Oficiais criaram CARREIRA JURÍDICA aumentando o fosso com os praças, e como estratégia para protegerem e blindarem direitos frente a DESMILITARIZAÇÃO
сентября 11, 2013 7:26 - no comments yetACORDA PRAÇA!!!
Carreira Jurídica Militar - De volta à Ditadura? |
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Tramita na Assembléia Legislativa de Minas Gerais a PEC 59, de autoria de alguns membros do parlamento, com o objetivo de exigir a formação superior em direito para ingresso no oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais, além de atribuir à carreira militar o status de jurídica. Muito mais que uma simples modificação nos requisitos de ingresso à carreira ou em sua nomenclatura, a proposição exige atenção especial da sociedade e do próprio Governo, sob pena de duro golpe ao Estado Democrático de Direito e à própria Constituição.
É de se observar, inicialmente, que a reivindicação dos militares ocorre em reação ao recente reconhecimento na Constituição Estadual de carreira jurídica de Estado aos Delegados de Polícia, fruto de amplo e transparente debate social, especialmente como segunda proposta mais votada no seminário de segurança pública realizado pela própria Assembléia em 2006, além de fundamentado em disposições expressas do Conselho Nacional de Justiça e em decisões do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, a proposição relativa aos Delegados de Polícia amadureceu por longos quatro anos em nosso Parlamento.
A proposta dos militares não foi debatida ou analisada, sequer superficialmente. É o que expõe em seu blog, aliás, o renomado Professor Sapori, ex-Secretário de Estado de Defesa Social, Coordenador do Curso de Ciências Sociais da PUC Minas e Secretário Executivo do Instituto Minas Pela Paz:
“A conquista recente dos Delegados da PCMG suscitou uma resposta anacrônica e irracional de setores do oficialato da PMMG. E as entidades representativas das diversas carreiras da PCMG estão reagindo à PEC 59, como era de se esperar.
Confesso-me abismado com a PEC 59/2010. Jamais podia imaginar que o oficialato de uma Polícia Militar pudesse reivindicar o statusde carreira jurídica. Para tanto estão prevendo que o ingresso no quadro do oficialato da PMMG exigirá o bacharelado em Direito.
Eis um infeliz retrocesso na história da Polícia Militar de Minas Gerais!
Na ânsia de não perder espaço político para os Delegados mineiros, setores do oficialato da PMMG estão metendo os pés pelas mãos.” (grifo nosso).
Em seguida é preciso que se esclareça o que significa dizer que determinada carreira é jurídica?
A definição de carreira jurídica nos é apresentada em dois planos. No normativo, o art. 2º da Resolução nº 11/2006 do Conselho Nacional de Justiça prevê que “Considera-se atividade jurídica aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito, bem inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagem do estágio acadêmico ou qualquer atividade anterior à colação de grau.
No plano jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal, mais alta corte Judiciária do país e responsável pela defesa das disposições constitucionais já trouxe em inúmeros de seus julgados a caracterização de carreira jurídica. A título de ilustração, o Ministro Carlos Ayres Brito, em voto proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.460, discorre que “Há exceções, reconheço, nesse plano do preparo técnico para a solução de controvérsias. E elas estão, assim penso, justamente nas atividades policiais e nas de natureza cartorária. É que a Constituição mesma já distingue as coisas. Quero dizer: se a atividade policial diz respeito ao cargo de Delegado, ela se define como de caráter jurídico. [...] Isto porque: a) desde o primitivo § 4º do artigo 144 da Constituição, que o cargo de Delegado de Polícia é tido como equiparável àqueles integrantes das chamadas carreiras jurídicas [...]”.
Notadamente no mesmo sentido, o Ministro Cezar Peluso, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.614/PR, asseverou que“compete somente às polícias judiciárias (e não às militares) a lavratura de termos circunstanciados (Lei nº 9.099/95) –, cabe ao delegado de polícia a realização de “um juízo jurídico de avaliação dos fatos que são expostos”.
Portanto, de forma mais objetiva possível, pode-se afirmar que pertencem às carreiras jurídicas os cargos que, além de exigirem formação superior em direito pela utilização inevitável e preponderante de conhecimentos jurídicos, atuam no processo (ainda que na fase pré-processual) com capacidade postulatória, em nome próprio, com a realização de valoração jurídica. Sabidamente, pertencem às carreiras jurídicas os cargos de Magistrado, Promotor de Justiça, Defensor Público, Procurador do Estado e Delegado de Polícia, essencialmente.
Na atuação da Polícia Militar, conforme disposto no art. 144 da Constituição da República, não há utilização de conhecimentos jurídicos de forma preponderante, tampouco de forma considerável pois ao órgão cabe a manutenção da ordem e a prevenção do crime, especialmente através da realização de policiamento (patrulhamento) ostensivo, dando visibilidade à presença do Estado de forma a inibir a prática do delito.
Ainda que nos refiramos à apuração de crimes militares não há que se falar em carreira jurídica. O Oficial Militar responsável pela elaboração de inquérito policial militar realiza mera adequação matemática de uma conduta a uma norma militar, inexistindo aqui capacidade postulatória e tampouco valoração jurídica por parte de seus responsáveis. É por tal razão que o policial militar que age em legítima defesa e no estrito cumprimento do dever legal, ainda assim, é preso e indiciado pelo crime penal. Basta lembrar que o IPM é realizado, indistintamentepor qualquer Oficial da Polícia Militar, sem que possua formação superior em direito.
Por que então a busca de se criar a inexistente figura do militar jurista? O que pretendem, pois, os militares com a tentativa equivocada de tal inserção?
Como muito bem afirmado pelo Professor Sapori, trata-se de reação dos Oficiais, motivada pelo medo da perda de prestígio em relação aos Delegados de Polícia e, mais, pelo medo da inevitável diferenciação salarial que deve existir entre os cargos.
Os Oficiais da Polícia Militar de Minas Gerais, sabidamente, alegam uma inconstitucional e absurda vinculação salarial com os Delegados de Polícia como questão cultural no Estado. Ora, a remuneração dos diversos cargos da Administração Pública deve obedecer aos critérios de requisito, à natureza das funções e ao grau de responsabilidade, por inarredável previsão constitucional. Não há como se defender a tal vinculação porque, pertencendo os Delegados de Polícia às carreiras jurídicas, tal quais deve ser tratado sob o aspecto remuneratório.
Mas seria menos preocupante se o único objetivo do Oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais fosse o “prestígio jurídico”. Por detrás da proposta está uma tendência já hoje observada de militarização da investigação criminal, o que nos remete ao período sombrio da ditadura militar em nosso país.
É que a função constitucional da Polícia Militar é a prevenção do crime e a manutenção da ordem. Não é sem razão que os policiais militares usam uniforme e uma de suas principais estratégias deveria ser a presença policial com o objetivo de inibir a prática do crime. Diz-se “deveria” porque se observa em nosso Estado o abandono da prevenção em prol de uma cultura de repressão.
Imagine-se presenciando diariamente, na saída pela manhã e no retorno à noite, a presença de uma dupla de policiais militares rondando a pé o quarteirão residencial. Sentir-se-ia seguro? Será que ali ocorreriam crimes contra o patrimônio? Como se explicar a atuação repressiva em prejuízo da prevenção?
Basta examinar as ferramentas motivacionais dos estatutos da PMMG. Não há previsão de premiação para os militares ou unidades militares que reduzam o índice de criminalidade em determinada região, mas, sim, existe premiação para a realização de prisões e apreensões. Institucional e culturalmente na Polícia Militar de Minas Gerais o militar que impede a ocorrência de delitos através de eficiente patrulhamento e presença policial, não é reconhecido, enquanto aquele que prende tem méritos. O que é mais importante: evitar que o crime ocorra ou prender o criminoso depois de sua ocorrência?
O abandono da prevenção pode ser comprovado pela simples observação cotidiana da ausência de viaturas e de policiais militares, aliada à ilegal atuação da P2 (militares sem farda) que exercem atividade investigativa ilegal, repita-se, desprovida de procedimento e de controle por quem quer que seja.
Pois bem, a Polícia Militar em Minas Gerais tem se dedicado a atuar depois da ocorrência do crime, em concorrência com a Polícia Civil. Nessa atuação, vítimas, testemunhas e criminosos já tem sido levados às unidades militares para diversos procedimentos (não previstos em lei) e o objetivo maior da PEC 59 é abrir uma porta para que a investigação criminal seja feita intra muros de unidades militares, remetendo-nos, uma vez mais, ao período sombrio da ditadura. Não basta a prisão de supostos criminosos. É preciso que a investigação criminal seja realizada em estrita obediência aos preceitos legais de forma a se garantir o processo penal futuro e a responsabilização do autor do crime.
É cristalina a absoluta ausência de interesse público na aprovação da referida PEC, tratando-se de manobra rasteira de tentar impor de forma ilegítima uma situação inexistente por pura vaidade classista.
É oportuno se registrar que o militarismo possui características próprias que tem como fundamento o enfrentamento ao inimigo, destinado às guerras. Ademais, o regime militar possui benefícios próprios, dentre os quais os previdenciários. Acredita-se que o Oficialato não pretenda deles abrir mão para se tornar carreira jurídica.
O atual estágio do Estado Democrático de Direito, alcançado a duras penas em nosso país e em constante amadurecimento, exige-nos uma reflexão mais profunda sobre a real necessidade de uma Polícia Militar para manutenção da ordem social e prevenção da criminalidade. Qual o verdadeiro sentido de uma polícia militarizada para agir no meio social?
Pretender a formação em curso superior para, em tese, maior qualificação de seus profissionais, é absolutamente legítimo. Por que então não se formam policiais pedagogos, assistentes sociais, sociólogos? Profissionais mais bem capacitados para a proximidade com o cidadão, para a presença visível que traz concreta sensação de segurança?
É necessário, urgentemente, que nos atentemos aos verdadeiros objetivos do Oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais, cujas estratégias, não raras vezes, sequer encontram respaldo no próprio corpo militar que sustenta a instituição. Não se pode permitir que uma proposta tão grave à democracia seja votada e aprovada sob cortinas e à toque de caixa sem amplo debate e acurada análise aos quais desde já convidamos toda a sociedade e as autoridades públicas.
A quem pretenda a atuação na gestão da investigação criminal, cabe a formação necessária e a aprovação em concurso público para Delegado de Polícia.
Sobre o sol reluzente da democracia já é possível avistar a sombra assustadora da ditadura.
