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Política, Cidadania e Dignidade

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April 3, 2011 21:00 , von Unbekannt - | No one following this article yet.

Prisões do Brasil. Um pacote de equívocos que gera e mantém o caos.

September 2, 2015 7:03, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Entrevista Especial com Julita Lemgruber

"Toda legislação, toda norma de funcionamento da prisão, é basicamente masculina. A questão de gênero, que deveria atravessar todo o funcionamento do sistema penitenciário e deveria ser transversal a todos os demais campos, não é considerada", constata a pesquisadora.
Foto: balancododia.com.br
A combinação entre uma legislação que agrava penas e contribui para a superlotação dos presídiose a morosidade judicial que obstrui o fluxo de entrada e saída de encarcerados dos presídios é o principal fator que gera e sustenta a situação caótica do sistema prisional brasileiro. A análise é da socióloga Julita Lemgruber, que desde os anos 1980 estuda o tema e afirma que esse cenário se mantém inalterado ao longo de décadas. De acordo com a pesquisadora, os principais punidos por esta estrutura são os que estão na base da pirâmide social do país. “Aqui quem acaba sendo penalizado com a pena de prisão, com raríssimas exceções, sãoos pobres, os negros, aqueles que moram nas periferias, enfim, quem não tem voz nem poder nessa sociedade”, aponta.
A socióloga destaca que os presídios não são e nunca foram espaços de ressocialização e nem a solução para oferecer segurança. “É uma hipocrisia dizer que se privará alguém de liberdade para que essa pessoa aprenda a viver em liberdade. É uma contradição em termos e uma forma de justificar a existência da pena de privação da liberdade”, constata. E ainda afirma com veemência que “não há relação de causa e efeito entre aumento do número de presos e queda do número de crimes, em nenhum país do mundo”. Ao longo da entrevista concedida por telefone à IHU On-LineJulita Lemgruber também aborda a questão de gênero no sistema prisional a partir da perspectiva das mulheres presas e de sua visão particular como a primeira mulher a estar à frente da direção geral do sistema penitenciário do Rio de Janeiro, entre os anos 1991 e 1994.
Julita Lemgruber é graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, com mestrado em Sociologia pela Sociedade Brasileira de Instrução do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro - SBI/IUPERJ. Atualmente é coordenadora e pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes – UCAM. Entre suas publicações destacam-se Quem Vigia os Vigias (Rio de Janeiro: Record, 2003) e Cemitério dos Vivos: Análise Sociológica de uma Prisão Feminina (Rio de Janeiro: Forense).
Confira a entrevista.
Foto: domtotal.com
IHU On-Line - De que maneira a senhora avalia o sistema prisional hoje no Brasil? Como se chegou a esse quadro?
Julita Lemgruber - O punir o pobre no Brasil é caótico e essa é uma realidade de décadas, isso não é novidade. Eu particularmente já dei depoimentos em três CPIs [1], uma nos anos 1980, outra nos anos 1990 e outra nos anos 2000. Entre 1980 e 2010 houve três CPIs e agora recentemente houve uma quarta, só nesse período em que eu me dedico a esse assunto. Nessa última CPI me convidaram para dar um depoimento, mas eu me recusei porque eu já depus em três CPIs com quase dez anos de intervalo entre uma e outra e é impressionante, se você ler as análises e as conclusões finais dessas CPIs, elas são rigorosamente as mesmas: reconhecem o fracasso e caos absoluto do funcionamento do sistema penitenciário no Brasil. Então isso não é novidade para ninguém, é uma realidade de décadas e não se faz absolutamente nada.
Acho que a gente chegou a essa situação por várias razões, mas é evidente que o sistema de justiça criminal não funciona. Mas, vendo de uma outra perspectiva, dentro dos objetivos a que esse sistema se propõe numa sociedade como a brasileira, extremamente hierarquizada e desigual, o sistema penitenciário está aí para criminalizar a pobreza, e ele cumpre esse papel muito bem, pune muito bem. Aqui quem acaba sendo penalizado com a pena de prisão, com raríssimas exceções, são os pobres, os negros, aqueles que moram nas periferias, enfim, quem não tem voz nem poder nessa sociedade.
IHU On-Line - Em alguns de seus trabalhos a senhora aponta que o sistema prisional é a expressão de uma guerra contra a pobreza. Poderia falar um pouco sobre o que significa essa guerra?
Julita Lemgruber - O sistema penitenciário é a maior prova de que o sistema de justiça criminal funciona de forma a criminalizar a pobreza. O sistema penitenciário é o último momento desse ciclo de funcionamento. Na verdade, se fizéssemos uma análise ainda mais ampla, eu diria que o sistema de justiça criminal funciona de acordo com as leis vigentes nesse país, que também são normas que desde a sua origem têm o objetivo de deixar no claro aquelas ações que se deseja deixar no claro e criminalizar as ações de quem não tem poder e não tem voz na sociedade.

“As leis também são desenhadas de forma a proteger os interesses de uns e não de outros”

 

Há um estudo belíssimo de um jurista, já falecido, chamadoAugusto Thompson. Ele escreveu o livro Quem são os criminosos? O crime e o criminoso: entes políticos (Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2007) e nessa pesquisa ele mostra como tudo isso funciona de modo que o resultado final seja criminalizar os pobres e os sem poder. Desde o momento em que são feitas as leis há uma série de ações do cotidiano que acabam sem ser criminalizadas porque não interessa que se as criminalize. Então, as leis também são desenhadas de forma a proteger os interesses de uns e não de outros. É todo um sistema que funciona, sim, é eficaz, sim, para os objetivos a que se propõe, se for considerado que esses objetivos são os de criminalizar a pobreza. Isso acontece aqui e em qualquer país do mundo.
IHU On-Line - O sistema penal se propõe a atender o binômio punir/ressocializar os apenados. É possível a coexistência desses dois objetivos? De que forma?
Julita Lemgruber - São dois objetivos absolutamente antagônicos e é uma hipocrisia a gente insistir na possibilidade de que a privação da liberdade possa contribuir para reformar alguém. Sabemos que o sistema penitenciário está aí para punir o pobre, e pune muito bem. Esses sistemas não foram feitos para transformar criminosos em não criminosos. É uma hipocrisia dizer que se privará alguém de liberdade para que essa pessoa aprenda a viver em liberdade. É uma contradição em termos e uma forma de justificar a existência da pena de privação da liberdade.
O que eu tenho insistido é que a gente precisa ter clareza também de que no Brasil há problemas adicionais graves. Temos uma explosão do número de presos; hoje há mais de 600 mil encarcerados e só tem lugar para aproximadamente metade deles. Isso é resultado também de legislações inadequadas e funcionamento absolutamente caótico na entrada e na saída do sistema.
A primeira legislação, ainda nos anos 1990, instituindo os crimes hediondos, fez com que se oferecessem mais restrições na obtenção de qualquer possibilidade de benefício legal aos condenados por delitos dessa categoria. Esse foi o primeiro momento em que se agravaram penas, sempre com a ideia equivocada a que os juristas chamam de legislação do pânico.
O que aconteceu é que nos anos 1990 houve uma onda de sequestros, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, e aí surge a lei dos crimes hediondos com a expectativa de que isso pudesse inibir os sequestros. Depois, a filha da Glória Peres [2], Daniella Peres, foi assassinada e aí se considerou que também os homicídios seriam crimes hediondos. Em seguida, o tráfico de drogas também passou a ser considerado um crime hediondo. Então, hoje esse pacote de crimes hediondos é muito diverso, inclui crimes que vão do sequestro ao tráfico de drogas. Isso realmente contribuiu com a limitação dos benefícios legais que pessoas condenadas por esses crimes poderiam obter e também contribuiu muito para a superlotação do sistema.
Piora ainda mais em 2006, quando entrou em vigor a lei do tráfico e agravou essa situação porque tínhamos como pena mínima três anos para o tráfico de drogas, e a partir dessa legislação aumentou para cinco anos o mínimo para condenações por este delito, além do que não houve a distinção entre usuário e traficante, abrindo uma margem enorme para a rotulação de pessoas pobres, negras, faveladas como traficantes. Essa lei não ajudou.

 

“No Brasil 40% do contingente de 600 mil presos são provisórios, isso é um escândalo”

Sabemos que nos últimos 15 anos a população prisional em geral triplicou, mas a população presa especificamente por tráfico de drogas mais do que triplicou nos últimos cinco anos. Então, essa lei claramente piorou a situação dos presídios. Tem-se de um lado legislações que contribuíram para a explosão do número de presos, e por outro lado tem dois momentos do funcionamento do sistema de justiça criminal que também contribuem para isso. Cerca de 40% dos nossos presos são provisórios, e isso é um número impensável em alguns países do mundo. O máximo admitido é que se tenha 15% dos presos como provisórios, isto é, aqueles que ainda não estão condenados e aguardam por julgamento. Pense, no Brasil 40% do contingente de 600 mil presos são provisórios, isso é um escândalo, e ninguém se assusta com isso! E por que isso acontece? Porque essas pessoas não têm quem as defenda, e ficam mofando nas cadeias ou nas delegacias aguardando julgamento. É uma vergonha para o país.

Temos um problema grave na entrada do sistema penitenciário e também na saída, porque grande parte dos presos já condenado poderia ter algum benefício legal, como progressão de regime e livramento condicional. Entretanto, esses benefícios atrasam muito porque o sistema não está preparado para fornecer ao judiciário toda a documentação necessária para que sejam concedidos. Por sua vez, o judiciário e as varas de execução estão repletos de processos e não conseguem dar encaminhamento a tempo para as solicitações desses benefícios. Assim se tem umestrangulamento do sistema na entrada e na saída.

Então temos um sistema estrangulado e ainda, como pano de fundo, legislações que agravaram as penas, e — é importante que se diga — que não contribuíram para diminuir a criminalidade. Há um caos no sistema penitenciário, sem nenhum reflexo no controle da criminalidade; essa que é a grande questão. Não há relação de causa e efeito entre aumento do número de presos e queda do número de crimes em nenhum país do mundo. Essas duas variáveis não se comportam uma respondendo à outra. Quem está perdendo com esse processo na verdade é a segurança pública, porque estamos mandando para a cadeia criminosos que não são perigosos, e, por outro lado, a taxa de esclarecimentos de homicídios no Brasil é de menos de 10%. Em vez de estarmos ocupando espaços nas cadeias com pessoas que são violentas, estamos entupindo as cadeias com pequenos traficantes ou pessoas que não cometeram crimes violentos.
IHU On-Line - A senhora foi diretora-geral do sistema penitenciário do Rio de Janeiro de 1991 a 1994. O que mudou na situação do sistema penitenciário nesses 20 anos?
Julita Lemgruber – Não mudou nada. Há 20 anos se ouvia dizer que havia prisões no Brasil em que as mulheres usavam miolo de pão como absorvente higiênico, agora acaba de ser publicado um livro sobre a situação da mulher presa no país [3] e a autora mostra exatamente isso hoje, em 2015. Acho que isso é uma demonstração inequívoca de que não houve nenhum avanço, de que a situação continua caótica a despeito do fato de que hoje no Brasil tem uma pessoa na Presidência da República que é mulher, foi presa e torturada.
IHU On-Line - Como foi ser a primeira mulher a estar à frente do sistema penitenciário do Rio de Janeiro?
Julita Lemgruber – Não foi uma experiência fácil, tive muitos desafios ao estar à frente de um grupo, tanto de presos quanto de funcionários, que é composto basicamente por homens. Em um ambiente desses é muito desafiador impor autoridade, mas acho que consegui muitas vitórias exigindo que os agentes penitenciários, a todo o momento, cumprissem a lei e não disciplinassem os presos através da violência física. Essa foi uma luta constante. É difícil para qualquer um, tanto para homens quanto para mulheres, conseguir fazer com que agentes penitenciários compreendam que existe uma legislação e que, se houver necessidade de disciplinar os presos, deve ser usado o regulamento, e não a violência física.
Por outro lado, também tive que lidar com a questão da corrupção, que é uma coisa entranhada na vida desse país, e no sistema penitenciário não é diferente. Lutar contra a violência, a corrupção e se impor enquanto profissional demanda muita dedicação. Claro que o fato de ser mulher sempre teve alguma influência, porque há uma expectativa de papel em relação à mulher, de que ela talvez não tenha autoridade suficiente para lidar com essa realidade, mas acho que no meu caso isso não teve tanto peso porque eu já era uma pessoa conhecida. Quando assumi o sistema penitenciário já estava lá há alguns anos trabalhando junto à direção, então eu não era alguém desconhecido nem para presos, nem para funcionários.

“A mulher é punida duplamente, pela lei e pela regra social de uma sociedade que tem uma expectativa diferente de papel para ela”

 
IHU On-Line - Sua pesquisa de mestrado, que resultou na obra Cemitério dos Vivos: análise sociológica de uma prisão de mulheres (Rio de Janeiro: Forense, 1999), se debruçou sobre a situação da mulher presa. De que modo a perspectiva de gênero perpassa as questões da criminalidade e da punição?
Julita Lemgruber – A mulher sofre duplamente quando ela comete um crime e vai para a prisão. Se por um lado ela é punida como os homens porque há uma legislação penal que determina quais comportamentos são criminosos, em outra via ela sofre uma punição adicional porque da mulher não é esperado que ela seja criminosa. Há uma expectativa de que a mulher seja uma figura dócil, que vai cuidar dos filhos, será uma boa mãe, esposa e companheira, mas quando acaba na vida do crime, em geral ela vai ser literalmente abandonada na cadeia. Assim, a mulher é punida duplamente, pela lei e pela regra social de uma sociedade que tem uma expectativa diferente de papel para ela.
Ainda, se observamos o dia de visita de uma cadeia masculina, há filas enormes cheias de mães, esposas, companheiras, filhas, irmãs, carregando sacolas levando desde um lanche até artigos de higiene, enfim, tudo aquilo que o Estado ilegalmente não fornece ao preso. Já nas prisões femininas as filas de visita são infinitamente menores, as mulheres são muito pouco visitadas. Na época em que eu fiz a pesquisa eu ouvi histórias do tipo: “Meu marido diz para os meus filhos que eu morri porque ele tem vergonha de vir aqui me visitar e trazer as crianças”. Isso quase não acontece em prisão de homem.
Toda legislação, toda norma de funcionamento da prisão, é basicamente masculina. A questão de gênero, que deveria atravessar todo o funcionamento do sistema penitenciário e deveria ser transversal a todos os demais campos, não é considerada. As prisões do mundo inteiro são feitas basicamente para abrigar homens. Mundialmente mais de 90% dos apenados são do sexo masculino. Então, as prisões são feitas para abrigar homens, são geridas por homens e suas regras estão muito mais preocupadas com homens do que com mulheres. Assim as mulheres sofrem de muitas maneiras quando são privadas de liberdade em qualquer país.
IHU On-Line - De que modo a senhora avalia o campo de estudos acadêmicos que trata das discussões sobre segurança e sistemas punitivos? Que papel tem a academia nesses debates?
Julita Lemgruber – Lamentavelmente o sistema penitenciário jamais foi um assunto de interesse da academia, pelo menos ao longo dessas décadas que eu acompanho esse tema. Isso é muito triste porque uma das coisas que poderia propiciar avanços nessa área é o compromisso de estudiosos, tanto alunos quanto professores, em discutir essas questões e buscar alternativas, seja para o funcionamento da prisão, seja para o aperfeiçoamento de algumas das estratégias que compõem a atividade do sistema penitenciário. Hoje, se formos procurar livros sobre prisões no Brasil, não encontraremos nem uma dúzia. Ao contrário, eu diria que nos últimos 20 anos a temática da segurança pública, por exemplo, vem despertando muito interesse na academia. Atualmente estão espalhados pelo Brasil vários centros de estudos dedicados aos temas da segurança pública, da violência, das polícias. Mas, lamentavelmente, o sistema penitenciário não foi um ponto que seduziu os estudiosos do sistema de justiça criminal. Se essa situação fosse diferente, talvez tivéssemos mais avanços.

