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3 de Abril de 2011, 21:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.

7 de abril, dia do jornalista. Comemoração ou luta?

7 de Abril de 2017, 10:35, por Renata Mielli

Cena do filme A montanha dos 7 abutres
Final da década de 30 do século XI, Honoré de Balzac publica um livro que se transformaria num clássico da literatura, Ilusões Perdidas. Em centenas de páginas, o escritor francês conta a história de Lucien de Rubempré que se aventura pelo jornalismo e pelas entranhas da aristrocracia decadente numa busca insaciável por riqueza, fama e poder.

Li Ilusões Perdidas há muitos anos. A lucidez ácida e crítica de Balzac é um verdadeiro balde de água fria sobre os que, iludidos pela ideia glamourizada do jornalismo, acreditam que este é um ofício a serviço da sociedade e das pessoas. Uma vocação autruista de tornar público os acontecimentos de forma desinteressada, ou ainda um instrumento da sociedade para fiscalizar o Estado. “O jornal já não é feito para esclarecer, mas adular opiniões. Por isso, daqui a algum tempo, todos os jornais serão covardes, hipócritas, infames, mentirosos, assassinos; vão matar ideias, sistemas”, vaticina Balzac.

Este tempo é hoje.

Espere! Mas os jornalistas não são os jornais, o jornalista não é a imprensa. Mas é impossível pensar no profissional apartado de sua profissão. Não há um jornalista ideal. Há o trabalhador, a pessoa de carne e osso que é uma das muitas peças na ingrenagem na indústria jornalística.

E nestes tempos, este trabalhador em sua maioria está anestesiado, está calado ou conivente. Afinal, o jornalista não se considera trabalhador. O jornalista é um intelectual, um colega do patrão. Colega?

Dic. sm e sf: Pessoa que pertence ao mesmo colégio, à mesma classe, escola, instituição, corporação, repartição ou sociedade, principalmente literária ou científica, que outra ou outras; aquele que preenche as mesmas funções, que exerce a mesma profissão ou atividade que outras pessoas: colegas de escola, de magistratura.

A alcunha “coleguinha” – já bravejou tantas vezes o emérito Bernardo Kucinski – acabou com a identidade de classe do jornalista. Dono do jornal e jornalista são coleguinhas não porque são amigos, mas porque são “iguais”, pertencem à mesma “sociedade”. Pelas relações no cotidiano um trabalhador até pode se tornar amigo do chefe. Há amizade entre as diferentes classes sociais, mas isso não borra a identidade de um ou outro.

Esse “apagamento social do trabalhador” é uma estratégia de adestramento. É uma cooptação. Isso é alimentado nas salas de aula de jornalismo e pela visão glamourizada da profissão. Todos querendo riqueza, fama e poder, tudo à imagem e semelhança de Bonner e Miriam Leitão.

Mas a realidade é totalmente outra. O jornalista é um trabalhador. Está precarizado. Está pejotizado. Não tem autonomia para narrar uma notícia, não tem autonomia para definir quem serão suas fontes, não tem autonomia para definir manchetes. Perdeu a autonomia e foi se adequando. Foi se moldando à tal da linha editorial. Foi perdendo o direito de ter direito à cláusula de consciência. Foi perdendo a consciência. Tudo em nome do emprego, na verdade do trabalho, porque emprego mesmo ele não tem mais há muito tempo: carteira assinada, férias, 13º salário, licença maternidade, licença paternidade, fundo de garantia, aposentadoria. Afinal, jornalista não é trabalhador é empreendedor. É um funcionário dele mesmo. É um CNPJ de Pessoa Jurídica.

Ué, mas isso é o que querem para todos nós: Reforma da Previdência, Reforma Trabalhista... É o fim dos direitos conquistados. Os que já sentem na própria pele o que significa a perda destes direitos deveriam ser os primeiros a se levantarem contra as reformas. Mas não. Estão paralisados, estão anesteciados, estão defendendo o interesse dos coleguinhas, que “somos todos nós jornalistas”, afinal? Ou não?

É o que alerta a Fenaj em nota sobre o dia de hoje, “como parte da classe trabalhadora, os/as jornalistas também serão afetados pelas reformas em curso, caso sejam implementadas. Essas reformas significam precarização das relações de trabalho, instabilidade, rebaixamento de salários e trabalho sem fim. Com elas, perde o país e perdem os trabalhadores e trabalhadoras”.