Daniel Barcelos Ferreira
Delegado de Polícia
Professor de Direitos Humanos da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais
Especialista em Segurança Pública e Complexidade
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Oficiais criaram CARREIRA JURÍDICA aumentando o fosso com os praças, e como estratégia para protegerem e blindarem direitos frente a DESMILITARIZAÇÃO
сентября 11, 2013 7:26 - no comments yetACORDA PRAÇA!!!
Carreira Jurídica Militar - De volta à Ditadura? |
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Tramita na Assembléia Legislativa de Minas Gerais a PEC 59, de autoria de alguns membros do parlamento, com o objetivo de exigir a formação superior em direito para ingresso no oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais, além de atribuir à carreira militar o status de jurídica. Muito mais que uma simples modificação nos requisitos de ingresso à carreira ou em sua nomenclatura, a proposição exige atenção especial da sociedade e do próprio Governo, sob pena de duro golpe ao Estado Democrático de Direito e à própria Constituição.
É de se observar, inicialmente, que a reivindicação dos militares ocorre em reação ao recente reconhecimento na Constituição Estadual de carreira jurídica de Estado aos Delegados de Polícia, fruto de amplo e transparente debate social, especialmente como segunda proposta mais votada no seminário de segurança pública realizado pela própria Assembléia em 2006, além de fundamentado em disposições expressas do Conselho Nacional de Justiça e em decisões do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, a proposição relativa aos Delegados de Polícia amadureceu por longos quatro anos em nosso Parlamento.
A proposta dos militares não foi debatida ou analisada, sequer superficialmente. É o que expõe em seu blog, aliás, o renomado Professor Sapori, ex-Secretário de Estado de Defesa Social, Coordenador do Curso de Ciências Sociais da PUC Minas e Secretário Executivo do Instituto Minas Pela Paz:
“A conquista recente dos Delegados da PCMG suscitou uma resposta anacrônica e irracional de setores do oficialato da PMMG. E as entidades representativas das diversas carreiras da PCMG estão reagindo à PEC 59, como era de se esperar.
Confesso-me abismado com a PEC 59/2010. Jamais podia imaginar que o oficialato de uma Polícia Militar pudesse reivindicar o statusde carreira jurídica. Para tanto estão prevendo que o ingresso no quadro do oficialato da PMMG exigirá o bacharelado em Direito.
Eis um infeliz retrocesso na história da Polícia Militar de Minas Gerais!
Na ânsia de não perder espaço político para os Delegados mineiros, setores do oficialato da PMMG estão metendo os pés pelas mãos.” (grifo nosso).
Em seguida é preciso que se esclareça o que significa dizer que determinada carreira é jurídica?
A definição de carreira jurídica nos é apresentada em dois planos. No normativo, o art. 2º da Resolução nº 11/2006 do Conselho Nacional de Justiça prevê que “Considera-se atividade jurídica aquela exercida com exclusividade por bacharel em Direito, bem inclusive de magistério superior, que exija a utilização preponderante de conhecimento jurídico, vedada a contagem do estágio acadêmico ou qualquer atividade anterior à colação de grau.
No plano jurisprudencial, o Supremo Tribunal Federal, mais alta corte Judiciária do país e responsável pela defesa das disposições constitucionais já trouxe em inúmeros de seus julgados a caracterização de carreira jurídica. A título de ilustração, o Ministro Carlos Ayres Brito, em voto proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.460, discorre que “Há exceções, reconheço, nesse plano do preparo técnico para a solução de controvérsias. E elas estão, assim penso, justamente nas atividades policiais e nas de natureza cartorária. É que a Constituição mesma já distingue as coisas. Quero dizer: se a atividade policial diz respeito ao cargo de Delegado, ela se define como de caráter jurídico. [...] Isto porque: a) desde o primitivo § 4º do artigo 144 da Constituição, que o cargo de Delegado de Polícia é tido como equiparável àqueles integrantes das chamadas carreiras jurídicas [...]”.
Notadamente no mesmo sentido, o Ministro Cezar Peluso, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.614/PR, asseverou que“compete somente às polícias judiciárias (e não às militares) a lavratura de termos circunstanciados (Lei nº 9.099/95) –, cabe ao delegado de polícia a realização de “um juízo jurídico de avaliação dos fatos que são expostos”.
Portanto, de forma mais objetiva possível, pode-se afirmar que pertencem às carreiras jurídicas os cargos que, além de exigirem formação superior em direito pela utilização inevitável e preponderante de conhecimentos jurídicos, atuam no processo (ainda que na fase pré-processual) com capacidade postulatória, em nome próprio, com a realização de valoração jurídica. Sabidamente, pertencem às carreiras jurídicas os cargos de Magistrado, Promotor de Justiça, Defensor Público, Procurador do Estado e Delegado de Polícia, essencialmente.
Na atuação da Polícia Militar, conforme disposto no art. 144 da Constituição da República, não há utilização de conhecimentos jurídicos de forma preponderante, tampouco de forma considerável pois ao órgão cabe a manutenção da ordem e a prevenção do crime, especialmente através da realização de policiamento (patrulhamento) ostensivo, dando visibilidade à presença do Estado de forma a inibir a prática do delito.
Ainda que nos refiramos à apuração de crimes militares não há que se falar em carreira jurídica. O Oficial Militar responsável pela elaboração de inquérito policial militar realiza mera adequação matemática de uma conduta a uma norma militar, inexistindo aqui capacidade postulatória e tampouco valoração jurídica por parte de seus responsáveis. É por tal razão que o policial militar que age em legítima defesa e no estrito cumprimento do dever legal, ainda assim, é preso e indiciado pelo crime penal. Basta lembrar que o IPM é realizado, indistintamentepor qualquer Oficial da Polícia Militar, sem que possua formação superior em direito.
Por que então a busca de se criar a inexistente figura do militar jurista? O que pretendem, pois, os militares com a tentativa equivocada de tal inserção?
Como muito bem afirmado pelo Professor Sapori, trata-se de reação dos Oficiais, motivada pelo medo da perda de prestígio em relação aos Delegados de Polícia e, mais, pelo medo da inevitável diferenciação salarial que deve existir entre os cargos.
Os Oficiais da Polícia Militar de Minas Gerais, sabidamente, alegam uma inconstitucional e absurda vinculação salarial com os Delegados de Polícia como questão cultural no Estado. Ora, a remuneração dos diversos cargos da Administração Pública deve obedecer aos critérios de requisito, à natureza das funções e ao grau de responsabilidade, por inarredável previsão constitucional. Não há como se defender a tal vinculação porque, pertencendo os Delegados de Polícia às carreiras jurídicas, tal quais deve ser tratado sob o aspecto remuneratório.
Mas seria menos preocupante se o único objetivo do Oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais fosse o “prestígio jurídico”. Por detrás da proposta está uma tendência já hoje observada de militarização da investigação criminal, o que nos remete ao período sombrio da ditadura militar em nosso país.
É que a função constitucional da Polícia Militar é a prevenção do crime e a manutenção da ordem. Não é sem razão que os policiais militares usam uniforme e uma de suas principais estratégias deveria ser a presença policial com o objetivo de inibir a prática do crime. Diz-se “deveria” porque se observa em nosso Estado o abandono da prevenção em prol de uma cultura de repressão.
Imagine-se presenciando diariamente, na saída pela manhã e no retorno à noite, a presença de uma dupla de policiais militares rondando a pé o quarteirão residencial. Sentir-se-ia seguro? Será que ali ocorreriam crimes contra o patrimônio? Como se explicar a atuação repressiva em prejuízo da prevenção?
Basta examinar as ferramentas motivacionais dos estatutos da PMMG. Não há previsão de premiação para os militares ou unidades militares que reduzam o índice de criminalidade em determinada região, mas, sim, existe premiação para a realização de prisões e apreensões. Institucional e culturalmente na Polícia Militar de Minas Gerais o militar que impede a ocorrência de delitos através de eficiente patrulhamento e presença policial, não é reconhecido, enquanto aquele que prende tem méritos. O que é mais importante: evitar que o crime ocorra ou prender o criminoso depois de sua ocorrência?
O abandono da prevenção pode ser comprovado pela simples observação cotidiana da ausência de viaturas e de policiais militares, aliada à ilegal atuação da P2 (militares sem farda) que exercem atividade investigativa ilegal, repita-se, desprovida de procedimento e de controle por quem quer que seja.
Pois bem, a Polícia Militar em Minas Gerais tem se dedicado a atuar depois da ocorrência do crime, em concorrência com a Polícia Civil. Nessa atuação, vítimas, testemunhas e criminosos já tem sido levados às unidades militares para diversos procedimentos (não previstos em lei) e o objetivo maior da PEC 59 é abrir uma porta para que a investigação criminal seja feita intra muros de unidades militares, remetendo-nos, uma vez mais, ao período sombrio da ditadura. Não basta a prisão de supostos criminosos. É preciso que a investigação criminal seja realizada em estrita obediência aos preceitos legais de forma a se garantir o processo penal futuro e a responsabilização do autor do crime.
É cristalina a absoluta ausência de interesse público na aprovação da referida PEC, tratando-se de manobra rasteira de tentar impor de forma ilegítima uma situação inexistente por pura vaidade classista.
É oportuno se registrar que o militarismo possui características próprias que tem como fundamento o enfrentamento ao inimigo, destinado às guerras. Ademais, o regime militar possui benefícios próprios, dentre os quais os previdenciários. Acredita-se que o Oficialato não pretenda deles abrir mão para se tornar carreira jurídica.
O atual estágio do Estado Democrático de Direito, alcançado a duras penas em nosso país e em constante amadurecimento, exige-nos uma reflexão mais profunda sobre a real necessidade de uma Polícia Militar para manutenção da ordem social e prevenção da criminalidade. Qual o verdadeiro sentido de uma polícia militarizada para agir no meio social?
Pretender a formação em curso superior para, em tese, maior qualificação de seus profissionais, é absolutamente legítimo. Por que então não se formam policiais pedagogos, assistentes sociais, sociólogos? Profissionais mais bem capacitados para a proximidade com o cidadão, para a presença visível que traz concreta sensação de segurança?
É necessário, urgentemente, que nos atentemos aos verdadeiros objetivos do Oficialato da Polícia Militar de Minas Gerais, cujas estratégias, não raras vezes, sequer encontram respaldo no próprio corpo militar que sustenta a instituição. Não se pode permitir que uma proposta tão grave à democracia seja votada e aprovada sob cortinas e à toque de caixa sem amplo debate e acurada análise aos quais desde já convidamos toda a sociedade e as autoridades públicas.