“Essa bancada 'BBB' está interessada em comunidades terapêuticas, na internação forçada de usuários de drogas, quer reduzir a maioridade penal, tudo isso pensando nos lucros que vai ter com a privatização”

IHU On-Line - De que forma a senhora vê as discussões sobre a proposta de privatização dos presídios? Qual a questão de fundo em torno destas privatizações?
Julita Lemgruber – Acho que claramente nesse momento há muitos interesses em jogo. A própria discussão daredução da maioridade penal e a possibilidade do aumento significativo no número de presos que essa decisão implicaria vão, necessariamente, provocar a discussão sobre a necessidade de criação de mais vagas nos presídios. A inclinação para uma medida que num primeiro momento parece mais fácil e rápida, que é a privatização, costuma surgir nesses momentos.
Ninguém para e pensa que se atentássemos para as questões que eu apontei antes, como o estrangulamento do sistema penal na entrada e na saída dos presos e a legislação equivocada que agrava penas, talvez tivéssemos metade do número de apenados que temos hoje no país. Então, nesses momentos em que há superlotação, em que há riscos de redução da maioridade penal, essa discussão da privatização é muito presente. Eu sou radicalmente contra, tenho várias ressalvas quanto a isso. A primeira diz respeito a uma questão ética, política e ideológica, com a qual geralmente ninguém está muito preocupado. É o Estado que priva alguém de liberdade, então é ele quem tem que administrar essa privação da liberdade, não pode entregá-la para a iniciativa privada cuidar. Isso seria um absurdo do ponto de vista ético, moral, político e ideológico. Mas esse debate não é feito.
Outro ponto importante é que prisões privadas não custam mais barato. O custo per capita de um preso em uma prisão privada é até três vezes maior do que em uma prisão pública. Os contratos desse tipo de presídio são de até de 30 anos. Na verdade, se tivéssemos um funcionamento adequado do sistema penitenciário, não haveria a preocupação com a criação de novas vagas.
Hoje há claros interesses no congresso. Essa bancada “BBB” está interessada em comunidades terapêuticas, na internação forçada de usuários de drogas, quer reduzir a maioridade penal, tudo isso pensando nos lucros que vai ter com a privatização. Sabemos também que num primeiro momento a ideia de privatizar é muito tentadora, porque vai aumentar a oferta de vagas, sem a preocupação inicial de despender grandes investimentos do Estado, mas depois vamos ficar na mão dos sistemas prisionais privados por no mínimo 30 anos, que é o tempo dos contratos que geralmente são firmados. Ninguém sabe o que vai acontecer neste país daqui a dez anos e aí ficaremos escravos da privatização de uma área que pode ter um encaminhamento diferente nesse período.
Nos Estados Unidos, por exemplo, há vários Estados que estão fechando prisões privadas por falta de presos porque a criminalidade diminuiu muito em diversos lugares. Eles estão com vagas ociosas e tendo que pagar como se aquela prisão estivesse cheia, porque o contrato diz que a unidade deve ser mantida por um número determinado de anos, com uma certa quantidade de presos e pagando um valor per capita por eles. Os Estados Unidos estão se desdobrando para dar conta desses contratos milionários. Nessa experiência ficou comprovado que foram interesses do lobby das prisões privadas, que contrataram lobistas para funcionar nas assembleias legislativas estaduais fazendo um jogo de interesses muito bem costurado. Algumas dessas empresas de prisões privadas contrataram até parentes de membros das assembleias legislativas estaduais para funcionarem como lobistas. O objetivo da articulação dessas pessoas era conseguir agravar as penas para criar uma demanda grande por espaço nas prisões que propiciasse a contratação de vagas privadas. Nós estamos vivendo a mesma coisa, com uma bancada no nosso congresso que quer agravar as penas, quer tornar a situação mais caótica com redução da maioridade, para provocar uma situação em que a resposta vai ser a prisão privada. Desse modo vamos ficar escravos de arranjos que podem se tornar absolutamente desnecessários daqui a uma ou duas décadas e aí o Brasil estará refém dessas empresas.
Por Leslie Chaves
Notas:
[1] Comissão Parlamentar de Inquérito. (Nota da IHU On-Line)
[2] Glória Perez (1948): é uma autora de telenovelas, séries e minisséries brasileiras. Em dezembro de 1992 sua filha, Daniella Perez, que na época trabalhava como atriz na novela “De Corpo e Alma”, que Glória escrevia para a Rede Globo, foi brutalmente assassinada pelo colega de trabalho Guilherme de Pádua. (Nota da IHU On-Line)
[3] QUEIROZ, Nana. Presos que menstruam. A brutal vida das mulheres – tratadas como homens – nas prisões brasileiras (Rio de Janeiro: Record, 2015). (Nota da IHU On-Line)



Que torna nossas metrópoles insustentáveis

September 2, 2015 6:34, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

POR 
REDAÇÃO

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Reportagem sobre uma praga brasileira. Empreiteiras financiam partidos, dirigem Orçamento das cidades e as moldam segundo seus próprios interesses
Por Thales Schmidt e Vinicius Martins | Imagem: Chensiyuan
“A liberdade da cidade é muito mais que um direito de acesso àquilo que já existe: é o direito de mudar a cidade mais de acordo com o desejo de nossos corações”. David Harvey no artigo “A Liberdade da Cidade” – publicado no livro Cidades Rebeldes – reflete que, além de usufruir de bens e serviços indispensáveis à vida, a população urbana deve ter o direito de decidir os rumos do desenvolvimento das cidades.
Desde 2001 algumas ações do governo federal têm apontado nessa direção: aplicação do Estatuto da Cidade (lei 10.257/01), criação do ministério das Cidades, obrigatoriedade da elaboração de Planos Diretores Participativos para municípios com mais de 20 mil habitantes – e a implantação do programa Minha Casa, Minha Vida.
O objetivo dessas iniciativas é definir a função social da cidade e da propriedade, além de buscar soluções para problemas crônicos causados pelo crescimento desordenado e excludente das áreas urbanas. Os principais atingidos desse quadro são as populações de baixa renda, afetadas, principalmente, pela falta de acesso aos equipamentos e serviços públicos essenciais como praças, escolas, hospitais, transporte e segurança.
Apesar da criação desses mecanismos de regulação, a direção do solo urbano ainda não pertence aos interesses da sociedade civil. O mercado imobiliário e as empreiteiras são os responsáveis por determinar a finalidade da cidade e por expor a crise prática da legislação de terras nos municípios.
A disputa pela cidade
“O que está comandando as cidades não é interesse público, não é interesse coletivo, não é justiça social, não é sustentabilidade. Tudo isso é discurso, todas as grandes cidades brasileiras têm ótimos planos diretores, a nossa legislação é muito avançada, conhecimento técnico nós temos, mas nós estamos perdendo na correlação de forças, estamos levando uma surra na disputa com aqueles que têm lucro com as cidades, com o crescimento das cidades”, analisa Ermínia Maricato, professora titular do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, e autora da proposta de criação do ministério das Cidades do Brasil.
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Quase um quarto, 22%, ou 1,39 milhão dos 6,2 milhões habitantes do Rio de Janeiro moram em aglomerados subnormais, as chamadas favelas

O Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) demonstra que 84% da população brasileira vivem em áreas urbanizadas. Estima-se que existam no país cerca de 6329 aglomerados subnormais – ou favelas -, de acordo com o último Censo do IBGE. O número engloba um total de 3.224.529 domicílios e 11.425.644 pessoas.
Segundo Juliano Costa Gonçalves, professor da Universidade Federal de São Carlos e autor do livro Especulação imobiliária na formação de loteamentos urbanos: um estudo de caso, a prática acarreta em conflitos na organização espacial das cidades. “O processo de urbanização costuma ser bastante caro, como levar saneamento e energia a novos bairros, por exemplo. Quando essas áreas ficam presas no processo de especulação, aumenta-se a área urbana. Então, você obriga que algumas pessoas morem nas regiões mais periféricas da cidade, que muitas vezes não têm bons processos de urbanização nesses lotes”, ressalta Gonçalves.
O pesquisador lista outras consequências da especulação, como a falta de acesso à infraestrutura pública básica: iluminação, ruas asfaltadas, escolas e hospitais. No rol de problemas produzidos pelo mercado de terras estão os vazios urbanos e o alargamento do tecido urbano, a segregação sócio-espacial – provocada pela alta no preço dos aluguéis – e complicações na configuração do transporte público. Ou seja, os pobres não frequentam os mesmos parques, escolas e hospitais que os ricos.
Gislene Pereira, professora da Universidade Federal do Paraná, analisa que esse processo é cíclico dentro do sistema capitalista, portanto está presente em outros países do globo. “A cidade que temos é resultado da forma pela qual ela é produzida, ou seja, dentro das regras de produção de um sistema capitalista. Esse modelo de cidade, portanto, é o mesmo em todos os países capitalistas. E os problemas – segregação espacial, periferia, carência de infraestrutura, etc – estão presentes em todas as cidades capitalistas; não é, portanto, uma exclusividade do Brasil”, explica.
Para lidar com déficit de habitação no país, o governo federal criou em 2009 o Minha Casa, Minha Vida. Atualmente, o programa encontra-se em sua segunda fase e promete entregar mais 1,6 milhões de moradias até o fim do ano. No entanto, o projeto costuma receber críticas de especialistas em urbanismo. “O maior déficit habitacional no Brasil está na faixa de 0 a 3 salários mínimos, faixa que praticamente não é atendida pelo programa Minha Casa Minha Vida. Nessa situação, o deficit deve aumentar, como efetivamente está ocorrendo”, aponta Gislene Pereira.
Gislene complementa que: “o problema do deficit habitacional deveria ser enfrentado de modo articulado com a questão do uso da terra urbana. Não falta terra, o que falta, de fato, é terra urbanizada a preço acessível. Dessa forma, somente se pode pensar em atender às demandas por habitação se houver uma política de controle do uso do solo de forma a garantir a oferta de terra urbanizada a preços acessíveis para a população de menor renda”.
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O aumento dos valores dos contratos de venda e aluguel em São Paulo costuma ser maior do que a inflação do mesmo período. Em 2010 – um ano após o lançamento do Minha Casa, Minha Vida – o valor do aluguel mais que dobrou em comparação com a inflação do período. Fonte: Índice Fipe Zap
Empreiteiros: os senhores da cidade
O Minha Casa, Minha Vida é um dos programas dos programas federais que vêm garantindo uma poderosa fonte de recursos para as empreiteiras nacionais – empresas responsáveis por empreendimentos vitais para a cidade como obras rodoviárias, túneis, pontes e até a construção dos edifícios e casas em que habitamos. Nesse setor, a unidade usada para calcular projetos, valores e lucros é a dos bilhões.
Boa parte do fluxo de dinheiro que alimenta o caixa dessas empresas vem do Estado brasileiro por obras dos governos federal e estaduais. Segundo levantamento da revista O Empreiteiro, referência do setor de engenharia, em 2013 a União foi responsável por investir R$ 12,416 bilhões em obras e serviços por meio de licitações públicas; todavia, o valor ainda é menor que o investido pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco no mesmo período: R$ 18,415 bilhões.
Os eventos esportivos sediados pelo Brasil – Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro – têm garantido contratos gordos para o setor. De acordo com reportagem da Agência Pública, os dez maiores contratos dos dois eventos chegam a quase R$ 30 bilhões. Programas federais com grandes investimentos em obras de infraestrutura econômica e social, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) – iniciado em 2007 e já na segunda edição – também fazem a festa das corporações.
O casamento entre poder público e empreiteiras, contudo, é de longa data. O historiador Pedro Campos, professor da Universidade Federal Rural de Rio de Janeiro, analisou a formação das principais empreiteiras brasileiras durante a ditadura civil-militar brasileira (1964-1985) em sua tese de doutorado. “Os empreiteiros já eram importantes no país antes da ditadura, eles crescerem muito na década de 50, em especial nas obras de Juscelino Kubitischeck (1956-1961). Naquele período eles começam a se organizar em nível nacional, criaram organizações de empreiteiros e a partir dessas organizações passam a ter um papel político e uma atuação junto ao aparelho de Estado muito decisiva”.
Durante o regime ditatorial, a situação melhorou ainda mais para as empreiteiras nacionais. Por meio do decreto 64.345, o militar e então presidente Artur da Costa e Silva (1964-1966) determinou que obras de infraestrutura no Brasil só poderiam ser feitas por empresas nacionais. A medida ajudou o estabelecimento das empreiteiras brasileiras em áreas com forte concorrência internacional, como a construção de hidrelétricas, engenharia industrial, de petróleo e outras obras urbanas. A decisão fez com que as empreiteiras nacionais fossem as únicas beneficiadas pelos grandiosos projetos desenvolvimentistas dos militares. A restrição a empresas estrangeiras só foi revertida em 1991 pelo presidente Fernando Collor (1990-1992).
“Existia um cenário ideal para o desenvolvimento dessas empresas, tanto é que elas se desenvolveram de maneira bastante expressiva ao longo do regime. E no final da ditadura o que a gente tinha eram grandes conglomerados econômicos, aquelas empreiteiras que já eram grandes e importantes na ditadura no final eram multinacionais que atuavam em vários lugares do mundo”, aponta Pedro Campos.
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Evolução da receita bruta das empreiteiras nacionais mostra consolidação da baiana Norberto Odebrecht como a principal empresa do setor, única a ultrapassar R$ 10 bilhões de receita bruta em 2013. Fonte: O Empreiteiro
As grandes empreiteiras nacionais são superlativas em todos os seus números. A maior delas, a construtora baiana Norberto Odebrecht, teve em 2013 uma receita bruta de R$ 10,149 bilhões e conta com mais de 125 mil funcionários. Segundo ranking das maiores empresas do setor realizado pela revista O Empreiteiro, 40% da receita no período se deve a contratos com o setor público.
Levantamento do Estadão Dados apontou que a mesma Odebrecht foi responsável por doar R$ 47,7 milhões para a campanha eleitoral de 2014. Outra gigante do setor, a Andrade Gutierrez doou R$ 93,6 para o mesmo pleito. Ainda assim, nenhuma doadora supera o grupo pecuarista JBS, com R$ 357,3 milhões aplicados. Na legislação atual, as empresas podem doar até 2% do faturamento bruto do ano anterior ao da eleição.
O fim das doações empresariais foi um dos pontos das mudanças políticas votadas pela Câmara dos Deputados. Embora a extinção das doações de empresas tenha sido aprovada em primeira votação, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) conseguiu reverter a decisão por meio de manobra regimental no dia seguinte; procedimento repetido durante a votação da redução maioridade penal. Os temas ainda serão votados novamente por Câmara e Senado.
“O grande problema urbano no Brasil hoje é o financiamento de campanha. Está tudo absolutamente comprometido com o financiamento de campanha. Nas nossas grandes cidades, e pequenas e médias também, grande parte da orientação do crescimento urbano é dada por interesses de proprietários de uma elite local, das grandes empreiteiras, do capital imobiliário e dos parlamentares e prefeitos de plantão. É assim que se dá a decisão, por exemplo, de ao invés de construir metrô, você construir viaduto, ponte, túnel, para transporte rodoviário e não transporte sobre trilho”, indica Erminia Maricato.
O historiador Campos também aponta o financiamento privado como um grande problema do sistema político atual: “Se uma empresa que presta serviços ao Estado pode (financiar campanhas), é obvio que isso vai dar problemas. Se uma empreiteira que faz obra pública para um governo pode financiar campanha, isso é realmente algo que vai gerar problemas, distorções e uma rede de propinas”. Para o historiador, as doações são uma espécie de “investimento” para conquistar “protagonismo e poder politico”.
Desde 2014, a Polícia Federal e Ministério Público Federal investigam uma rede de corrupção e distribuição de propinas na Petrobras, os investigadores acreditam que o esquema ocorra há pelo menos 10 anos. A chamada Operação Lava Jato apura o desvio de bilhões de reais de licitações e contratos da maior estatal brasileira, dinheiro usado para pagar altos funcionários corruptos e políticos. PT, PMDB, PP, PSDB e PSB abrigam 47 políticos alvos de investigação por participação no esquema. A lista de suspeitos inclui os presidentes da Câmara Federal e do Senado: Eduardo Cunha e Renan Calheiros – ambos do PMDB.
O processo se notabilizou por ir além das operações policiais mais costumeiras no Brasil ao prender não só agentes políticos e públicos corruptos, mas também os corruptores. Altos dirigentes de empreiteiras como OAS, Camargo Corrêa, Mendes Júnior, Queiroz Galvão, UTC, Engevix, Iesa e Galvão Engenharia estão respondendo pelos desvios praticados. Marcelo Odebrecht, presidente da maior empreiteira nacional, e Otávio Marques de Azevedo, chefão da Andrade Gutierrez, estão em prisão preventiva.
Regulação urbana
Ainda que o Brasil tenha mecanismos de regulação do tecido urbano que são referências mundiais – como edificação compulsória, o IPTU progressivo, a Desapropriação para Fins de Reforma Urbana, o Direito de Preempção, a Outorga Onerosa e outras ferramentas – os interesses das empreiteiras costumam prevalecer na decisão da política urbana das cidades brasileiras. No meio do caminho da efetivação do direito à cidade estão a política e o jogo de correlação de forças que traça os rumos do desenvolvimento e emprego de verbas públicas.
A aplicação de tais instrumentos legais seria vital no atual contexto de forte especulação imobiliária das médias e grandes cidades brasileiras. Entretanto, há uma crise prática que impede o efeitos da legislação no espaço urbano. “O que você tem agora é uma politica que é regressiva do ponto de vista da sustentabilidade ambiental, da justiça social e territorial, do direito à cidade. Atualmente, as nossas cidades, com raras exceções, estão em um caminho regressivo”, analisa Ermínia Maricato.
“O planejamento tem que atuar sobre a lógica de produção do solo urbano, o que significa utilizar os instrumentos legais existentes para interferir na lógica de produção urbana individual, priorizando a questão coletiva. O Brasil, apesar de avançado na legislação, ainda está engatinhando na aplicação desses instrumentos. Como referência, citaria as cidades de Bogotá e Medellin, na Colômbia, que têm obtido bons resultados nas políticas urbanas”, aponta Gislene Pereira.
As cidades de Bogotá e Medellin têm priorizado os cidadãos para guiar o desenvolvimento urbano. Em pouco mais de oito anos, os municípios investiram em mobilidade urbana planejada e sustentável, segurança cidadã com a remodelação das polícias e um novo ordenamento do espaço público. As melhorias colocam como foco as populações de baixa renda, dispondo para esses estratos sociais equipamentos públicos como escolas, bibliotecas, hospitais, praças e espaços de convivência, além de corredores para ônibus e ciclovias. Todas as obras fazem parte de uma política integrada de desenvolvimento urbano. Os resultados diminuíram os índices de violência urbana e colocaram as duas cidades entre as melhores indicadores de qualidade de vida da Colômbia.



