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O fim da lealdade do empregado à empresa: mais uma vítima do novo mercado de trabalho

21 de Março de 2018, 15:43 , por Bertoni - | No one following this article yet.
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Se definirmos lealdade como fidelidade a uma causa, um ideal, um costume, uma instituição ou a um produto, então parece haver uma certa dose de infidelidade no ambiente de trabalho atualmente.

Loyalty

Para isso, basta atentar ao que dizem alguns estudos recentes: a 10ª. pesquisa anual de benefícios, tendências e atitudes dos empregados divulgada em março pela MetLife coloca, pelo sétimo ano, a lealdade do funcionário numa posição bem incômoda. De acordo com o relatório de 2011 da Careerbuilder.com, 76% dos funcionários em tempo integral na empresa, embora não estejam de fato à procura de um novo emprego, deixariam seu trabalho atual se deparassem com uma boa oportunidade. Outros estudos mostram que, todos os anos, as empresas perdem de 20% a 50% do seu quadro de funcionários.

Sejam quais forem os números reais, o fato é que muita gente se sente alheia ao trabalho que faz. Alguns motivos para isso: a recessão, ocasião em que as empresas despediram inúmeros empregados com pouca consideração por sua lealdade e tempo de casa; corte de benefícios, treinamento e promoções para os que ficaram; idade dos empregados (geração Y, de 15 a 30 anos) com outras expectativas em relação à carreira, entre elas a necessidade de "deixar uma marca própria", onde quer que isso possa levá-los. Uma das vítimas desse mundo nômade é o compromisso cada vez mais frágil com a empresa.

Adam Cobb, professor de administração da Wharton, vê outra razão para a mudança em andamento na relação entre patrão e empregado. "Quando se fala em lealdade no local de trabalho, é preciso que haja reciprocidade", diz ele. "Minha lealdade à empresa depende da lealdade dela a mim. Todavia, há uma parte nessa troca cujo poder é muito maior do que o da outra: a empresa."

Cobb diz que "a lealdade não é algo em que a empresa possa confiar. Contudo, quando as pessoas dizem que os empregados não são leais à empresa, o que se tem aí é um argumento do tipo quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? Vamos imaginar um mundo diferente, em que as empresas se preocupassem com seus funcionários e a lealdade fosse recíproca. Será que as pessoas estariam mudando o tempo todo de emprego como fazem atualmente?"

O comportamento do empregado, diz Cobb, sofreu o influxo da reestruturação drástica da empresa deflagrada há 30 anos. "As empresas sempre recorreram à demissão, mas nos anos 80, empresas sólidas começaram a mandar seus funcionários embora, preocupadas sobretudo com os ganhos dos acionistas." Quando anunciavam a iminência de cortes, "as empresas diziam: 'Nossa decisão se deve à preservação dos interesses dos nossos acionistas'", observa Cobb. "Havia também cortes nos benefícios — 401(k) em vez de pensões de benefícios definidos, ao mesmo tempo que o custo com saúde era transferido para o empregado. Seguia-se uma tendência segundo a qual os riscos deviam ser transferidos para o trabalhador, em vez de serem responsabilidade da empresa. Se sou empregado, isso significa que não vou permitir que a empresa controle minha carreira."

Peter Cappelli, diretor do Centro de Recursos Humanos da Wharton [Center for Human Resources], também acha que, atualmente, mudou a atitude do empregador em relação ao empregado. "Para a empresa, o funcionário é um recurso de curto prazo", diz. Como o empregador não emprega mais ninguém pela vida toda, acrescenta Cappelli, autor do livro "Por que pessoas boas não conseguem emprego: falta de habilidades e o que as empresas podem fazer a esse respeito" [Why Good People Can't Get Jobs: The Skills Gap and What Companies Can Do About It], "a segurança no emprego depende agora de o empregado ser o tempo todo útil ao empregador. Salários menores e cargas de trabalho cada vez maiores acontecem quando convém à empresa. No momento em que o empregado percebe que sua carreira pode deslanchar em qualquer outro lugar, ele deixa de dar atenção apenas à empresa" para a qual trabalha no momento.

Lealdade a indivíduos, não à empresa

O Loyalty Research Center [Centro de Pesquisa de Lealdade], consultoria de Indianápolis que trabalha com a questão da lealdade do cliente e do funcionário, define lealdade, em parte, como "o comprometimento do empregado com o sucesso da empresa na crença de que trabalhar naquela empresa é sua melhor opção […] Os empregados leais não estão empenhados em encontrar outro emprego e não são responsáveis pelas ofertas que lhes são feitas". Cappelli diz que "lealdade do empregado" é um "termo técnico. A analogia mais próxima em pesquisa é dada pelo conceito de compromisso, isto é, a ideia de que o empregado se preocupa com os interesses do seu empregador".

