partidos de esquerda brasileiro, o especialista enumera: o PCB, fundado em 1922 e que passou boa parte de sua história na ilegalidade; o PSB, fundado em 1947; o PCdoB, que surge no país em 1959, a partir de um racha internacional da esquerda; o PDT, criado em 1979; e o PT, fundado em 1980. “Mais recentemente surgiram novos partidos a partir de dissidentes do PT como o PCO (1994), PSTU (1995) e PSOL (2004)”, explica.
No espectro da direita, Iglecias afirma que as primeiras legendas surgiram ainda no Império, com os partidos liberal e conservador — e, no final do século XIX, surgiram os partidos republicanos estaduais que representavam as mesmas oligarquias rurais que controlavam os partidos liberal e conservador.
“No século passado emergiu a União Democrática Nacional (UDN), fundada em 1945, que caracterizou-se pela oposição radical ao intervencionismo estatal na economia e às utopias socialistas. Tinha apoio nos latifundiários e na classe média urbana alocada no setor privado da economia. Acabou extinta pelo golpe militar de 1964, mas viu vários de seus quadros voltarem à cena pública logo depois, quando o regime criou a Aliança Renovadora Nacional (ARENA). No fim da ditadura a Arena deu origem ao Partido Democrático Social (PDS), que em 1985 rachou durante a eleição indireta de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Vários de seus líderes fundaram o Partido da Frente Liberal (PFL), atual Democratas”, conta. Desde então o antigo PDS mudou de nome várias vezes, tornando-se o atual Partido Popular (PP).
O sociólogo diz que a partir do processo de redemocratização foram criados outros partidos de distintas linhagens de direita – alguns mais liberais do ponto de vista econômico, outros mais focados na questão da moralidade e das tradições e dos costumes -, como o Partido Liberal (PL), Partido da Reorganização da Ordem Nacional (PRONA), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Partido Popular Socialista (PPS), Partido Social Cristão (PSC), Partido da República (PR), Partido Republicano Brasileiro (PRB), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Verde (PV), Partido Social Democrático (PSD), Solidariedade (SDD), PSDC, PRTB e PROS.
Em consonância, a cientista política Roseli Coelho, professora da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) ressalta que por ter como valor essencial a defesa da igualdade, as forças políticas de esquerda devem se propor a diminuir ou mesmo eliminar a exploração dos trabalhadores. “Para atingir esse objetivo, essas forças propõem ampliar as políticas públicas que valorizam a força de trabalho, além de ampliar os direitos sociais”, diz. Segundo ela, também fazem parte do pensamento de esquerda o nacionalismo e a defesa da soberania, como instrumentos da construção de um Estado forte voltado aos interesses da classe trabalhadora. Na opinião dela, PT, PCdoB e PSOL representam a esquerda brasileira, enquanto o PDT e Rede Sustentabilidade são de centro-esquerda.
Na visão de Roseli, a direita valoriza a liberdade em detrimento da igualdade. “Baseada nessa ideia, a direita enfatiza a competição econômica, inclusive entre pessoas, defendendo que o mercado é instrumento de aperfeiçoamento da sociedade — e não o Estado. “Embora exista uma direita nacionalista, um partido de direita é francamente defensor da abertura de negócios e oportunidades para grandes empresas internacionais. Na era da globalização, a direita é a principal defensora das privatizações de empresas estatais”, analisa, mencionando que no nível dos costumes, um partido de direita é, tipicamente, contra ampliação de direitos e contra a inclusão de novos sujeitos nos direitos já existentes. Para a cientista política, o DEM e PSDB são os dois mais importantes partidos da direita brasileira, mas há pequenos partidos francamente reacionários que vêm ampliando sua influência. “O PMDB pode ser considerado um partido de centro-direita, apesar de ser constituído por algumas facções de direita propriamente dita”, afirma.
Roseli Coelho explica que o nazismo foi um movimento político da ultradireita alemã que propunha o nacionalismo exacerbado, a perseguição aos judeus e outros grupos sociais, fazendo uso generalizado da violência contra seus opositores. Ou seja, um regime totalitário. “Na forma como usamos atualmente, nazismo e fascismo são sinônimos para definir propostas ou formas de atuação baseadas nas práticas adotadas por aqueles regimes. Particularmente, as práticas da propaganda nazifascista, que era baseada sobretudo na mentira repetida milhões de vezes e na demonização do inimigo”, reflete.