Boaventura: Para ler em 2050

September 2, 2015 6:32, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


150830-Distopia
“Por isso, aconteceu o que aconteceu. O quão terrível foi está inscrito no modo como tentamos curar as feridas da carne e do espirito ao mesmo tempo que reinventamos uma e outro”
Por Boaventura de Sousa Santos
Quando um dia se puder caracterizar a época em que vivemos, o espanto maior será que se viveu tudo sem antes nem depois, substituindo a causalidade pela simultaneidade, a história pela notícia, a memória pelo silêncio, o futuro pelo passado, o problema pela solução. Assim, as atrocidades puderam ser atribuídas às vítimas, os agressores foram condecorados pela sua coragem na luta contra as agressões, os ladrões foram juízes, os grandes decisores políticos puderam ter uma qualidade moral minúscula quando comparada com a enormidade das consequências das suas decisões. Foi uma época de excessos vividos como carências; a velocidade foi sempre menor do que devia ser; a destruição foi sempre justificada pela urgência em construir. O ouro foi o fundamento de tudo, mas estava fundado numa nuvem. Todos foram empreendedores até prova em contrário, mas a prova em contrário foi proibida pelas provas a favor. Houve inadaptados, mas a inadaptação mal se distinguia da adaptação, tantos foram os campos de concentração da heterodoxia dispersos pela cidade, pelos bares, pelas discotecas, pela droga, pelo facebook.
A opinião pública passou a ser igual à privada de quem tinha poder para a publicitar. O insulto tornou-se o meio mais eficaz de um ignorante ser intelectualmente igual a um sábio.
Desenvolveu-se o modo de as embalagens inventarem os seus próprios produtos e de não haver produtos para além delas. Por isso, as paisagens converteram-se em pacotes turísticos e as fontes e nascentes tomaram a forma de garrafa. Mudaram os nomes às coisas para as coisas se esquecerem do que eram. Assim, desigualdade passou a chamar-se mérito; miséria, austeridade; hipocrisia, direitos humanos; guerra civil descontrolada, intervenção humanitária; guerra civil mitigada, democracia. A própria guerra passou a chamar-se paz para poder ser infinita. Também a Guernika passou a ser apenas um quadro de Picasso para não estorvar o futuro do eterno presente. Foi uma época que começou com uma catástrofe mas que em breve conseguiu transformar catástrofes em entretenimento. Quando uma catástrofe a sério sobreveio, parecia apenas uma nova série.
Todas as épocas vivem com tensões, mas esta época passou a funcionar em permanente desequilíbrio, quer ao nível coletivo, quer ao nível individual. As virtudes foram cultivadas como vícios e os vícios como virtudes. O enaltecimento das virtudes ou da qualidade moral de alguém deixou de residir em qualquer critério de mérito próprio para passar a ser o simples reflexo do aviltamento, da degradação ou da negação das qualidades ou virtudes de outrem. Acreditava-se que a escuridão iluminava a luz, e não o contrário.
Operavam três poderes em simultâneo, nenhum deles democrático: capitalismo, colonialismo e patriarcado; servidos por vários sub-poderes, religiosos, mediáticos, geracionais, étnico-culturais, regionais. Curiosamente, não sendo nenhum democrático, eram o sustentáculo da democracia-realmente-existente. Eram tão fortes que era difícil falar de qualquer deles sem incorrer na ira da censura, na diabolização da heterodoxia, na estigmatização da diferença. O capitalismo, que assentava nas trocas desiguais entre seres humanos supostamente iguais, disfarçava-se tão bem de realidade que o próprio nome caiu em desuso. Os direitos dos trabalhadores eram considerados pouco mais que pretextos para não trabalhar. O colonialismo, que assentava na discriminação contra seres humanos que apenas eram iguais de modo diferente, tinha de ser aceito como algo tão natural como a preferência estética. As supostas vítimas de racismo e de xenofobia eram sempre provocadores antes de serem vítimas. Por sua vez, o patriarcado, que assentava na dominação das mulheres e na estigmatização das orientações não heterossexuais, tinha de ser aceito como algo tão natural como uma preferência moral sufragada por quase todos. Às mulheres, homossexuais e transsexuais haveria que impor limites se elas e eles não soubessem manter-se nos seus limites.
Nunca as leis gerais e universais foram tão impunemente violadas e seletivamente aplicadas, com tanto respeito aparente pela legalidade. O primado do direito vivia em ameno convívio com o primado da ilegalidade. Era normal desconstituir as Constituições em nome delas.
O extremismo mais radical foi o imobilismo e a estagnação. A voracidade das imagens e dos sons criava turbilhões estáticos. Viveram obcecados pelo tempo e pela falta de tempo. Foi uma época que conheceu a esperança mas a certa altura achou-a muito exigente e cansativa. Preferiu, em geral, a resignação. Os inconformados com tal desistência tiveram de emigrar. Foram três os destinos que tomaram: iam para fora, onde a remuneração econômica da resignação era melhor e por isso se confundia com a esperança; iam para dentro, onde a esperança vivia nas ruas da indignação ou morria na violência doméstica, no crime comum, na raiva silenciada das casas, das salas de espera das urgências hospitalares, das prisões, e dos ansiolíticos e anti-depressivos; o terceiro grupo ficava entre dentro e fora, em espera, onde a esperança e a falta dela alternavam como as luzes nos semáforos. Pareceu estar tudo à beira da explosão, mas nunca explodiu porque foi explodindo, e quem sofria com a explosões ou estava morto, ou era pobre, subdesenvolvido, velho, atrasado, ignorante, preguiçoso, inútil, louco – em qualquer caso, descartável. Era a grande maioria, mas uma insidiosa ilusão de ótica tornava-a invisível. Foi tão grande o medo da esperança que a esperança acabou por ter medo de si própria e entregou os seus adeptos à confusão.
Com o tempo, o povo transformou-se no maior problema, pelo simples fato de haver gente a mais. A grande questão passou a ser o que fazer de tanta gente que em nada contribuía para o bem estar dos que o mereciam. A racionalidade foi tão levada a sério que se preparou meticulosamente uma solução final para os que menos produziam, por exemplo, os velhos. Para não violar os códigos ambientais, sempre que não foi possível eliminá-los, foram biodegradados. O êxito desta solução fez com que depois fosse aplicada a outras populações descartáveis, tais como os imigrantes, jovens das periferias, toxicodependentes, etc.
A simultaneidade dos deuses com os humanos foi uma das conquistas mais fáceis da época. Para tal bastou comercializá-los e vendê-los nos três mercados celestiais existentes, o do futuro para além da morte, o da caridade e o da guerra. Surgiram muitas religiões, cada uma delas parecida com os defeitos atribuídos às religiões rivais, mas todas coincidiam em serem o que mais diziam não ser: mercado de emoções. As religiões eram mercados e os mercados eram religiões.
É estranho que uma época que começou  como só tendo futuro (todas as catástrofes e atrocidades anteriores eram a prova da possibilidade de um novo futuro sem catástrofes nem atrocidades) tenha terminado como só tendo passado. Quando começou a ser excessivamente doloroso pensar o futuro, o único tempo disponível era tempo passado. Como nunca nenhum grande acontecimento histórico foi previsto, também esta época terminou de modo que colheu todos de surpresa. Apesar de ser geralmente aceito que o bem comum não podia deixar de assentar no luxuoso bem estar de poucos e no miserável mal-estar das grandes maiorias, havia quem não estivesse de acordo com tal normalidade e se rebelasse. Os inconformados dividiam-se em três estratégias: tentar melhorar o que havia, tentar romper com o que havia, tentar não depender do que havia. Visto hoje, a tanta distância, era obvio que as três estratégias deviam ser utilizadas articuladamente, ao modo da divisão de tarefas em qualquer trabalho complexo, uma espécie de divisão do trabalho do inconformismo e da rebeldia. Mas, na época, tal não foi possível, porque os rebeldes não viam que, sendo produto da sociedade contra a qual lutavam, teriam de começar por se rebelar contra si próprios, transformando-se eles próprios antes de quererem transformar a sociedade. A sua cegueira fazia-os dividir-se a respeito do que os deveria unir e unir-se a respeito do que os devia dividir. Por isso, aconteceu o que aconteceu. O quão terrível foi está bem inscrito no modo como vamos tentando curar as feridas da carne e do espirito ao mesmo tempo que reinventamos uma e outro.
Porque teimamos, depois de tudo? Porque estamos reaprendendo a alimentar-nos da erva daninha que a época passada mais radicalmente tentou erradicar, recorrendo para isso aos mais potentes e destrutivos herbicidas mentais – a utopia.



Polícia Federal acionada contra tucano 'assassino'

September 2, 2015 6:31, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Advogado filiado ao PSDB afirma que, caso Dilma Rousseff não saia do Brasil, 'com a foice e o com o martelo nós vamos arrancar sua cabeça'.

Viomundo (via Blog do Altamiro Borges)
reprodução
O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) apresentou, nesta segunda-feira (31), um conjunto de requerimentos à Polícia Federal, Ministério da Justiça, Ministério Público Federal e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para que seja apurada a ameaça de morte à Presidenta Dilma Rousseff feita por um advogado de Brasília, e que em 2014 concorreu ao cargo de deputado federal pelo PSDB.
 
Em vídeo divulgado nas redes sociais, Matheus Sathler Garcia afirma que, caso a Presidenta Dilma não saia do Brasil até a véspera do dia 7 de setembro, “sangue vai rolar”, e prossegue dizendo que “com a foice e o com o martelo nós vamos arrancar sua cabeça e pregar e fazer um memorial pra você”.
 
No pedido remetido à PF, o deputado Pimenta solicita que o advogado filiado ao PSDB seja ouvido para que reafirme diante da autoridade policial as ameaças feitas à Presidenta Dilma. “Ele terá uma oportunidade para reafirmar as ameaças e esclarecer o teor de sua manifestação”, enfatizou Pimenta, lembrando que recentemente, em um caso idêntico, um americano foi detido após ameaçar de morte o Presidente Barack Obama. Nos Estados Unidos ameaças dirigidas ao Presidente são punidas com até 10 anos de prisão.
 
Em outro documento enviado ao Ministério da Justiça, o parlamentar requer “instauração de procedimento investigatório adequado”. De acordo com o Código Penal cabe, exclusivamente, ao ministro da Justiça proceder quando crimes contra a honra forem dirigidos à Presidente da República.
 
O deputado Pimenta fez ainda mais três encaminhamentos: ao Gabinete de Segurança Institucional do Ministério da Justiça, responsável pela segurança do 7 de setembro; um pedido de providências ao Ministério Público Federal, por incitação ao crime; e à Ordem dos Advogados do Brasil, para que o Tribunal de Ética e Disciplina instaure processo disciplinar contra Matheus Sathler Garcia.
 
De acordo com Pimenta, além das ameaças, o advogado prega mecanismos violentos de rompimento da ordem constitucional, com flagrante escárnio pelos princípios do Estado Democrático de Direito.
 
“O Código prevê ainda que o advogado ‘deve ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos’ (artigo 3º).
 
O advogado Matheus Diniz Sathler Garcia, ao contrário, prega mecanismos violentos e que se valem até mesmo de tortura e da morte para finalidades políticas”, diz o pedido do deputado Pimenta enviado à OAB.



Eduardo Cunha prepara saída magistral da cena política

September 2, 2015 6:30, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Eduardo Cunha não digeriu, até agora, o discurso de seu hoje ex-aliado no PSDB, o senador Aécio Neves e disparou: 'não vou cair sozinho'.

Correio do Brasil
José Cruz / Agência Brasil
Cada vez mais isolado, dentro e fora de seu partido, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, prepara sua saída do cargo de forma magistral, segundo fontes adiantaram ao Correio do Brasil, nesta segunda-feira. Cunha não digeriu, até agora, o discurso de seu hoje ex-aliado no PSDB, o senador Aécio Neves (MG) e a expectativa, antes da possível queda nos próximos dias, é quem ele levará junto, na descida, após avisar aos navegantes: “Não vou cair sozinho”.
 
Neves desembarcou da aventura golpista liderada por Cunha, ao perceber que a campanha para o impedimento da presidenta Dilma Rousseff fez água, no momento em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, arquivou a denúncia do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a campanha da petista, em 2014.
 
O desembarque de Neves, no entanto, foi mais ruidoso do que Cunha esperava. A ponto de aguardar, sem sucesso, uma reparação do ex-aliado, na noite passada. Um grupo de 15 deputados já apresentou pedido de afastamento de Eduardo Cunha do comando da Casa e seu único ponto de apoio, com capacidade para segurá-lo no posto, cedeu. O PSDB, que até a semana passada dava sustentação ao parlamentar carioca, já passa a considerá-lo uma ameaça ao discurso jacobino da direita.
 
Até a proteção da mídia conservadora, que ainda mantinha Eduardo Cunha longe dos holofotes da opinião pública, começa a transparecer os primeiros sinais de fadiga. Na edição desta semana, a revistaÉpoca dispara mais um petardo contra o presidente da Câmara Federal, na reportagem intitulada A derrocada de Eduardo Cunha.
 
Em entrevista a um programa na TV aberta, neste domingo, o líder da bancada peemedebista na Câmara, Leonardo Picciani – principal aliado de Cunha no partido – tentou acalmar aqueles que preveem um período conturbado no Legislativo, caso o STF aceite a denúncia de Janot. O presidente da Câmara seguirá “os ritos democráticos, como não poderia deixar de ser”, segundo o parlamentar.
 
Esquema de corrupção
 
“Rápido, incansável, agressivo e acuado em uma situação muito delicada, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, do PMDB, causa apreensão em Brasília. Na tarde da quinta-feira, dia 20, colegas do PMDB souberam que Cunha mandou ao vice-presidente da República, Michel Temer, aquele clássico aviso de ‘não vou cair sozinho’, disparado quando a tensão fica alta na região mais escura do espectro político. Durante anos, Cunha e Temer foram muito próximos no PMDB. O governo sabe que não será poupado da ira de Cunha, apesar do discurso oficial otimista espalhado por ministros petistas”, afirma a revista semanal de propriedade das Organizações Globo.
 