Cético, Balzac diz que “a igualdade pode ser um direito, mas não há poder sobre a Terra capaz de a tornar um fato”. Discordo veementemente. Ilusões são projeções fictícias da realidade. É fundamental não alimentá-las.

Luta não é ilusão. Luta é atitude, é empoderamento. A história da humanidade nos mostra que a luta organizada da sociedade, dos trabalhadores, transforma a realidade e garante conquistas.

Por isso, apesar de não termos muito o que comemorar, temos muito sobre o que discutir, sobre o que refletir. Sobre a profissão e o profissional. Sobre nossa identidade de classe. Sobre a urgência de nos colocarmos na luta, ao lado dos trabalhadores e das trabalhadoras contra as Reformas. Contra os retrocessos em curso no país.
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O golpe da mídia e a luta pela democratização da comunicação

1 de Setembro de 2016, 0:06, por Renata Mielli


A doutrinação diária dos meios de comunicação hegemônicos no Brasil, realizada sistematicamente nos últimos 13 anos, reuniu alguns elementos que levaram à consumação do golpe deste dia 31 de agosto. O aprofundamento da criminalização dos movimentos sociais, as denúncias seletivas de corrupção contra o PT e suas lideranças, e a criação de uma nova ameaça comunista na América Latina, representada pelos governos bolivarianos e pelo Foro de São Paulo, resultou numa mistura explosiva que cindiu a sociedade e fez emergir dos subterrâneos as piores manifestações do fascismo que estavam adormecidas no país.

Não, não há equivoco no substantivo utilizado para abrir este artigo. Doutrinação. A mídia hegemônica há muitos anos deixou de praticar jornalismo, de perseguir o objetivo de levar às pessoas informações isentas sobre acontecimentos relevantes. Ignorar isso é deixar de perceber a centralidade dos meios de comunicação no golpe. A mídia é o golpe. Sem ela o golpe não teria se consumado.

Isso não significa, claro, que ela deu o golpe sozinha. Não. Contou com o parlamento vendido para os interesses privados que financiam as campanhas eleitorais e com o Poder Judiciário que foi alimentado e alimentou as notícias que gestaram o golpe. Sem a mídia, o Parlamento e o Poder Judiciário provavelmente não teriam conseguido derrubar Dilma.

Este processo histórico só reforça a indispensabilidade da luta pela democratização dos meios de comunicação. É preciso enfrentar o desafio de ampliar a diversidade e a pluralidade da mídia de massas no Brasil, apesar do cenário totalmente adverso. Encontrar brechas e buscar apoios internacionais para impedir ataques à liberdade de expressão e, quem sabe, conquistar pequenos avanços, mesmo no Brasil pós-golpe. Isso não significa ter ilusões de que podemos ter no curto prazo mudanças estruturais – já não as conquistamos nos últimos 13 anos – mas sim reconhecer que não se pode abandonar esta agenda e esperar o golpe passar.

Defender a comunicação pública, denunciar os ataques à liberdade de expressão, criar uma ampla campanha para garantir a sustentabilidade da mídia alternativa, impedir retrocessos de direitos conquistados no Marco Civil da Internet, denunciar o vigilantismo na rede, estreitar a agenda da democratização da comunicação com a pauta dos movimentos culturais, denunciar as violações de direitos humanos na mídia, e ampliar o debate sobre estes temas com a sociedade são iniciativas que precisam ser vistas como parte da luta contra o próprio golpe.

Se não dá pelas urnas, vamos de golpe

Apesar da campanha midiática em torno do mensalão, Lula ganhou as eleições em 2006. Em 2010, a prisão de integrantes do governo de Lula e a aliança da mídia com o judiciário para amplificar a repercussão do julgamento da Ação Penal 470 não foram sufientes para impedir a eleição de Dilma Rousseff. Em 2014, a crise em torno da Petrobras e o início da Operação Lava Jato também não garantiram a derrota de Dilma.