A professora lembra que o Brasil tem mais de trinta partidos com representação no Congresso Nacional, além de mais alguns que não têm deputados ou senadores e que, em meio a uma profusão de propostas e alianças (firmadas nas campanhas eleitorais e também nas casas legislativas) é natural que haja confusões entre direita e esquerda. “A retórica dos partidos contribui para essa confusão, pois nenhum partido jamais ousará declarar-se publicamente como defensor dos ricos e poderosos”, frisa.
O sociólogo e cientista político Rudá Guedes Ricci, diretor-geral do Instituto Cultiva, diz que o pensamento de direita privilegia a liberdade individual e, na prática, defende a desigualdade como parte da natureza humana. “Alguns citam até Darwin para sugerir que só os mais fortes e competentes sobrevivem. Muitos consideram que a meritocracia é o divisor de águas – o que se trata de um pensamento elitista. O ápice desta lógica foi a agenda neoliberal que sugeriu que qualquer gasto social, a partir de políticas distributivas, geraria inflação. Qualquer aumento de impostos diminuiria a capacidade de investimentos privados e geração de emprego”, afirma. Na opinião dele, além dos partidos citado por Iglecias, no espectro da direita brasileira fazem parte ainda a legenda Solidariedade, parte do PSB e parte do PMDB.
“Há, contudo, uma distinção a fazer. O pensamento conservador reage às inovações, mas nem sempre é de direita. Há forte inclinação conservadora da população de baixa renda no Brasil, com traços de comportamento e valores que pregam o sexismo e até mesmo o racismo e que adotam a meritocracia e o hedonismo como referência, mas que não são de direita. Ao contrário, querem a intervenção do Estado para lhes promover e dar condições de igualdade para competir com os mais ricos. Assim, no Brasil temos pensamento conservador majoritário que, em grande medida, censura a lógica estatal e econômica liberal ou de direita”, pondera.
Ricci reforça que o nazismo e fascismo foram lógicas totalitárias de direita, de perseguição de todas as forças de esquerda, incluindo homossexuais e migrantes. “São práticas mobilizadoras que cerceiam a divergência política. Pregam a intolerância e geram forte sobreposição da noção de nação, Estado e governo. Quase sempre a orientação geral de comportamento vem de uma liderança carismática, que desenvolve um forte discurso emocional e moralista e de perseguição aos que consideram inimigos da pureza e da moral nacional. Na esquerda, o mais próximo disto foi o stalinismo, que perseguiu e executou adversários em seu próprio partido (caso emblemático do assassinato de Trotsky, quando de seu exílio no México, por Ramon Mercader) e instalou o terror instalado pela burocracia estatal e pela política secreta ou de segurança pública”, explica.
Na opinião dele, a grande confusão ideológica existente no Brasil se deve à transformação de nossos partidos políticos em máquinas eleitorais e não de formulação programática. “As siglas brasileiras não formam dirigentes e lideranças, mas cabos eleitorais e operadores da burocracia partidária e das negociações a partir dos escaninhos do Estado. Há autores contemporâneos que denominam esta tendência como a de formatação dos ‘Partidos Cartéis’ – que são organizações políticas que dependem totalmente do Estado para sobreviver, financiar suas ações, ter acesso aos meios de comunicação, profissionalizar seus quadros e se alimentar de obras e cargos suas bases eleitorais. Esta tendência levaria um partido a não se relacionar mais organicamente com a sociedade, mas com o aparelho de Estado”, diz, mencionando que a partir disso emergem lideranças partidárias apartadas dos interesses sociais, mas hábeis negociadores com cúpulas partidárias, criando um mundo fechado, focado na sobrevivência político-eleitoral e não na formulação e implantação de um programa.



“Estado democrático de direito” ou “Democracia”?

April 14, 2016 17:42, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


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Por uma esquerda que rejeite o mito da neutralidade das leis; e que defenda, em vez a “legalidade” abstrata, os conflitos, a pressão social e a disputa no interior do sistema jurídico
Por Monica Stival Do Outras Palavras
Proponho que nós, de esquerda, reflitamos sobre o que significa defender pura e simplesmente “a legalidade”, “o Estado de direito”, “a aplicação imparcial das leis”.
Quando discutimos os meios de comunicação, quando discutimos as intervenções e posições cotidianas, mesmo aquelas em almoços familiares ou nas confusões sentimentais em grupos de amigos, costumamos mostrar como é ingênua a afirmação da neutralidade. Tomamos já como discussão vencida a ideia da imparcialidade. Por que, então, haveria neutralidade ou imparcialidade no sistema judiciário?