A quem pretenda a atuação na gestão da investigação criminal, cabe a formação necessária e a aprovação em concurso público para Delegado de Polícia.
Sobre o sol reluzente da democracia já é possível avistar a sombra assustadora da ditadura.
Daniel Barcelos Ferreira
Delegado de Polícia
Professor de Direitos Humanos da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais
Especialista em Segurança Pública e Complexidade
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COMUNICADO IMPORTANTE!
сентября 6, 2013 8:08 - no comments yet
Em razão de viagem ao interior do Estado, para atividades de articulação política, interlocução e confraternização com amigos e companheiros de luta e caminhada, estaremos de recesso, retornando nossas atividades normais no dia 15 de setembro.
No mais, vamos retornar com mais vontade e disposição de levar informação, opinião, crítica, e artigos que incitem a reflexão, a conscientização e ao espírito de liberdade e igualdade, do qual são dotados todos os cidadãos, e com mais razão os policiais e bombeiros militares, cujo sacrifício que se lhes exige é da própria vida para proteger e defender os cidadãos, mesmo os criminosos e infratores da lei.
Um fraterno abraço.
SARGENTO CLAUDIO CASSIMIRO DIAS ENTREVISTA O BLOGUEIRO SARGENTO BARBOSA - parte 2
сентября 6, 2013 7:51 - no comments yet
Fonte: Blog do Cláudio Cassimiro Dias
SARGENTO CLAUDIO DIAS ENTREVISTA O BLOGUEIRO SARGENTO BARBOSA - PARTE 1
сентября 6, 2013 7:51 - no comments yet
Fonte: Blog do Cláudio Cassimiro Dias
Situação cíclica desafia políticas públicas preventivas
сентября 6, 2013 6:27 - no comments yet
BÔNUS DEMOGRÁFICO
O IBGE divulgou, dia 29 de agosto, uma pesquisa alertando para a tendência de inversão do bônus demográfico. A queda da fecundidade e o aumento da expectativa de vida vêm provocando um envelhecimento acelerado da população brasileira, representado pela redução da proporção de crianças e jovens e um aumento na proporção de idosos na população. O envelhecimento virá a afetar a razão de dependência da população, que é representada pela proporção entre os segmentos economicamente dependentes (abaixo de 15 e acima de 64 anos de idade) e o segmento etário potencialmente produtivo (15 a 64 anos de idade), ou seja, a parcela da população que, teoricamente, deveria ser sustentada pela parcela economicamente produtiva. Em 2013, cada grupo de 100 indivíduos em idade ativa está tendo que sustentar 46 indivíduos, este número ainda está decrescendo e vai chegar a 43,3 em 2022. Depois, a tendência é que comece a aumentar, chegando a 66, em 2060. O percentual da população com 65 anos ou mais de idade passará de 7,4%, em 2013, para 26,8%, em 2060.
Esta tendência, que sequer começou a se expressar em números, deve ser o argumento ultraliberal para a restrição ainda mais ampla de direitos sociais. Paradoxalmente, porque hoje deveríamos estar nos beneficiando dos efeitos do bônus demográfico, que, para o brasileiro, pouco avanço trouxe, senão que foi desperdiçado por políticas públicas equivocadas.
A transição demográfica é um dos fenômenos estruturais que ameaça os Estados Sociais desde a segunda metade do século passado. Embora se cuide de um fenômeno universal, recebendo o influxo das condições históricas dos diferentes países e regiões, ele se manifesta de formas não lineares e assimétricas. Há uma tendência de ocorrer de forma diferente nos países desenvolvidos, nos países em desenvolvimento e no chamado terceiro mundo.
O que há hoje de relevante na crise financeira do Estado Social é justamente esse fenômeno que afeta mais drasticamente alguns países da Europa, vale dizer, o desequilíbrio na pirâmide etária ou transição demográfica: houve um considerável aumento da expectativa de vida dos indivíduos em detrimento das taxas de natalidade. Tiveram alguns países europeus uma redução drástica na população economicamente ativa (Camada ativa – PIA – composta por pessoas de 16 a 64 anos) e um aumento considerável na população economicamente inativa (idosos com idade acima de 65 anos), de que se ocupa mais de perto a Previdência Social. Esse desequilíbrio afeta sobremaneira a relação receita pública/despesas sociais. Resulta numa espécie de geração sacrificada (dos 20 aos 45 anos), que, estando economicamente ativa, no sistema de seguro social, culmina por pagar a conta da antecessora: os jovens pagam pelo serviço prestado aos idosos.
As razões de dependência demográfica partem do pressuposto de que a população jovem, de 0 a 14 anos, e a idosa, de 65 anos e mais, podem ser consideradas dependentes da população em idade ativa, de 15 a 64 anos. Os países desenvolvidos, desde o final da Segunda Guerra Mundial, precisaram suprir parte das suas necessidades de mão de obra por meio da migração internacional, caso da Itália e da França, por exemplo, em que hoje a população economicamente ativa é menor. Hoje, com crise do Euro isso mudou bastante. Já não há vagas para os nacionais.
O Brasil, atualmente, assim como os países chamados tigres asiáticos, se beneficia do chamadobônus demográfico (menos crianças e idosos, mais jovens economicamente ativos: a pirâmide está em forma de pera). Isso deve perdurar até aproximadamente 2040, quando passaremos a ter uma população idosa maior, com tendência ao desequilíbrio das contas da Previdência.
A situação é cíclica e desafia sempre políticas públicas preventivas. Por exemplo, não adianta ter uma grande população economicamente ativa, como ocorre em alguns países da América Latina, que se beneficiam do bônus demográfico, e não ter políticas econômicas de geração de emprego e de controle de natalidade para prevenir problemas certos no futuro. O que se vai ter é um aumento do quantitativo de desempregados, que, por sua vez, irá onerar o Estado Social. O interessante é que, por ser um fenômeno que não oferece surpresas, pois leva décadas para se consumar, a transição demográfica permite aos Estados planejarem, por meio de políticas públicas, o controle de seus efeitos com muita antecedência.
A nossa transição demográfica necessita ser compreendida e tratada dentro do nosso contexto social. A extensa pauta de mudanças sociais e econômicas que o Brasil definiu, a partir do ideário neoliberal, representa causa e efeito. Paradoxalmente, tanto pode criar possibilidades demográficas que potencializem o crescimento da economia, aumentando o bem-estar social, quanto exacerbar as adversidades econômicas e sociais, ampliando as graves desigualdades sociais que caracterizam a sociedade brasileira.
Os bônus demográficos, no caso do Brasil, estão condicionados pela gravidade do quadro de exclusão social. Isso fica evidente quando se constata que a maioria da população jovem, no Brasil, é pobre e que os índices de desemprego já estão perto de 10%. Deve-se lembrar que os países desenvolvidos, quando enfrentaram a transição demográfica, tinham uma economia com crescimento sustentado e, sobretudo, um Estado do Bem-Estar Social devidamente consolidado. O Brasil, ao invés, não tem registrado taxas satisfatórias de crescimento da sua economia, mas se apressa em reformar seu sistema de Seguridade Social, que está muito distante dos padrões dos países desenvolvidos, embora seja utópica uma comparação para fins de definição de prestações sociais.
O desafio crucial para as políticas públicas é de dupla contingência: projetar a situação tanto dos jovens como dos idosos. Se levarmos em conta que os idosos tiveram um incremento de renda a partir da Constituição de 1988, com a Aposentadoria Rural e Benefício Assistencial (PPC), que constituem políticas de transferência de renda, de fato devemos nos preocupar com a perspectiva de insustentabilidade que o futuro apresenta, sem uma alternativa séria de custeio. É fundamental, para equacionarmos a questão dos idosos, uma rigorosa política de investimentos de curto e médio prazo na população jovem pobre, com o objetivo não só de garantir sua dignidade atual, mas, sobretudo, para projetar as condições de mobilidade e definitiva inclusão social, como garantia de um futuro melhor, francamente condicionado às possibilidades criadas pelo crescimento da economia, principalmente a geração de mais empregos e ocupações que aumentem o número de contribuintes.
Ninguém duvida que o sistema de Previdência Social, no qual, em princípio, haveria uma contrapartida adequada da parte dos futuros beneficiários, precisa estar sintonizado com a emergência no novo padrão demográfico, sob pena de implodir. A situação demográfica hoje é favorável, o número de contribuintes potenciais é, dizem os economistas, quase dez vezes maior do que o de idosos. A dificuldade, então, não se verifica, no atual estágio, na existência de uma geração sacrificada, como disse Rosanvallon, mas, sim, na maioria da população jovem (PIA) que, à míngua de oportunidades de emprego e incentivo, não contribui, produzindo uma situação de autoinsustentabilidade.
A informalidade é um problema prioritário, que deve atacado antes do enxugamento da Previdência. De fato, os últimos censos mostram uma relação entre população ocupada e população contribuinte muito desfavorável à política previdenciária: perto da metade dos ocupados não contribui para a Previdência, gerando um profundo desequilíbrio atuarial. Nós sabemos que a maioria da massa trabalhadora brasileira não tem carteira de trabalho assinada. Perto de 45% das pessoas em idade economicamente ativa não possui carteira assinada ou trabalha por conta própria, na informalidade. Temos cerca de 11 milhões de pessoas trabalhando na informalidade. De cada 10 (dez) novos empregos gerados nos últimos 14 anos, 7 (sete) são informais (Organização Internacional do Trabalho - OIT). Micro e pequenas empresas têm 12,5% de empregados informais e 10,9% dos empregadores são informais, segundo dados do SEBRAE.
Parece evidente, ademais, que qualquer compromisso com a redução das desigualdades sociais passa, obrigatoriamente, pela implementação de políticas públicas que traduzam ações efetivas de esclarecimento e apoio às populações mais pobres e, portanto, em tese, menos esclarecidas, para que tenham condições de regular seus níveis de fecundidade.
Equacionar o sistema de previdência social, sem que o país tenha implantado um verdadeiro Estado do Bem-Estar Social é um desafio para as políticas que visem a incrementar os objetivos do Estado Democrático de Direito com a justiça social, a redução das desigualdades e o desenvolvimento econômico, sob pena de as oportunidades demográficas, que ainda nos são favoráveis, continuarem a ser desperdiçadas.
Paulo Afonso Brum Vaz é desembargador federal, corregedor regional do TRF-4.
