[1]Uma pesquisa realizada em dois congressos estudantis, sendo um deles o 46.º CONUNE (Congresso da União Nacional dos Estudantes) ocorrido em Belo Horizonte em 1999 e outra no CONEA (Congresso Nacional dos Estudantes de Agronomia) ocorrido em Pelotas (Rs) em setembro deste mesmo ano procurou saber como andava a organização e estrutura do movimento estudantil. A escolha do CONUNE foi feita porque ele foi considerado um ponto onde os diversos grupos se manifestam e marcam seu campo político e reivindicações, mas acima de tudo um local onde a experiência coletiva se consolida e procura mudar seus métodos ou continuar como está. A pesquisa delimitou quatro campos extraídos a partir das entrevistas e pesquisa participante para sua exposição: A) O movimento estudantil e os estudantes B) O movimento estudantil e os partidos políticos C)O movimento estudantil e seus ideários D) O surgimento de novas linguagens e práticas emergentes em seu interior. . No primeiro texto da série “Por um movimento social menos ideológico” tratou-se do item A dizendo das falhas do movimento em relação a sua institucionalização e de formas de atuação antigas. O segundo texto “Por um movimento social menos ideológico 2: o movimento e o partido” tratou do envolvimento dos partidos e nesse terceiro vamos tratar do item C, isto é, a função da ideologia.
A pesquisa detectou o movimento estudantil com ideários classistas, transclassistas, alguns mais gerais e até pautas setorizadas, uma mistura de diferentes estratégias e concepções. Ainda assim as questões convergem para três principais: a) reestruturação da entidade b)ampliação das temáticas com lutas amplas mas setorizadas e c)lutas pela educação, de forma mais forte a defesa das universidades, contra o neoliberalismo procurando resgatar aspetos clássicos e históricos do movimento estudantil sendo esse tripé, um ideal, um modelo. Na prática ou uma das dimensões é privilegiada ou se intercruzam a partir das necessidades e assim alguns conflitos podem ocorrer nesse processo de disputa e encaminhamento das pautas, mas a metodologia de cada grupo ainda é mais conflitante. Quando perguntados sobre as prioridades do movimento estudantil a maioria pautou a defesa da educação e mais especificamente as universidades sabendo da crise a qual passava na época a universidade pública aliado a uma luta contra uma política econômica que gera carência de saúde, educação e menos qualidade de vida.
Isso se justifica sobre a perda do sentimento de “coisa pública” e os estudantes sentiam na pele o sucateamento das universidades e sabiam de sua importância para a soberania nacional, sendo pouco incluída nos discursos as universidades privadas, sendo um discurso que se repete independendo a orientação partidária e a dinâmica de cada tendência. É uma reivindicação de uma universidade de fato pública, gratuita, de qualidade e democrática.[2] Algo comum aos discursos também é a redemocratização das instituições estudantis, luta contra o neoliberalismo. A independência da UNE vem como um caminho para a defesa dos interesses da juventude, para uma aproximação maior da vulnerabilidade e os enfrentamentos sofridos devido a falta de políticas públicas, em suma, a luta por uma política para a juventude. Esse acabou sendo o tema de aproximação de questões mais gerais.
Durante os debates houveram muitos comentários sobre o conceito de política pública, e a idéia da criação de política de participação pública marca a diferença entre o caráter propositivo do presente e reivindicatório do passado, como a proposta de fóruns de participação, conselhos e comissões onde a juventude se represente. Os tempos diferem dos anos 60 em que um diploma era algo da classe média, e agora trabalho e qualificação são necessários para a não exclusão de jovens inseridos num ensino mais democratizado mas não adaptado a falta de mobilidade social causada pelo neoliberalismo. Muitos dos estudantes vêem que é preciso um enfrentamento ao governo federal feito por uma ação mobilizadora como a única forma de romper a estrutura social dominante e capitalista e também a ampliação dos canais de participação. É possível afirmar o crescimento de uma consciência da interligação entre vários grupos juvenis e políticas de juventude que integrem as necessidades dos vários setores, pautada inclusive em termos de oportunidade ou sua falta para os vários grupos juvenis. Ainda assim procura-se uma causa comum como na década de 90- “fora Collor”.
