O “novo normal” do nosso ministro da Economia – o capitalismo liberal, devagar, quase parando – foi um fracasso.
Um dos melhores comentários sobre a avaliação do ministro Paulo Guedes a respeito do atual desempenho da economia brasileira foi o do jornalista Carlos Drummond, publicado na revista CartaCapital no início deste mês. Guedes tem dito que nossa economia vive “um novo normal”: em vez de inflação elevada, juros altos e o real valorizado em relação à moeda americana, temos hoje inflação baixa, juros baixos e o real desvalorizado. Drummond resume essa avaliação no título do seu artigo: “O fracasso subiu à cabeça de Guedes”.
O grande problema do “novo normal” do ministro Guedes é que a economia brasileira que ele administra não cresce. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou há pouco o crescimento do produto interno bruto (PIB) do Brasil em 2019: 1,1%. Se se considera que o governo comandado pelo presidente Jair Bolsonaro é uma continuação do governo surgido do golpe parlamentar que derrubou a presidente Dilmar Rousseff, seu crescimento médio é menor que o de todos os governos dos últimos 25 anos. Nos dois governos de Fernando Henrique Cardoso o PIB cresceu anualmente, em média, 2,6% no primeiro mandato (1994-98) e 2,4% no segundo(1999-2002). Nos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva aumentou 3,5% no primeiro (2003-06) e 4,7% no segundo (2007-10). Nos quatro anos do primeiro mandato de Dilma (2011-14) cresceu 2,4% em média por ano. O segundo mandato da presidente começou em 2015 – com redução do PIB de 3,5% – e terminou em meados de maio de 2016, quando foi afastada do cargo pelo processo de impeachment que sofreu.
Para simplificar, vamos atribuir o crescimento negativo do PIB de 2016 – de-3,3% – tanto a Dilma, que governou quatro meses e meio, de 1º de janeiro a 12 de maio, quanto a Michel Temer, seu substituto, que esteve no comando do País nos sete meses e meio restantes de 2016 e ficou no cargo até o final de 2018). Fazendo essa simplificação, nos seis anos em que a presidente esteve no governo a economia cresceu, em média, aproximadamente 0,5% ao ano; e nos quatro anos de governo com Temer e Bolsonaro (a variação do PIB nesse período foi de -3,3% em 2016, de +1,3% em 2017, de +1,3% em 2018 e de +1,1% em 2019), aumentou, em média, 0,1% ao ano.
Guedes, junto com seu chefe, Bolsonaro, se apresenta ao grande mundo das finanças como o homem que irá “vender o Brasil”, com o objetivo de atrair capital estrangeiro para desenvolver o País. O ministro é doutor em economia. Ele sabe que o capitalista estrangeiro não compra uma empresa brasileira para levá-la para fora do país, mas para explorar o mercado a partir dela. E, mesmo que venda a empresa a preço de banana, que derrube leis trabalhistas e direitos dos trabalhadores a fim de tornar essa exploração mais atrativa ao capital estrangeiro, a economia do Pais precisa crescer para que essa exploração exista.
O capitalismo não é um sistema de apropriação por saque de riqueza já criada. Foi assim, na sua formação, com a pilhagem do colonialismo. Mas, há séculos é amplamente sabido que a criação de riqueza, de valor novo, se dá no tempo presente do trabalho: o empregador obtêm, na venda de seus produtos ou serviços, descontados os custos de matérias-primas e de outros insumos, um valor maior do que o que paga em salários e benefícios aos trabalhadores. A grande virtude, digamos assim, do capitalismo é a exploração do trabalho vivo. A avaliação vale também para a exploração do trabalho no modelo de desenvolvimento da China, que, para uma “etapa primária da construção do socialismo”, criou o conceito da “economia socialista de mercado”, na qual coexistem a exploração capitalista tradicional, de trabalhadores chineses por empresários privados chineses e estrangeiros e a exploração não tradicional, de trabalhadores chineses por estatais dirigidas por representantes do governo comunista daquele país.
Nem no modelo capitalista tradicional, nem no modelo chinês, no entanto, se dispensa a dinâmica do crescimento econômico. Veja-se, por exemplo, entre 2010 e 2019, a variação da taxa de investimento calculada pela IBGE – a parcela do PIB brasileiro destinada a aumentar a capacidade produtiva do País – comparada com a posição do Brasil no “Índice Global de Confiança para Investimentos Estrangeiros”, da consultoria americana Kearney, um dos mais usados com esse fim.
O resultado da comparação é claríssimo: nesses 10 anos, de 2010 a 2019, o investimento no País caiu de 20,5% para 15,4% do PIB e, do outro lado, a confiança dos investidores estrangeiros no Brasil despenca – do quarto lugar entre os países preferidos para investimento, em 2010, para o sexto, em 2015, para o 12º, em 2016, para o 25%, em 2018 até, simplesmente, cair fora do índice no ano passado. O índice da Kearney mede a perspectiva de investimento nos próximos três anos, a partir de entrevistas com 500 executivos das maiores multinacionais em 25 países. Até 2014, o Brasil estava entre os cinco primeiros, no topo da lista. Agora, já não aparece nela.
A demanda é um dos principais fatores que o investidor observa ao decidir o que fazer com seu dinheiro. “O maior entrave, no caso do Brasil, é a recessão e o baixo crescimento dos últimos anos”, diz artigo do jornal O Globo referindo-se a relação do crescimento com o interesse dos investidores estrangeiros. Com esse “novo normal”, Guedes, o liberal, está tentando inovar? Ele inventou o capitalismo liberal devagar, quase parando? Ou, como disse o colega Drummond, simplesmente o fracasso lhe subiu à cabeça? Nem aos seus pares, o Pibinho do Guedes agradou.
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