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Rodrigo Vianna

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Muito além do expediente: a gestão “da porta para fora” de Fernando Haddad, na avaliação de uma professora da USP

1 de Março de 2016, 10:27 , por Escrevinhador - | No one following this article yet.
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Da porta pra fora: existe vida em SP
Da porta pra fora: existe vida em SP

por Nilce Aravecchia Botas*

Na campanha eleitoral de 2012, o então candidato a prefeito Fernando Haddad disparava o bordão: “São Paulo está cansada de prefeitos de meio expediente ou de meio mandato”. Para enfatizar o tom de seu programa de governo dizia que, se a vida do paulistano tinha melhorado da “porta para dentro”, precisava então melhorar “da porta para fora”. A cidade certamente sofreu uma transformação desde então.

Ao longo do século XX, São Paulo viveu sob outro bordão, o de que “a cidade não podia parar”, e teve seu cotidiano submetido à lógica da circulação. O lazer foi ficando restrito aos parques e às praças, que por sua vez sofreram por estar à margem das prioridades de sucessivos governos que, desde Prestes Maia, priorizaram as grandes obras viárias.

Assim, deu-se o desenho da vida na metrópole: espaços de habitação, de trabalho e de lazer, conectados por sistemas viários complexos, que se revelaram sempre insuficientes para dar vazão ao crescente aumento de veículos em circulação. Essa lógica elegeu o transporte sobre pneus, sobretudo o automóvel individual, em detrimento do coletivo, e do ponto de vista do lazer e da sociabilidade, incentivando os shoppings e grandes equipamentos de cultura. Isso limitou o acesso da população e as trocas culturais.

Mas já tem alguns anos que parte da população parece ter cansado de viver confinada entre paredes e grades. São Paulo está agora passando por uma transformação importante, e o carnaval de rua de 2016 talvez tenha sido o corolário desse processo, cujo símbolo maior é a Avenida Paulista nos domingos de sol.

A cultura aos poucos vai deixando de ser entendida como atividade pontual, em teatros, casas de show, ou em parques com grandes eventos em datas comemorativas, e passa cada vez mais a fazer parte do cotidiano, melhorando, de verdade, a vida “da porta para fora”.

Para isso, concorre a visão contemporânea de Haddad que aposta no poder transformador e na energia dos jovens, que por sua vez seguem contagiando todas as faixas etárias.

Destaca-se o papel de maior relevância que gradativamente as políticas de cultura foram adquirindo nessa administração. Como parte fundamental da incorporação das manifestações culturais na vida cotidiana, em 2013, a Prefeitura regulamentou a arte de rua conseguindo aprovação de lei municipal que permite manifestações artísticas ao ar livre, desde que observadas algumas regras simples, como a garantia da circulação do público pelas vias durante as atividades.

Também foi diretriz da gestão Haddad a distribuição mais equilibrada das atividades culturais, no espaço da cidade e também ao longo do ano. Assim, a Virada Cultural foi deixando de ser exceção, e a ocupação dos espaços públicos com artistas e o público em geral tornou-se cada vez mais frequente. O propósito de descentralizar e de democratizar o acesso a cultura fica evidente na edição do Circuito Municipal de Cultura de 2016 que contará com mais de 3 mil atividades distribuídas em mais de 130 espaços da cidade.

Tais iniciativas respondem em parte à crítica, de certa forma justa, de que há uma concentração de recursos no Theatro Municipal. O processo que vem buscando efetivar os artistas dos corpos estáveis de música, dança e canto, por meio da Fundação Theatro Municipal de São Paulo, tem o objetivo de propiciar condições razoáveis de trabalho a artistas que necessitam de aperfeiçoamento constante, e de fato consomem parte expressiva do orçamento municipal da cultura.

Mas, com a ampliação do financiamento para outras atividades, por meio de programas e de editais, tem-se buscado ampliar a participação de coletivos culturais de bairros da periferia, demonstrando que não se trata de reduzir a aplicação nas atividades mais tradicionais, mas de ampliar gradativamente os investimentos em outras atividades culturais, buscando diminuir a distância entre as práticas consideradas eruditas daquelas entendidas como populares.

Numa ação de dupla via, que tende a ampliar o próprio conceito de cultura, as manifestações populares ocupam as ruas do centro ao mesmo tempo em que os corpos estáveis do Municipal vão às ruas. Por meio do programa Municipal na Cidade que acontece desde 2015, os artistas recebem alunos da rede pública para concertos e espetáculos, e fazem suas apresentações em bairros da periferia, em locais de grande circulação, como os terminais de ônibus.

Assim, os segmentos sociais desejosos de uma transformação na cultura urbana têm encontrado uma gestão disposta a responder às demandas por meio de políticas comprometidas e elaboradas a partir de diagnósticos e de consultas aos interessados. Há um esforço de ações mais integradas que impulsionem novas relações entre a população e o espaço da cidade.

Todos os governos têm erros e têm acertos, e com a gestão Haddad não foi diferente. Não é possível mascarar certos tropeços, como por exemplo a forma com que conduziu o aumento das tarifas de ônibus. Sob argumentos puramente técnicos e econômicos, mesmo buscando melhorar o transporte público por meio da implantação dos corredores, acabou arrastando um problema que advém da dificuldade de colocar limites claros aos interesses privados em assunto tão crucial. Entretanto, a própria implantação dos corredores de ônibus, somada às ciclovias e à redução da velocidade, fez parte de uma visão integral da vida urbana – que aposta nos ideais de uma cidade mais humana, com mais integração entre as pessoas de todas as classes e idades, e menos incentivo à circulação de automóveis.

Mas negar os acertos dessa gestão cabe apenas aos movidos pelo conservadorismo mais reacionário. Em tempos de marketing político agressivo, tem sido surpreendente a aproximação entre forma propagandística e o conteúdo de suas ações. Haddad é, literalmente, prefeito para além do expediente, porque sua aposta na transformação da cultura urbana demanda sua presença nas ruas, aos domingos e feriados.

A vida na cidade melhorou muito “da porta para fora” de 2013 para cá, está bem menos formal, mais leve e divertida, ao menos para os que estão dispostos a romper as grades e desfrutar o espaço livre da diversidade.

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*Nilce Aravecchia Bota é arquiteta e professora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) da USP (Universidade de São Paulo)

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Fonte: http://www.revistaforum.com.br/rodrigovianna/geral/37782/