Em 1974, 44 anos atrás, Chico Buarque lançava o samba "Acorda Amor", atribuído à dupla Leonel Paiva - Julinho da Adelaide, nomes que o genial compositor usava para enganar a censura - para quem não sabe, naqueles dias o Brasil vivia mergulhado numa feroz ditadura patrocinada pelos nossos homens de bem e pelos bravos e heroicos militares que nos salvaram das garras do cruel comunismo.
"Acorda Amor" fala, em tom debochado, do medo que o personagem tem de ser levado embora pela "dura", pelos "homens", numa "muito escura viatura", algo então muito frequente - a repressão contra quem não achava que este era um país que ia para a frente não era brincadeira.
No refrão, o pobre coitado pedia ao seu amor para chamar o ladrão.
E no fim, a advertia: "Acorda, amor/Que o bicho é brabo e não sossega/Se você corre, o bicho pega/Se fica não sei não/Atenção!/Não demora/Dia desses chega a sua hora/Não discuta à toa, não reclame/Clame, chame lá, chame, chame/Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão/(Não esqueça a escova, o sabonete e o violão).
Como se vê por esse samba do Chico, as décadas foram passando e o Brasil continuou o mesmo.
Acorda, amor
Eu tive um pesadelo agora
Sonhei que tinha gente lá fora
Batendo no portão, que aflição
Era a dura, numa muito escura viatura
Minha nossa santa criatura
Chame, chame, chame lá
Chame, chame o ladrão, chame o ladrão
Acorda, amor
Não é mais pesadelo nada
Tem gente já no vão de escada
Fazendo confusão, que aflição
São os homens
E eu aqui parado de pijama
Eu não gosto de passar vexame
Chame, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão
Se eu demorar uns meses
Convém, às vezes, você sofrer
Mas depois de um ano eu não vindo
Ponha a roupa de domingo
E pode me esquecer
Acorda, amor
Que o bicho é brabo e não sossega
Se você corre, o bicho pega
Se fica não sei não
Atenção!
Não demora
Dia desses chega a sua hora
Não discuta à toa, não reclame
Clame, chame lá, chame, chame
Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão
(Não esqueça a escova, o sabonete e o violão)