Cunha tem até o próximo dia 10 para responder à denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), na qual ele pede 184 anos de prisão para o possível réu. Cunha é um dos envolvidos no esquema de corrupção que drenou cerca de R$ 80 bilhões da Petrobras. Na peça jurídica encaminhada ao STF, Cunha é acusado, em 85 páginas, por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo Janot, ele teria recebido cerca de US$ 5 milhões em propinas, no contrato celebrado entre a estatal e a empresa coreana Samsung. Janot pede ao Supremo que Cunha devolva US$ 80 milhões – equivalentes a cerca de R$ 280 milhões.
 
Cunha teria usado a igreja a que pertence, a Assembleia de Deus em Madureira, Zona Norte do Rio,segundo investigações da Polícia Federal (PF), para lavar dinheiro e distribuir parte da propina arrecadada, durante sua campanha eleitoral. A Operação Lava Jato, da PF, Cunha estaria envolvido em outros crimes, ainda em fase de apuração.
 
‘Acordão’
 
“A ação de Janot desestabiliza Cunha severamente. Entretanto, devido ao cargo do deputado, a seu perfil pessoal e ao atual cenário político, torna-o ainda mais perigoso para a estabilidade do país”, afirmou Época. “Cunha tende a ameaçar colegas como o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também acusado pela Operação Lava Jato e que recentemente se aproximou da presidente Dilma Rousseff. Cunha pediu a aliados que aprovem a convocação de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, para depor na CPI da Petrobras. Afilhado de Renan, Machado permaneceu 11 anos na Presidência da subsidiária da Petrobras, de onde saiu por ter sido mencionado pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa como pagador de uma propina de R$ 500 mil”, acrescentou a reportagem da revista.
 
Em nota, Cunha negou as acusações, mas não tentou se explicar diante das denúncias. Preferiu atribuir a ação da Procuradoria-Geral da República a um complô entre Janot e o governo contra ele. Segundo afirmou, haveria um “acordão” que inclui a preservação de outro acusado pela Lava Jato, o presidente do Senado, Renan Calheiros.
 
– Não participei e não participo de qualquer acordão e certamente, com o desenrolar, assistiremos à comprovação da atuação do governo, que já propôs a recondução do procurador, na tentativa de calar e retaliar minha atuação política – defende-se Cunha.



Na busca e apreensão, policial se depara com novas orientações

September 2, 2015 6:26, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

ACADEMIA DE POLÍCIA





I - Introdução
A maior conscientização da população, o jornalismo investigativo e a especialização e integração dos órgãos públicos encarregados da apuração de crimes de corrupção, atos de improbidade e desvio de recursos públicos têm propiciado ricas investigações de natureza administrativa ou criminal.

Os órgãos de segurança pública avançaram muito, nas últimas décadas, no planejamento operacional, nas novas estratégias para lidar com a criminalidade, nos estudos de análise criminal (mancha criminal), na revelação de cifras negras (subnotificação de crimes) e na criação de centros de estudo da violência em academias de polícia. Houve, enfim, a evolução da tecnologia, da política e de sistema de segurança pública, muito embora os problemas de recursos humanos e logísticos pareçam crônicos e sem a devida priorização pelos gestores.
Nesse contexto, a visão e a técnica investigativa também se apuraram, e passou-se a enxergar que, relacionado a algumas modalidades criminosas específicas, como aquelas contra a administração pública, a regularidade das licitações, os crimes financeiros e a lavagem de dinheiro, há um braço instrumental e viabilizador da empreitada criminosa que se vale, indevidamente, não apenas da proteção constitucional domiciliar, mas também de espaços públicos e privados para se preservar ou ocultar o corpo de delito, o que acontece, na maior parte dos casos, sem o conhecimento e a participação de seus pares, sócios ou colegas de trabalho.
A diligência policial de busca e apreensão, sempre autorizada judicialmente, ressalvada a situação flagrancial, tem ocorrido, lamentavelmente, com maior frequência do que antes em locais como repartições públicas e escritórios de profissionais liberais.
Diz-se "lamentavelmente", porque nomes de grandes instituições públicas são expostos por atos ilícitos praticados individualmente, e classes honradas de profissionais liberais, como contadores e advogados, bem como os servidores públicos, acabam presenciando ou recebendo notícia de diligência policial no seu local de trabalho ou que atinja um colega de profissão.
A diligência policial é, por natureza, ostensiva, e, claro, apesar da ostensividade que lhe é inerente, a discrição, independentemente de consignação no mandado judicial, deve ser a regra. A natureza ostensiva do trabalho policial, que imprescinde de coletes balísticos, armamento, viaturas e multiplicidade de atores para a segurança da equipe e do investigado, não é bem compreendida, principalmente por estigmas[1] em relação à atividade policial: "eu sou muito digno para receber a polícia em minha casa ou local de trabalho" ou "a polícia não pode ‘invadir’ uma repartição pública, escritório ou residência oficial, porque é uma afronta a toda categoria ou ao órgão".
Conforme diretrizes contidas no artigo 12 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, “a garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública. Esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada”. A ostensividade que decorre do socorro à força pública inibe, ou pelo menos minimiza, a possibilidade de uma agressão indesejável e ilegítima por parte do investigado, situação que redundaria no uso autorizado e legítimo da força física à superação da resistência.
A ideia estigmatizadora, em desacordo com a nobreza da função policial e as renúncias familiares e pessoais diárias de cada um desses profissionais, é fruto de a) deficiente aproximação com a população, b) pouca ênfase nos trabalhos sociais conjuntos e c) fraca política institucional de valorização dos recursos humanos.
O resultado da pouca compreensão da ostensividade do trabalho policial, conjugado com ideias estigmatizadoras da respectiva função, levam ao etiquetamento[2] da diligência policial em repartições públicas e escritórios, como se fossem "invasões", antidemocráticas ou mesmo violadoras de prerrogativas profissionais, parlamentares ou dos poderes públicos. Antes do julgamento de eventual ação penal, o cumprimento do mandado de busca e apreensão (MBA) passou pelo crivo inicial judicial e pela opinião do Ministério Público (MP), e, após cumprido, pelo prejulgamento popular, por uma série de julgamentos de Habeas Corpus (HC) e liminares e por uma cadeia de preconceitos alimentados pelos investigados, simpatizantes, militantes partidários, órgãos e associações de classe.
É por essas razões que um inovador manual de planejamento operacional (PO) policial ou um bom briefing momentos antes da operação deve contemplar, além das disposições legais, recomendações consentâneas com o império do Direito[3], para que a diligência policial seja executada a) de forma circunstanciada, de tudo lavrando-se auto, b) com cortesia, harmonia, transparência e discrição, c) com proatividade da equipe, d) observada a discrionariedade regrada pelo interesse público e pelos instrumentos legais e normativos, e) de forma eficaz, eficiente, proporcional e razoável, f) com uso excepcional e progressivo da força nas situações que a legitimem, g) sem constrangimentos que não sejam os decorrentes do cumprimento da lei e do mandado judicial, h) em parceria ou regime de força-tarefa com as demais instituições; i) de forma sigilosa, sendo que a política de comunicação social do órgão policial deve se pautar pelo interesse público e pela preservação dos direitos dos investigados, inclusive o de imagem.
Quanto ao exposto na letra "i", é de capital importância o artigo 201[4] da recente Instrução Normativa (IN) 1/2015 da Polícia Civil do Estado do Paraná (PC-PR):
"Artigo 201. Os delegados de polícia deverão abster-se da divulgação, pelos órgãos de comunicação, de imagens de pessoas tidas como suspeitas ou indiciadas em inquéritos policiais, face aos princípios estatuídos nos incisos X, XLI, XLIX e LVII, do artigo 5º da Constituição Federal, artigos 1º, 2º e 3º, parágrafo único do Decreto Estadual 465 de 11 de junho de 1991, Ordem de Serviço 14/2014, do Departamento da Polícia Civil, salvo quando por elas expressamente autorizadas, a critério e sob responsabilidade do delegado de polícia encarregado da investigação".
Some-se às orientações contidas nas letras “a” a “i” um extenso rol normativo disciplinador do cumprimento do MBA[5]: artigo 5º da Constituição Federal (CF), dos artigos 240 a 250 do Código de Processo Penal (CPP), da Lei 8.906/94, das Portarias 1.287 e 1288-Ministério da Justiça (Diário Oficial da União - DOU I, de 1 de julho de 2005), da IN 11/2001-DG/DPF (DOU I, de 2 de julho de 2001, em vias de revisão e atualização).
II - Dispensabilidade do MBA na prisão em flagrante
A primeira questão que se põe em análise é a respeito da necessidade de MBA em situações flagranciais.

Na esteira do pensamento dos tribunais superiores, em caso de prisão em flagrante, dispensa-se o MBA:
"(...) 1. Este Tribunal Superior prega que, por ser permanente o crime de tráfico de drogas, a sua consumação se protrai no tempo, de sorte que a situação de flagrância configura-se enquanto o entorpecente estiver sob o poder do infrator, sendo possível, portanto, em tal hipótese, o ingresso da polícia na residência, ainda que não haja mandado de prisão ou de busca e apreensão, já que incide a excepcionalidade inscrita no artigo 5º, inciso XI, da CF, a afastar a inviolabilidade do domicílio.
2. Outrossim, não há falar em vício na operação policial, se houver a permissão de entrada dos policiais na residência do investigado, a descaracterizar a inviolabilidade de domicílio, que pressupõe, justamente, o não consentimento do morador. (...)" (HC 208.957/SP, rel. desembargador convocado Vasco della Giustina, 6ª. T. do STJ, DJe 19/12/2011).
"(...) 2. Estando o agente em situação de flagrante delito, tornam-se desnecessários para acesso ao seu domicílio, o mandado de busca e apreensão judicialmente autorizado, bem como o consentimento do morador". (AgRg no Ag 1357515/DF, rel. min. Jorge Mussi, 5ª T. do STJ, DJe 26/08/2011).
No âmbito da PF o trato normativo é semelhante:
"66. O ingresso em casa, sem consentimento do morador, somente poderá ocorrer nas hipóteses de flagrante, desastre ou para prestar socorro, conforme previsão do inciso XI do artigo 5º da Constituição Federal.
66.1. No caso de consentimento do morador a busca será presenciada por duas testemunhas não policiais, que assinarão o respectivo auto, além do termo de consentimento de busca".
O termo de consentimento do morador é tranquilamente aceito pelos tribunais:
"(...) O consentimento do morador supre a determinação judicial para o ingresso em residência, não havendo qualquer exigência de que tal consentimento deva ocorrer na presença de testemunhas do povo". (HC 18.863/DF, rel. min. Gilson Dipp, 5ª. T do STJ[6]).
III - Da prévia instauração de inquérito e formalização dos atos de polícia judiciária como requisitos para o MBA
O inquérito policial é instrumento formal, inquisitivo, sigiloso, escrito e oficial, características tratadas uniformemente pela doutrina e jurisprudência.

Por mais que se confunda a formalização de atos de polícia judiciária com burocracia no inquérito, é da lei a sua forma escrita, o que a) garante ao investigado e seu advogado o acesso aos autos da investigação, b) confere transparência pré-processual, c) registra a sequência cronológica de atos e a cadeia de custódia de provas, d) demonstra o procedimento de indicação de autoria e materialidade a serviço da busca da verdade real, e não apenas como subsídio da ação penal, que pode não haver por atipicidade ou inexistência do fato, por exemplo.
Em princípio, ressalvada a apuração de situação flagrancial que não possibilite a imediata instauração de procedimento policial, a representação por MBA e demais medidas cautelares ocorrerá em inquérito preexistente, o qual, quando possível, mencionará na portaria inicial, subscrita pelo delegado de polícia, a delimitação do fato, sua tipicidade penal e possível autoria.
As medidas cautelares, a exemplo da representação por MBA, serão apensadas ao inquérito após o levantamento de sigilo judicial e quando não sejam mais consideradas pendentes ou "em andamento", não sendo possível o acesso "à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso" (HC 82354/PR, rel. min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF[7]). No AgR Rcl 18191, rel. min. Roberto Barroso, a 1ª Turma do STF[8], não autorizou o acesso à interceptação telefônica “sob o fundamento de ainda estarem em curso as diligências. Em razão da natureza sigilosa do feito, bem como da não conclusão de diligências, não há ofensa à Súmula Vinculante 14".
Em síntese, é fundamental a prévia formalização ou documentação dos atos de polícia judiciária executados e determinados, inclusive cautelares pois, embora o inquérito seja sigiloso, o ordenamento jurídico pátrio não compactua com investigações secretas, assim, essas não se iniciam e não se encerram sem atos formais, justamente para que não fiquem na esfera subjetiva do investigador. Equipes policiais, salvo apurações urgentes de delitos em curso, diligenciam mediante ordens de missão policiais (OMP) ou de serviço expedidas em sede de procedimento policial (inquérito, termo circunstanciado, verificação de procedência de informação com notícia-crime registrada nos sistemas policiais), com apresentação de relatório circunstanciado após prazo determinado.
Da IN 1/2015-PC/PR, destaca-se:
"Artigo 197. Sendo o inquérito policial um instrumento que registra a atividade de polícia judiciária, a atuação do servidor policial há que ter sempre o respaldo de uma ordem de serviço expedida pelo delegado de polícia, em face do caso concreto, exceto nos casos de flagrante delito”.
O artigo 2 da IN 5/2000-DG/DPF, reproduzido nos artigos 6 e 28 da IN 1/2013- PC/BA, pontua que a OMP “é documento de natureza policial de caráter sigiloso, de uso interno, obrigatório em qualquer missão de policiais federais, expedido por autoridade competente”.
A formalidade do ato de investigação é exigência legal e constitucional, garantindo-se ao investigado, desde o ato de prisão, 1) o direito de comunicar-se com familiares e advogado, 2) o direito de não se autoincriminar (fornece-se nota de ciência das garantias constitucionais), 3) a identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial (artigo 5º, incisos XLIX, LXI a LXVI da CF), 4) nota de culpa (artigo 306, parágrafo 2º do CPP), 5) comunicações ao Poder Judiciário, MP (artigo 306 do CPP), Defensoria Pública (na ausência de advogado constituído), consulado ou embaixada, Funai (índio não integrado), MJ (caso de abertura de inquérito de expulsão de estrangeiro), 6) ofícios para realização de exame de integridade física do preso (ad cautelam), de seu encaminhamento ao sistema prisional.
A investigação policial não é formada apenas pelos atos escritos do delegado de polícia como a portaria (ato inicial), decisão fundamentada de prisão e de indiciamento, despacho de impulso da investigação, representações por medidas cautelares (como a de busca e apreensão) de afastamento ou mitigação de garantias constitucionais e o relatório (ato final), mas por uma coletividade de iniciativas e diligências executadas por todos os policiais envolvidos.
O delegado e o escrivão de polícia e igualmente o agente de polícia, inspetor ou investigador (que atua como olhos, ouvidos, voz, braços e pernas da autoridade policial, em diligências externas) são responsáveis por atos formais no inquérito. Cabe ao agente, por exemplo, a confecção de informações, autos circunstanciados, relatórios de missão policial  (RMP), de análises e de vigilância, que, se não forem bem lavrados e diligenciados com proatividade, levarão ao retardo, fracasso da investigação ou frustração do objeto do MBA. A equipe policial deve ser boa e competente tanto na linha de tiro como na caneta, no tablet, no computador e na consulta de sistemas informatizados, afinal de contas, o sucesso da investigação e a celeridade do inquérito são resultados de um trabalho em equipe.
Retomando o tema, ainda quanto à formalização dos atos de polícia judiciária - que é uma decorrência lógica também da Súmula Vinculante 14 do STF, para que o advogado possa ter acesso aos documentos já produzidos para atuar em defesa de seu cliente -, o excelso STF já se manifestou que eventual investigação pelo MP deverá observar o rol de direitos constitucionais do investigado e conterá todas as peças, termos de declarações e demais subsídios probatórios coligidos:
"O procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público deverá conter todas as peças, termos de declarações ou depoimentos, laudos periciais e demais subsídios probatórios coligidos no curso da investigação, não podendo, o parquet, sonegar, selecionar ou deixar de juntar, aos autos, quaisquer desses elementos de informação, cujo conteúdo, por referir-se ao objeto da apuração penal, deve ser tornado acessível tanto à pessoa sob investigação quanto ao seu advogado. O regime de sigilo, sempre excepcional, eventualmente prevalecente no contexto de investigação penal promovida pelo Ministério Público, não se revelará oponível ao investigado e ao advogado por este constituído, que terão direito de acesso — considerado o princípio da comunhão das provas — a todos os elementos de informação que já tenham sido formalmente incorporados aos autos do respectivo procedimento investigatório." (HC 94173, rel. min. Celso de Mello, 2ª T. do STF, DJe-223, 27-11-2009).
Ou seja, em razão dos gravames que lhes são inerentes, toda e qualquer medida cautelar invasiva da intimidade do cidadão e investigação criminal que se inicie — seja qual for o nome que a ela se dê ou roupagem, de iniciativa do MP ou da polícia judiciária —, assegurarão ao investigado os seus direitos e se revestirão de forma escrita, como garantia de não haver atos secretos nem subjetivismo do investigador.

