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Aluno responde professor da UTFPR que diz que SISU é sorteio de vagas

5 de Outubro de 2015, 12:29 , por Tânia Mandarino - | No one following this article yet.
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Por Leandro Alves, aluno do 7º período de Engenharia da Computação na UTFPR. Leandro é egresso do SISU e do sistema de cotas das universidades publicas.

 

O estudante Leandro recebeu o e-mail abaixo do professor Rafael Barreto, titular de várias cadeiras junto a UTFPR entre elas, o Laboratório de Física Computacional naquela intituição (texto em destaque nosso):

 

---------- Mensagem encaminhada ----------
De: Prof. Barreto <barreto@hpc.ct.utfpr.edu.br>
Data: 4 de outubro de 2015 09:20
Assunto: Física UTFPR
Para: Leandro <pj.leandro@gmail.com>


Oi Leandro.
Estou mandando este e-mail porque eu gostaria que você avaliasse se seus professores têm ou não cumprido o conteúdo das disciplinas.

Veja esse link: http://hpc.ct.utfpr.edu.br/~barreto/conteudos

De 2010 para cá, a UTFPR mudou o sistema de ingresso, e com isso mudou o perfil dos estudantes. Antes o vestibular era um sistema de seleção muito forte, e todos os alunos entravam muito bem preparados. Portanto era "fácil" para o professor dar aula e conseguir aprovar a maior parte da turma.

Após o Sisu (mas antes de colocar os pesos no Enem), houve uma espécie de "sorteio de vagas", ou seja, os ingressantes não estavam sendo devidamente selecionados. Isso teve um impacto negativo principalmente nos cursos de engenharia e ciências exatas, pois uma parte significativa dos alunos ainda não tinha a base adequada de física e matemática para acompanhar as aulas dos primeiros períodos.

A consequência disso foi uma explosão dos índices de reprovação.
Veja a análise aqui: http://hpc.ct.utfpr.edu.br/~barreto/utf/analise.html

Minha hipótese é que a maioria dos professores não estava preparada para essa mudança de perfil (o corpo docente não foi consultado sobre o fim do vestibular). E ao invés de fazer um trabalho diferenciado para reforçar a base desses alunos, muitos professores simplesmente baixaram o nível para evitar ter que reprovar em massa.

E se você parar para pensar, se essa hipótese for verdadeira, isso tornou a situação ainda pior. Parte significativa dos alunos passou por disciplinas-chave dos primeiros períodos (como Física 1 e 2, Cálculo 1 e 2, Geometria Analítica e Álgebra Linear) sem realmente aprender esses conteúdos. Para piorar, normalmente o aluno só percebe que não aprendeu o suficiente em uma disciplina quando precisa desses conteúdos em disciplinas subsequentes (quando é tarde demais).

Por isso, se você puder avaliar quais ementas foram cumpridas (e quais não foram), você estará contribuindo para melhorar a nossa universidade. Avalie o máximo de disciplinas que você puder, e não apenas as que você teve problemas.

E por favor, incentive seus colegas a fazer o mesmo (o mais rápido possível). A qualquer momento eu posso ser obrigado a retirar esse formulário do ar.

Abraços
Rafael

 

Eis a resposta ao e-mail do Prof. Barreto, enviado esse fim de semana aos alunos da UTFPR:



Prof. Dr. Rafael C. Barreto

Em resposta ao seu e-mail, preciso fazer algumas considerações. Sou filho de pais sem estudo, de mãe empregada domestica e serei na minha família até o momento o primeiro e único a se formar em engenharia em uma universidade publica

A minha vaga nesta universidade eu conquistei com dedicação e esforço após três anos sem conseguir passar no vestibular da USP e UNICAMP em SP, de onde sai para estudar em Curitiba - PR. Portanto não devo deixar de reconhecer que as políticas de acesso ao ensino superior foram fundamentais para tornar isso possível, entre elas o SISU.