Quando a lei antiterrorismo for utilizada contra manifestações populares, quando a lei de propriedade for utilizada contra ocupações populares daqueles que não contam nem com a garantia do direito à moradia, quando o aborto for absolutamente criminalizado, vamos defender pura e simplesmente a legalidade? Não estou sugerindo, de modo algum, menosprezar o direito positivo; estou propondo disputar o espaço que confere legitimidade às leis, às interpretações e às decisões jurídicas. É nessa medida que defender a Constituição de 1988 é defender o direito positivo vigente sobretudo porque esta Constituição é uma conquista social substancialmente progressista. Nem toda Constituição é imediatamente boa ou justa, de um ponto de vista político e social (não qualquer ponto de vista). É somente este ponto de vista que pode disputar a legitimidade dos processos institucionais – e a disputa política, sabemos bem, não se dá em esfera pública igualitária, mas nos enfrentamentos por narrativas próprias (aqui o papel fundamental das mídias alternativas e das redes sociais, apesar dos pesares) e nos enfrentamentos práticos organizados, como ocupações e manifestações de rua.
Assim, creio que a tarefa crítica de esquerda seja hoje, sobretudo, explicitar a posição política que cada decisão implica. Não podemos sacralizar o direito positivo, como se a aplicação das normas ou os procedimentos pudessem ser “puros”, independentes de narrativas e de perspectivas políticas e morais. Não se pode simplesmente defender a legalidade por ela mesma, mas disputar o sentido e, com isso, o conteúdo do sistema legal. Por exemplo, creio que caiba à esquerda mostrar que, sim, há lei de responsabilidade fiscal, cujo sentido é fundamentalmente liberal; mas ela implica crime de responsabilidade? A ilegalidade que justifica o termo golpe, abstraindo todo o resto do processo complexo de narrativa e inviabilização de certas figuras politicamente fortes, está na ligação entre a lei que regulamenta a gestão orçamentária e a possibilidade de interromper mandato – essa possibilidade não está dada constitucionalmente. Pelo menos se a questão for analisada politicamente. Afinal, além da letra da lei de responsabilidade há o espírito complexo que faz com que outros direitos dependam de grana, simplesmente – combate à zika, combate à miséria, ao desemprego, etc. Vale notar como é curioso defender alteração no sistema institucional executivo por gestão orçamentária e, ao mesmo tempo, como sugere Armínio Fraga em entrevista recente, propor “orçamento zero”, isto é, a suspensão dos repasses constitucionais – muitos dos quais ligados a políticas públicas que se sobrepuseram, por seu valor social e político, à letra do controle fiscal.
Aqui entra a decisão sobre o vínculo entre essas normas, a viabilidade de políticas públicas dentro do preceito liberal do modelo fiscal e a aplicação da lei geral ao caso particular (sem comentar que se aplicaria, se fosse o caso, a todos os governantes, em exercício ou não…). [não vou tratar aqui da questão das ilegalidades que não estão diretamente ligadas ao processo formal de impedimento aberto na Câmara Federal]. A decisão é conceito político por excelência (e não elemento especificamente jurídico, como diz Schmitt, senão formalmente ligado ao sistema jurídico nesse nosso tipo de sociedade).
Portanto, a democracia se revela esse espaço aberto à disputa política e moral sobre as leis, interpretações e decisões. É na democracia que se pode disputar o sentido político que atravessa necessariamente o sistema judiciário, na medida em que é praticado por pessoas. E explicitar isso não significa menosprezar a ordem jurídica, mas mostrá-la tão humana quanto qualquer outra esfera da vida social, tão política quanto qualquer outra intervenção no espaço comum, no espaço público. Não se pode simplesmente defender a legalidade como se estivesse em questão assentir ao que diz o sistema jurídico, como se este fosse um sistema impessoal que se revelasse a origem e o fundamento da verdade e do justo.
Ora, todo movimento social que obteve vitória na demanda por algum direito social sabe que não se pode reservar as transformações do direito positivo exclusivamente ao movimento de jurisprudência, como se as transformações – que não são “frias”, mas reacionárias ou progressistas, isto é, com sentido político – respondessem apenas a uma necessidade interna do sistema jurídico; ou como se fossem legitimadas em discussões igualitárias cujo procedimento estivesse calcado em uma razão comum. As conquistas sociais sedimentadas na forma jurídica são resultado de disputas que envolvem racionalidades distintas, que envolvem força política, que envolvem posição explícita a respeito do sentido progressista que tais demandas representam, considerando a vida concreta das pessoas (não todas, é claro…).