[1]BACILA, Carlos Roberto. Estigmas: Um Estudo Sobre os Preconceitos. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
[2]CASTRO, Lola Anyar de. Criminologia da reação social. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1983.
[3]DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
[5]Disponível em:http://www.jf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/viewFile/741/921. Acesso em 30 ago. 2015. GOMES, Rodrigo Carneiro.
[6]DJ 16/09/2002, p. 207.
[7]DJ de 24/09/2004.
[8]DJe-107, 05-06-2015.
Rodrigo Carneiro Gomes é delegado da Polícia Federal, mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília, especialista em segurança pública e defesa social e professor da Academia Nacional de Polícia. Foi assessor de ministro do Superior Tribunal de Justiça e da Secretaria da Segurança Pública do Distrito Federal.

Revista Consultor Jurídico



Cadeia para quem precisa, prêmio para quem merece

September 2, 2015 6:24, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Em editorial, reafirmamos o compromisso com a fiscalização do poder, mas ressaltamos a necessidade de reconhecer os melhores parlamentares para evitar que os bandidos tomem de vez o controle da política

Ana Volpe/Ag. Senado
A Justiça, estátua de Alfredo Ceschiatti, na Praça dos Três Poderes: entre o Supremo e o Congresso Nacional
Brasília vive outra noção de tempo. O que acontecia em semanas ou meses pode agora se passar em dias ou horas. Fatos de impacto se sucedem numa velocidade inédita, sinalizando a cada minuto que vivemos um processo de mudanças profundas. Um aspecto óbvio das transformações em curso é a exaustão do grupo político que governa o país desde 2003.
Temos registrado aqui outras peculiaridades, nem sempre tão claras, da presente conjuntura. Na edição 14 da Revista Congresso em Foco, que circulou no final de 2014, mostramos que a combinação de crise política e econômica com as turbulências causadas pela Operação Lava Jato levariam o Brasil a passar por “dois anos de purgatório” até criar condições de retomar o crescimento, previsão que àquela altura muitos tomaram como pessimista (hoje não mais).
Chegamos a março de 2015 mostrando o jogo do PMDB para aprofundar a fragilidade de Dilma, por “ver na crise a oportunidade ideal para aumentar seu poder” (edição 16). Dois meses depois, na edição seguinte (17), refletíamos sobre a inédita força que o Parlamento alcançara sob a batuta de Renan e Cunha. Força, apontávamos, usada para produzir “aberrações” legislativas ao mesmo tempo em que os presidentes do Senado e da Câmara se recusavam a fazer o elementar, que naquele momento ninguém lhes cobrava: o afastamento dos cargos “até que ficasse provada sua inocência” nas bilionárias roubalheiras do petrolão, pelas quais ambos são investigados.
Na edição mais recente da nossa revista bimestral, abordamos dois temas que nos sugerem novas formas de pensar a crise, justificando uma vez mais a necessidade de uma publicação que procure ver as coisas além do imediatismo que nos consome a cada dia. Enquanto alguns alardeiam a fortaleza das instituições nacionais, documentamos sua incrível debilidade. Os famosos 7 a 1 impostos pela Alemanha são brincadeira de criança comparados com a surra que o banditismo político impõe à nação. Desde a Constituição de 1988 mais de 500 parlamentares federais foram alvo de acusações criminais apresentadas à Suprema Corte pelo Ministério Público. Só 16 foram condenados e apenas oito cumpriram – ou cumprem – pena de prisão. A impunidade dos poderosos é componente fundamental da descrença dos brasileiros nos políticos e na política. E o que se ouve por aí? “Ah, político é tudo igual”. “Sempre foi assim e sempre será”. “Certo estava Bezerra da Silva: ‘Se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão’”.
Apesar da visão crítica que cultivamos por dever de ofício, a experiência de acompanhar o Congresso nos mostra diariamente que a realidade não é essa. Não existem políticos sem defeitos, assim como seres humanos perfeitos são personagens restritos ao universo da ficção. Mas há, sem dúvida, mulheres e homens que se destacam positivamente na Câmara e no Senado. Pela dedicação ao mandato. Pelo preparo intelectual e participação nos debates. Pela capacidade de articulação. Pela oratória e poder de comunicação. Pelas leis que resultaram da sua atuação. Ou pela defesa que fazem de certas bandeiras. O Prêmio Congresso em Foco, que neste ano será entregue pela nona vez, é uma oportunidade de estimular a sociedade a apontar, ela própria, quem são esses congressistas.
Reconhecê-los é um exercício sempre difícil num país cujo sistema político é moldado pela força do poder econômico, da corrupção, do fisiologismo, do aparelhamento estatal e do marketing enganoso. Mas é imperioso para identificar os aliados na travessia que a sociedade brasileira há de fazer para dar a política a dimensão nobre que ela deve ter. Esse percurso passa tanto pela premiação dos melhores quanto pela punição dos bandidos que deveriam estar na cadeia, mas encontraram no mandato parlamentar proteção para cometer crimes impunemente. Nos dois casos, sem partidarismos e colocando o jornalismo acima de qualquer outro interesse, queremos ajudar a cidadania a encontrar luz em meio ao nevoeiro que nos atormenta.



Uso Legal e Progressivo da Força

September 1, 2015 19:07, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE
Por: Rogério Grecco





O VIII Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinqüentes editou os Princípios Básicos Sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei. Entre os diversos princípios que recomendam o uso da força necessária de modo progressivo e proporcional para o cumprimento da lei, há também a orientação para a utilização de metodologias apropriadas que facilitem o treinamento dos agentes sobre a questão do "Uso da Força".
ATENÇÃO: O uso da força é um ato discricionário, legal, legítimo e idealmente profissional. O uso da violência é um impulso arbitrário, ilegal, ilegítimo e amador, próprio dos despreparados.



         Funcionário público 

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
         Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.


§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

a)  FORÇA: é toda intervenção compulsória sobre o indivíduo ou grupos de indivíduos, reduzindo ou eliminando sua capacidade de autodecisão;

b)  NÍVEL DO USO DA FORÇA: é entendido desde a simples presença do vigilante em uma intervenção, até a utilização da arma de fogo, em seu uso extremo (letal);

c)  USO PROGRESSIVO DA FORÇA: consiste na seleção adequada de opções de força pelo vigilante em resposta ao nível de submissão do indivíduo suspeito ou infrator a ser controlado. Na prática será o escalonamento dos níveis de força conforme o grau de resistência ou reação do oponente.

É concedido ao agente de segurança pública fazer uso da força em situações que ele qualifique como necessárias. Porém, como saber qual o momento e o modo certo de empregar essa força? Esse julgamento cabe ao agente público que detém o poder de policia na hora em que a ocorrência surge. Mas será que ele está preparado e doutrinado para efetuar tais decisões? Todavia, deve-se fazer também um trabalho mais específico no que diz respeito ao trato com o cidadão, além de um estudo mais aguçado à cerca dos métodos empregados na melhoria ao atendimento à sociedade.


Conforme bem disse Vianna (2000), não se deve confundir “uso legítimo da força” com violência. A guarda municipal existe para garantir a incolumidade(isenção de perigo, intacto ileso) social. Seus membros são retirados do seio da sociedade e capacitados para exercerem a função. Teoricamente, esses profissionais de segurança recebem treinamentos específicos para que sejam qualificados como aptos para desempenharem a atividade policial. Logo, não é concebível a idéia de profissionais nesse ramo cometendo atos que firam a integridade das pessoas. Tais ações abalam a confiança da sociedade nos “mantenedores da lei”.


Já a legislação internacional é bem mais abrangente. Nela vêm especificadas normas e diretrizes de regulamentação das aplicações da força, de forma a padronizar os procedimentos julgados necessários para que a sua utilização seja legal, sem que haja violência ou excessos.

         O Modelo Fletc determina que as ações do GM também sejam centradas nas ações do indivíduo, e não no ator da situação, evitando-se a discriminação e o pré-julgamento, que poderiam tornar o uso da força arbitrário e ilegal. 

ATENÇÃO: Adotando o Modelo Fletc, o Guarda Municipal (GM) terá suas ações amparadas nos preceitos legais do ordenamento jurídico e nos princípios dos Direitos Humanos.


Submissão / Cooperação

Nível I

Comando verbal

Resistência passiva

Nível II

Comando moral

Resistência ativa

Nível III

Técnica de submissão

Ameaça física

Nível IV

Tática defensiva

Ameaça física mortal

Nível V

Tática de sobrevivência




         Nível 1 - Consiste em procedimentos de rotina do trabalho diário. A presença do GM ou sua simples ordem - considerados como força legal - é suficiente para obter a submissão e a cooperação de transgressores.

         Nível 2 - Além do uso da força legal descrita no nível anterior, este nível inclui ações de cunho psicológico. É a demonstração da autoridade pela postura do GM e sua perseverança em cumprir o estabelecido no ordenamento jurídico.

         Nível 3 - Exige a introdução do componente físico por parte do GM para fazer cessar a resistência ativa do transgressor. Geralmente a partir deste nível, se faz necessário o auxílio de reforço para diminuir a possibilidade de lesão das partes envolvidas.

         Nível 4 - Exige o uso de táticas de controle em razão da agressão física sofrida pelo GM.

 

         Nível 5 - Neste nível, todas as ações devem ser concentradas visando à sobrevivência e a auto-preservação, utilizando-se dos meios legais necessários.

Percepção Razoável- O modelo se fundamenta na capacidade do GM ter uma percepção razoável de avaliar a situação e ser capaz de identificar no  infrator.

      Submissão - Quando ele coopera, obedecendo à ordem legal do GM;

         Resistência passiva - Quando ele não obedece à ordem legal demonstrando insubmissão, mas não reage fisicamente;

         Resistência ativa - Quando ele não obedece à ordem legal e reage fisicamente ao contato, sem, no entanto, agredir ninguém;

         Resistência agressiva - Quando ele parte para a agressão física;
         Resistência agressiva grave - Quando a agressão possa causar uma lesão mortal.

A utilização da força é uma das funções do agente de segurança pública, desde que na situação, ela se faça necessária. Contudo, esta prática deve ser efetuada de forma moderada e legítima. O agente de segurança deve ter em mente quatro princípios básicos: a necessidade, a proporcionalidade, a ética e a legalidade, sem os quais, sua ação implicará em uma resultante incondizente com a sua atividade fim; isto é, ao invés de estar prevenindo e combatendo a violência, ele a estará gerando.


O guarda municipal que fizer uso irregular da força será responsabilizado judicialmente por seus atos, sofrendo as sanções que a justiça lhe implicar. Contudo, quem sofrerá maior perda será a instituição, pois será penalizada com a desconfiança da sociedade, tendo em vista que a população passará a recear a presença dos agentes de segurança, bem como irão pôr em cheque a eficiência do serviço policial.

Estabelece que é função do agente de segurança pública, prestar serviços à sociedade realizando a manutenção da ordem e da paz. Os funcionários da área de segurança devem respeitar os cidadãos e zelar pela integridade dos mesmos, fazendo uso da força somente quando justificável. E, acima de tudo, os policiais devem manter a sua idoneidade. Seus princípios e valores, éticos e morais, jamais devem ser alvo de dúvida.


Segundo o CCEAL, o uso da força policial deve ser comedido para situações extremas. A banalização da força é uma conduta a ser inibida. O guarda municipal deve a todo custo evitar entrar em atrito com o cidadão, salvo quando a situação exija o contrário.

    De um modo geral, as resoluções propostas possuem um caráter humanístico muito forte. E isso é muito bom. Porém, não devemos esquecer que a polícia atua de comum acordo com os indicadores sociais. 

O que diferencia o policial dos demais cidadãos e torna as suas ações legítimas é o seu conhecimento, preparo e treinamento especializados para atuar na atividade. Na falha ou na aplicação inadequada de um desses fundamentos, o policial estará sujeito à sanção, desde que não apresente uma justificativa para tal. Ter convicção em suas ações é primordial para desempenhar bem a sua função. O policial conhecedor das técnicas e procedimentos corretos dificilmente precisará ser violento, excedendo assim os limites de sua atuação.

  1. Quando você perceber a necessidade de usar a força para atender

o objetivo legítimo da aplicação da lei e manutenção da ordem pública, e antes

de qualquer iniciativa de ação, teremos que atentar para os seguintes

questionamentos:

          O emprego da força é legal?
       Já foram esgotadas todas as possibilidades preliminares?

       A aplicação da força é necessária?

       O nível de força a ser utilizado é proporcional ao nível de resistência oferecida?

      Você detém os meios materiais e os conhecimentos para empregar a técnica?

       O Uso da força é conveniente, no que diz respeito às conseqüências da ação ou omissão?

      O EMPREGO DA FORÇA É LEGAL?

    O Vigilante deve amparar legalmente sua ação,devendo ter conhecimento da lei e estar preparado tecnicamente, através da sua formação e do treinamento recebido.

          A APLICAÇÃO DA FORÇA É NECESSÁRIA?

     Para responder a esta indagação precisamos identificar o objetivo a ser atingido, ou seja, se a ação atende aos limites considerados mínimos para que se torne justa e legal sua intervenção.

 

Sugere-se ainda verificar se todas as opções estão sendo consideradas e se existem outros meios menos danosos para se atingir o objetivo.

O NÍVEL DE FORÇA A SER UTILIZADO É PROPORCIONAL
AO NÍVEL DE RESISTÊNCIA OFERECIDA?

Neste caso está se verificando a proporcionalidade do uso da força, e caso não haja, estará caracterizado o abuso de poder. Jamais poderemos efetuar um tiro em uma pessoa, se esta está apenas agredindo um caixa eletrônico que reteve seu dinheiro ou até mesmo o cartão. Ainda que gere danos à instituição financeira e constitua um ato ilícito, é desproporcional efetuar disparos de arma de fogo para fazer cessar esta ação. Na maioria das vezes só a presença do vigilante já faz cessar ou até mesmo inibir a ação.

 

O USO DA FORÇA É CONVENIENTE?
O aspecto referente à conveniência do uso da força diz respeito ao momento e ao local da intervenção. Exemplos de ações inconvenientes são o uso de arma de fogo em local de grande concentração de pessoas, bem como o acionamento de espargidores de agentes químicos gasosos em locais fechados.

Ao responder essas perguntas buscamos enquadrar a ação dentro destes PRINCÍPIOS BÁSICOS E ESSENCIAIS para o uso da força:

          LEGALIDADE;

          NECESSIDADE;

          PROPORCIONALIDADE; e

          CONVENIÊNCIA



 

a) Legalidade - O uso da força somente é permitido para atingir um objetivo legítimo, devendo-se, ainda, observar a forma estabelecida, conforme dispositivos legais mencionados no início da postagem.
b) Necessidade - O uso da força somente deve ocorrer quando outros meios forem ineficazes para atingir o objetivo desejado.

c) Proporcionalidade - O uso da força deve ser empregado proporcionalmente à resistência oferecida, levando-se em conta os meios dos quais o policial dispõe. O objetivo não é ferir ou matar, e sim cessar ou neutralizar a injusta agressão.

d) Conveniência - Mesmo que, num caso concreto, o uso da força seja legal, necessário e proporcional, é preciso observar se não coloca em risco outras pessoas ou se é razoável, de bom-senso, lançar mão desse meio. Por exemplo, num local com grande aglomeração de pessoas, o uso da arma de fogo não é conveniente, pois traz riscos para os circunstantes.

Sempre que possível, empregue a força progressivamente
Dentro das possibilidades de cada situação, utilize a força gradativamente

   O uso da força faz parte do dia-a-dia da atividade policial. Nem todas as ocorrências são resolvidas por meio da verbalização ou negociação.

Conforme legislação abaixo, o policial pode usar de força em legítima defesa própria ou de terceiros, em caso de resistência à prisão e em caso de tentativa de fuga.


