Por Edson Sardinha, do Congresso em Foco
O Partido Verde (PV) oficializou a pré-candidatura do ex-deputado Eduardo Jorge à Presidência da República. Em ato realizado na Assembleia Legislativa de São Paulo, nesse sábado (22), o ex-deputado apresentou o documento “Viver Bem. Viver Verde”, em que lista dez diretrizes para a elaboração de um programa de governo.
O texto defende questões polêmicas, como a descriminalização do aborto e da maconha e uma reforma política que prevê a extinção do Senado, a redução em um quarto no número de deputados e a troca do atual sistema presidencialista pelo parlamentarista no Brasil.
“O que o PV quer é a revolução de mudar a forma de viver”, disse Eduardo Jorge. O texto, disponível na internet (leia a íntegra), estará sujeito à avaliação dos militantes até abril, quando o partido volta a se reunir para analisar as críticas e sugestões dos filiados. Só então, com as modificações acolhidas, será apresentado oficialmente à sociedade como proposta de governo, diz o partido.
Deputado estadual e federal pelo PT de São Paulo, Eduardo Jorge rompeu com o partido em 2003, após uma série de divergências internas, para se filiar ao PV. Ainda pela antiga legenda, foi secretário da Saúde na capital paulista nas gestões de Luiza Erundina e Marta Suplicy. Já pelo PV, foi secretário de Meio Ambiente nos governos de José Serra (PSDB) e Gilberto Kassab (ex-DEM, agora no PSD).
O texto é construído a partir de três eixos: superação da miséria; crise climática e aquecimento global e reforma política. “A ideia não é construir mais um programa enciclopédico, como se costuma fazer neste tipo de campanha para o Executivo, que pouca gente lê. Às vezes, nem o próprio candidato. Além disso, no Brasil, ultimamente, a maior parte dos vários programas são bem parecidos na sua maior parte”, diz o documento. “O que queremos é marcar nossas diferenças nesta convergência para que o povo possa julgar se merecemos ou não o seu apoio”, acentua.
Aborto
A proposta do PV declara apoio a um dos pontos que causaram maior polêmica nas eleições presidenciais de 2010: a descriminalização do aborto, tema que acirrou a disputa entre José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT).
Pressionados por religiosos, os dois assumiram compromisso, durante a campanha, de não propor ou apoiar mudança na atual legislação, que considera crime a interrupção da gravidez, ressalvadas exceções, como estupro ou risco de morte para a mãe.
“Queremos a legalização do procedimento, estabelecendo regras e limites de idade gestacional numa lei, mas que permita à mulher e seu companheiro seguirem este caminho com segurança”, diz trecho do texto.
Drogas
O texto também é explícito ao defender a legalização da maconha como forma de coibir o narcotráfico e o crime organizado. “As outras drogas mais pesadas devem ter estratégias a ser implementadas na sequência”, afirma o documento. O documento proposto por Eduardo Jorge destaca que a política de repressão à droga tem causado efeito contrário aos seus objetivos.
“O consumo não caiu, e, pior, construiu indiretamente uma economia do crime poderosa, violenta, opressiva. O tráfico da maconha é um dos principais pilares desta economia criminosa no Brasil e no mundo. Como ela é uma droga cujos malefícios são equivalentes aos das drogas chamadas legais, como fumo/tabaco e álcool, é por ela que devemos começar com segurança nossa estratégia de confrontar a economia do crime e da violência. Para nós, a educação e a assistência à saúde são mais eficientes do que a repressão policial”, afirma.
O partido apoia a proposta do deputado Eurico Júnior (PV-RJ), apresentada no final de fevereiro, que legaliza o cultivo, o comércio e a distribuição da maconha, tanto para uso medicinal quanto recreativo. “Fique bem claro que o PV não apoia nem incentiva o uso, seja do fumo, do álcool ou da maconha”, ressalva o texto.
Reforma política
No capítulo dedicado à reforma política, o PV defende nova consulta popular sobre o sistema de governo, para que o país adote o parlamentarismo, modelo rejeitado em plebiscito nacional realizado em 1993. A proposta apoia a extinção do Senado e a redução, dos atuais 513 para 411, no número de deputados federais. Cada bancada estadual perderia 25% de seus representantes. O mesmo corte seria feito nas assembléias legislativas. O número de ministérios também seria reduzido dos atuais 39 para 14.