Apesar da campanha sistemática da mídia, o povo deu quatro vitórias eleitorais sucessivas ao PT. O que explica isso? Três fatores foram decisivos para garantir as eleições de Lula e Dilma: as políticas públicas de transferência de renda, geração de emprego e inclusão social que tiraram 40 milhões de brasileiros da miséria; bons resultados da economia nacional; e a ação da mídia alternativa e das redes sociais na construção de uma outra narrativa dos acontecimentos.

A complexidade que os tempos de novas tecnologias da informação trazem para a política são enormes. A começar pela constatação de que o poder da mídia não é absoluto, mas ainda é muito grande e capaz de influenciar cultural, social e politicamente a sociedade.

Ao longo dos últimos anos surgiram dezenas, centenas de blogs, sites e veículos de comunicação contra-hegemônicos que desmascararam farsas (a bolinha de papel), que denunciaram a manipulação da mídia, que realizaram uma verdadeira guerrilha informativa para disputar a narrativa dos acontecimentos em curso no país.

Assim, ao perder a quarta eleição consecutiva, a elite conservadora percebeu que investir em mais quatro anos de campanha opocionista sistemática poderia ser muito arriscado. Principalmente depois do fracasso da iniciativa de selar a vitória de Aécio, no dia 23 de outubro de 2014, quando a revista Veja publicou antecipadamente sua edição dominical com a capa que trazia Lula e Dilma e a manchete: Eles sabiam de tudo.

Usada como panfleto para tentar garantir a vitória de Aécio Neves numa disputa bastante apertada, a capa da Veja chegou a ser impressa separadamente do miolo e encartada em jornais. Depois de três derrotas eleitorais consecutivas, a elite econômica e política do país (e seus aliados internacionais) estavam certos que voltariam à conduzir o Brasil.

Se surpreenderam ao ver que não. Na verdade amargaram a quarta derrota seguida.

As estratégias de propaganda da mídia

A mídia brasileira é porta-voz dos interesses da elite econômica e política do país desde sempre. Ela nasceu desta elite, é parte dela. Imaginar que estes veículos (Globo, Bandeirantes, SBT, Folha de S.Paulo, Estadão, Veja, Isto É & Cia) olhariam desinteressados, melhor dizendo, noticiariam de forma desinteressada a mudança no governo e na orientação política do país é de uma ingenuidade inominável. Infelizmente, essa ingenuidade foi hegemônica nos governos de Lula e Dilma. Acreditaram, ou quiserem crer, que seria possível implementar um novo projeto político de desenvolvimento nacional, de relações internacionais baseadas na soberania e na integração, de inclusão social e promoção de direitos em aliança com a mídia. Deu no que deu.

Para desconstruir o governo e a esquerda, os meios de comunicação seguiram um roteiro que se encaixa perfeitamente nos princípios da proganda política criada por Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolph Hitler: Simplifique não diversifique, escolha um inimigo por vez. Ignore o que os outros fazem concentre-se em um até acabar com ele; Divulgue a capacidade de contágio que este inimigo tem; Transladar todos os males sociais a este inimigo; Exagerar as más noticias até desfigurá-las transformando um delito em mil delitos criando assim um clima de profunda insegurança e temor; Transformar tudo numa coisa torpe e de má índole. As ações do inimigo são vulgares, ordinárias, fáceis de descobrir; Fazer ressonar os boatos até se transformarem em notícias sendo estas replicadas pela “imprensa oficial’; Sempre há que bombardear com novas notícias (sobre o inimigo escolhido) para que o receptor não tenha tempo de pensar, pois está sufocado por elas; Discutir a informação com diversas interpretações de especialistas, mas todas em contra do inimigo escolhido; Ocultar toda a informação que não seja conveniente; Buscar convergência em assuntos de interesse geral apoderando-se do sentimento produzido por estes e colocá-los em contra do inimigo escolhido.

Utilizando-se destes expedientes, a mídia foi alimentando um discurso de ódio contra o PT e contra tudo que se relaciona com ele, levando pessoas a levantarem cartazes desejando o retorno da ditadura militar, ou afirmando que o problema da ditadura foi não ter matado Dilma e todos os comunistas.

O PT é o responsável por toda a corrupção e pela crise econômica. Não um dos, o único. Ignoram-se processos políticos anteriores, crise econômica internacional, problemas ambientais, a culpa de tudo é do PT. Além disso, o PT passou a ser sinônimo de coisas ruins e personificou ameaças e “inimigos” externos. Um espectro ronda a América Latina, o espectro do bolivarianismo. E o representante do bolivarianismo no Brasil é o PT. Ninguém sabe muito bem o que é isso, só sabem que não é bom. A associação da imagem de Lula e Dilma com Chávez, sempre tratado como ditador e autoritário foi explorada inúmeras vezes.