Combater o normativismo não implica dizer que não há democracia, mas estado de exceção. As medidas de exceção só estão em disputa política e social em uma democracia, em um espaço aberto justamente a diferentes narrativas e interpretações sobre os fatos e sobre o dever-ser (direito). Enquanto pudermos enfrentar esse debate, há democracia. E é explicitando o sentido reacionário de interpretações e decisões correntes que poderemos manter esse espaço aberto e nos colocarmos dele de maneira distinta daquela religiosa pela qual se coloca as decisões jurídicas acima da crítica social. Abrir mão de mostrar que há sentidos distintos nas normas e na sua aplicação é abrir mão de colocar-se no espaço aberto e indeterminado que a democracia permite.



Melhor maneira de julgar um crime é imaginar o enredo sem o ato violento

April 14, 2016 6:08, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

DIÁRIO DE CLASSE




Aparentemente pode-se dizer que o sujeito tem nome e qualificação que, socialmente, pode indicar um lugar. Assim, alguém pode ser chamado de "Paulo" e exercer a função de juiz. Neste lugar ele não chegou, nem se sustenta sozinho, enfim, não existe um "Paulo" essencial. Ele foi construído pelas falas de quem — se teve sorte — exerceu as funções maternas, interditadas por uma paterna.

Nessa possível estrutura que fala do sujeito, que diz e demanda sobre e a partir dele, está lançada a sorte de uma sustentação simbólica. Enfim, o sujeito nasce sem nome e, como tal, recebe um que é falado pela geração anterior. No caso, o Paulo. Dele se disse muita coisa antes do nascimento e se continuou dizendo depois disso. Que ele era esperto, incapaz, que não servia para nada ou que era inteligente e vencedor. Havia “puxado” ao pai, ou não.
Os caminhos individuais não dependem de manual de autoajuda para a criação de filhos, justamente porque entre eles só existem as leis da linguagem e sujeitos que se acomodam, quando podem, entre significantes. De qualquer forma, o lugar que eles ocupam na fantasia dos pais será fundamental: um pai e uma mãe condicionam a estrutura do sujeito. Sempre. Disso somente se escapa, claro, quando o objeto cai sobre o sujeito, o que não cabe neste texto.
Então o sujeito, diferente do indivíduo, caso congregue a possibilidade de enunciar, sempre fará na linguagem. E mais: ele precisa ser ensinado a assim proceder, porque não é uma capacidade inata. Devemos ser ensinados a desejar, a ensinar, a julgar, dado que nada é natural. Zizek diz que esperamos a todo o tempo que o alienígena que habita em nós saia, como no filme “Alien”. Dito de outro modo: todos temos um Berlusconi que nos habita. Adestrado ou não.
O sujeito é um vazio e seu preenchimento depende, em muito, da estrutura que o acolhe e lhe fornece significantes, os quais serão inscritos em sua história singular, seu romance familiar (Freud), e isso é de suma importância para entender o lugar e a função do juiz no contexto brasileiro contemporâneo.
Que se decide, se decide. A questão é saber sobre que base se está decidindo, ou seja, qual o contexto em que sabemos que decidimos. Não há nenhuma Justiça Divina que possa nos iluminar, mas apenas o resultado de um processo que nos ensina a decidir. O critério de uma decisão judicial é artificial, a saber, culturalmente condicionado. Não há nada de natural nas decisões. Assim como no desejo, diria Zizek, não há nada de espontâneo, porque somos ensinados a decidir. E esse ensino de como se deve decidir é, por definição, instrumento ideológico.
Uma decisão judicial é proferida em face de uma perspectiva e de um lugar, e aparentemente de um espectador que pode interferir, mas não interfere, dado que colocado na condição — imaginária — de Deus. Embora se possa, eventualmente, colocar-se na perspectiva dos atores do mundo da vida, a costura de significantes se dará de um ponto de vista onipresente, onisciente e onipotente: são os atributos divinos (lembrem-se das imagens nos filmes, que condicionam: há um lugar de catalisador do sentido pela imagem). Nada escapa ao juiz ao dizer a Verdade, reparem que esta verdade não é qualquer uma, mas Toda a Verdade. Logo, paranoica por definição – ocupa imaginariamente o saber total, de todos os fatos, corações e mentes. Enfim, não sem razão, já que a fantasia de ser o eleito divino, a Tropa de Elite dos Céus, aduba o imaginário judiciário.