Essa atualmente seria o fora FMI que apesar de ser aceita por todas as tendências de esquerda descontenta os anarquistas e libertários pela maneira como a questão é encaminhada. Tudo isso esbarra no problema da forma tradicional de atuação comentada no texto 1 “Por um movimento social menos ideológico- o estudante e o movimento” que não leva a prática mas fica na retórica e nem cria calendário de como os estudantes podem interferir na questão. Ficou claro na pesquisa um projeto não muito claro e incapaz de trazer uma solução, além de uma pluralidade de visões e ideários no movimento que causam tensões no campo político onde os vários grupos negociam as demandas e estratégias para ação.
Pensando através da pesquisa acima eu concluo uma nova função da ideologia. Na forma tradicional a ideologia serve como guia, referencial e objetivo do movimento. Cada grupo ideológico com sua instituição, partido representante (se houver) e sua ideologia tem objetivos diferentes e modos diferentes de ver o mundo, portanto por um lado a ideologia é responsável pela união entre os membros do grupo, proximidade entre certos grupos mas principalmente o afastamento entre alguns. Seja qual for a ideologia, proponho uma nova função a ela. Significa que ela vai perder a força atual que tem, mas não que vá deixar de ser necessária. Relego sua função como guia, referencial, e objetivo do movimento. Para min ela deve ser o motor que mantém o militante em movimento, que não o deixa perecer apesar das dificuldades, mas nada além disso. A ideologia pode ir de um simples pensamento de onde chegar, a simples noção que a luta é em longo prazo ou uma ideologia formal como anarquismo, comunismo, etc... mas se cumprir tal função cumpriu seu papel. A proposta então é um movimento multireferenciado que não nega as diferenças e as considera positiva. Um movimento que não polariza o diferente, mas busca suas qualidades para uma completa melhora do movimento. O que todos devem ter em comum é o objetivo. Dessa forma favorece-se a união do movimento sem sua homogeneização, mas que precisa de ou gera uma desinstitucionalização. Isso pôde ser visto na pratica nas manifestações de julho ainda que não de forma organizada e com vários objetivos, na reunião dos blogueiros com Lula que foi capaz de incomodar a grande organização Globo [4] e suponhamos a causa meio passe estudantil universitário, é algo que todos os grupos de movimento estudantil querem. A pesquisa confirmou a falta da clareza de um objetivo comum no movimento, não sendo algo fácil de construir, mas uma construção social que gera ou é gerada pela desinstitucionalização. A pergunta que fica é: como todos os referenciais podem ajudar no alcance de um mesmo objetivo e como ele pode ser construído?
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Escrito por: Rafael Pisani
Observação: No servidor anterior foi postado no dia 21/04/2014 as 14:16. Nesse servido foram feitas as seguintes alterações:
1. Substituição de “meio passe estudantil universitária” por “meio passe estudantil universitário”.
Referencias:
Marcos Ribeiro Mesquita, « Movimento estudantil brasileiro: Práticas militantes na ótica dos Novos Movimentos Sociais », Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 66 | 2003, colocado online no dia 01 Agosto 2012, criado a 28 Março 2014. URL : http://rccs.revues.org/1151 ; DOI : 10.4000/rccs.1151
Disponível em: http://blogoosfero.cc/blog-do-miro/blog/a-globo-e-a-entrevista-dos-camaradas Miguel do Rosário/ http://blogoosfero.cc/blog-do-miro . Data de acesso: 20 de abril de 2014
Disponível em: http://www.vermelho.org.br/radio/noticia/240396-331
Ramon de Castro/ http://www.vermelho.org.br . Data de acesso: 20 de abril de 2014
Disponível em: http://www.viomundo.com.br/opiniao-do-blog/entrevista-de-lula-a-blogueiros-zero-hora-mente-e-omite-informacoes-de-seus-leitores.html Luiz Carlos Azenha/ http://www.viomundo.com.br . Data de acesso: 20 de abril de 2014
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