Mas bastaram cinco minutos no asfalto esburacado para esse encantamento virar uma freada brusca.
Sem pensar, parei o carro — que já estava se arrastando mesmo — e gritei de longe, para manter minha integridade física e o moral ainda em processo de digestão.
“Ei, cabras, tão fazendo o quê aí? Isso aí é NOSSO, pô!”
Eles correram. Não pela vergonha, mas porque viram que era melhor preservar o anonimato do que arriscar um vídeo viral com a legenda: “Vândalos de poste foge de cidadão indignado”.
Continuei a viagem com o pensamento fervendo. Não no calor — que esse a gente aceita — mas no calor da injustiça silenciosa.
Lembrei de Margaret Thatcher e sua frase que hoje daria um bom tweet com 80 mil curtidas e 20 mil tretas:
“Não existe dinheiro público. Existe apenas o dinheiro do pagador de impostos.”
Mas vai tentar explicar isso pros meninos da pedra. Vai falar de carga tributária, de orçamento participativo, de custeio de bens públicos. Eles mal sabem que aquela lâmpada custou o mesmo que uma cesta básica inteira. Pra eles, “é do governo, né?”, como se o governo fosse um tio invisível e abastado que desce da capital uma vez por mês só pra instalar poste.
Esse episódio, pequeno à primeira vista, é uma amostra grátis da tragédia global: a desconexão entre o cidadão e a cidadania. Entre o uso e o pertencimento. A geração que vive de conteúdo em vídeo e reels esqueceu de reelaborar a noção de coletividade. E não é só no Brasil não, viu? Tá no mundo inteiro.
Enquanto uns quebram postes, outros quebram democracias. A diferença é só a ferramenta usada: pedra ou outros meios mais sutis.
E pensar que tudo começou com uma lâmpada. Uma simples lâmpada. Símbolo da luz, do progresso, da civilização. Quase um relicário da Era das Trevas moderna.
Ironia maior? Quando ela foi quebrada, ninguém viu. Exceto eu. E sabe o que fiz? Gritei e continuei a viagem.
Como a maioria faz diante dos absurdos cotidianos.
Talvez eu devesse ter feito mais. Talvez todos devêssemos. Mas aí lembro do que dizia minha avó: “é mais fácil calar e seguir do que defender o que é correto.” Então, por ora, sigo atento, indignado, mas inteiro.
Porque no fundo, toda luminária quebrada é um lembrete: quando a ignorância vence, quem paga a conta é quem ilumina.
Por: Luciano Júnior.