Revista Consultor Jurídico
ACORDO DE METAS ABUSIVAS NO TRABALHO, LEVA A REGULAMENTAÇÃO DO DANO MORAL
сентября 6, 2013 6:25 - no comments yet
METAS ABUSIVAS
TRT de Santa Catarina edita oito novas súmulas
Oito súmulas editadas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região foram incluídas na edição de terça-feira (3/9) do Diário Oficial Eletrônico de Santa Catarina, e passaram a vigorar no TRT-12. Entre elas está a Súmula 47, que regulamenta o dano moral em caso de fixação e cobrança de metas abusivas dentro das empresas.
Esse entendimento já fora adotado pela desembargadora Águeda Maria Lavorato Pereira, da 1ª Turma do TRT-12. Ao analisar caso julgado pela turma, ela apontou que a empresa pode buscar o maior lucro possível, como é o objetivo de qualquer companhia, mas isso não pode ocorrer através da humilhação de seus empregados.
Outra súmula regulamenta o pagamento em dobro das férias em caso de descumprimento do artigo 145 da Consolidação das Leis do Trabalho. A Súmula 44 aponta que, se for comprovada a contribuição do trabalho para o agravamento de patologias, é possível a indenização ao funcionário prejudicado.
A Súmula 46 classifica como máximo o grau de insalubridade da limpeza de banheiros públicos utilizados por grande quantidade de pessoas. As demais súmulas versam sobre ilegitimidade em embargos de terceiros, inocorrência de litisdependência de ações coletivas com individuais, sobre fraude à execução e sobre a impossibilidade da flexibilização dos minutos que antecedem e sucedem a jornada. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-12.
Clique aqui para ler a decisão.
Revista Consultor Jurídico
Independência de juiz não está condicionada a salário
сентября 6, 2013 6:23 - no comments yet
RESPEITO À FUNÇÃO
Como relator do processo do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa ganhou merecida notoriedade pelo denodo com que se houve na condenação de infratores de reconhecido prestígio político. Daí ter o seu nome sugerido, inclusive, para a presidência da República.
Recentemente, a imprensa noticiou que Barbosa entrará no panteão dos heróis nacionais, na série infantil Pequenos, grandes brasileiros, a ser publicada, em breve, pela Thesaurus editora. A coleção tem por objetivo levantar “exemplos para a juventude”. Será o único nome contemporâneo ao lado de Juscelino Kubitschek, Santos Dumont, Barão do Rio Branco e outros.
Mas, a despeito do prestígio granjeado em todas as camadas da população, o ministro tornou-se protagonista de alguns fatos que afetaram a sua imagem de autêntico catão dos dias atuais, pelo combate enérgico a prevaricação que assola o país.
Recebeu muitas críticas devido ao tratamento ofensivo a um repórter que pretendera entrevistá-lo. Num encontro com magistrados, que sustentavam a necessidade da criação de novos tribunais federais, cortou a palavra de um juiz que tinha opinião contrária à sua.
Nas diversas altercações que teve com o ministro Ricardo Lewandowski, a sua rispidez ultrapassou a razoável dissensão que possa ocorrer num colegiado. A esta altura, o presidente do STF tornou-se pródigo em despertar reações de amor e de ódio.
Em pleno turbilhão do aguardado desfecho da Ação Penal 470, Joaquim Barbosa defendeu o reajuste dos vencimentos dos ministros em mensagem dirigida ao Congresso. Sustentou que assim procedia para adequar os contracheques de seus pares “à realidade econômica do país”.
A questão da remuneração condigna não deixa de ser relevante no exercício da prestação jurisdicional. Ocorre que suscitar essa questão após o tumulto do mês de junho, numa fase de descrença generalizada com os Poderes da República, chega a ser uma temeridade.
Com efeito, havendo uma lei sancionada em 2012, estabelecendo que o reajuste do Judiciário será de 5% ao ano, Barbosa pretende ampliar esse aumento introduzindo um acréscimo de 4,6%, além do já concedido.
A vingar sua iniciativa, os ministros do STF perceberão, a partir de janeiro de 2014, R$ 30.658,42, o que importará em uma despesa de R$ 150 milhões ao ano. Este aditamento servirá de pretexto para deputados e senadores, que reclamarão o mesmo tratamento, por se considerarem com direito ao idêntico valor pago aos ministros do STF.
Ao ilustrar sua proposta, Joaquim Barbosa alegou que em Cingapura os membros da Suprema Corte percebem US$ 1,5 milhão por ano, o equivalente a R$ 275 mil por mês.
Valendo-se da informação recebida do ministro da Justiça daquela cidade-estado, Barbosa acrescentou que ali ninguém se opõe a esses valores, pois, se o julgador “não tiver remuneração desse nível, tendo em vista suas responsabilidades altíssimas, ele não terá como exercer com independência as atribuições do seu cargo”.
A comparação entre Brasil e Cingapura foi de extrema infelicidade, considerando-se o potencial econômico daquele tigre asiático e o país onde o salário mínimo é de R$ 678.
Convenhamos que a independência com que o juiz exerce a sua atividade não está condicionada ao que lhe é pago pelo Estado; mas sim ao zelo, à seriedade e ao respeito que deva ter pela própria função em que está investido.
Aristoteles Atheniense é conselheiro nato da OAB.
Revista Consultor Jurídico
Revisor diz que STF agravou penas para evitar prescrição
сентября 6, 2013 6:21 - no comments yet
AP 470
A pena fixada pelo Supremo Tribunal Federal para condenar oito réus na Ação Penal 470, o processo do mensalão, pelo crime de formação de quadrilha, foi aumentada de forma desproporcional com o objetivo de evitar a prescrição e garantir que, somada a outras condenações, alguns deles tivessem de cumprir pena em regime inicial fechado. Foi o que voltou a afirmar, nesta quinta-feira (5/9), no plenário do STF, o ministro Ricardo Lewandowski: “Claro que isso aqui foi para superar a prescrição, impondo regime fechado. É a única explicação que eu encontro”.
O ministro apresentou uma tabela para comprovar seu ponto de vista (veja abaixo). Pelos dados, enquanto para o crime de corrupção ativa a pena base fixada para José Dirceu e Delúbio Soares foi agravada em 20%, para condená-los por formação de quadrilha os ministros aumentaram a pena em 75% e 63%, respectivamente. O mesmo, segundo o ministro, aconteceu com José Genoíno, que teve a pena agravada em 15% na condenação de corrupção ativa e 63% para quadrilha.
A mesma coisa aconteceu com os réus Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Marcos Valério: foram aplicadas agravantes mais baixas para outros crimes e bastante altas para a formação de quadrilha — clique aqui para ver as tabelas compostas pelo ministro Lewandowski. Outros três ministros também votaram por alterar a pena dos oitos réus: Teori Zavascki, Dias Toffoli e Marco Aurélio. Mas ficaram vencidos pela maioria, que manteve as penas.
Na sessão desta quinta, o Supremo concluiu o julgamento dos Embargos de Declaração. E está julgando o cabimento de Embargos Infringentes, que, na prática, pode garantir um novo julgamento para 11 réus, 12 se considerado o caso de Simone Vasconcelos, que, embora condenada pelo crime de formação quadrilha, foi beneficiada com a prescrição. Em tese, a ré condenada poderia pedir para ter a inocência, neste delito, reconhecida.
O STF rejeitou também nesta quinta a tese divergente trazida no dia anterior pelo ministro Teori Zavascki, que propôs a redução de penas de todos os réus condenados por formação de quadrilha. O ministro retificou o voto na quarta-feira, depois que o Plenário reduziu a pena do réu Breno Fischberg, por reconhecer um erro de cálculo na dosimetria da pena do ex proprietário da corretora de valores Bônus Banval.
O ministro Teori Zavascki afirmou que, até aquele momento, entendia que a corte trabalhava com um conceito mais restrito de Embargos de Declaração e por isso rejeitou os pedidos de reformulação das penas sob a justificativa de que aquele não era o meio processual adequado. Porém, frente ao entendimento do colegiado no caso de Breno Fischberg, o ministro disse sentir-se compelido a estender o entendimento às condenações por quadrilha já que as penas estabelecidas para réus diversos, condenados pelos mesmos crimes, estavam discrepantes entre si.
Apenas outros três ministros acompanharam Zavascki nesta quinta, mudando seus votos ao reduzir as penas dos oito réus, entre eles José Dirceu. Restaram vencidos, dessa forma, Ricardo Lewandowski, Teori Zavascki, Dias Toffoli e Marco Aurélio.
Contradição por comparação
Quem se beneficiou de uma revisão de julgamento foi o ex-assessor do extinto PP, João Cláudio Genú. Depois de dois pedidos de vista (o primeiro por Luís Roberto Barroso há uma semana, e o segundo por Luiz Fux nesta quarta), o Plenário adotou a tese divergente proposta pelo segundo a partir de colocações do ministro Ricardo Lewandowski, que alertara para o fato de Genú ter sido punido com pena mais grave do que seus mandantes.
Barroso votou, desse modo, para que a pena de Genú fosse reduzida de cinco para quatro anos de prisão, o que abre a possibilidade de ser convertida em prestação de serviços comunitários ou ainda em prisão domiciliar. Restaram vencidos o presidente da corte e relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, e Luiz Fux. A ministra Rosa Weber também restou vencida isoladamente, porque acolheu o pedido de redução de pena, mas por meio de Habeas Corpus de ofício e não por embargo.
Fux justificou a negativa em acolher o recurso por entender que a discrepância entre as penas dos corruptores (parlamentares do PP) e seu funcionário (o assessor) é, de fato, o que chamou de “contradição por comparação” e não um equívoco de julgamento em si. “Não é erro judiciário, não é injustiça, é uma conclusão do grupo incumbido de julgar”, disse. O ministro rejeitou ainda o argumento de que a pena maior de João Cláudio Genú ofendia o argumento constitucional da isonomia.
Para tanto, Fux embasou sua conclusão em referências à doutrina germânica e americana, mais especificamente em decisões do Senado alemão e em pareceres de acadêmicos e juristas norte-americanos. De acordo com Fux, a doutrina estrangeira rejeita o conserto de um suposto equívoco legal por meio de outro equívoco, isto é, não se pode, a pretexto de garantir a isonomia, o Estado corrigir uma decisão colegiada arbitrariamente, observou. Para o ministro, o resultado do julgamento expressa “o todo dos votos”, dos ministros, não configurando, portanto, um equívoco.