Código de Processo Penal

Dispositivos legais que disciplinam o assunto:

     Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.

Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.

Código Penal

     Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
  I - em estado de necessidade;
 II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou  no exercício regular de direito.
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)


Estado de necessidade:

  "Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se." Segundo o art. 23, I, não há, nessa hipótese, crime; há uma excludente da antijuridicidade.

São requisitos do estado de necessidade perante a lei penal brasileira: 

a)     a ameaça a direito próprio ou alheio; 

b)     a existência de um perigo atual e inevitável; 

c)     a inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado; 

d)     uma situação não provocada voluntariamente pelo agente;

e)     o conhecimento da situação de fato justificante.


Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

  Artigo 20, § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

Estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito

    Como sendo fatos típicos, ou seja, passíveis de se amoldarem aos vários tipos penais previstos no estatuto repressivo. Sendo assim, o exercício regular de direito e o estrito cumprimento de dever legal são considerados causas de exclusão da antijuridicidade. Assim, o agente que age acobertado pelas referidas justificantes pratica um fato típico, porém lícito. Há  subsunção do fato à norma penal incriminadora, atendendo-se ao primeiro elemento do crime (fato típico) mas não ao segundo (antijuridicidade).
O dolo pode ser entendido como uma conduta voluntária, estando o agente consciente da sua conduta. O resultado é o que ele quer, deseja, ou quando não o é, o agente é indiferente quanto a isso. As principais classificações para o dolo são:

   a) DOLO DIRETO: o sujeito pretende atingir o resultado;

   b) DOLO EVENTUAL: o sujeito pratica um ato sem se importar se determinado resultado será ou não produzido, apesar de saber que há uma considerável possibilidade disso ocorrer (ele assume o risco de produzir o resultado).

Crime culposo é aquele que ocorre quando o agente dá causa ao resultado (que era previsível) por imprudência, negligência ou imperícia. Imprudência: arriscar-se sem necessidade, sem razão. Negligência: deixar ou esquecer de verificar certos requisitos mínimos de prudência antes de praticar uma ação.  Imperícia: falta de habilitação para o exercício de determinada atividade para o qual a pessoa deveria ser habilitada (ex. pessoa que tem carta de habilitação, mas causa um acidente de trânsito com vítimas por não saber, na prática, dirigir).

LESÕES CORPORAIS CULPOSAS

         Nas lesões culposas não há distinção no que tange à gravidade das lesões. O crime será sempre o mesmo, e a gravidade somente será levada em consideração por ocasião da fixação da pena base.

     Pena - detenção, de três meses a um ano.

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

 MEIO DE EXECUÇÃO

 O crime pode ser praticado por ação ou omissão. 

 LESÕES CORPORAIS DOLOSAS

    A lesão corporal dolosa subdivide-se em:

a) Lesões leves

b) Lesões graves

c) Lesões gravíssimas

d) Lesões seguidas de morte

a) OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA: Abrange qualquer alteração anatômica prejudicial ao corpo humano. Ex: cortes, luxações, queimaduras etc.

b) OFENSA À SAÚDE: Abrange a provocação de perturbações fisiológicas ou mentais, onde Perturbação fisiológica é o desajuste no funcionamento de algum órgão ou sistema componente do corpo humano. Ex: paralisia, cegueira, outros.
 

LESÕES CORPORAIS LEVES
     Considera-se leve toda lesão que não for definida em lei como grave ou gravíssima.

    MATERIALIDADE: deve ser provada através de exame de corpo de delito, mas para o oferecimento da denúncia, basta qualquer boletim médico ou prova equivalente.

Lesão corporal grave: 

  I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

 II - perigo de vida (possibilidade grave e imediata de morte)  ;

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV - aceleração do parto

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

LESÕES CORPORAIS GRAVÍSSIMAS
É possível a coexistência de formas diversas de lesão grave ou de várias lesões gravíssimas. Se o laudo de exame de corpo de delito apontar que a vítima sofreu determinada espécie de lesão grave e outra de lesão gravíssima, responderá o agressor apenas por lesão gravíssima.

Lesão Corporal Gravíssima

    I - Incapacidade permanente para o trabalho;

  II - enfermidade incurável;

 III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

 IV - deformidade permanente;

  V - aborto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos

Lesão corporal seguida de morte:


Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi - lo:

   Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

  


Neste caso a pessoa dolosamente quis lesionar a sua vítima, mas independentemente de sua vontade o resultado foi o óbito, ou seja, houve dolo no antecedente (lesão corporal dolosa) e culpa na conseqüência (morte da vítima). Por isso é conhecida como uma espécie de crime preterdoloso (dolo no antecedente, culpa no resultado).

     Não se confunde com homicídio, pois neste caso o autor do crime não quis nem assumiu o risco de matar a vítima, apesar disto ter ocorrido de forma culposa, em razão das lesões por ele praticadas.  

IMPUTABILIDADE PENAL EM CASO DE USO ILEGAL DA FORÇA.
O vigilante ou outra pessoa que vier a fazer uso de força de maneira ilegal ou abusiva poderá responder criminalmente pelos crimes tipificados no Código Penal Brasileiro, de lesão corporal, uso de gás tóxico ou asfixiante, ou no Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/03).

Art. 1º O direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa civil e penal, contra as autoridades que, no exercício de suas funções, cometerem abusos, são regulados pela presente lei.

Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:

a) à liberdade de locomoção;

b) à inviolabilidade do domicílio;

c) ao sigilo da correspondência;

d) à liberdade de consciência e de crença;


 

e) ao livre exercício do culto religioso;
f) à liberdade de associação;

g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto;

h) ao direito de reunião;

i) à incolumidade física do indivíduo;

j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. (Incluído pela Lei nº 6.657,de 05/06/79)

Art. 6º O abuso de autoridade sujeitará o seu autor à sanção administrativa civil e penal.

§ 1º A sanção administrativa será aplicada de acordo com a gravidade do abuso cometido e consistirá em:

a) advertência;

b) repreensão;

c) suspensão do cargo, função ou posto por prazo de 5 a 180 dias, com perda de vencimentos e vantagens;

d) destituição de função;

e) demissão;

f) demissão, a bem do serviço público.

DOS CRIMES PRATICADOS POR
PARTICULAR CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL

RESISTÊNCIA

    Art. 329 - Opor-se à execução de ato legal, mediante violência ou ameaça a funcionário competente para executá-lo ou a quem lhe esteja prestando auxílio:
Pena - detenção, de dois meses a dois anos.
§ 1º - Se o ato, em razão da resistência, não se executa: Pena - reclusão, de um a três anos.
§ 2º - As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.

Desobediência

Art. 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público:

Pena - detenção, de quinze dias a seis meses, e multa.

Desacato

Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Prisão em Flagrante (Código de Processo Penal)

Artigo 301 do Código de Processo Penal ("qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito, ressalvadas as imunidades absolutas"). Independente do seu local de trabalho, o GM deverá atuar até onde a vista alcançar.
Art. 302 - Considera-se em flagrante delito quem:

 I - Está cometendo a infração penal;

 II - Acaba de cometê-la;

III - É perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - É encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

         Art. 303 - Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência. Exemplo: Sequestro e guarda de entorpecente. 

Art. 304 - Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e as testemunhas que o acompanharam e interrogará o acusado sobre a imputação que lhe é feita, lavrando-se auto, que será por todos assinado. 
-  Vantagens da prisão em flagrante 
Não deixa dúvida quanto à autoria e materialidade do crime. 
O indivíduo, via de regra, é mantido preso até o julgamento. 
Seja qual for a sua espécie, a prisão pode ser efetuada a qualquer hora (do dia ou da noite), de qualquer dia, ressalvados os casos referentes à inviolabilidade do domicílio. 
Ao efetuar uma prisão (que deverá ser sempre em flagrante delito), o GM terá de agir com muito equilíbrio e serenidade, mas com toda a firmeza. Ao se dirigir a quem vai ser preso, deverá proceder com base no estabelecido no Código de Processo Penal, usando os seguintes termos: 
    "O Senhor está preso em nome da Lei".          O GM deve informar ainda ao preso os seus direitos, com os seguintes termos: 
         "O senhor tem o direito de permanecer calado".

         "Tem o direito à assistência da família".

         "Tem o direito a um advogado".

O GM evitará sempre retribuir as ofensas que lhe forem dirigidas pelo preso, devendo contudo repeti-las serena e moderadamente à autoridade, quando for comunicar os motivos que deram razão à prisão. O GM não deverá maltratar o preso física ou moralmente, não esquecendo nunca de que será responsabilizado criminalmente por qualquer excesso que venha a praticar.

PRINCIPAIS ELEMENTOS DE AÇÃO

  1. INSTRUMENTOS
  2. Os instrumentos incluem os tópicos disponíveis no currículo dos programas de treinamento da organização, tais como as armas e equipamentos disponíveis, os procedimentos, perspectivas comportamentais, dentre outros.
  3. TÁTICAS

         As táticas incorporam os instrumentos às estratégias consideradas necessárias e viáveis no contexto da iniciativa de repressão, ou seja, o vigilante que fará uso dos instrumentos (espargidores, granadas químicas ou arma de choque) deverá se utilizar de táticas que lhe permitam um melhor desempenho, tais como: quando irá usar, em que direção irá usar, a que distância usar, em quem irá usar, qual a quantidade usar, qual o ambiente a ser usado, em fim, seria como se fosse um manual de uso destes equipamentos, tudo isto para se obter um melhor resultado ou até mesmo para evitar excesso.

    USO DO TEMPO 
  4.      O tempo é demonstrado pela presteza da resposta do vigilante às ações do indivíduo, medida em termos da instantaneidade e da necessidade. Sempre que houver a necessidade de se fazer uma intervenção com o uso da força, principalmente em seu uso extremo, que é o uso letal de armas de fogo, deve haver uma prioridade em termos de segurança: Em primeiro lugar a segurança pessoal; em segundo do público; e em terceiro lugar a do indivíduo suspeito ou agressor.

    . NÍVEIS DE FORÇA PROGRESSIVA

        O ponto central na teoria do uso progressivo da força é a divisão da força em níveis diferentes, de forma gradual e progressiva. O nível de força a ser utilizado é o que se adequar melhor às circunstâncias dos riscos encontrados, bem como a ação dos indivíduos suspeitos ou infratores durante um confronto.

    ALTERNATIVAS NO CONTROLE DO USO LEGAL DAFORÇA


1. PRESENÇA FÍSICA ;

2. VERBALIZAÇÃO ;

3. CONTROLE DE CONTATO  OU     CONTROLE DE MÃOS LIVRES;

4. TÉCNICAS DE SUBMISSÃO ;

5. TÁTICAS DEFENSIVAS NÃO LETAIS ;

6. FORÇA LETAL .

 HABILIDADE

 OPORTUNIDADE

 RISCO


NÍVEL 1 – PRESENÇA FÍSICA:
         A mera presença do vigilante uniformizado pode ser na maioria dos casos o bastante para conter um crime ou ainda prevenir um futuro crime, bem como evitar ações de pessoas mal intencionadas.

NÍVEL 2 - VERBALIZAÇÃO :

         Baseia – se na ampla variedade de habilidades de comunicação por parte do vigilante, capitalizando a aceitação geral que a população tem da autoridade. É utilizada em conjunto com a presença física do vigilante e pode usualmente alcançar os resultados desejados.

    ATENÇÃO!!! OBS: Este nível de força pode e deve ser utilizado também em conjunto com todos os outros níveis de força.

NÍVEL 3 - CONTROLE DE CONTATO OU CONTROLE DE MÃOS LIVRES:

Trata – se do emprego de habilidades de contato físico por parte do vigilante, para atingir o controle da situação. Isto se dará quando se esgotarem as possibilidades de verbalização          devido ao agravamento da atitude do contendor (indivíduo conflitante). Havendo a necessidade de dominar o suspeito fisicamente utiliza-se neste nível apenas as mãos livres, compreendendo–se técnicas de imobilizações e condução.
NÍVEL 4 – TÉCNICAS DE SUBMISSÃO :

         É o emprego da força suficiente para superar a resistência ativa do indivíduo, permanecendo vigilante em relação aos sinais de um comportamento mais agressivo que exija uso de níveis superiores de resposta. Neste nível podem ser utilizados técnicas de mãos livres adequadas e agentes químicos.

NÍVEL 5 – TÁTICAS DEFENSIVAS NÃO LETAIS

Uma vez confrontado com as atitudes agressivas do indivíduo, ao vigilante é justificado tomar medidas apropriadas para deter imediatamente a ação agressiva, bem como ganhar e manter o controle do indivíduo, depois de alcançada a submissão. É o uso de todos os         métodos não letais, através de gases fortes, forçamento de articulações e uso de equipamentos de impacto. Aqui ainda se enquadram as situações de utilização das armas de fogo, desde que excluídos os casos de disparo com intenção letal.
NÍVEL 6 – FORÇA LETAL :

TRIÂNGULO DA FORÇA LETAL.

         É um modelo de tomada de decisão designado para desenvolver sua habilidade para responder a encontros de força, permanecendo dentro da legalidade e de parâmetros aceitáveis.

HABILIDADE ;

OPORTUNIDADE ;

RISCO.  











Quem tem medo da Polícia Militar?

September 1, 2015 18:49, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

"ATENÇÃO: O uso da força é um ato discricionário, legal, legítimo e idealmente profissional. O uso da violência é um impulso arbitrário, ilegal, ilegítimo e amador, próprio dos despreparados."


Os limites do uso da força e a violência nas ações policiais

Por: Isadora Vitti

Segundo pesquisa recente do Data Favela, 59% dos brasileiros que moram em periferias têm medo de sofrer violência policial dentro de sua comunidade. No Rio, esse número é de 65%. O medo da tortura é ainda mais relevante: segundo relatório da Anistia Internacional de 2014, oito em cada dez brasileiros discordam de que estariam seguros caso fossem detidos pela Polícia Militar. O que acontece para que essa desconfiança e medo sejam tão significativos?
Há algumas diretrizes que delimitam o uso da força por agentes do Estado. De acordo com o CCFRAL (Código de Conduta para os funcionários responsáveis pela aplicação da Lei) e o PBUFAF (Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei), os princípios essenciais em que se baseia o uso da força e das armas de fogo são: a legalidade, a precaução, a necessidade e a proporcionalidade. Ou seja, a força usada deve ser proporcional ao objetivo da ação, legal, e adequada ao caso. Para garantir que essa norma não seja transgredida por nenhum agente, a Polícia Militar possui procedimentos operacionais, que determinam quando, onde e como deve se dar o uso da força policial, se necessária. Quando esses princípios não são devidamente cumpridos, o uso da força pode transformar-se em violência policial. É o que houve na desocupação do Complexo da Maré, em 2014, e acontece frequentemente em manifestações, como a ação violenta da PM contra estudantes e professores da USP, em protesto no Dia Nacional de Paralisação, 25 de maio.
Na Universidade de São Paulo são frequentes os casos de violência policial. Muitos estudantes ficam inseguros e são contrários à presença da PM no campus, esta que, paradoxalmente, deveria passar uma sensação de proteção. Sobre a ação policial no campus, Guilherme Santos, aluno de graduação afirma: “Eu acho que a universidade é diferente da cidade. A Polícia Militar recebe um treinamento para um tipo de ação na cidade e nos grandes centros urbanos, que por si já é um treinamento questionável, e que não é adequado ao ambiente da faculdade”. Para ele, a USP deveria ter uma polícia própria, com iniciativas de policiamento comunitário e uma guarda que dialogasse com os estudantes e com o espaço universitário.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2014, entre os anos 2009 e 2013, cerca de 11.197 pessoas foram mortas pela Polícia Militar no Brasil. André Vianna, coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo, ressalta que essa tendência não deve ser generalizada, mas é preciso haver uma contenção: “O efeito da violência policial talvez seja porque o Estado como um todo, e aqui envolvo também o Judiciário e o Legislativo, tenha que se repensar e ser reformulado”. Para o coronel, essa carência no sistema pode contribuir para a formação de um contexto violento, resultando também em uma resposta violenta do próprio Estado e de seus agentes. “Em vez de responsabilizar uns aos outros, deve-se encontrar soluções para melhoria do sistema”- conclui ele.