“Pode ser paradoxal falar neste reforço do poder do Parlamento exatamente neste momento em que ele é tão atacado em todo o país. Mas esta é a reforma decisiva para ampliar a democracia no Brasil e reformar profundamente o próprio parlamento.”
O texto também estabelece um limite de 20 salários mínimos como remuneração dos parlamentares estaduais e federais, o fim das verbas de gabinete, das emendas individuais ao orçamento e das frotas de carros oficiais. “Mais qualidade em Brasília, com menos quantidade e despesas”, diz o documento.
Por outro lado, o partido propõe, ainda, o aumento no número de vereadores, que passariam a dividir espaço com conselheiros. Em São Paulo, em vez dos atuais 55 vereadores, o número de representantes municipais passaria para 5.500, entre vereadores e conselheiros. Remuneração, só em casos excepcionais, como ajuda de custo, ressalta o texto, que defende o fortalecimento das administrações das políticas públicas nos municípios.
Economia
Na economia, o esboço de programa do PV defende que, aos três princípios econômicos adotados desde o governo Itamar Franco – superávit primário, câmbio flutuante e metas inflacionárias com responsabilidade fiscal, –, sejam acrescentadas metas socioambientais como critério de desempenho dos governos federal, estaduais e municipais. Apoia, ainda, a substituição dos impostos federais por um imposto único, baseado na movimentação financeira. “Ficam preservadas, claro, como prevê a proposta original, taxas por serviços individualizados, tributos com função regulatória ou fiscalizadora”, ressalva.
O documento também prega mudança de foco na relação do governo com a agricultura: a prioridade seria dada à agricultura familiar, dos pequenos e médios produtores, sem utilização de agrotóxicos.
Em discussão
Entre os dez pontos destacados no documento estão o desenvolvimento sustentável, a reforma política, a rediscussão do atual modelo federativo, a economia verde, a energia, a Previdência Social, saúde, educação, o combate à desigualdade e à miséria.
“Esse é o esqueleto do que vai ser feito, é a iniciativa democrática que vem antes de qualquer campanha. Até porque, antes de termos uma pessoa, um nome, precisamos de uma boa proposta e só receberemos apoio e votos se nossas ideias forem acolhidas pela sociedade”, explicou Eduardo Jorge, durante a apresentação das diretrizes na Assembleia Legislativa de São Paulo.
Eleições
Além da pré-candidatura de Eduardo Jorge, o PV também oficializou ontem o lançamento de outros nomes aos governos estaduais, como Gilberto Natalini (São Paulo), Rosane Ferreira (Paraná), José Carlos Lima (Pará), Marcelo Lelis (Tocantins) e Roberto Rocco (Rio de Janeiro).
Em 2010, com Marina Silva (hoje no PSB), o PV conquistou a maior votação de sua história. A ex-senadora recebeu quase 20 milhões na corrida presidencial, ficou atrás apenas de Dilma e José Serra, que disputaram o segundo turno. A ex-ministra deixou o partido após desentendimento com o comando partidário. Depois de não conseguir criar sua própria legenda a tempo de disputar as próximas eleições, filiou-se ao PSB, que tem como pré-candidato à Presidência o governador pernambucano, Eduardo Campos.
Militância
Médico sanitarista, 64 anos, Eduardo Jorge nasceu em Salvador, mas se formou na Paraíba e começou sua militância partidária em São Paulo. Filiado ao PT, foi deputado estadual e federal entre 1983 e 2003, quando migrou para o PV. Em 1994, o então petista propôs uma aliança entre o PT e o PSDB para a disputa ao governo de São Paulo. Ele defendia o apoio ao tucano Mário Covas. A aliança foi vetada. O Partido dos Trabalhadores concorreu com José Dirceu.
Ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, o então deputado federal apoiou a aprovação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) com recursos para a saúde e da reforma da Previdência. Por causa do voto dado a favor da CPMF, acabou suspenso pelo PT. Já no governo Lula, a bancada se empenhou para manter a contribuição.
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