Luís Roberto Barroso disse, contudo, que a contradição que o convenceu a votar pela redução de pena de Genú não foi o princípio da isonomia, mas o fato da culpabilidade do réu ter sido reconhecida, de forma unânime, ser menor do que dos demais corréus. Barroso lembrou que Genú foi ainda beneficiado com atenuantes, mas, mesmo assim, teve a pena fixada em uma margem maior.
O ministro Teori Zavascki, a exemplo do julgamento desta quarta, acolheu o voto de Barroso, mas estendeu seu efeitos ao caso de outro réu, Jacinto Lamas, assessor do PL. Enquanto o presidente do partido, deputado Waldemar Costa Neto teve a pena base agravada em virtude da continuidade delitiva em um terço da pena, Lamas, que seguia ordens, viu sua pena crescer em dois terços, observou Zavascki.
Barroso, porém, disse que não via semelhança entre a situação de Genú e Lamas, porque, no segundo caso, a despeito da desproporção no cálculo, o réu ficou com uma pena menor do que a do dirigente do partido.
Referindo-se tanto ao caso de Genú quanto às condenações por quadrilha, o ministro Luiz Fux disse que, a despeito de corrigir supostas discrepâncias, o Plenário da corte corria o risco de anular o princípio do colegiado.
“Temos que ter cuidado para que o voto vencido não acabe fixando a pena, a despeito de ter prevalecido o voto do relator”, disse Fux. Ao que o ministro Gilmar Mendes respondeu: “É o que vai acabar acontecendo”.
Constrangida
Os ministros também rejeitaram os recursos do advogado Rogério Tolentino, o último réu a ter os Embargos de Declaração analisados pela corte no julgamento do processo do mensalão. Por seis votos a cinco, o Plenário manteve a pena de seis anos e dois meses de prisão, além de multa de R$ 494 mil, pelos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
O ministro Ricardo Lewandowski foi quem abriu a divergência ao acolher o argumento da defesa de Tolentino, que sustentava que os parlamentares corrompidos foram condenados com base na legislação mais branda enquanto Tolentino teve sua pena estabelecida de acordo com a lei mais severa, que entrou em vigor depois de novembro de 2003. Lewandowski conseguiu convencer o decano do tribunal, Celso de Mello e os ministros Teori Zavaski, Dias Toffoli e Marco Aurélio. Mas a maioria dos ministros acompanhou o relator, ministro Joaquim Barbosa.
A ministra Rosa Weber disse que, não só não via uma situação de manifesta ilegalidade no caso de Tolentino, como se sentiria desconfortável se o tribunal procedesse “com toda uma outra dosimetria”. Weber observou que algumas das correções sugeridas nos embargos vinham, de fato, ao encontro de alguns de seus votos que acabaram vencidos, mas que “ficaria constrangida se de vencida se tornasse vencedora” por meio da análise de um recurso processualmente limitado, como são os Embargos de Declaração.






Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Rodrigo Haidar é editor da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico
O Supremo não é o guardião da moral da nação
сентября 6, 2013 6:21 - no comments yet
SENSO INCOMUM

Advertência necessária ao leitor
Esta coluna não é indicada para a) quem gosta do jargão “o direito é aquilo que o judiciário diz que é”; b) para quem gosta do projeto do novo CPC quecommonliza o Direito; c) para os adeptos da ponderação de valores; d) para quem pratica o esporte chamado “pan-principiologismo”; e) para quem acha que o Judiciário pode ser o superego da nação; f) para quem acha que a moral pode corrigir o Direito.
Faço esta coluna com todo o carinho. E respeito. De alguém acostumado às práticas jurídicas cotidianas e da academia. Tratar-se-á de uma crítica a uma decisão do ministro Barroso. Cada um é responsável pelo(s) que cativa. Ele sempre me cativou. Com ele aprendi. Com ele já debati. E muito. E é exatamente por tudo isso é que a coluna é necessária. Não poderia deixar de escrevê-la. Pelo que sempre defendi, ninguém me perdoaria. Nem eu mesmo.
Além disso, estou a cavaleiro, porque o ministro Barroso, antes de assumir no STF, colocou reservas em relação ao ativismo. Só que, agora, proferiu uma decisão deveras ativista. E, por isso, deve ser cobrado. Na forma da lei e da Constituição.
Primeiro ato: do caso Cassol ao caso Donadon
A Ação Penal 470 consagrou a posição do STF de que, quando há condenação criminal transitada em julgado de mandatário de cargo eletivo, a cassação do mandato é consequência automática da pena, independente de manifestação da Casa Legislativa. Já com o “caso Cassol” (AP 565), houve uma reviravolta na jurisprudência do Supremo, da qual participou o ministro Luís Roberto Barroso: a perda do mandato passou a depender de decisão das Casas Legislativas, na forma como dispõe a Constituição brasileira (artigo 55, inciso VI, parágrafo 2º).
Sobre este assunto, o ministro Barroso apresentou posicionamento claro à época, afirmando que a cassação dos mandatos parlamentares pelo Congresso aliviaria a tensão entre os Poderes, in verbis: “É preciso acabar com esse clima de desconfiança. Em parte, esta decisão passando de volta ao Congresso essa competência é uma forma de desanuviar um pouco esta tensão”. Ainda, manifestou-se dizendo que, embora não acreditasse que esta fosse uma boa decisão, é o que afirma a Constituição: “Acho que a condenação criminal, pelo menos acima de um determinado grau de gravidade do delito, deveria ter essa consequência automática. Mas a Constituição diz o contrário. O dia que a Constituição for o que os intérpretes quiserem independentemente do texto, nós vamos cair numa situação muito perigosa”. [1]
Acertou o ministro Barroso: não importa quão boa ou má seja esta decisão. Ela segue, digamos assim — e isso foi dito pelo próprio ministro — a “letra da Constituição”. Ou seja, o que é relevante para um julgamento é se a decisão está de acordo com a Constituição. Estas são as regras do jogo. Não fosse isso, teríamos uma República Juristocrática (ou será que já não temos?).
Sigo. Bem recentemente, diante do “caso Donadon” (AP 396), a Câmara dos Deputados, cumprindo a prerrogativa que lhe foi concedida constitucionalmente e — gizo — reconhecida pelo Supremo graças ao percuciente voto do ministro Barroso, optou por não cassar o mandato do deputado. A opinião pública não gostou. Parte do Congresso também não aprovou. A revista Veja não gostou. Jornalistas e jornaleiros não gostaram. Wanderlei Luxemburgo não gostou. Fecham-se as cortinas.
Segundo ato: o mandado de segurança impetrado
Pois bem. O porta voz do repúdio a tanto desgosto foi o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que, contra tal decisão do Parlamento, impetrou o Mandado de Segurança n. 32326, com pedido liminar para suspender os efeitos da deliberação pela não cassação do deputado Donadon, distribuído para a relatoria do ministro Barroso. No fundo, um tiro no pé do Congresso. Mas, enfim...
Easy: a Constituição disciplina claramente sobre este assunto. O STF já havia se pronunciado sobre esta questão. Até o próprio ministro Barroso já havia se posicionado sobre este tema, como referido no início desta coluna.
Mas o que fez o ministro Barroso? Para a surpresa da comunidade jurídica (na verdade, minha frase é retórica, porque não sei a dimensão da surpresa; nem sei se há), na contramão do posicionamento apresentado anteriormente, concedeu liminar inaudita altera pars, suspendendo os efeitos da deliberação da Câmara dos Deputados que tomou a malfadada decisão, nos seguintes termos:
1. A Constituição prevê, como regra geral, que cabe a cada uma das Casas do Congresso Nacional, respectivamente, a decisão sobre a perda do mandato de Deputado ou Senador que sofrer condenação criminal transitada em julgado.
2. Esta regra geral, no entanto, não se aplica em caso de condenação em regime inicial fechado, que deva perdurar por tempo superior ao prazo remanescente do mandato parlamentar. Em tal situação, a perda do mandato se dá automaticamente, por força da impossibilidade jurídica e fática de seu exercício.
3. Como consequência, quando se tratar de deputado cujo prazo de prisão em regime fechado exceda o período que falta para a conclusão de seu mandato, a perda se dá como resultado direto e inexorável da condenação, sendo a decisão da Câmara dos Deputados vinculada e declaratória. [2]
Nitidamente, há uma contradição na decisão do ministro. Por isso, o que pretendo demonstrar é que o Direito, como diria Dworkin, exige coerência e integridade. O Judiciário, especialmente a Corte Constitucional, que exerce um papel contramajoritário, não pode simplesmente mudar de ideia, nem mesmo se houver um grande descontentamento da opinião pública. Isso porque, acima de tudo, o argumento que fundamenta uma decisão judicial deve ser jurídico — nem moral, nem político.
Em face de tudo isso, portanto, a pergunta que se faz é: o que é um argumento jurídico? O que é um argumento moral? O que é um argumento metajurídico (sic)? Como, afinal, decidiu o ministro Barroso?
Terceiro ato: os argumentos do ministro Barroso
Para decidir, recorreu à velha distinção entre casos fáceis e casos difíceis. Para ele, casos fáceis se resolvem como no século XIX. Por subsunção. Existiriam regras gerais que abarcam todas as hipóteses de aplicação. Já os casos difíceis seriam os que não se enquadram nos fáceis. Despiciendo registrar que nem Dworkin acredita nessa distinção. Mas, sigamos. Dissertou, também, sobre a interpretação semântica (sobre os métodos de Savigny, penso eu). Ou seja, o que fez o ministro foi utilizar de técnicas argumentativas para dar roupagem jurídica, um véu de legitimidade, para um posicionamento que, na verdade, é teleológico. Decidiu e depois buscou o fundamento. A argumentação utilizada não foi a condição de possibilidade. Foi, na verdade, apenas uma capa de sentido.
Aliás, no âmbito da dogmática jurídica, os métodos interpretativos ou técnicas de interpretação são definidos como instrumentos/mecanismos eficientes e necessários para o alcance do conhecimento científico do direito. Assim, sob a aparência de uma reflexão científica, criam-se fórmulas interpretativas que permitem: a) veicular uma representação imaginária sobre o papel do Direito na sociedade; b) ocultar as relações entre as decisões jurisprudenciais e a problemática dominante; c) apresentar como verdades derivadas dos fatos, ou das normas, as diretrizes éticas que condicionam o pensamento jurídico; d) legitimar a neutralidade dos juristas e conferir-lhes um estatuto de cientistas. De há muito Warat desmi(s)tificou isso.