Um exemplo disto se dá pela prece do Juiz. Amilton Bueno de Carvalho aponta essa lógica divina: “Quando o julgador fala de si mesmo emerge um discurso efetivamente alienado dando a si próprio ares de divindade. O exemplo palmar desta ótica (aqui manifestada com todo o respeito) é a 'Prece de um Juiz', do magistrado aposentado João Alfredo Medeiros Vieira, vertido para quinze línguas. E assim começa a prece; 'Senhor! Eu sou o único ser na Terra a quem Tu deste uma parcela de Tua onipotência: o poder de condenar ou absolver meus semelhantes. Diante de mim as pessoas se inclinam; à minha voz acorrem, à minha palavra obedecem, ao meu mandado se entregam... Ao meu aceno as portas das prisões se fecham.... Quão pesado e terrível é o fardo que puseste em meus ombros!... E quando um dia, finalmente, eu sucumbir e já então como réu comparecer à Tua Augusta Presença para o último juízo, olha compassivo para mim. Dita, Senhor, a Tua sentença. Julga-me como um Deus. Eu julguei como homem.' O texto explica-se por si só. E o que é pior: nós (juízes e povo) acreditamos nas ideias do mito juiz-divindade.
Feita essa pontuação, do lugar do juiz, cabe apontar que é vício de pensamento achar que a Constituição de 1988 é coerente. Salo de Carvalho já mostrou que ela apresenta “múltiplas personalidades” — embora não acredite em personalidades. Ou seja, ao mesmo tempo em que aponta para sistema garantista, tem dispositivos inquisitórios. É somente no processo de atribuição de sentido (Lenio Streck) que a “coisa” pode acontecer. Inexistiu autoridade central na elaboração da CF 88, como bem mostrou Adriano Pilatti. O que se deu foi um "arrastão constitucional": muitos deputados e senadores querendo aparecer e uma Constituição que, embora possa trazer um semblant democrático, proporciona várias leituras totalitárias.
É como se houvesse uma "Estrutura Dual". No manifesto, a coisa é "mostrada" com a aparência de fundamentação, em um efeito estético persuasivo de semblante, enquanto no plano dos pressupostos, do latente, ou seja, do que serviu de fundamento, o vazio significante toma conta. O vazio, como tal, embora seja condição de possibilidade no caso de decisões judiciais, não pode ser qualquer coisa em uma Democracia. O julgador não está autorizado a julgar a partir de ementas e julgados embalados para presente, nem por jargões morais decorrentes de cruzadas sociais, nem muito menos no cínico (meu) “interesse público”. Os efeitos mágicos da produção veloz e em série contracenam com o descompromisso, com a ausência de responsabilidade do sujeito que assina. A tradição autêntica precisa fazer barreira e não se pode deixar levar por esta deriva de sentidos.
Fica valendo a cena do filme Matrix (1999): “É sua última chance. Depois não há como voltar atrás. Se você tomar a pílula azul, a história termina e você acorda em seu quarto, acreditando no que quiser acreditar. Tomando a pílula vermelha, você permanece no País das Maravilhas e eu te mostro quão profunda a toca do coelho pode ser”, diz Morpheus para Neo.
Sobre o tema discorre Zizek: "Mas a escolha entre a pílula azul e a vermelha não é verdadeiramente uma escolha entre ilusão e realidade. É claro que a Matrix é uma máquina de produzir ficções, mas são ficções que já estruturam nossa realidade. Se tirarmos da realidade as ficções simbólicas que a regulam, perdemos a nossa própria realidade. Eu quero uma terceira pílula. Mas o que é a terceira pílula? Certamente não algum tipo de pílula transcendental que conduza a uma experiência religiosa tipo fast-food, mas uma pílula que me permita perceber, não a realidade por trás da ilusão, masa realidade contida na própria ilusão. Se algo se torna muito traumático, muito violento, ou está muito cheio de gozo, as coordenadas de nossa realidade se estremecem. Precisamos transformar isso em ficção."
