Abre-se um novo espaço para disputar os corações e mentes dos brasileiros desejosos de livrar o país, pelo menos em parte, de gente como os donos das grandes empreiteiras e como o atual presidente da Câmara.
Por Wladimir Pomar*
O Brasil é, realmente, um país de surpresas. Tomemos como exemplo a Operação Lava-Jato. Ela teve início com o objetivo claro de torpedear a campanha presidencial do PT e de Dilma. Não passa de história da carochinha a informação de que as pistas surgiram por acaso num dos lava-jato do doleiro Youssef.
Todo o mercado sabia que as grandes empreiteiras monopolizavam o setor de construção pesada na área de petróleo e gás, operando como um cartel. E que isso só seria possível com a complacência dos operadores das licitações da Petrobras. Em tais condições, a escolha do momento para o lançamento da operação policial e judiciária não foi nenhum “abre-te sésamo”. No entanto, da mesma forma que não bastava à mulher de César (o imperador romano) ser honesta, também devendo “parecer” honesta, a operação de criminalização de Dilma e do PT teria que ser e parecer honesta, para que sobre ela não pairasse qualquer dúvida.
Assim, como aprendizes de feiticeiros, os investigadores, embora desejosos de apenas vazar informações comprometedoras contra os petistas (com o sólido apoio do “partido da mídia”), viram-se puxando cordões e fios do Brasil real. Isto é, do Brasil dominado por grandes corporações empresariais, cujos proprietários e executivos se consideravam imunes a qualquer investigação, e cujos tentáculos manejavam, há muito tempo, as diretrizes da política brasileira, apesar do cinismo de FHC em querer demonstrar o contrário.
Foi na onda da operação policial e judiciária, e na perspectiva dessa operação, que não havia atingido Dilma durante a campanha eleitoral, mas inevitavelmente a atingiria a curto prazo, que o nobre deputado Eduardo Cunha vestiu indumentária parecida à de São Jorge, cavalgou um Rocinante quixotesco, e se elegeu presidente da Câmara. Seu sonho: comandar a cassação da presidenta e elevar-se à condição de candidato natural à presidência da República.
Diz, porém, um ditado popular que quem tem culpa em cartório deve evitar passar em frente de qualquer delegacia. Apesar disso, o deputado Cunha usou e abusou de sua prerrogativa de presidente da Câmara Federal, na crença de que, entre os cordéis puxados pelos investigadores, não estariam os seus. Quando seu nome apareceu pela primeira vez, no rompante que o caracteriza, ameaçou não só o procurador geral da república, mas também a presidenta. Sequer se deu conta de que estava praticando um absurdo, responsabilizando o executivo por algo praticado pelo judiciário.
Agora, no entanto, com as operações investigativas sobre senadores e deputados, e com seu nome aparecendo nas manchetes não só como receptador de propina, mas principalmente como achacador, a ficha do deputado parece haver caído, levando-o ao destempero completo. Ao invés de romper com a Justiça Federal do Paraná, ou com o STF que está autorizando as investigações, decidiu romper com a presidenta.
Porém, sendo realista, talvez o deputado Cunha esteja na condição daquele ladrão da piada que, para salvar-se, grita “pega ladrão”, e aponta para um passante qualquer à sua frente. Bem vistas as coisas, a essa altura talvez essa seja a situação de grande parte do empresariado nacional e estrangeiro no Brasil, e de seus representantes políticos. Eles jamais esperaram que as investigações policiais e judiciais perdessem o foco no PT e se voltassem para suas operações escusas. Não acreditavam em bruxas. Agora, porém, parecem estar vendo não só que elas existem, mas que também estão soltas e ameaçando-os diretamente.
Bruxas soltas, como se vê pelo exemplo do deputado Cunha, causam pânico e destempero. À presidenta Dilma não cabe outra atitude senão agradecer que tal figura tenha rompido com ela. À esquerda, em geral, cabe conquistar os parlamentares enganados por esse presidente sem jaça e lutar para que a Câmara reveja os atos retrógrados e reacionários praticados por ele, além de apoiar que as investigações sobre suas falcatruas prossigam. Ao PT, em particular, cabe reconhecer que praticou um erro sério em receber contribuições empresariais, independentemente delas terem sido provenientes de dinheiro sujo ou limpo, e comprometer-se em não mais praticar esse tipo de financiamento.
Com as bruxas soltas, abre-se um novo espaço para disputar os corações e mentes dos brasileiros desejosos de livrar o país, pelo menos em parte, de gente como os donos das grandes empreiteiras e como o atual presidente da Câmara. E, também, para retificar os erros que estão sendo cometidos na economia e pesando sobre o povo, com o aumento do desemprego e dos preços, e com a paralização do crescimento.
* Wladimir Pomar é escritor e analista político (Via http://www.pagina13.org.br/ )