No caso do MS 32.326, o ministro Barroso utiliza-se dos métodos como eles são, na prática, quase sempre aplicados: como argumentos retóricos para justificação da decisão.
Partindo da premissa de que existe uma regra concreta regulando a cassação de mandato parlamentar em razão de trânsito em julgado de sentença condenatória (artigo 55, inciso VI e parágrafo 2º da Constituição), Barroso faz uso dos métodos semântico (para ele, gramatical), histórico, sistemático e teleológico para fundamentar a validade deste dispositivo. Não é necessário ir muito fundo na discussão dos métodos. Parece que a teoria do direito em terrae brasilis não consegue avançar, em determinados casos, para além do século XIX. O que Savigny (falo nele, porque é nele que a dogmática jurídica aposta quando trata desse tipo de “metodologia”) tem a ver com isso? Sobre os métodos de interpretação é importante registrar alguns pontos na perspectiva de retirar o debate do lugar comum e tentar lançar um pouco mais de luz nessa discussão. Por exemplo, o "x" da questão para a escola histórica não estava na interpretação do direito legislado, mas, sim, na afirmação de um direito que fosse concebido radicalmente como produto da história e que não buscasse aparar a sua autoridade em alguma realidade transcendente. Só aí já temos um problema. Por outro lado, esse direito que encontra sua autoridade na história — ou no "espírito do povo" — não pode ser encarado como simples produto de um legislador racional. É equivocado pensar que a Escola Histórica era um positivismo do tipo exegético, assim como é errado pensar que Savigny era um legalista (entendendo por legalista o tipo de experiência que se tem no ambiente francês). Por isso, muito cuidado com o tal “método gramatical”. Mais ainda: muito cuidado, porque tudo isso se passou no contexto de um direito que tinha como objeto de estudo algo maior que um simples código estatuído por um parlamento. Era da história que se falava. Quanto ao método teleológico, mais cuidado ainda, porque aí já estamos tratando de algo que vai além, como no caso da formulação do segundo Ihering, aquele que abandona a sistematicidade da escola histórica para ir em direção à finalidade do Direito.
Ainda: semântica não é igual a “gramatical”, que tem relação com a sintática. Essa questão (da semântica) é bem discutida, mais tarde, no neopositivismo lógico, no plano da semiótica, quando a sintaxe e a semântica eram a condição para um enunciado ser científico (a pragmática ficava de fora). Pois bem. Sintaxe é análise dos signos com os signos. Isso é método gramatical. Semântica é para além disso. Aliás, para ser bem claro, Kelsen foi um positivista semântico. Mas isso já é para outra discussão. A propósito, sobre a metodologia savignyana, basta ler a crítica arrasadora do pai do pós-positivismo, Friedrich Müller.
Portanto, o uso ou não uso desse tipo de “metodologia” é absolutamente irrelevante para o deslinde da causa. Tais métodos, neste caso, podem ser considerados álibis retóricos para suprir a falta de integridade e coerência na fundamentação da decisão. Neste caso, os métodos legitimam a criação de uma exceção não prevista nem Constituição nem no Código Penal (sequer no regimento interno da Câmara dos Deputados).
Ou seja, os tais métodos foram utilizados para dizer que quem cassa é a Câmara. Mas quando a pena for daquelas que inviabilizam o mandato, aí a cassação é automática... Quer dizer, então, que, segundo essa tese, alguém em regime semiaberto pode ser deputado ou senador? Neste caso, a decisão mira no padre e acerta na igreja, porque beneficia(rá) quem é condenado à pena menor que oito anos (ou até mesmo em regime fechado, desde que seja feita aquele cálculo que está na decisão). Ao que entendi do teor da liminar, é escandaloso um deputado condenado a uma pena alta e em regime fechado exercer o mandato; mas não o é se ele estiver em regime semiaberto? É isso, ou entendi mal?
Quarto ato: “Argumentos metajurídicos”. O que é isto?
Na decisão, vê-se o ministro invocar supostas “variáveis metajurídicas”. Mas o que significariam, efetivamente? Questões políticas? Questões pessoais? A opinião pública(da)? Seus valores, suas vontades? Seus interesses? Já vi essas “variáveis” na Wertungsjurisprudenz. E também já as vi nos diversos positivismos de cariz voluntarista-axiologista.
A democracia tem seus bônus e seus ônus. Em ambos existe um elemento de princípio que jamais pode ser violado: o respeito às regras preestabelecidas (algo como uma questão de princípio ou o sentimento de pertença que se vê na fala de Sócrates, no diálogo Críton). Digo isso porque há, no texto constitucional, a determinação de que a cassação de um parlamentar condenado criminalmente deve ser feita pela respectiva Casa, e não pelo Executivo ou pelo Judiciário. Simples, pois. E a deliberação da Casa Legislativa para perda do mandato não caiu de paraquedas na Constituição. É instituto que possui uma razão histórica: está dentro do marco da separação de Poderes e constitui uma cláusula pétrea. E o Congresso não está obrigado a cassar o mandato.
Claro, em tempos de ativismo judicial desenfreado (que já venho denunciado há anos, juntamente com meus orientados do Dasein – Núcleo de Estudos Hermenêuticos), em nome de uma espécie de realismo jurídico (tardio), instaura-se uma espécie de império da vontade, no sentido da Wille zur Macht. O ativismo deita suas raízes no utilitarismo supostamente moral e na vontade de poder de quem o pratica, algo muito perigoso ao regime democrático.
A violação à Constituição é sempre uma ameaça à democracia. O senso comum — sempre pragmati(ci)sta — costuma pensar a Democracia como sendo um processo cujo fim é a sua conquista, ou como algo do qual a coletividade se apropria. Não é visto tal qual é: uma relação, sempre instável e sujeita a altos e baixos, a avanços e retrocessos, a continuidades ou rupturas. Nossa história mostra isso. A democracia precisa ser vista numa perspectiva histórica e de lutas políticas.
O aplauso de hoje do ativismo jurídico pode ter sua antítese amanhã, quando os que hoje festejam se sentem prejudicados. Ora, o ativismo é behaviorista.[3] Não se pode admitir, pelo menos em um regime democrático, baseado no respeito às regras do jogo, que o Judiciário lance mão de “argumentos metajurídicos” em suas decisões. Eles precisam decorrer de uma atribuição de sentidos oriunda de textos normativos. Assim como não existe salvo-conduto para atribuição arbitrária de sentidos, com tal razão não se pode admitir que um julgador deixe de lado o texto constitucional em benefício de qualquer outro fundamento. Senão, está ferindo as regras do jogo democrático, do qual ele, por determinação constitucional, é exatamente o guardião. Iudicialis activismum constitutione lupus est.
Ao que me parece, o que há nos “argumentos metajurídicos” é, na verdade, uma tentativa de “moralização do Direito”. Aposta-se no protagonismo judicial, considerado como inevitável (conforme Kelsen já dizia). Mas o fato do intérprete atribuir o sentido não quer dizer que ele possa, sempre, dar o sentido que lhe bem convier (como se houvesse uma separação integral entre texto e norma e como se estes tivessem existências autônomas) e deixar de lado o texto constitucional.
O Tribunal que julga por meio de “argumentos metajurídicos” (que não deixam de ser elementos pragmático-axiológicos) assume uma postura apartada da normatividade (veja-se, pois, o paradoxo: dias antes, o ministro Barroso se ancorava no texto da Constituição, dizendo que dele não podia fugir). Enfraquece-se o Direito, uma vez que o afasta da tradição e o instrumentaliza. Tanto o discricionarismo positivista quanto o pragmatismo (que é uma forma de positivismo), que se funda no declínio do direito, têm déficit democrático. Se o direito como transformador das relações sociais foi a grande conquista do século XX, decidir por meio de argumentos metajurídicos é um retrocesso. E acrescento: precisamos tanto de constitucionalistas quanto de Constituição e tanto de democratas quanto de democracia. São aqueles que efetivam estas. E a democracia é um processo — sempre inconcluso. Democracia é, antes de tudo, uma jornada, uma grande caminhada. Pede uma atenção e um cuidado constante. A democracia exige de nós estarmos em alerta.
Mas por que decidir somente com base em argumentos jurídicos? Porque a sociedade tem uma garantia: o respeito à Constituição. Ninguém está acima dela. Ela é o norte do regime democrático porque condiciona todos a um regramento único. Assim, sem o respeito a argumentos jurídicos na decisão judicial, o aplauso de hoje pode se tornar o seu grito de horror do amanhã.
Numa palavra: a moral não corrige o Direito
O ministro Barroso fez alusão também à moral. Algo como “a moral exige que...”. Como se argumentos morais pudessem corrigir o Direito. Claro: eu sei de onde veio isso. Veio da malsinada tese de que “princípios são valores”. Esse seria o canal pelo qual a moral ingressaria no Direito. Tem até o positivismo inclusivo, que parece escolher os momentos em que a moral deve corrigir o direito. Ponto para a moral e a moralização; zero para a autonomia do Direito.
Quero dizer, com toda convicção, que direito não é moral. Direito não é sociologia. Direito não é filosofia. Direito é um conceito interpretativo e é aquilo que é emanado pelas instituições jurídicas, sendo que as questões e ele relativas encontram, necessariamente, respostas nas leis, nos princípios constitucionais, nos regulamentos e nos precedentes que tenham DNA constitucional, e não na vontade individual do aplicador (mesmo que seja o STF).
Ou seja, ele, o Direito, possui, sim, elementos (fortes) decorrentes de análises sociológicas, morais etc. Óbvio isso. Só que estas, depois que o direito está posto — nesta nova perspectiva (paradigma do Estado Democrático de Direito) — não podem vir a corrigí-lo. Aqui me parece fundamental um olhar dworkiniano. Na verdade, o Direito presta legitimidade à política, compreendida como poder administrativo, sendo que a política lhe garante coercitividade. Concebendo a política como comunidade (Polity), o Direito faz parte dela. Compreendida como exercício da política (politics), há uma coimplicação entre eles na constituição do político. Como ponto de vista partidário, o Direito tem o papel de limitar a política em prol dos direitos das minorias, definindo o limite das decisões contramajoritárias. O Direito é essencialmente político se o considerarmos como um empreendimento público. Daí política ou político, no sentido daquilo que é da polis, é sinônimo de público, de res publica.
