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Léa Freire e a difícil arte de se viver dos sonhos

21 de Novembro de 2017, 0:21 , por segundo clichê - | No one following this article yet.
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Carlos Motta

 

A flautista e compositora Léa Freire (foto), uma das grandes batalhadoras da música instrumental brasileira, não mede as palavras quando fala sobre o apoio que o Estado dá aos artistas do país: "Seria bom ter uma política cultural que revisse a Lei Rouanet, que criasse programas de incentivo ao artista como os que existem na Europa e Estados Unidos, que pagasse direito autoral, que conectasse seus muitos órgãos, que não fosse somente um cabide de empregos, que fosse fiscalizado... Enfim, falta fazer tudo", diz. E complementa com uma observação que dá o que pensar: "O Sesc [entidade mantida por empresários do comércio, serviços e turismo, que atua nas áreas da educação, saúde, lazer, cultura e assistência] parece fazer muito mais pela cultura do que todo o aparato estatal."

 

A sua é uma opinião de respeito.


Afinal, Léa tem atuado, já por um bom tempo, nas duas pontas do balcão, como uma produtiva musicista, vivendo as dificuldades impostas por um mercado que, raras exceções, trata a arte como mero entretenimento, e como empresária, à frente do selo Maritaca, que comemora, neste ano, duas décadas de bons serviços prestados à música brasileira. 

"A Maritaca hoje é muito mais mecenas do que empresa", diz ela sobre a sua gravadora, que edita apenas música instrumental.

 

Neste ano, o selo lançou os CDs "A Mil Tons", um dueto entre o aclamado piano de Amilton Godoy, ex-Zimbo Trio, e a flauta de Léa Freire, com composições do pianista; "Arraial", terceiro disco do grupo Vento em Madeira, do qual ela faz parte; “Flor de Sal”, sétimo disco na carreira do compositor e multi-instrumentista Arismar do Espírito Santo;  "Na Calada do Dia", do baterista e compositor Edu Ribeiro, também integrante do Trio Corrente; e "Troubadour", do contrabaixista francês, estabelecido no Brasil, Thibault Delor. Não é pouca coisa.

 

Léa conta que ouvia, durante os anos de estudo de piano, vários músicos eruditos brasileiros, como Camargo Guarnieri, Heitor Villa Lobos, Radamés Gnattali, e Souza Lima, entre outros. Foi nesse período que também conheceu a obra de Bach, Debussy e dos autores estrangeiros e se interessou pelo jazz, que a trouxe para a bossa nova, que chamou o choro e que, por fim, lhe mostrou o caminho para os inúmeros ritmos brasileiros.

Ela lançou seu primeiro CD, “Ninhal”, em 1997, com participações especiais da Banda Mantiqueira, Quarteto Livre, Joyce, Filó Machado e outros músicos de primeira linha, num total de 51 pessoas entre instrumentistas, arranjadores e compositores.

Em 1998 integrou-se ao grupo do saxofonista e flautista Teco Cardoso, com o qual fez várias apresentações, inclusive na Universidade de Miami e no Blue Note de Nova York, montando com ele um repertório que gerou o CD “Quinteto”, gravado em Nova York.

Em 2005 lançou dois CDs, o “Antologia da Canção Brasileira – Vol. 1” e “Vol. 2”, em parceria com o trombonista Bocato, com os quais recebeu cinco indicações pela imprensa como melhor disco do ano e também como melhor show.

Em 2006 realizou turnê pela Europa e no Brasil com o pianista dinamarquês Thomas Clausen e Teco Cardoso, tendo gravado o CD "Water Bikes", lançado no Brasil e na Europa. No ano seguinte foi a vez do CD “Cartas Brasileiras”, com a participação especial do maestro Gil Jardim.

Em 2011 e 2013 lançou os CDs "Vento em Madeira" e "Brasiliana", com o Quinteto Vento em Madeira e participação especial de Monica Salmaso. O quinteto é formado, além dela, por Teco Cardoso, Tiago Costa, Fernando Demarco e Edu Ribeiro.

Ainda em 2013 houve o lançamento, em Curitiba, do CD "Léa Freire e a Orquestra à Base de Sopro de Curitiba", com arranjos inéditos de suas composições.

Como produtora e editora de música instrumental brasileira, lançou, pela Maritaca, mais de 45 CDs e dois livros. Ela tem ainda parcerias com Joyce, que gravou músicas da dupla no Japão, Alemanha, Inglaterra e Brasil.

Nesta entrevista ao blog, Léa fala sobre o mercado da música instrumental no Brasil ("imagino que se formou uma rede alternativa que dá vazão a essa produção"), sobre o seu trabalho e o do Vento em Madeira ("tocamos em projetos sociais e escolas de música"), sobre o seu lado empresarial ("a indústria de hardware é hoje também dona da mídia") e, é claro, sobre a música brasileira instrumental contemporânea.

 

Segundo Clichê - Como está hoje o mercado para a música instrumental no Brasil? 

Léa Freire - Temos mais músicos e mais gravações a cada ano, cada vez com melhor qualidade, feitas por apaixonados pela música que estão espalhados pelo mundo inteiro e que por sua vez espalham essa paixão. Imagino que se formou uma rede alternativa que dá vazão à essa produção. As oficinas estão sempre lotadas de novos talentos e de nomes consagrados também.  

Segundo Clichê - No caso do Vento em Madeira e do seu próprio, como está se desenvolvendo o trabalho e quais os planos para o futuro?  

Léa - O Vento, este ano, além de lançar o CD "Arraial", se dedicou a tocar nos projetos Guri, da cidade e do Estado de São Paulo, além de escolas de música públicas e privadas, voluntariamente, visando a  formação de plateia e o contato com estudantes  de música. 

Segundo Clichê - Dá para explicitar, em termos gerais, que tipo de música instrumental se faz hoje no Brasil?  

Léa - Muitos, inúmeros! Choro, choro Jazz, uns com pegada mais jazzística, outros mais regionais, coisas com uma cara erudita, outras com um pé no contemporâneo... Tem de tudo.  

Segundo Clichê - A produção brasileira é bem aceita em muitos países pelo mundo e vários artistas nacionais são conhecidos mais no Exterior do que aqui. Por que isso acontece?   

Léa - Países com educação musical nas escolas tendem a ter plateias mais acostumadas com a música sem letra. Aqui existe uma pré-indisposição criada artificialmente, que desaparece quando as pessoas têm oportunidade de conhecer essa música.  

Segundo Clichê - No que se refere à sua atuação como empresária: como tem evoluído a Maritaca Discos?  

Léa - A maior dificuldade é a difusão: a indústria do hardware hoje também é dona da mídia, das gravadoras. A Maritaca hoje é muito mais mecenas do que empresa. Nosso maior sucesso foi o "Antologia da Canção Brasileira Vol. 1". Só gravei música instrumental, mas aqui voz é instrumento e poesia também é música. Não sou muito afeita a rótulos.  

Segundo Clichê - Na sua opinião, o que o Estado, por meio de seus órgãos ligados à arte e cultura, poderia fazer para ajudar os músicos brasileiros?  

Léa - Seria bom ter uma política cultural que revisse a Lei Rouanet, que criasse programas de incentivo ao artista como os que existem na Europa e Estados Unidos, que pagasse direito autoral, que conectasse seus muitos órgãos, que não fosse somente um cabide de empregos, que fosse fiscalizado, enfim, falta fazer tudo. O Sesc parece fazer muito mais pela cultura do que todo o aparato estatal...


Fonte: http://segundocliche.blogspot.com/2017/11/lea-freire-e-dificil-arte-de-se-viver.html

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