11774482_481388465368750_999337205_nFonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2014
Alguns órgãos podem ser acionados em casos de violência ou abuso de autoridade policial, e as denúncias podem ser feitas anonimamente. A Ouvidoria de Polícia dos estados, por exemplo, recebe denúncias da população contra policiais militares e civis que tenham cometido atos arbitrários ou ilegais. Já a Corregedoria da Polícia Civil e da Polícia Militar é responsável pela apuração dos desvios de conduta do policial. “Cada vez que se constatar um desvio de conduta ou um mau comportamento, isso deve ser apurado como qualquer instituição”, afirma André Vianna.
O Núcleo de Estudos sobre Violência da USP desenvolve projetos de pesquisa e cursos de extensão visando a abordagem interdisciplinar na discussão sobre violência, democracia e diretos humanos. Há estudos e pesquisas também no âmbito da violência policial. Bruno Paes Manso, jornalista e pesquisador do NEV, explica que atualmente o Núcleo está realizando um estudo sobre legitimidade, abordando a relação entre várias autoridades e instituições democráticas com as pessoas. “Como é que esse tipo de relacionamento e as autoridades positivas legítimas são mais importantes para fazer as pessoas obedecerem do que a punição? Esse é um estudo que está começando, é um projeto que vai se estender nos próximos anos”, conta ele.
O endereço e a cor da violência
Não é a toa que nas periferias, o medo da violência policial atinja contingentes maiores. Guilherme, estudante da USP entrevistado, de pele branca, tem 3 vezes menos chances de ser morto pela Polícia Militar de SP do que um jovem negro. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2014, negros são 18,4% mais encarcerados e a chance de ser vítima de homicídio é 30,5% maior.
Um estudo realizado pela pesquisadora Jacqueline Sinhoretto, do Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos (GEVAC) da UFSCar, apontou que 61% das vítimas de morte por policiais no estado de São Paulo entre 2009 e 2011 eram negras. Segundo a pesquisadora, o que existe é um “racismo institucional”, em que o sistema de segurança pública opera identificando os jovens negros como perigosos e colocando-os como alvos de uma ação violenta. Mas André ratifica que o preconceito não é intrínseco à Polícia Militar: “A instituição não procura estimular qualquer tipo de preconceito, de qualquer espécie. Acontece que as pessoas que entram, muitas vezes vem com preconceitos e uma visão da sociedade. A formação policial é técnica e profissional, mas não muda a essência da pessoa”.

11753915_481389395368657_1722906930_nCréditos da Imagem: G1

Tortura pelos Agentes do Estado
A tortura se constitui como crime inafiançável segundo os incisos III e XLIII do artigo 5º da Constituição de 1988. No entanto, mesmo com leis e artigos proibitivos, ela continua sendo prática recorrente como meio punitivo ou forma de conseguir uma informação.
Entre 2010 e 2011, o  Instituto Terra Trabalho e Cidadania e a Pastoral Carcerária desenvolveu a pesquisa Tecer Justiça: repensando a prisão provisória”. Atuando no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros I e na Penitenciária Feminina de Sant’Ana, a pesquisa aplicou 1161 questionários nesses locais. Nas prisões em flagrante realizadas pela Polícia Militar, a imensa maioria dos entrevistados homens (79,5%) e mulheres (70,3%) afirmou ter sofrido algum tipo de violência. Uma das práticas relatadas foi o zig-zag, em que o motorista da viatura faz manobras violentas e a pessoa algemada pode bater a cabeça e se machucar no porta-malas. Além dessa,  o “micro-ondas”, no qual o preso permanece sem água, no interior da viatura por longas horas, o uso de spray de pimenta e a discriminação racial também foram práticas mencionadas.
Uma das causas para essa continuidade da tortura é a impunidade dos casos e falta de uma fiscalização mais severa. Muitos dos casos de violência são “justificados” pela Polícia Militar como consequentes de uma resistência por parte do suspeito, na maioria dos casos uma troca de tiros seguida de morte (do suspeito).
Em 2011, o Subcomitê para a Prevenção da Tortura da ONU visitou o Brasil a fim de avaliar ações de combate e prevenção da tortura no Brasil, e apontou que a atual estrutura institucional não proporciona proteção suficiente contra a tortura e os maus-tratos (o relatório pode ser acessadoaqui). Há uma nova visita marcada para o Brasil entre os dias 19 a 30 de outubro desse ano.

11756628_481388582035405_1691447907_nO caminho da pessoa presa. Fonte: Tecendo Justiça/ITTC.


Uso da força e armas de fogo e condução das hostilidades

September 1, 2015 18:40, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

O uso da força ou das armas de fogo para aplicar a lei é, claramente, uma medida extrema. Isto advém direto do fato de que o direito à vida é o direito humano fundamental. É claro que a situação em caso de conflito armado é muito diferente. Os princípios que regem o uso da força merecem uma explica- ção, em especial, levando em conta que se faz referência a alguns princípios, tais como os de necessidade e proporcionalidade com relação à aplicação da lei e ao conflito armado, em sentidos completamente diferentes.

 Uso da força e armas de fogo na aplicação da lei Embora não sejam tratados, o CCFRAL e o PBUFAF oferecem uma diretriz sobre o uso da força e as armas de fogo. O CCFRAL estabelece padrões para as práticas de aplicação da lei que são consistentes com as disposições relativas aos direitos humanos e liberdades fundamentais. O PBUFAF estabelece princípios formulados “para assistir os Estados membros (do Conselho Econômico e Social) na tarefa de assegurar e promover o papel adequado dos responsáveis pela aplicação da lei”. Os princípios essenciais em que se baseia o uso da força e das armas de fogo são: • legalidade; • precaução; • necessidade; e • proporcionalidade. 

Os responsáveis pela aplicação da lei só podem recorrer ao uso da força quando todos os outros meios de alcançar um objetivo legítimo tiverem falhado (necessidade) e o uso da força puder ser justificado (proporcionalidade) em termos da importância do objetivo legítimo (legalidade) a ser alcançado. Os responsáveis pela aplicação da lei devem ser moderados quando usam a força e as armas de fogo e devem agir em proporção à gravidade da infração e ao objetivo legítimo a alcançar (Princípios 4 e 5 do PBUFAF). Eles estão autorizados a usar apenas a força necessária para alcançar um objetivo legítimo.

O uso de armas de fogo para alcançar objetivos legítimos de aplicação da lei é considerado uma medida extrema. Assim sendo, os princípios de necessidade e proporcionalidade são mais elaborados nos Princípios 9o , 10 e 11 do PBUFAF. Os responsáveis pela aplicação da lei não devem usar armas de fogo contra pessoas, salvo: • em caso de legítima defesa ou defesa de terceiros contra perigo iminente de morte ou de lesão grave; • para evitar um crime particularmente grave que ameace vidas humanas; ou • para proceder à detenção de pessoa que represente essa ameaça e que resista à autoridade, ou para impedir sua fuga; e somente quando medidas menos extremas se mostrem insuficientes para alcançarem aqueles objetivos. Só devem recorrer ao uso intencional de armas letais quando for estritamente indispensável para proteger vidas humanas. (Princípio 9o do PBUFAF).


Mais uma vez, o uso de uma arma de fogo é uma medida extrema. Isto é ilustrado com mais detalhe nas normas de comportamento que os responsáveis pela aplicação da lei precisam observar antes de usar uma arma de fogo (precaução). O Princípio 10 do PBUFAF estabelece que: Nas circunstâncias referidas no Princípio 9o , os responsáveis pela aplicação da lei devem: • identificar-se como tal e • fazer uma advertência clara de sua intenção de utilizar armas de fogo, deixando um prazo suficiente para que o aviso possa ser respeitado, exceto • se esse modo de proceder colocar indevidamente em risco a segurança daqueles responsáveis ou • implicar um perigo de morte ou lesão grave para outras pessoas ou • se mostrar claramente inadequado ou inútil, tendo em conta as circunstâncias do caso. (ênfase acrescentada) 

O uso da força e das armas de fogo nos casos de protestos e manifestações merece uma análise mais detalhada. Vários princípios de especial importância para o “monitoramento” de reuniões e manifestações são estabelecidos no PBUFAF: na dispersão de manifestações ilegais, mas não violentas, os responsáveis pela aplicação da lei devem evitar o uso da força ou, quando isso não for possível, devem limitar a utilização da força ao estritamente necessário (Princípio 13 do PBUFAF); • na dispersão de manifestações violentas, os responsáveis pela aplicação da lei só podem usar armas de fogo se não for possível recorrer a meios menos perigosos e somente • no limite do estritamente necessário, • salvo nas condições estipuladas no Princípio 9o (Princípio 14 do PBUFAF, ênfase acrescentada).


Fonte: https://www.icrc.org/por/assets/files/other/icrc_007_0943.pdf



Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

September 1, 2015 18:33, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Direitos Humanos na Administração da Justiça - Conduta profissional



Adoptados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de Setembro de 1990.


O Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes,
Recordando o Plano de Acção de Milão 130 adoptado por consenso pelo Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes e aprovado pela Assembleia Geral na sua Resolução 40/32 de 29 de Novembro de 1985,
Recordando também a Resolução 14 do Sétimo Congresso 131 na qual o Congresso solicitou ao Comité para a Prevenção do Crime e a Luta contra a Delinquência que considerasse medidas adequadas para favorecerem a aplicação efectiva do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei,
Tomando nota com satisfação dos trabalhos realizados em aplicação da Resolução 14 do Sétimo Congresso131 pelo Comité, pela Reunião Preparatória Inter-regional do Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes consagrada às "Normas e Princípios Orientadores da Organização das Nações Unidas no domínio da prevenção do crime e da justiça penal e aplicação e prioridades tendo em vista a definição de novas normas" 132 e pelas reuniões preparatórias regionais do Oitavo Congresso,

1. Adopta os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, que figuram no anexo à presente resolução;
2. Recomenda os Princípios Básicos para acção e aplicação a nível nacional, regional e inter-regional, tendo em conta a situação e as tradições políticas, económicas, sociais e culturais de cada país;
3. Convida os Estados membros a tomarem em consideração e a respeitarem os Princípios Básicos no quadro das respectivas legislação e prática nacionais;
4. Convida igualmente os Estados membros a submeterem os Princípios Básicos à atenção dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei e de outros membros do poder executivo, de magistrados, advogados, órgãos legislativos e do público em geral;
5. Convida ainda os Estados membros a informarem o Secretário-Geral, de cinco em cinco anos a partir de 1992, dos progressos realizados na aplicação dos Princípios Básicos, incluindo a sua difusão, incorporação na legislação, práticas, procedimentos e políticas internas, problemas encontrados na sua aplicação a nível nacional e assistência que poderia ser necessária da parte da comunidade internacional e solicita ao Secretário-Geral que elabore um relatório sobre o assunto para o Nono Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes;
6. Apela aos Governos para que promovam a organização, a nível nacional e regional, de seminários e cursos de formação sobre a função de aplicação da lei e sobre a necessidade de limitar a utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei;
7. Solicita insistentemente às comissões regionais, aos institutos regionais e inter-regionais para a prevenção do crime e a justiça penal, às instituições especializadas e outros organismos do sistema das Nações Unidas, às outras organizações intergovernamentais interessadas e às organizações não governamentais dotadas de estatuto consultivo junto do Conselho Económico e Social, que participem activamente na aplicação dos Princípios Básicos e informem o Secretário-Geral dos esforços feitos para difundir e aplicar os Princípios Básicos, bem como da medida em que aqueles princípios são aplicados, e solicita ao Secretário-Geral que inclua essa informação no seu relatório para o Nono Congresso;
8. Convida o Comité para a Prevenção do Crime e a Luta contra a Delinquência a examinar com prioridade os meios de garantir a aplicação efectiva da presente resolução;
9. Solicita ao Secretário-Geral que:
a) Tome as medidas adequadas para submeter a presente resolução à atenção dos Governos e de todos os organismos das Nações Unidas interessados e para assegurar a mais ampla difusão possível dos Princípios Básicos;
b) Inclua os Princípios Básicos na próxima edição da publicação das Nações Unidas intituladaDireitos do Homem: Compilação de Instrumentos Internacionais;
c) Forneça aos Governos, que o solicitem, os serviços de peritos e conselheiros regionais e inter-regionais para colaborarem na aplicação dos Princípios Básicos e informe o Nono Congresso sobre a assistência técnica e a formação efectivamente prestadas;
d) Elabore um relatório para a décima segunda sessão do Comité, sobre as medidas tomadas para aplicação dos Princípios Básicos;
10. Solicita ao Nono Congresso e às respectivas reuniões preparatórias que apreciem os progressos realizados na aplicação dos Princípios Básicos.

ANEXO

Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei

Considerando que o trabalho dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei 133 representa um serviço social de grande importância e que, consequentemente, há que manter e, se necessário, aperfeiçoar, as suas condições de trabalho e o seu estatuto,
Considerando que a ameaça à vida e à segurança dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei deve ser considerada como uma ameça à estabilidade da sociedade no seu todo,
Considerando que os funcionários responsáveis pela aplicação da lei têm um papel essencial na protecção do direito à vida, à liberdade e à segurança da pessoa, tal como garantido pela Declaração Universal dos Direitos do Homem 134 e reafirmado no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos 135,
Considerando que as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos prevêem as circunstâncias em que os funcionários prisionais podem recorrer à força no exercício das suas funções,
Considerando que o artigo 3.º do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei 136 dispõe que esses funcionários só podem utilizar a força quando for estritamente necessário e somente na medida exigida para o desempenho das suas funções,
Considerando que a reunião preparatória inter-regional do Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, que teve lugar em Varenna (Itália), acordou nos elementos que deveriam ser apreciados, no decurso dos trabalhos ulteriores, com relação às restrições à utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei 137,
Considerando que o Sétimo Congresso, na sua resolução 14 138 , sublinha, nomeadamente, que a utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei deve ser conciliada com o respeito devido pelos Direitos do Homem,
Considerando que o Conselho Económico e Social, na secção IX da sua Resolução 1986/10, de 21 de Maio de 1986, convidou os Estados membros a concederem uma atenção particular, na aplicação do Código, à utilização da força e de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei e que a Assembleia Geral, na sua Resolução 41/149, de 4 de Dezembro de 1986, se congratula com esta recomendação do Conselho,
Considerando que é conveniente atender, tendo em devida conta as exigências de segurança pessoal, ao papel dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei na administração da justiça, na protecção do direito à vida, à liberdade e à segurança das pessoas, bem como à responsabilidade dos mesmos na manutenção da segurança pública e da paz social e à importância das suas qualificações, formação e conduta,
Os Governos devem ter em conta os Princípios Básicos a seguir enunciados, que foram formulados tendo em vista auxiliar os Estados membros a garantirem e a promoverem o verdadeiro papel dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, a observá-los no quadro das respectivas legislação e prática nacionais e a submetê-los à atenção dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, bem como de outras pessoas como os juízes, os magistrados do Ministério Público, os advogados, os representantes do poder executivo e do poder legislativo e o público em geral.
Disposições gerais
1. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem adoptar e aplicar regras sobre a utilização da força e de armas de fogo contra as pessoas, por parte dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei. Ao elaborarem essas regras, os Governos e os organismos de aplicação da lei devem manter sob permanente avaliação as questões éticas ligadas à utilização da força e de armas de fogo.
2. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem desenvolver um leque de meios tão amplo quanto possível e habilitar os funcionários responsáveis pela aplicação da lei com diversos tipos de armas e de munições, que permitam uma utilização diferenciada da força e das armas de fogo. Para o efeito, deveriam ser desenvolvidas armas neutralizadoras não letais, para uso nas situações apropriadas, tendo em vista limitar de modo crescente o recurso a meios que possam causar a morte ou lesões corporais. Para o mesmo efeito, deveria também ser possível dotar os funcionários responsáveis pela aplicação da lei de equipamentos defensivos, tais como escudos, viseiras, coletes antibalas e veículos blindados, a fim de se reduzir a necessidade de utilização de qualquer tipo de armas.
3. O desenvolvimento e utilização de armas neutralizadoras não letais deveria ser objecto de uma avaliação cuidadosa, a fim de reduzir ao mínimo os riscos com relação a terceiros, e a utilização dessas armas deveria ser submetida a um controlo estrito.
4. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei, no exercício das suas funções, devem, na medida do possível, recorrer a meios não violentos antes de utilizarem a força ou armas de fogo. Só poderão recorrer à força ou a armas de fogo se outros meios se mostrarem ineficazes ou não permitirem alcançar o resultado desejado.
5. Sempre que o uso legítimo da força ou de armas de fogo seja indispensável, os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem:
a) Utilizá-las com moderação e a sua acção deve ser proporcional à gravidade da infracção e ao objectivo legítimo a alcançar;
b) Esforçar-se por reduzirem ao mínimo os danos e lesões e respeitarem e preservarem a vida humana;
c) Assegurar a prestação de assistência e socorros médicos às pessoas feridas ou afectadas, tão rapidamente quanto possível;
d) Assegurar a comunicação da ocorrência à família ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afectada, tão rapidamente quanto possível.
6. Sempre que da utilização da força ou de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei resultem lesões ou a morte, os responsáveis farão um relatório da ocorrência aos seus superiores, de acordo com o princípio 22.
7. Os Governos devem garantir que a utilização arbitrária ou abusiva da força ou de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei seja punida como infracção penal, nos termos da legislação nacional.
8. Nenhuma circunstância excepcional, tal como a instabilidade política interna ou o estado de emergência, pode ser invocada para justificar uma derrogação dos presentes Princípios Básicos.
Disposições especiais
9. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem fazer uso de armas de fogo contra pessoas, salvo em caso de legítima defesa, defesa de terceiros contra perigo iminente de morte ou lesão grave, para prevenir um crime particularmente grave que ameace vidas humanas, para proceder à detenção de pessoa que represente essa ameaça e que resista à autoridade, ou impedir a sua fuga, e somente quando medidas menos extremas se mostrem insuficientes para alcançarem aqueles objectivos. Em qualquer caso, só devem recorrer intencionalmente à utilização letal de armas de fogo quando isso seja estritamente indispensável para proteger vidas humanas.
10. Nas circunstâncias referidas no princípio 9, os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem identificar-se como tal e fazer uma advertência clara da sua intenção de utilizarem armas de fogo, deixando um prazo suficiente para que o aviso possa ser respeitado, excepto se esse modo de proceder colocar indevidamente em risco a segurança daqueles responsáveis, implicar um perigo de morte ou lesão grave para outras pessoas ou se se mostrar manifestamente inadequado ou inútil, tendo em conta as circunstâncias do caso.
11. As normas e regulamentações relativas à utilização de armas de fogo pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem incluir directrizes que:
a) Especifiquem as circunstâncias nas quais os funcionários responsáveis pela aplicação da lei sejam autorizados a transportar armas de fogo e prescrevam os tipos de armas de fogo e munições autorizados;
b) Garantam que as armas de fogo sejam utilizadas apenas nas circunstâncias adequadas e de modo a reduzir ao mínimo o risco de danos inúteis;
c) Proíbam a utilização de armas de fogo e de munições que provoquem lesões desnecessárias ou representem um risco injustificado;
d) Regulamentem o controlo, armazenamento e distribuição de armas de fogo e prevejam nomeadamente procedimentos de acordo com os quais os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devam prestar contas de todas as armas e munições que lhes sejam distribuídas;
e) Prevejam as advertências a efectuar, sendo caso disso, se houver utilização de armas de fogo;
f) Prevejam um sistema de relatórios de ocorrência, sempre que os funcionários responsáveis pela aplicação da lei utilizem armas de fogo no exercício das suas funções.