Apesar de terem perdido a eleição em 26 de outubro, o caminho para o golpe estava pavimentado. Assim, a narrativa do golpe midiático/parlamentar/jurídico que teve seu desfecho neste dia 31 de agosto de 2016 começou a ser construída exatamente no dia 27 de outubro de 2014.

O que se seguiu depois da reeleição de Dilma foi o escancaramento de uma mídia partidária e militando em favor do impeachment de forma calculada. Melhor perder um pouco da credibilidade momentaneamente e interromper o ciclo político iniciado por Lula agora. Depois se vê como cicatrizar as feridas. Algo como: vão-se os aneis mas ficam os dedos.

A postura da Rede Globo na convocação dos atos pelo impeachment foi realmente vergonhosa. A família brasileira espontâneamente nas ruas clamando pelo fim da corrupção. Enquanto os atos organizados pelos movimentos sociais não eram compostos do povo, mas de militantes petistas pagos para defender o governo.

Cada palavra e imagem eram colocadas e construídas de forma cirúrgica para criminalizar Dilma e o PT. A transmissão ao vivo da sessão do dia 17 de abril da Câmara dos Deputados, pela Rede Globo, tinha um duplo sentido: mobilizar a sociedade contra o PT e a Dilma e mostrar que eles estavam de olho no voto. Contudo, o baixo nível do parlamento brasileiro acabou apenas fazendo com que parte considerável das pessoas que estavam defendendo o impeachment, passassem a ter vergonha deste processo.

Na votação do Senado, portanto, já ciente de que a maioria da sociedade estava contra o impeachment e temendo dar um tiro no próprio pé, a Rede Globo decidiu ignorar a sessão de segunda-feira, quando a presidenta foi pessoalmente se defender perante os senadores. Tampouco transmitiu a sessão de terça ou a de quarta-feira.

A mídia mostra o que lhe convém e esconde o que não lhe convém.

Em 01 de setembro um novo ciclo se abre com o golpe. Nele, não duvidem, vamos ver um comportamento inverso da mídia. Potencializar pautas positivas para o governo e esconder as negativas. Também vamos vivenciar o aumento da repressão policial, a perseguição política e ideológica e o cerceamento à liberdade de expressão, que já davam as caras desde 14 de maio de 2016, quando Michel Temer assumiu interinamente a presidência.

Agora, empossado de forma definitiva para concluir o mandato de Dilma, Michel Temer já anuncia que não tolerá ser chamado de golpista.

O golpe mostra sua face mais torpe, a da mordaça. Cala boca já morreu, e por mais que tentem ressucitar esta página infeliz na nossa história haverá resistência.


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Discurso representando o FNDC no ato político de abertura do 5ºBlogProg

23 de Maio de 2016, 13:15, por Renata Mielli


Muita gente me pediu, então aqui está a minha fala no ato político de abertura do BlogProg. Queria agradecer a todos que me procuraram para elogiar o conteúdo do discurso. Fico muito feliz em ter encontrado o tom e o equilíbrio certo para falar sobre o cenário político num momento tão delicado, denunciando o golpe sem deixar de fazer as críticas necessárias aos erros cometidos pelo setor progressista, principalmente no campo da comunicação. Abaixo na íntegra:

Me coube, nesta noite, a responsabilidade de falar neste ato político que abre o 5º Encontro de Blogueiros e ativistas digitais representando o movimento social que está hoje nas mais variadas frentes de luta defendendo a democracia no nosso país.

Desde que o Senado Federal acolheu a denuncia contra a presidenta Dilma Rousseff e a afastou de sua função, há 8 dias, que se multiplicam os atos, as ocupações, as marchas, as intervenções culturais. 

A resistência democrática tem a cara da diversidade do povo brasileiro: é negra, indígena, branca, mulata, é feminina, é da cidade, da floresta e das águas, é moleca, jovem, madura e cravejada com as marcas do tempo nos rostos de quem não imaginava mais ter que lutar para defender a democracia.