Na mesma linha, acrescento que a necessidade de uma justificação moral mais abrangente para a teoria jurídica não pode significar que o direito seja tomado por moralismos pessoalistas. No fundo, cumprir o Direito em sua integridade evidencia a melhor forma de condução da comunidade política. Essa melhor forma não representa uma exclusão da moral, mas, antes, incorpora-a. A moral não éoutsider. O Direito não ignora a moral, pois o conteúdo de seus princípios depende dessa informação. Todavia, quando o direito é aplicado, não podemos olvidar dos princípios, tampouco aceitar que eles sejam qualquer moral. Aqui também devemos pensar em Habermas.
Este é o custo que temos de pagar para ter um direito como o de hoje. Que não é igual ao de antanho. Detalhe: novamente com Dworkin é importante anotar que, com isso, não estou a negar a justificação política, de caráter geral, que a teoria jurídica pressupõe. Essa é uma questão de legitimidade do uso da força por parte de um governo. Todavia, as questões políticas em sentido estrito — que se expressam a partir de raciocínios teleológicos, de metas sociais etc., não podem — e não devem — fazer parte do discurso judicial. Juiz decide por princípios e não por políticas ou moral(ismos). No momento de concretização do direito, as questões de princípio se sobrepõem às questões de política. Assim, o direito também deve “segurar” (conter) a moral (e os moralismos). Isso, por exemplo, pode ser visto de forma mais acentuada nas cláusulas pétreas e no papel da jurisdição constitucional.
Resumo da ópera
Do que se viu, tem-se que, primeiro, o STF ratificou a prerrogativa de o Congresso ter a última palavra na cassação (perda do mandato) de mandatos de parlamentares condenados à pena de prisão. Segundo, quando, dias depois, a Câmara, acreditando que, pudesse, de fato, exercer essa faculdade, deixou — por azar histórico — de cassar um deputado condenado ao regime fechado, o mesmo STF decidiu que a Câmara não se houve bem. Ora, também acho que a Câmara errou. Mas, e daí? O STF também não erra? A consequência disso deveria ser bem simples, além do desgaste político do Congresso: o deputado, preso, não comparece às sessões e, bingo, é cassado. Simples.
Entretanto, para o ministro Barroso, o Congresso pode até não cassar, mas, quando a pena for daquelas que inviabilizam o mandato, a moral da nação exige que se construa um argumento para evitar isso. Logo, criou, a partir de argumentos metajuridicos, uma hipótese nova no ordenamento. Ou seja: o STF, em nome de argumentos morais, legislou. Como superego (Über-Ich) da nação (utilizo a expressão de Ingeborg Maus), o ministro relator arvorou-se no direito de corrigir não somente a atitude do Congresso, mas, também, a própria Constituição. Reescreveu a Constituição, dizendo, em outras palavras, que toda a perda do mandato de um parlamentar condenado a prisão não é automática,[4] a não ser nas hipóteses em que...(basta ler a decisão). E mais não precisa ser dito.
Como referi, não se trata de uma simples discussão ou tese acadêmica. Tratou-se de uma decisão da mais alta Corte do país. Por isso a relevância. E o respeito por ela. E, também por isso, escrevi esta coluna. Buscando, sempre, dialogar com os protagonistas da história. E encontrar elementos para superar — e aqui me reporto a um dos meus livros preferidos, a peça Medida por Medida, de Shakespeare — tanto o modelo de juiz “Ángelo I”, como o “Ángelo II”, ou seja, nem o juiz boca da lei, nem o juiz dono da lei!
[1] Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/08/1324523-decisao-do-stf-reduz-tensao-com-congresso-diz-ministro.shtml
[2] Parte da Ementa da Decisão.
[3] Tenho sempre feito a distinção, com Ribas Vieira, Vanice do Vale et alii, entre ativismo e judicialização. O primeiro é comportamental; a segunda é contingente. E acrescento: o ativismo vem a ser a vulgata da judicialização.
[4] Só para registrar: a decisão da Câmara vale. Não pode ser revogada. Não há meios jurídicos para tal. É ônus político do Congresso. Se não nos agrada a decisão, na próxima eleição devemos escolher melhor. O deputado, em regime fechado, perderá o mandato ao não poder comparecer às sessões. E poderá renunciar, se assim desejar.
Lenio Luiz Streck é procurador de Justiça no Rio Grande do Sul, doutor e pós-Doutor em Direito. Assine oFacebook.
Revista Consultor Jurídico
O editorial de O Globo e a caixa preta da relação da mídia com a ditadura
сентября 6, 2013 6:08 - no comments yet
DEBATE ABERTO
A participação da mídia brasileira no golpe de 64 e na ditadura é um episódio que ainda está para ser plenamente contado. Muitos dos compromissos que levaram uma parte importante da imprensa brasileira a se aliar com setores golpistas e autoritários permanecem presentes e se manifestam em outros debates da vida nacional.
Marco Aurélio Weissheimer
O jornal O Globo publicou editorial, dia 31 de agosto, admitindo que “o apoio editorial ao golpe de 64 foi um erro”, ou um “equívoco” como também diz o texto. A decisão de tornar pública essa avaliação, diz ainda o editorial. “vem de discussões internas de anos, em que as Organizações Globo concluíram que, à luz da história, o apoio se constituiu um equívoco”.
Quase 50 anos depois do golpe civil-militar que derrubou o governo constitucional de João Goulart, as organizações Globo vêm a público falar desse “equívoco”, lembrando que outros grandes jornais do país também aderiram ao movimento golpista (cita o Estado de São Paulo, a Folha de São Paulo, o Jornal do Brasil e o Correio do Brasil, “apenas para citar alguns”) e admitindo que as vozes recentes das ruas afirmando que “a Globo apoiou a ditadura” são inquestionáveis.
Mas o que poderia parecer uma autocrítica acaba descambando ao longo do texto do editorial para um exercício cínico de justificação da decisão tomada em 1964 e de ocultamento dos benefícios que a empresa teve por seu apoio aos golpistas. O texto cita um editorial assinado por Roberto Marinho em 1984, que “ressaltava a atitude de Geisel em 13 de outubro de 1978, que extinguiu todos os atos institucionais, o principal deles o AI5, reestabeleceu o habeas corpus e a magistratura (...)”.
Logo em seguida, justifica o apoio ao golpe destacando “os avanços econômicos obtidos naqueles vinte anos” e a crença de que o golpe foi “imprescindível para a manutenção da democracia e, depois, para conter a irrupção da guerrilha urbana”. O argumento do editorial, em resumo, é: “à luz da história, olhando 50 anos depois, foi um erro, mas naquele momento foi imprescindível para a manutenção da democracia”.
A mídia e a ditadura: uma história que deve ser contada
O exercício editorial de cinismo e memória seletiva de O Globo serve ao menos como oportunidade para trazer à luz um debate que permanece escondido nas sombras no Brasil. É uma oportunidade histórica para debater as relações entre as grandes empresas de comunicação do país e a ditadura civil-militar que atingiu o Brasil entre 1964 e 1985. Várias dessas empresas construíram seus impérios midiáticos gozando de favores e benefícios dos governos da ditadura. A imensa maioria da população brasileira não conhece essa história, especialmente as novas gerações.
O nosso país está muito atrasado neste processo. A Argentina, ao contrário do que aconteceu no Brasil, está acertando as contas com o período da ditadura militar (1976-1983). Além de dar prosseguimento ao julgamento dos militares e policiais acusados de crimes como tortura e assassinato, o governo argentino decidiu mexer em outro vespeiro e levantou o tapete que escondia as relações promíscuas entre a ditadura e meios de comunicação. No dia 24 de agosto de 2010, por exemplo, a presidente Cristina Fernández de Kirchner apresentou um relatório de mais de 20 mil páginas acusando os donos dos principais jornais do país de envolvimento em crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura.
No relatório, intitulado Papel Prensa, a Verdade, o governo argentino denunciou os proprietários dos jornais La Nación, Clarín e do extinto La Razón de terem se apropriado ilegalmente e mediante ameaças da maior empresa fornecedora de papel jornal do país na época da ditadura, a Papel Prensa, em novembro de 1976. O documento relata como os antigos proprietários da empresa, o banqueiro David Gravier e sua esposa Lídia, foram sequestrados pelos militares em 1977 e forçados a assinar papéis “vendendo” suas ações na empresa. Uma parte importante das investigações do governo argentino baseia-se no testemunho de Lídia Papaleo que, além ter sido sequestrada, foi torturada pelos militares argentinos.
Em um artigo, intitulado “O que há por trás de um jornal chamado Clarín” (Carta Maior (04/06/2012), o jornalista Eric Nepomuceno relata um trecho de um novo depoimento de Lídia Papaleo à Justiça argentina. Ela afirmou:
Até hoje lembro os rostos de meus torturadores. Porém, nenhum desses rostos, nenhum desses olhares, me persegue e amedronta mais em meus pesadelos que o olhar de Héctor Magnetto me dizendo que ou assinava a venda de Papel Prensa, ou eu e minha filha seríamos mortas.
Héctor Magnetto, assinala Nepomuceno, era e continua sendo o principal executivo do grupo Clarín. Foi quem, naquele distante 1976, e antes do sequestro e das torturas de Lidia Papaleo, se reuniu com ela, e foi diante dele que ela capitulou.
Os proprietários dos jornais acusados acusaram e seguem acusando o governo argentino de querer controlar a imprensa e impor um regime de censura. A verdade é que, como aconteceu também no Brasil, essas empresas apoiaram a ditadura, beneficiaram-se com ela e, possivelmente, são cúmplices diretos ou indiretos de vários crimes cometidos pelo regime ditatorial. Ao mexer na caixa preta da mídia, Cristina Kirchner comprou aquela que é, talvez, a mais pesada luta de seu governo.
Porta-vozes do interesse público?
As empresas de comunicação têm o hábito de se apresentarem como porta-vozes do interesse público. Em que medida uma empresa privada, cujo objetivo central é o lucro, pode ser porta-voz do interesse público? Essas empresas participam ativamente da vida política, econômica e cultural do país, assumindo posições, fazendo escolhas, pretendendo dizer à população como ela deve ver o mundo. No caso do Brasil, assim como ocorreu na Argentina, a história recente de muitas dessas empresas é marcada pelo apoio a violações constitucionais, à deposição de governantes eleitos pelo voto e pela cumplicidade com crimes cometidos pela ditadura militar (cumplicidade ativa muitas vezes, como no caso do uso de veículos da Folha de São Paulo para o transporte de presos políticos torturados durante a famigerada Operação Bandeirantes).