Matthew Bidwell, professor de administração da Wharton, divide o termo em duas partes: "De um lado, significa valorizar ao extremo os interesses do empregador; do outro, conservar o mesmo funcionário em vez de trocá-lo." Os estudiosos da administração, diz Bidwell, referem-se a essa atitude como "compromisso com a organização". No entanto, isso está mudando. "É cada vez remota a percepção de que a empresa vai se preocupar com o funcionário como no passado — e isso faz com que ele se torne menos leal a ela." Bidwell, entretanto, questiona o grau de lealdade que as pessoas tinham para com seu empregador nos bons e maus tempos. "O empregado é sempre mais leal àqueles à sua volta — gerente, colegas, talvez seus clientes. Seu senso de profissionalismo — e lealdade — tem mais a ver com o trabalho que executa do que com a empresa."

Parte da pesquisa de Bidwell estuda o comportamento do empregado terceirizado em comparação com o do funcionário a empresa. Era de se esperar que o funcionário terceirizado tivesse uma "relação distante e menos comprometida" com a gerência da companhia do que o funcionário da empresa, diz. "Mas sempre que converso com os gerentes, eles quase sempre dizem que não há, de fato, muita diferença entre um e outro." A relação do funcionário com a empresa é cada vez mais frágil, diz Bidwell, por isso "há quem diga que a lealdade à empresa é coisa do passado".

James Harter, cientista chefe da área de gestão do ambiente de trabalho e bem-estar da Gallup, tem outra opinião baseada nos levantamentos da empresa iniciados em 2000 com objetivo de medir o envolvimento do funcionário. A pesquisa dividiu os trabalhadores em três grupos: empregados "engajados", os que eram "ligados emocionalmente ao seu local de trabalho e se sentiam motivados a produzir"; "não engajados", empregados "distantes emocionalmente do trabalho e com pouca probabilidade de se sentir motivados"; e "funcionários efetivamente alheios", para quem "o local de trabalho era um ambiente negativo e que tendiam a espalhar sua negatividade para outros".

Em 2000, o levantamento feito mostrava que 26% dos empregados eram do tipo engajado, 56% não eram e 18% eram efetivamente alheios ao trabalho. Em 2008, os percentuais foram, respectivamente: 29%, 51% e 20%; em 2010, 28%, 53% e 19%; e, em 2011, 29%, 52% e 19%. Em suma, há uma diferença surpreendentemente pequena entre os números. Para Harter, "não mudou muita coisa no que diz respeito à experiência diária das pessoas no local de trabalho".

Harter cita um relatório da Gallup intitulado "Estado do local de trabalho nos EUA: 2008-2010", em que são feitas 12 perguntas cujo objetivo é lidar com questões como produtividade, qualidade dos relacionamentos com colegas e gerentes, adesão do funcionário à missão integral da empresa. Uma das conclusões a que chegou o relatório foi que "apesar do estresse observado no local de trabalho na esteira da mais severa recessão registrada em muitas décadas, o nível médio de envolvimento emocional do empregado com seu trabalho não apresentou queda significativa".

Em busca de uma fórmula salvadora

A lealdade, que pode ser considerada um componente do engajamento do funcionário, baseia-se em diversos fatores, diz Harter. Por exemplo, se o empregador "se preocupa em atender aos principais interesses do funcionário, se dá atenção à sua carreira, se dá a ele oportunidade de melhorar sua condição de bem-estar etc.". Nessa equação, os gerentes desempenham um papel crucial, acrescenta, referindo-se a uma pesquisa feita há vários anos em que foram analisadas as razões pelas quais as pessoas permanecem ou saem de uma empresa. "A fórmula salvadora, no caso, é a qualidade da relação entre o empregado e seu gerente. É isso que vai determinar o nível geral de engajamento do funcionário. Boas empresas vão fazendo, ao longo do tempo, uma lista de bons gerentes […] e de boas equipes locais e o modo pelo qual elas se conectam graças ao trabalho de líderes e gerentes" cujo impacto sobre elas é mais significativo.