Queria começar homenageando todos estes brasileiros e brasileiras que estão aqui e nas ruas cerrando fileiras para derrotar o golpe e para impedir que o Brasil mergulhe em mais um período de exceção, de ataque aos direitos duramente conquistados nos últimos anos, de subordinação acrítica do país aos interesses do imperialismo norte-americano e das grandes corporações internacionais.

Não nos enganemos quanto aos objetivos do processo político que está em curso no nosso país: Ele quer acabar com a inserção soberana do Brasil no mundo; enfraquecer a construção de um pólo de países que questionam política e economicamente os Estados Unidos e seu poder imperialista. O protagonismo do Brasil na construção dos Bric's é uma ameaça à ordem econômica internacional. O objetivo do golpe é sabotar a integração da América Latina e colocar um ponto final na Unasul e no Banco do Sul. É para desmontar a indústria nacional e a política de conteúdo nacional, para privatizar as empresas públicas que sobreviveram ao desmanche neoliberal dos anos 90, para reduzir o papel do Estado e atacar direitos sociais e trabalhistas.

A direita conservadora, que teve seu projeto político rejeitado pela soberania do voto nas quatro últimas eleições, não viu outro meio de impor ao país sua agenda antipopular senão o do golpe.

Inconformada com mais uma derrota, a direita iniciou em 26 de outubro de 2014 uma campanha oposicionista inconsequente, que aprofundou a crise econômica, disseminando intolerância e gerando uma grande instabilidade política no país. Assumiram a tática do quanto pior melhor [para eles] para atacar o projeto político que, com todas as suas limitações e apesar de muitos erros cometidos, trouxe mais dignidade e qualidade de vida ao povo brasileiro. 

O processo de impeachment conduzido pelo parlamento contra a presidenta Dilma é baseado em fatos que não configuram crime de responsabilidade. Sem crime de responsabilidade, qualquer tentativa de abreviar um mantado conferido pelo povo é ilegal, é golpe contra a democracia e suas instituições.

O que define o Estado Democrático de Direito é o respeito às leis vigentes no país, o respeito à Constituição Federal. Quando há violação de direitos e regras estabelecidas a democracia corre risco. E é isto que está em curso no Brasil. 

A palavra golpe tem incomodado muita gente, porque é uma palavra dura, é uma palavra que carrega em cada uma de suas letras uma força simbólica terrível para muitos homens e mulheres de nosso continente. O golpe nos remete à dor física da repressão policial, da tortura, do sequestro da liberdade. 

Não aceitam a palavra golpe porque não há tanques nas ruas. Mas talvez este golpe seja ainda mais terrível porque se desenvolve sob a máscara da legalidade. 

No dia 12 de maio de 2016, o Brasil entrou numa máquina do tempo e foi levado de volta para o passado. Voltamos para a época do governo dos homens brancos e ricos. Só dos homens. Eu os tenho chamado de homens de ternos pretos. Sempre impecáveis, elegantes, eles se reúnem como corvos ao redor de uma mesa para repartir as riquezas do país entre si. Esta, presidenta, é a descrição da foto de Michel Temer e seus acéclas ocupando o Palácio do Planalto. 

Os homens brancos, ricos e de terno preto prestam continência ao mercado e este já deu sua orientação: rever o tamanho do Sistema Único de Saúde, rescindir contratos do Minha Casa, Minha Vida, autorizar a cobrança de mensalidades nas universidades, reduzir programas como o FIES e o ProUni, iniciar o programa de desestatização para privatizar os bancos públicos, a Petrobras, os Correios. Nenhuma das coisas que eu citei é especulação, elas já estão sendo colocadas em prática nestes dias. 

Eles vão varrer o país, mas não é da corrupção. Vão varrer as políticas públicas de reparação das desigualdades sociais, que atavam o racismo, a violência e o preconceito contra as mulheres. 

Em governos de orientação neoliberal, o que impera são as políticas de mercado. O Estado é mínimo, como já deu para ver pelo enxugamento do governo. Afinal, o grande vilão do neoliberalimo é o Estado. Quanto menor, melhor [para eles]. Ele só não é extinto para oficializar o tempo da supremacia das corporações, porque as corporações se locupletam com o Estado e este serve ao seu propósito de ser o instrumento de repressão social para reprimir as manifestações por direitos e em defesa da democracia. 

