Carlos Motta
Uma das histórias mais famosas entre o pessoal que trabalhou no Jornal da Tarde e Estadão - eles eram divididos por um corredor - é a do urubu.
Contam - não presenciei o ocorrido porque estava em férias - que a ave entrou por um dos janelões e deu alguns sobrevoos pela redação, que entrou em pânico.
Foram registradas, enquanto o animal reconhecia o terreno desconhecido, cenas de histeria, de choro e de nervosismo.
Quanto mais faziam para pegar a negra ave, mais ela se amedrontava, até que entrou numa sala e ficou acuada pelos seguranças, chamados para dar fim ao pandemônio.
Sem saída, com medo, a sua reação foi regurgitar, ou vomitar, como queiram.
Todos sabem que o urubu é considerado o lixeiro da natureza.
Tem uma incrível capacidade de comer qualquer coisa, até mesmo carne pútrida.
Por isso o conteúdo de seu estômago não é muito agradável.
E o cheiro, idem.
Acabaram capturando o bicho, mas o ar ficou empesteado.
A redação demorou para se recuperar do susto.
Da mesma forma que os faxineiros, que tiveram muito trabalho para limpar a sujeira toda.
A aventura do urubu aconteceu há muitos anos.
O Jornal da Tarde nem existe mais.
Mas a ave e o pessoal que se espantou com os rasantes que ela deu no enorme salão do jornal servem como metáfora para o Brasil de hoje, invadido não só por um urubu, mas por um bando deles, cada qual com mais fome, cada qual mais disposto a se empanturrar com qualquer carcaça que encontre.
A diferença entre os dois casos é que agora quem vomita não é o urubu, mas o povo brasileiro, que, atônito com o apetite desses abutres, não sabe como se livrar deles.
Nem estimar quanto tempo será necessário para limpar, se algum dia eles forem embora, a sujeira que estão fazendo.