A natureza humana, acrescenta Harter, "não muda quando muda a economia. Ela pode adquirir uma dinâmica diferente" durante um período de recessão, mas o que permanece constante é a "necessidade de estar conectada — a um gerente, um colega e/ou a um propósito, bem como a necessidade de ser reconhecida". A percepção que as pessoas têm do seu padrão de vida "cai à medida que a atividade econômica cai também", diz. Contudo, essa mesma queda não foi observada em locais de trabalho em que os empregados dizem que "há alguém que incentiva seu desenvolvimento. A presença de um mentor, ou alguém na vida que o ajude a ver o futuro no meio do caos pode fazer diferença".

Deborah Small, professora de marketing da Wharton, faz referência a várias pesquisas sobre o que se convencionou chamar de "justiça procedimental", sinal de que muito do que os empregados sentem em relação à empresa "não diz respeito tanto assim aos resultados obtidos, mas aos processos. Se as pessoas perceberem que os processos são administrados de maneira imparcial pela empresa, mesmo que disso não resulte algo que seja o melhor para elas", a tendência é de que tal comportamento estimule sua lealdade.

As pesquisas mostraram também que nem todo comportamento é fruto de interesses pessoais, diz Small. "Às vezes, as pessoas fazem coisas a um custo considerável para elas como, por exemplo, permanecer em um emprego apesar do salário inferior, quando poderiam perfeitamente mudar de emprego e, possivelmente, ganhar mais. No entanto, elas não o fazem porque se importam com os relacionamentos construídos e com o bem-estar dos colegas. Quando existe um bom relacionamento com a empresa ou com os colegas, mudar de emprego acarreta um custo social." Na medida em que um empregado é bem tratado por uma empresa ou por seu chefe, "isso poderá, ainda que indiretamente, fazer diferença em sua decisão de ficar ou de sair da empresa".

Os incentivos financeiros — como, por exemplo, opções de ações, ações e pensões restritas — também são expedientes de que as empresas têm lançado mão para conservar seus funcionários. Contudo, Wayne Guay, professor de contabilidade da Wharton, não está convencido de que esse tipo de remuneração postergada tenha algum efeito significativo sobre a lealdade do funcionário. "Há evidências de que as opções de ações, ações restritas e outros instrumentos do tipo resultem em menor rotatividade", diz Guay. "Os executivos e alguns outros funcionários tendem a permanecer mais tempo na empresa. Isso, porém, não significa que haja um elo implícito entre empregador e empregado. O que há é muito mais um acordo contratual."

Os planos de pensão de benefícios definidos sempre foram um forte mecanismo de retenção usado pelas empresas para conservar seus funcionários, diz Guay, porém poucas empresas atualmente os oferecem. São mais comuns os planos 401(k), que requerem dos empregados que assumam o risco do investimento, mas que podem ser transferidos quando o empregado sai de uma empresa e vai para outra.

Ao mesmo tempo, as ações e opções de ações podem, em alguns casos, ser mais do que um simples mecanismo de retenção. Elas podem motivar os funcionários não apenas a permanecer na empresa, mas a trabalhar duro e ir além das exigências mínimas, diz Guay, acrescentando, porém, que seu efeito é maior no caso de executivos do alto escalão, "que veem efetivamente de que modo suas decisões afetam o preço das ações da empresa e seu desempenho geral. Quando se desce aos escalões inferiores, o elo entre as ações do empregado e o desempenho geral da empresa é mais frágil". Algumas empresas, diz Guay, têm planos de incentivos próprios para divisões e unidades da empresa capazes de melhorar seu desempenho.

O crescimento do mercado global é outro fator de mobilidade no que diz respeito ao local de trabalho. "Há uma concorrência muito acirrada, tanto interna quanto externamente, o que tem obrigado as empresas a ser mais ágeis em termos de contratação e demissão", diz Guay. "Hoje em dia se trata de uma via de mão dupla: o funcionário sabe que a empresa não pode mais lhe oferecer emprego vitalício, e a empresa sabe que o funcionário se sente livre para mudar de emprego a qualquer momento." As redes sociais e de profissionais, além da explosão das informações disponíveis sobre as empresas e planos de carreira ajudaram nesse processo. "Nos últimos dez ou 20 anos, ficou muito mais fácil conseguir emprego em outras indústrias ou regiões do que há dez ou 20 anos, quando não havia Internet", diz.