E todo golpe, para ser viabilizado, precisa de um aparato ideológico que o sustente. Que conduza a opinião pública e diga ao povo – às vezes de forma explícita, às vezes velada – o que ele deve pensar. Esta é a função dos meios de comunicação no Brasil, mas não só. A mídia privada brasileira é a própria promotora do golpe, ela está umbilicalmente ligada ao mercado e à direita conservadora. A mídia é o golpe.

Aqui, presidenta Dilma, cometemos um erro histórico. Acreditar que seria possível levar a cabo um projeto soberano de desenvolvimento econômico para o Brasil sem garantir um ambiente de pluralidade e diversidade nos meios de comunicação. A luta pela democratização dos meios de comunicação é estratégica para o avanço de direitos, para a realização das reformas estruturais que o Brasil precisa, para a consolidação da própria democracia. 

Nós, do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, nós da mídia alternativa, nós blogueiros e blogueiras, ativistas digitais, nós dos movimentos sociais temos repetido exaustivamente que sem uma comunicação democrática não há democracia.

E lutamos presidenta, lutamos desde o primeiro ano do governo do presidente Lula para tentar construir políticas públicas e normas legais modernas e democráticas para romper com o monopólio privado que domina a comunicação no Brasil. E não conseguimos. Não fomos ouvidos. A falta de compreensão dos governos progressistas sobre o caráter estratégico da pauta da comunicação resultou no não enfrentamento deste tema.

A mídia privada permaneceu sem regras, abusando do privilégio de serem a única voz a falar de forma massiva para 200 milhões de brasileiros. A mídia foi a principal articuladora da desestabilização política e econômica do país, promovendo ataques cotidianos ao governo, espetacularizando a notícia e criando um clima de ódio e terror diários que levou uma parcela considerável da sociedade a defender a bandeira do seu afastamento. A sociedade brasileira encontra-se à mercê de uma mídia concentrada e golpista. 

A luta pela democratização da comunicação não é para calar ninguém, é para que mais setores sociais possam ter o direito à expressão. Conquistamos a duras penas e com limitações a Empresa Brasil de Comunicação. Com a sua criação, em 2008, o país começou, de forma muito tardia, a cumprir o previsto no artigo 223 da Constituição Federal, que determina que as concessões de radiodifusão observem a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal. A EBC estava aos poucos encontrando o seu caminho, o seu jeito de fazer uma comunicação voltada para o interesse público, construindo cidadania, promovendo diversidade e pluralidade. Isso é democratização da informação, da cultura. Isso faz pensar, mostra que uma televisão pode ser diferente. 

E isso é uma ameaça aos que se sentem donos da informação e da comunicação. O monopólio midiático do país nunca engoliu a criação da Empresa Brasil de Comunicação, tanto é que hoje a nossa experiência de comunicação pública, que ainda estáva na sua primeira infância, está sendo desmontada.

Nestes anos, a luta política de embate ao discurso único dos meios de comunicação privados tem se dado a partir da mídia alternativa, da imprensa do movimento sindical, popular, estudantil, de muitos veículos de comunicação formados por comunicadores populares, dos blogs de opinião, do ativismo realizado nas redes sociais, de coletivos e cooperativas de jornalistas que ousaram trilhar um caminho próprio, longe da redação dos grandes meios de comunicação.
A mídia alternativa tem dado voz aos setores invisibilisados e criminalizados pela mídia hegemônica e feito o enfrentamento ao golpe, defendendo a democracia e direitos. 

A ação da comunicação alternativa incomoda muito o monopólio, os partidos de direita e a elite conservadora. Para tentar nos calar, eles se utilizam da Justiça, através de ações que impõe multas econômicas desproporcionais aos meios alternativos. Querem nos calar pela intimidação e pela asfixia econômica, porque ousamos fazer uma narrativa contra-hegemônica dos fatos em curso no país. Temos sofrido a violência moral, física e até a morte de comunicadores no Brasil. A censura econômica e privada é hoje o principal obstáculo à liberdade de expressão no país. Mas se eles pensam que vão nos calar, estão muito enganados.