Até hoje nenhuma dessas empresas julgou necessário justificar seu posicionamento durante a ditadura. O Globo faz o primeiro ensaio disso agora, em um texto que, a todo momento, procura justificar o “erro” pelo “contexto histórico”. Muitas delas sequer usam hoje a expressão “ditadura” ao se referir àquele triste período da história brasileira, preferindo falar em “regime de exceção”. Agem como se suas escolhas (de apoiar a ditadura) e os benefícios obtidos com elas fossem também expressões do “interesse público”. Apoiar o golpe militar que derrubou o governo Jango foi uma expressão do interesse público? Ser cúmplice de uma ditadura que pisoteou a Constituição brasileira, torturou e matou é credencial para se apresentar como defensor da liberdade? O silêncio dessas empresas diante dessas perguntas, por outro lado, não deixa de ser uma resposta às mesmas.
No Rio Grande do Sul, temos também um triste capítulo dessa história que ainda está para ser devidamente contada. O jornal Zero Hora ocupou o lugar da Última Hora, fechado pelos militares por apoiar Jango. O batismo de nascimento deste jornal foi marcado por atos de violência contra o Estado Democrático de Direito. Três dias depois da publicação do Ato Institucional n° 5 (13 de dezembro de 1968), ZH publicou matéria sobre o assunto afirmando que “o governo federal vem recebendo a solidariedade e o apoio dos diversos setores da vida nacional”. No dia 1° de setembro de 1969, o jornal publica um editorial intitulado A preservação dos ideais, exaltando a “autoridade e a irreversibilidade da Revolução”. A última frase editorial fala por si: “Os interesses nacionais devem ser preservados a qualquer preço e acima de tudo”.
Interesses nacionais ou interesses empresariais? A expansão da empresa de mídia gaúcha se consolidou em 1970, com a criação da RBS. A partir das boas relações estabelecidas com os governos da ditadura militar e da ação articulada com a Rede Globo, a RBS foi conseguindo novas concessões e diversificando seus negócios. Hoje, quem falar em resgatar essa história será acusado de ser “inimigo da liberdade de imprensa”.
Mas não foi apenas a Zero Hora. O Correio do Povo teve ativa participação no Golpe de 1964 que derrubou o governo de João Goulart. O artigo “1964: o Rio Grande do Sul no olho do furacão”, de Enrique Serra Padrós e Rafael Fantinel Lamiera, descreve o comportamento da publicação então pertencente ao grupo Caldas Junior:
“O jornal Correio do povo assumiu uma crítica violenta, acusando Goulart de agitador, violador da democracia, demagogo e de querer instalar um “neoperonocastrismo” no Brasil (seja lá o que isso quisesse dizer).
Adotava uma linha de questionamento como a que vinha sendo utilizada por Lacerda e a imprensa do centro do país nos ataques tanto ao governo federal quanto ao próprio Brizola. Tratava-se de uma referência explícita aos planos de instalar no Brasil um regime comunista aos moldes “caudilhescos” e populistas dos pampas; em decorrência, uma mistura de Perón e Fidel Castro, dois dos maiores pesadelos das direitas latino-americanas” (p.41, in A Ditadura de Segurança Nacional no Rio Grande do Sul)”.
Repetindo posição assumida por outros jornais de grande circulação do país, o Correio do Povo publicou às vésperas do golpe de 1964, um editorial clamando “para que as Forças Armadas cumprissem sua histórica missão de serem sustentáculos da lei e da ordem, sob o espírito de sua vocação histórica, o cristianismo e a democratismo-liberal. O final do desse editorial afirma:
“O caminho a seguir nesta hora de decisão não comporta dúvidas ou vacilações: é o do saneamento ético das cúpulas políticas e administrativas e da anulação dos inimigos da pátria e da democracia, que se encastelaram funestamente na própria cidadela do poder”.
A participação da mídia brasileira no golpe de 64 e na ditadura que se seguiu a ele é um episódio que ainda está para ser plenamente contada. Há muitas lacunas e zonas cinzentas nesta história. E isso não parece ocorrer por acaso. Muitos dos compromissos que levaram uma parte importante da imprensa brasileira a se aliar com setores golpistas e autoritários permanecem presentes e se manifestam em outros debates da vida nacional.
Enquanto a sociedade não decidir que abrir essa caixa preta é uma condição para o avanço da democracia no país, essas empresas, no Brasil, na Argentina e em outros países da América Latina seguirão praticando um de seus esportes preferidos: pisotear a memória e apresentar os seus interesses privados como se fossem interesses públicos.
(*) Publicado originalmente no Sul21.
Marco Aurélio Weissheimer é editor da Carta Maior (gamarra@hotmail.com)
De acordo com 89,37% dos entrevistados pela Federação Nacional dos Policiais Federais, há controle político na instituição
сентября 6, 2013 5:37 - no comments yet
Pesquisa divulgada nesta sexta-feira pela Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) aponta que a ingerência política e o enfraquecimento da Polícia Federal - por ação ou omissão do governo - são as principais causas do recuo nas investigações de impacto contra a corrupção.
Coletada num universo de 1.732 servidores da PF, a pesquisa mostra que 89,37% afirmam que há controle político da instituição, 75,28% dizem ter presenciado ou ouvido algum relato de interferência político e - o mais alarmante - 94,34% acreditam que o enfraquecimento do órgão, proposital, é uma espécie de “castigo” pelo fato de investigações anteriores terem chegado a personagens que gravitam em torno do poder.
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“Nunca em sua história a PF enfrentou uma situação como agora. O órgão está sucateado, os policiais estão desmotivados e há uma crise de atribuições sem precedentes. A falta de investimentos enfraquece as investigações, enquanto o comando da PF se mostra alheio à crise”, dispara o presidente da Fenapef, o agente federal Jones Borges Leal.
Leal diz ainda que o esvaziamento das operações contra a corrupção reflete diretamente no número de prisões por desvios de recursos públicos. Atualmente, segundo ele, o volume de prisões não chega a 20% do que foi nos anos em que a polícia fazia um ataque frontal à corrupção na ofensiva que se tornou prioridade do órgão e sem interferência política. O levantamento da entidade mostra uma queda brutal no número de prisões em geral de 2009 a 2013: de 2.663 para 786.
Segundo ele, para a pesquisa, a entidade usou um sistema de consulta baseado no envio de mensagens eletrônicas individualizadas e criptografadas num universo formado por agentes, escrivães e papiloscopistas (peritos em impressões digitais), cargos essenciais em análises, ações de inteligência e estruturação das grandes operações do órgão.
Leal diz que a pesquisa, com margem de erro de 3%, é confiável e reflete o aumento de reclamações que chegam à Fenapef.
“Quase todos os dias um policial denuncia que foi realocado para outras funções quando estava para concluir alguma investigação, normalmente contra a corrupção”, afirma o policial.
Outro dado preocupante apontado pela pesquisa: 95% declararam que o governo federal não está preocupado com a produtividade do órgão, e mostraram que a Polícia Federal virou uma espécie de caixa preta, sem a ofensiva que há poucos anos marcou a atuação do órgão contra poderosos de todos os poderes da República flagrados em malfeitos.
“É necessário avaliar o que está acontecendo. Quem perde é a sociedade”, alerta o presidente da Fenapef. Para Leal a inércia da PF está na contramão das manifestações populares, mas ajuda a explicar atitudes como a absolvição política do deputado Natan Donadon cujo mandato, apesar de preso e condenado definitivamente por desvios de recursos públicos, a Câmara preservou.
APRENDENDO DIREITO!
сентября 6, 2013 5:20 - no comments yet
A tríplice finalidade da pena
Retribuição, Prevenção e Reeducação
1) a prevenção geral atua antes mesmo da prática de qualquer infração penal, pois a simples cominação da pena conscientiza a coletividade do valor que o direito atribui ao bem jurídico tutelado.
2) a prevenção especial e o caráter retributivo atuam durante a imposição e execução da pena.
3) finalmente, o caráter reeducativo atua somente na fase de execução. Nesse momento, o escopo é não apenas efetivar as disposições da sentença (concretizar a punição e prevenção), mas, sobretudo, a ressocialização do condenado, isto é, reeducá-lo para que, no futuro, possa reingressar ao convívio social.
(BARROS, Flávio Augusto Monteiro. Direito Penal – Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 440):
Lições penais do passado. Ainda bem!, do passado...
“Questiona-se sobre se o marido pode ser, ou não, considerado réu no estupro, quando, mediante violência, constrange a esposa à prestação sexual. A solução justa é no sentido negativo. O estupro pressupõe cópula ilícita (fora do casamento). A cópula intra matrimonium é recíproco dever dos cônjuges (...). O marido violentador, salvo excesso inescusável, ficará isento até mesmo da pena correspondente à violência física em si mesma (excluído o crime de exercício arbitrário das próprias razões, porque a prestação corpórea não é exigível judicialmente), pois é lícita a violência necessária para o exercício regular de um direito.”
(HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 125-126)
***
“As relações sexuais são pertinentes à vida conjugal, constituindo direito e dever recíproco dos que casam. O marido tem direito à posse sexual da mulher, ao qual ela não pode se opor. Casando-se, dormindo sob o mesmo teto, aceitando a vida em comum, a mulher não se pode furtar ao congresso sexual, cujo fim mais nobre é o da perpetuação da espécie. A violência por parte do marido não constituiria, em princípio, crime de estupro, desde que a razão da esposa para não aceder à união sexual seja mero capricho ou fútil motivo, podendo, todavia, ele responder por excesso cometido.”
(NORONHA, Magalhães. Direito penal, v. 3. São Paulo: Saraiva, 27. ed., 2003)
CONDENADOS DO MENSALÃO PODEM IR PARA A CADEIA NA PRÓXIMA SEMANA
сентября 6, 2013 5:18 - no comments yet
Neste vídeo mais um debate do siste da revista Veja sobre o julgamento do mensalão, com os jornalista Augusto Nunes, Reinaldo Azevedo, o historiador Marco Antonio Villa e o jurista Francisco Resek.
O julgamento teoricamente está para ser concluído na próxima semana. Se a maioria dos ministros acompanhar o voto do presidente Joaquim Barbosa, os embargos infringentes, que postulam um novo julgamento, serão recusados e começará o cumprimento das penas.
O debate está muito bom, destacando-se competente análise do jurista Francisco Resek. Portanto, vale a pena ver o vídeo.