Bidwell aponta outra dinâmica por trás da mudança na relação entre empregado e empregador. Muita coisa que o empregador fazia no passado para ganhar cada vez mais a lealdade do empregado — pelo menos até os anos 80 — ele fazia não com a intenção de aumentar a produtividade e a satisfação no trabalho, mas para manter os sindicatos à distância, diz Bidwell. "As empresas temiam os sindicatos e a possibilidade de que convocassem greves. Elas tratavam bem o funcionário para que ele não entrasse para o sindicato. Hoje não é mais assim. os sindicatos estão em decadência. É fácil sufocá-los quando tentam se organizar. Por isso, há gerentes que não se preocupam mais tanto com a lealdade do funcionário como no passado."

O desafio de mensurar a lealdade do empregado

Será possível mensurar a lealdade do funcionário? Se for, será que o aumento ou a diminuição da lealdade afeta o desempenho da empresa? Embora a lealdade não esteja, por exemplo, no mesmo nível das receitas e dos lucros, que afetam diretamente os resultados da empresa, "há evidências de que um funcionário mais satisfeito trabalha melhor", diz Bidwell, "mas essa relação não é necessariamente obrigatória".

Faz sentido usar a lealdade do empregado como parâmetro de desempenho, acrescenta Cappelli. "Resta saber como precificar isso: quanto vale a atitude do empregado que sempre coloca os interesses da empresa à frente de outros fatores naquelas situações em que ele tem liberdade de ação? Provavelmente muito, mas é difícil converter o valor dessa atitude em dólares."

Cobb reconhece também a dificuldade de se criar um parâmetro definitivo de lealdade. "Com frequência, as perguntas feitas nessas pesquisas são mais ou menos do tipo: 'Você pretende procurar outro emprego nos próximos 12 meses?' O fato é que a pessoa poderia procurar outro emprego por vários motivos e não porque estivesse insatisfeita com a empresa onde trabalha", diz Cobb. "Talvez o indivíduo esteja pensando em fazer faculdade, ou quem sabe quer morar mais perto dos pais. Portanto, esses parâmetros nunca são muito transparentes. Na verdade, não servem para avaliar a lealdade do empregado. Medem apenas o que a empresa espera que esteja relacionado à lealdade."

Será que as empresas deveriam se preocupar com o cultivo da lealdade, uma vez que alguns empregadores querem simplesmente que os empregados façam o que lhes foi pedido que fizessem? Cappelli acredita que "sim". O grande desafio do empregador, diz ele, é que "os empregados tenham discernimento, sobretudo em se tratando de funções que desfrutam de maior autonomia. A chefia não os está supervisionando o tempo todo, e nem pode fazê-lo, para lhes dizer como agir."

Além disso, diz Cobb, alguns trabalhadores levaram para a empresa, ou adquiriram lá dentro, habilidades que são muito difíceis de substituir. "A empresa não quer que aquele conhecimento, ou especialidade, saia pela porta afora." Os funcionários desleais também podem se tornar um risco para o empregador no momento em que começam a espalhar que a empresa não é um lugar bom de trabalhar. "Isso afeta a percepção que o cliente tem de você", acrescentou.

Talvez o argumento mais convincente para quem queira tentar preservar os bons profissionais seja o fato de que a substituição de funcionários do setor administrativo, além de outros, pode custar aproximadamente 150% do seu salário anual, segundo várias estimativas. Harter observa que no caso dos funcionários de suporte ao cliente, e os de renda mais baixa, o custo seria de metade dos salários pagos a eles, ao passo que no segmento de profissionais de TI, esse percentual seria de 200%. "O impacto real", diz Harter, "pode se dar sobre a produtividade dos colegas".

Para Cobb, o debate em torno da lealdade do empregado se resume às ações do lado mais dominante da equação, a empresa. "A relação empregado/empregador mudou por causa das empresas. Ouvimos as pessoas dizerem que 'o trabalhador não se importa em cultivar relações empregatícias de longo prazo'. Talvez eu seja ingênuo, mas não creio que a humanidade tenha mudado tanto assim." A retórica dos anos 80, diz ele, focalizava sobretudo a importância de "assumir o controle da carreira e da vida. É difícil imaginar que meu pai seja tão diferente de mim nesse aspecto. Não faz sentido dizer que as pessoas nascidas nos anos 70 de repente tiveram uma revelação e agora estão decididas a controlar o rumo de sua vida, e que as pessoas nascidas nos anos 40 pensam de outro jeito. As pessoas sempre quiseram ter mais controle sobre sua vida". O que mudou agora, diz Cobb, é o modo como as empresas tratam os empregados. "Parece estranho que eu deva ser leal a uma empresa que, eu sei, não é leal a mim."

Fonte: www.knowledgeatwharton.com.br


Fonte: TIE-Brasil

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