Neste momento estamos ocupados exigindo o retorno do Minc e a manutenção das políticas públicas de cultura, estamos lutando para impedir o fim da comunicação pública através do desmonte da Empresa Brasil de Comunicação. Temos que defender a mídia alternativa dos ataques que já estão se ampliando. Exemplo disso foi a notícia de que o contrato de patrocínio firmado com a Caixa Econômica para a realização deste evento não será honrado. O Estado não pode patrocinar eventos que discutem a democratização dos meios de comunicação, pior até, que constróem diariamente uma comunicação mais democrácia, mas pode patrocinar os encontros do Instituto Millenium, onde são elaboradas as políticas para retirar os direitos sociais e que reúne a nata do golpe para patrocinar e articular o golpe.

Temos que impedir retrocessos no campo da Internet, tentando barrar projetos de lei que desfigurem uma das poucas conquistas obtidas no campo da comunicação, que foi a aprovação do Marco Civil da Internet. 

E, principalmente, temos o desafio de ao lado dos movimentos sociais defender a democracia e denunciar o golpismo em nosso país. Nossa luta está apenas no começo e saíremos vitoriosos. Venceremos.
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Fala no ato político de abertura do 5º BlogProg 2016

23 de Maio de 2016, 12:36, por Renata Mielli



Me coube, nesta noite, a responsabilidade de falar neste ato político que abre o 5º Encontro de Blogueiros e ativistas digitais representando o movimento social que está hoje nas mais variadas frentes de luta defendendo a democracia no nosso país.

Desde que o Senado Federal acolheu a denuncia contra a presidenta Dilma Rousseff e a afastou de sua função, há 8 dias, que se multiplicam os atos, as ocupações, as marchas, as intervenções culturais.

A resistência democrática tem a cara da diversidade do povo brasileiro: é negra, indígena, branca, mulata, é feminina, é da cidade, da floresta e das águas, é moleca, jovem, madura e cravejada com as marcas do tempo nos rostos de quem não imaginava mais ter que lutar para defender a democracia.

Queria começar homenageando todos estes brasileiros e brasileiras que estão aqui e nas ruas cerrando fileiras para derrotar o golpe e para impedir que o Brasil mergulhe em mais um período de exceção, de ataque aos direitos duramente conquistados nos últimos anos, de subordinação acrítica do país aos interesses do imperialismo norte-americano e das grandes corporações internacionais.

Não nos enganemos quanto aos objetivos do processo político que está em curso no nosso país: Ele quer acabar com a inserção soberana do Brasil no mundo; enfraquecer a construção de um pólo de países que questionam política e economicamente os Estados Unidos e seu poder imperialista. O protagonismo do Brasil na construção dos Bric's é uma ameaça à ordem econômica internacional. O objetivo do golpe é sabotar a integração da América Latina e colocar um ponto final na Unasul e no Banco do Sul. É para desmontar a indústria nacional e a política de conteúdo nacional, para privatizar as empresas públicas que sobreviveram ao desmanche neoliberal dos anos 90, para reduzir o papel do Estado e atacar direitos sociais e trabalhistas.

A direita conservadora, que teve seu projeto político rejeitado pela soberania do voto nas quatro últimas eleições, não viu outro meio de impor ao país sua agenda antipopular senão o do golpe.

Inconformada com mais uma derrota, a direita iniciou em 26 de outubro de 2014 uma campanha oposicionista inconsequente, que aprofundou a crise econômica, disseminando intolerância e gerando uma grande instabilidade política no país. Assumiram a tática do quanto pior melhor [para eles] para atacar o projeto político que, com todas as suas limitações e apesar de muitos erros cometidos, trouxe mais dignidade e qualidade de vida ao povo brasileiro.

O processo de impeachment conduzido pelo parlamento contra a presidenta Dilma é baseado em fatos que não configuram crime de responsabilidade. Sem crime de responsabilidade, qualquer tentativa de abreviar um mantado conferido pelo povo é ilegal, é golpe contra a democracia e suas instituições.

O que define o Estado Democrático de Direito é o respeito às leis vigentes no país, o respeito à Constituição Federal. Quando há violação de direitos e regras estabelecidas a democracia corre risco. E é isto que está em curso no Brasil.

A palavra golpe tem incomodado muita gente, porque é uma palavra dura, é uma palavra que carrega em cada uma de suas letras uma força simbólica terrível para muitos homens e mulheres de nosso continente. O golpe nos remete à dor física da repressão policial, da tortura, do sequestro da liberdade.