A melhor maneira de julgarmos um processo-crime é imaginar o enredo sem o ato violento, corrupto ou criminalizado. Sem ele, a coisa gira em outra frequência. Para julgar, precisamos estar instalados em uma ordem simbólica: é ela que nos dará os meios para avaliar o que dela se afasta. Essa mesma ordem simbólica, entretanto, pressupõe certo afastamento. Não é possível transformar-se em um dos personagens como em um jogo virtual. Nesse campo, os jogos virtuais promovem afastamento e são, de regra, muito violentos. Neles se mata, vive-se, consome-se drogas, estupra-se. São proibidos, e nisso, tudo é da ordem do excesso de gozo. Charles Melman dizia que a geração anterior era marcada pelo recalque, sua pedra de toque; atualmente vive-se a exigência do excesso de gozo – escópico, pode-se arriscar –, em que ver sem ser visto passa a ser um imaginário ponto de referência para o sujeito (Rubens Casara chama de Processo Penal do Espetáculo). Mas isso tem um preço.
Entretanto, nesse jogo entre andares da subjetividade, o espaço simbólico é não raro perturbado e a realidade sofre um processo de desintegração. Pode acontecer, assim, a passagem ao ato — de violência —, em suas mais variadas formas. O virtual apresenta-se como um dos lugares da subjetividade humana também aplicável aos juízes, embora pensar desse lugar, diz Pierre Legendre, seja atividade clandestina, quase proibida.
É como se fosse esperado do juiz a resposta baseada no “ego normal”, do sujeito da modernidade, da plena consciência — o qual domina, pela racionalidade, as causas e consequências das coisas que acontecem no mundo. E mais: é capaz de nomeá-las com o arsenal com que o Direito o instrumentaliza. Contudo, surgem sempre duas instâncias: o superego, que depende de trabalho individual em diálogo com o Outro, e também o que pode ser o mais íntimo e desconhecido do sujeito: a violência constitutiva.
O Direito Penal é a violência mediada pelo Estado. Aqui, a lição de São Paulo precisa ser invocada. Sem proibição não existe crime. Sem tipos penais, tampouco. Há algo de obsceno que, embora não possa ser dito, irrompe nos palcos judiciários. Nesse silêncio que diz, bem sabe Eni Orlandi, não raro surgem situações traumatizantes, a posteriori, como se vê nos crimes sexuais. E deve existir um sujeito no lugar do juiz, que deveria se envergonhar de violar a lei em nome de seus interesses, por exemplo.
Diz Jerzy Kosinski: "Àquilo que lembramos, falta o duro traço do fato. Para nos ajudarmos criamos pequenas ficções, cenários altamente sutis e individuais que possam esclarecer e modelar nossa vivência. O acontecimento recordado torna-se ficção, uma estrutura feita para acomodar certos sentimentos. A mim, isso se torna evidente. Não fora por essas estruturas, a arte seria pessoal demais para que o artista a criasse, mais ainda para que a plateia a compreendesse. Até o cinema, a mais literal de todas as artes, é editado".
Isso tudo para dizer que precisamos ensinar qual o devido lugar do juiz no processo penal em uma democracia. O senso comum teórico, fomentado pelos discursos alarmistas de hoje, exige que o juiz se coloque em um lugar cada vez mais paranoico. Demitir-se desse lugar paranoico ad hoc, de que falam Franco Cordero e Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, parece ser o desafio contemporâneo.
O problema, contudo, é que o sujeito não foi ensinado para tanto, mas justamente para o contrário. E ele gosta de ocupar esse lugar do sujeito que aparentemente sabe tudo. Não fosse imaginário, ingênuo e fugaz. Aliás, se fosse tão capaz não se aposentaria. É instrumentalizado e alienado. Parece ser uma perda de potência de gente habituada, no seu modo de ser, a dizer a Verdade do lugar do cajado, e este lugar sempre é empulhador, nos mostrou Lacan.
O lutar por reposicionar o juiz em lugar específico da estrutura, apartando-o da gestão da prova é a luta de todos os dias. Mas, ao que parece, isso não é assimilado pelo senso comum teórico, que demanda que ele retome as rédeas: assuma suas funções, paranoicas, de pontuar a Verdade. Enfim, o processo de “dessubstancialização” do lugar do juiz não depende de uma alteração processual, embora esta possa auxiliar. Depende fundamentalmente de uma postura, e é isso que se espera, ainda que atualmente o modelo protagonista seja o de projetar no outro o Berlusconi que habita em cada um de nós, mesmo que sutilmente adormecido. Só o tempo dirá.
PS: A indicação ao personagem Berlusconi se dá no sentido do documentárioVideocracy, de Erik Gandini.
 é juiz em Santa Catarina, doutor em Direito pela UFPR e professor de Processo Penal na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e na Univali (Universidade do Vale do Itajaí).

Revista Consultor Jurídico