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Bernard Appy: PT nunca teve práticas que pusessem em risco a democracia

16 de Outubro de 2018, 15:36 , por Nocaute - | No one following this article yet.
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O economista já fez parte da equipe econômica do PT, mas por discordâncias políticas se desligou do partido desde 2009. No entanto, diz que agora não há outra opção senão apoiar Fernando Haddad.

Do Jornal Estado de S. Paulo

por Bernard Appy*

Eu já fui próximo ao PT, tendo, inclusive, trabalhado no governo Lula. Afastei-me em 2009, decepcionado com os rumos que estava tomando a política econômica. Minha decepção só aumentou, e muito, com a revelação dos esquemas de corrupção e com a péssima gestão da economia no governo Dilma. Ainda assim, não vejo opção senão apoiar Fernando Haddad no segundo turno das eleições presidenciais.

Essa é uma decisão estritamente pessoal. O Centro de Cidadania Fiscal, onde trabalho, seguirá contribuindo para o aprimoramento das políticas públicas brasileiras, qualquer que seja o presidente eleito.

A razão de minha decisão certamente não é a economia. Honestamente, não tenho a menor ideia de como será a gestão da política econômica de Haddad ou de Bolsonaro. O programa de Haddad tem algumas boas propostas, mas tem pontos muito preocupantes, como a sinalização do uso de instrumentos ineficientes de intervenção governamental ou a falta de uma indicação clara de compromisso com a sustentabilidade fiscal. Em seu favor, Haddad conta com o fato de ter feito uma gestão consistente das finanças públicas quando foi prefeito de São Paulo.

O programa de Bolsonaro tem um viés mais liberal, mas é absolutamente superficial, a ponto de sugerir que irá reduzir a carga tributária, quando qualquer economista que faz contas sabe que será impossível fazer o ajuste fiscal e simultaneamente reduzir a carga tributária nos próximos quatro anos. O mais preocupante é a completa dissonância entre a prática histórica de Bolsonaro – claramente populista – e o discurso de austeridade de seus assessores econômicos, a qual foi ratificada pelo recente anúncio de que irá criar um 13.º salário para o Bolsa Família.

Tampouco acredito que o combate à corrupção e a “tudo isso que está aí” seja a questão decisiva neste segundo turno. O PT certamente não está bem na foto, mas Bolsonaro também não. Ele foi deputado federal por 27 anos, a maior parte dos quais no PP, um dos partidos mais envolvidos na Operação Lava Jato. É pouco provável que não tivesse conhecimento da forma de operação de seu partido.

A razão para minha opção nem sequer é a preferência por uma política de esquerda ou de direita (votei contra a candidata do PT nas duas últimas eleições presidenciais). É bom que haja alternância no poder, desde que as regras do jogo democrático sejam preservadas. E aí é que está o problema.

Apesar de várias escorregadas no discurso, o PT nunca teve práticas que pusessem em risco a democracia. Bolsonaro, ao contrário, questiona a legitimidade das eleições caso não seja eleito, além de reiteradamente elogiar a ditadura militar e questionar a independência da imprensa. O risco de eleger um autocrata antidemocrático é que o governo e os próprios instrumentos democráticos sejam manejados de modo a reprimir a oposição e perpetuar sua permanência no poder – padrão infelizmente observado em várias democracias frágeis.

O mais preocupante em Bolsonaro, no entanto, é o discurso de incitação à violência e o tratamento como inferiores de homossexuais, negros e mulheres, o que é a negação dos princípios liberais e democráticos mais básicos. Quais são os valores de uma pessoa cujo herói é um torturador?

Não se trata de uma característica sem consequências. O discurso de ódio de Bolsonaro legitima a intolerância violenta de parte da população, como já temos visto desde o primeiro turno das eleições e talvez vejamos de forma mais intensa se ele for eleito. Trata-se de um risco enorme num país que se encontra dividido e com os nervos à flor da pele.

Pode ser que as instituições democráticas no Brasil sejam mais fortes que as de outros países governados por autocratas. Pode ser que Bolsonaro, contrariando toda a sua história, aceite atuar estritamente dentro das regras do jogo democrático. Mas o risco de apostar nessa hipótese e estar errado é alto demais. Prefiro apoiar um candidato que, se fizer um mau governo, eu tenho certeza de que posso tirar pelo voto daqui a quatro anos.

*Bernard Appy é economista formado pela USP e diretor do Centro de Cidadania Fiscal. 

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Fonte: https://nocaute.blog.br/2018/10/16/bernard-appy-pt-nunca-teve-praticas-que-pusessem-em-risco-a-democracia/

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