Manutenção da ordem em caso de reuniões ilegais

12. Dado que a todos é garantido o direito de participação em reuniões lícitas e pacíficas, de acordo com os princípios enunciados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, os Governos e os serviços e funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem reconhecer que a força e as armas de fogo só podem ser utilizadas de acordo com os princípios 13 e 14.
13. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem esforçar-se por dispersar as reuniões ilegais mas não violentas sem recurso à força e, quando isso não for possível, limitar a utilização da força ao estritamente necessário.
14. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem utilizar armas de fogo para dispersarem reuniões violentas se não for possível recorrer a meios menos perigosos, e somente nos limites do estritamente necessário. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem utilizar armas de fogo nesses casos, salvo nas condições estipuladas no princípio 9.

Manutenção da ordem entre pessoas detidas ou presas

15. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem utilizar a força na relação com pessoas detidas ou presas, excepto se isso for indispensável para a manutenção da segurança e da ordem nos estabelecimentos penitenciários, ou quando a segurança das pessoas esteja ameaçada.
16. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei não devem utilizar armas de fogo na relação com pessoas detidas ou presas, excepto em caso de legítima defesa ou para defesa de terceiros contra perigo iminente de morte ou lesão grave, ou quando essa utilização for indispensável para impedir a evasão de pessoa detida ou presa representando o risco referido no princípio 9.
17. Os princípios precedentes entendem-se sem prejuízo dos direitos, deveres e responsabilidades dos funcionários dos estabelecimentos penitenciários, tal como são enunciados nas Regras Mínimas para o Tratamento de Presos, em particular as regras 33, 34 e 54.

Habilitações, formação e aconselhamento

18. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem garantir que todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei sejam seleccionados de acordo com procedimentos adequados, possuam as qualidades morais e aptidões psicológicas e físicas exigidas para o bom desempenho das suas funções e recebam uma formação profissional contínua e completa. Deve ser submetida a reapreciação periódica a sua capacidade para continuarem a desempenhar essas funções.
19. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem garantir que todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei recebam formação e sejam submetidos a testes de acordo com normas de avaliação adequadas sobre a utilização da força. Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei que devam transportar armas de fogo deveriam ser apenas autorizados a fazê-lo após recebimento de formação especial para a sua utilização.
20. Na formação dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, os Governos e os organismos de aplicação da lei devem conceder uma atenção particular às questões de ética policial e de direitos do homem, em particular no âmbito da investigação, aos meios de evitar a utilização da força ou de armas de fogo, incluindo a resolução pacífica de conflitos, ao conhecimento do comportamento de multidões e aos métodos de persuasão, de negociação e mediação, bem como aos meios técnicos, tendo em vista limitar a utilização da força ou de armas de fogo. Os organismos de aplicação da lei deveriam rever o seu programa de formação e procedimentos operacionais, em função de incidentes concretos.
21. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem garantir aconselhamento psicológico aos funcionários responsáveis pela aplicação da lei envolvidos em situações em que sejam utilizadas a força e armas de fogo.

Procedimentos de comunicação hierárquica e de inquérito

22. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem estabelecer procedimentos adequados de comunicação hierárquica e de inquérito para os incidentes referidos nos princípios 6 e 11 f). Para os incidentes que sejam objecto de relatório por força dos presentes Princípios, os Governos e os organismos de aplicação da lei devem garantir a possibilidade de um efectivo procedimento de controlo e que autoridades independentes (administrativas ou do Ministério Público), possam exercer a sua jurisdição nas condições adequadas. Em caso de morte, lesão grave, ou outra consequência grave, deve ser enviado de imediato um relatório detalhado às autoridades competentes encarregadas do inquérito administrativo ou do controlo judiciário.
23. As pessoas contra as quais sejam utilizadas a força ou armas de fogo ou os seus representantes autorizados devem ter acesso a um processo independente, em particular um processo judicial. Em caso de morte dessas pessoas, a presente disposição aplica-se às pessoas a seu cargo.
24. Os Governos e organismos de aplicação da lei devem garantir que os funcionários superiores sejam responsabilizados se, sabendo ou devendo saber que os funcionários sob as suas ordens utilizam ou utilizaram ilicitamente a força ou armas de fogo, não tomaram as medidas ao seu alcance para impedirem, fazerem cessar ou comunicarem este abuso.
25. Os Governos e organismos responsáveis pela aplicação da lei devem garantir que nenhuma sanção penal ou disciplinar seja tomada contra funcionários responsáveis pela aplicação da lei que, de acordo como o Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei e com os presentes Princípios Básicos, recusem cumprir uma ordem de utilização da força ou armas de fogo ou denunciem essa utilização por outros funcionários.
26. A obediência a ordens superiores não pode ser invocada como meio de defesa se os responsáveis pela aplicação da lei sabiam que a ordem de utilização da força ou de armas de fogo de que resultaram a morte ou lesões graves era manifestamente ilegal e se tinham uma possibilidade razoável de recusar cumpri-la. Em qualquer caso, também existe responsabilidade da parte do superior que proferiu a ordem ilegal.



Prática de execuções extrajudiciais pela polícia do Rio de Janeiro é reconhecida por autoridades

September 1, 2015 11:30, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE

Ação em frente à ALERJ, 31 de agosto de 2015. Cada flor representa uma morte cometida por policiais em 2014, ao todo são 580. | ©Luis Filipe Marques / Anistia Internacional
Ação em frente à ALERJ, 31 de agosto de 2015. Cada flor representa uma morte cometida por policiais em 2014, ao todo são 580. | ©Luis Filipe Marques / Anistia Internacional
Apesar da ausência marcante de um representante da Secretaria de Segurança Pública (SESEG/RJ), autoridades que participaram da audiência pública realizada hoje (31), na ALERJ, reconheceram a existência da prática de execuções extrajudicias cometidas pela polícia no estado do Rio de Janeiro. No encontro, as recomendações propostas pelo relatório da Anistia Internacional – “Você matou meu filho: Homicídios cometidos pela Polícia Militar na cidade do Rio de Janeiro” -, lançado no início do mês, foram consideradas como importantes medidas para mudar esta realidade. Participaram da audiência pública o chefe do Estado Maior Administrativo da Polícia Militar, coronel Ibis Pereira, o chefe de gabinete da Polícia Civil, Fernando Pouca Vila e o promotor Paulo Roberto Jr, representando o Ministério Público.
“Esperamos que os indicativos dados hoje na audiência pública de compromisso com as recomendações do relatório da Anistia Internacional não caiam no vazio e as ações possam realmente ser implementadas. Os registro de homicídios decorrentes de intervenção policial têm sido usados como uma cortina de fumaça para ocultar casos de execuções extrajudiciais cometidas pela polícia. Essa realidade precisa mudar”, afirma Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional Brasil.
A Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ abriu diálogo com as autoridades responsáveis pelo tema, agendando reuniões de trabalho com o Ministério Público Estadual e com os comandos das polícias civil e militar para avançar na efetivação das recomendações.
Para o Ministério Público Estadual, pede-se a criação de um grupo permanente que concentre a investigação dos homicídios decorrentes de intervenção policial, que inclua também uma força tarefa para concluir as centenas de casos em andamento. Espera-se também que seja criada uma comissão de controle externo da atividade policial.
Para a Polícia Civil, foi solicitada a definição de um cronograma para que todos os homicídios decorrentes de intervenção policial passem a ser investigados pela Divisão de Homicídios. O chefe de gabinete da Polícia Civil, Fernando Vila Pouca, afirmou que esta decisão já foi tomada no comando da polícia, mas ainda faltam recursos para implementar a proposta.
O chefe do Estado Maior Adminstrativo da PMERJ, coronel Íbis Pereira, anunciou que em breve a polícia militar do Rio de Janeiro vai implementar um protocolo para o uso da força. O diretor da Anistia Internacional, Atila Roque, sugeriu que o comando da PM também desenvolva ações de controle do uso da força letal nos batalhões e unidades da polícia militar que apresentam maior número de homicídios decorrentes de intervenção policial.
Segundo o pesquisador Michel Misse, as mortes cometidas pela polícia e a falta de investigação são temas denunciados por pesquisas e estudos acadêmicos desde os anos 90. Monica Cunha, da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência, foi enfática: “Como quem teve um filho assassinado vai ter paciência de esperar? Como ter paciência, se eles continuam morrendo?”
A proposta de incorporar os protocolos internacionais sobre o uso da força, na legislação estadual, também foi discutida e recebeu apoio não apenas do presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Marcelo Freixo, como do próprio presidente da casa, deputado Jorge Picciani, em encontro prévio à audiência. A audiência pública contou com a presença de familiares de vítimas da violência, as organizações da sociedade civil ISER e Justiça Global, especialistas no tema, defensores de direitos humanos e autoridades.
“Os encaminhamentos que saíram da audiência pública são um passo importante, mas ainda há um longo caminho a ser percorrido até que as autoridades firmem compromissos concretos e implementem as mudanças necessárias para mudar a realidade apresentada”, destaca Atila Roque. A Anistia Internacional continuará empenhada em cobrar a efetivação e monitorar os compromissos assumidos na audiência pública, assim como continuar pressionando para que todas as recomendações do relatório sejam implementadas.
Diga não à execução
Durante a audiência pública, ativistas da Anistia Internacional fizeram uma manifestação pacífica na escadaria do Palácio Tiradentes (ALERJ), onde 580 vasos de flores foram dispostos representando cada uma das vítimas de homícidios decorrentes de intervenção policial no estado do Rio de Janeiro, em 2014. Os ativistas recolheram assinaturas para a petição “Diga não à execução”, que será entregue às autoridades estaduais cobrando a implementação das recomendações do relatório. A petição pode ser assinada aqui.
Saiba mais



Adolescente morre baleado após perseguição policial na Zona Sul de SP

September 1, 2015 11:28, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Outro jovem ficou ferido; segundo a polícia, suspeitos atiraram.
Polícia diz que três jovens não obedeceram ordem de parada.

Do G1 São Paulo
Um adolescente de 15 anos morreu e outro jovem foi baleado na madrugada desta segunda-feira (31) depois de uma perseguição policial na região do Capão Redondo, na Zona Sul da capital paulista.
Por volta da 1h, a polícia suspeitou de três jovens que estavam dentro de um carro. Eles desobedeceram uma ordem de parada e os policiais iniciaram uma perseguição. Depois de dez minutos, o trio parou em uma rua do bairro Jardim Copacabana, também na Zona Sul, e a viatura da PM que vinha atrás bateu no carro. Na versão da polícia, os suspeitos saíram atirando do carro e os policiais revidaram.
O adolescente morreu na hora e o jovem baleado foi levado ao Pronto-Socorro Saboia. Um terceiro suspeito conseguiu fugir. A polícia disse que apreendeu dois revólveres 38 e um tijolo de maconha.



O efetivo das polícias brasileiras – militares e civis

August 30, 2015 17:26, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Por Danillo Ferreira

PMDF
A PMDF, proporcionalmente, é a polícia militar com o maior efetivo do Brasil. Foto: André Gustavo Stumpf
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pela primeira vez dedicou um espaço da sua Pesquisa de Informações Básicas Estaduais (Estadic) à área de segurança pública. No estudo, o Instituto divulgou dados interessantes referentes à quantidade de policiais militares e civis nas regiões e unidades da federação brasileiras.
O destaque fica para a relação entre efetivo policial e quantidade de habitantes:
Efetivos das polícias brasileiras
De acordo com a tabela acima, retirada do estudo do IBGE, o estado com o menor efetivo policial-militar relativo ao número de habitantes é o Maranhão, com 881 habitantes por policial militar. O Distrito Federal possui o maior efetivo relativo, com 194 habitantes por policial militar.
É bom lembrar que fatores como a distribuição do efetivo em cada município, e até unidade policial, contam muito para analisar esses dados. Ressalvas como policiais empregados em setores administrativos e a concentração de efetivo em algumas regiões, em detrimento de outras, podem ser definitivas para definir a quantidade real de policiais por habitante.



Cães labradores da PM serão leiloados no próximo dia 10

August 22, 2015 4:12, von POLÍTICA CIDADANIA E DIGNIDADE


Hoje em Dia




Rocca/Divulgação
Cães labradores da PM serão leiloados no próximo dia 10
Cães têm entre 3 e 5 anos


Onze cães da raça labrador da Polícia Militar irão a leilão no próximo dia 10 de setembro. Conforme o Batalhão de Rondas Ostensivas com Cães (Rocca), os animais são saudáveis e bem cuidados, mas não demostraram aptidão para fazer parte da corporação, como farejadores de drogas, explosivos e de buscas e, por isso, serão leiloados. "Todos os cães são dóceis e brincalhões", frisou o tenente Albuquerque, chefe do Núcleo de Treinamento e Adestramento da Rocca.
 
Conforme o policial, são seis machos e cinco fêmeas, com idades entre 3 e 5 anos, sendo que os lances mínimos variam entre R$ 130 e R$ 150. O leilão acontecerá no Batalhão de Choque (avenida Amazonas, 6227, bairro Gameleira), às 10h.
 
Os interessados podem visitá-los no canil da PM, na rua Padre Feijó, 917, no bairro Saudade, na região Leste de BH, do dia 31 de agosto até 4 de setembro. "Os cães são destinados a leilão por serem bens patrimoniais do Estado, cuja alienação se dá por meio de leilão", explicou o tenente.