O que o senhor chama de “sistema de seleção muito forte” em defesa do vestibular eu chamo de sistema de exclusão.

A universidade no Brasil tem seu inicio marcado pela elitização, onde apenas a aristocracia tinha acesso. Durante seu desenvolvimento a universidade evoluiu e assumiu cada vez mais seu papel como instituição de pesquisa e desenvolvimento do conhecimento no pais. Porem somente nas ultimas décadas a universidade passa a assumir também sua responsabilidade com o desenvolvimento social e o combate as desigualdades histórica no Brasil, acolhendo em seus bancos estudantes que habitam as periferias, pobres, negros, indígenas e quilombolas. Estes estudantes tem as mesmas capacidade de aprendizado que qualquer outro estudante que teve todas as condições socioeconômicas e educacionais favoráveis nos ensinos fundamental e médio.

Portanto não se trata de “sorteio de vagas” e sim de garantia de direitos constitucionais ao ensino e ao desenvolvimento, intrínsecos de cada pessoa humana, independentemente de sua condição social e econômica. O SISU e outras políticas como a Lei nº 12.711/2012 (Lei de Cotas), o Decreto nº 7.234/2010(PNAES) e Decreto nº 5.493/2005(PROUNI) são políticas essenciais e indispensáveis, ainda que com suas contradições, para a efetivação deste direito.

Primeiramente, os dados que você apresenta sobre retenção e trancamento não justifica qualificar como sendo um “impacto negativo” a presença destes alunos na universidade. Vejo como uma atitude preconceituosa essa sua afirmação, que é na verdade o principal argumento utilizado por aqueles que não aceitam ver estudantes antes excluído ocupando um espaço que não foi pensado para ele estar presente.

Em segundo lugar, não é justo colocar a culpa nos estudantes e nos seus colegas professores. Dados apresentados no relatório do Perfil sócio econômico e cultura do FONAPRACE, referentes ao conjunto das universidades federais, mostram que mais de 60% dos estudantes dependem das políticas de assistência estudantil para se manterem na universidade sendo que mais de 40% são estudantes de alta demanda desta políticas pertencentes as classes socioeconômicas C, D e E. A UTFPR esta inserida nesta realidade e ainda assim no mês de Setembro, em pleno semestre letivo, a universidade não pagou a bolsa permanência dos estudantes, deixando milhares de alunos sem qualquer condição de pagar aluguel, alimentação e transporte.

Como estudar e ter bom desempenho nestas condições? Ou melhor, nesta falta de condição.

Apesar das políticas de acesso abrir as portas das universidades, as praticas administrativas e o sistema de ensino permanecem elitista e excludentes. A construção de uma universidade mais democrática passa por uma reformulação deste sistema. Além das dificuldades advindas destes fatores temos de enfrentar situações de preconceitos como esta, que culpa os estudante.

 

Após a publicação deste post, recebemos a resposta do Professor Rafael Barreto, a qual publicamos abaixo:

 

Em 5 de outubro de 2015 13:11, Rafael Barreto <baarreth@gmail.com> escreveu:

Oi Leandro

Sem dúvida alguma você é um vencedor por perseverar e superar tantas dificuldades.

E sem dúvida nenhuma o vestibular é um processo de exclusão e o ensino superior no Brasil é voltado para as classes mais abastadas.

Entretanto não leve minha análise a mal... não estou dizendo que *todos* os alunos Sisu são despreparados, ou que devemos voltar ao modelo do vestibular, ou mesmo que a culpa é dos alunos.

Esse não é o foco da minha discussão.

Estava apenas contextualizado o porque da mudança de perfil discente, e justificando porque os professores tiveram (e ainda tem) dificuldade em trabalhar com esse novo público.

Ou seja, precisamos melhorar os professores.

Te desejo muito sucesso, Leandro. Espero que você (e muitos outros) saiam bem formados de nossa universidade e ajudem a melhorar nosso país.

Abraços
Rafael