Não aceitam a palavra golpe porque não há tanques nas ruas. Mas talvez este golpe seja ainda mais terrível porque se desenvolve sob a máscara da legalidade.

No dia 12 de maio de 2016, o Brasil entrou numa máquina do tempo e foi levado de volta para o passado. Voltamos para a época do governo dos homens brancos e ricos. Só dos homens. Eu os tenho chamado de homens de ternos pretos. Sempre impecáveis, elegantes, eles se reúnem como corvos ao redor de uma mesa para repartir as riquezas do país entre si. Esta, presidenta, é a descrição da foto de Michel Temer e seus acéclas ocupando o Palácio do Planalto.

Os homens brancos, ricos e de terno preto prestam continência ao mercado e este já deu sua orientação: rever o tamanho do Sistema Único de Saúde, rescindir contratos do Minha Casa, Minha Vida, autorizar a cobrança de mensalidades nas universidades, reduzir programas como o FIES e o ProUni, iniciar o programa de desestatização para privatizar os bancos públicos, a Petrobras, os Correios. Nenhuma das coisas que eu citei é especulação, elas já estão sendo colocadas em prática nestes dias.

Eles vão varrer o país, mas não é da corrupção. Vão varrer as políticas públicas de reparação das desigualdades sociais, que atavam o racismo, a violência e o preconceito contra as mulheres.

Em governos de orientação neoliberal, o que impera são as políticas de mercado. O Estado é mínimo, como já deu para ver pelo enxugamento do governo. Afinal, o grande vilão do neoliberalimo é o Estado. Quanto menor, melhor [para eles]. Ele só não é extinto para oficializar o tempo da supremacia das corporações, porque as corporações se locupletam com o Estado e este serve ao seu propósito de ser o instrumento de repressão social para reprimir as manifestações por direitos e em defesa da democracia.

E todo golpe, para ser viabilizado, precisa de um aparato ideológico que o sustente. Que conduza a opinião pública e diga ao povo – às vezes de forma explícita, às vezes velada – o que ele deve pensar. Esta é a função dos meios de comunicação no Brasil, mas não só. A mídia privada brasileira é a própria promotora do golpe, ela está umbilicalmente ligada ao mercado e à direita conservadora. A mídia é o golpe.

Aqui, presidenta Dilma, cometemos um erro histórico. Acreditar que seria possível levar a cabo um projeto soberano de desenvolvimento econômico para o Brasil sem garantir um ambiente de pluralidade e diversidade nos meios de comunicação. A luta pela democratização dos meios de comunicação é estratégica para o avanço de direitos, para a realização das reformas estruturais que o Brasil precisa, para a consolidação da própria democracia.

Nós, do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, nós da mídia alternativa, nós blogueiros e blogueiras, ativistas digitais, nós dos movimentos sociais temos repetido exaustivamente que sem uma comunicação democrática não há democracia.

E lutamos presidenta, lutamos desde o primeiro ano do governo do presidente Lula para tentar construir políticas públicas e normas legais modernas e democráticas para romper com o monopólio privado que domina a comunicação no Brasil. E não conseguimos. Não fomos ouvidos. A falta de compreensão dos governos progressistas sobre o caráter estratégico da pauta da comunicação resultou no não enfrentamento deste tema.

A mídia privada permaneceu sem regras, abusando do privilégio de serem a única voz a falar de forma massiva para 200 milhões de brasileiros. A mídia foi a principal articuladora da desestabilização política e econômica do país, promovendo ataques cotidianos ao governo, espetacularizando a notícia e criando um clima de ódio e terror diários que levou uma parcela considerável da sociedade a defender a bandeira do seu afastamento. A sociedade brasileira encontra-se à mercê de uma mídia concentrada e golpista.

A luta pela democratização da comunicação não é para calar ninguém, é para que mais setores sociais possam ter o direito à expressão. Conquistamos a duras penas e com limitações a Empresa Brasil de Comunicação. Com a sua criação, em 2008, o país começou, de forma muito tardia, a cumprir o previsto no artigo 223 da Constituição Federal, que determina que as concessões de radiodifusão observem a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal. A EBC estava aos poucos encontrando o seu caminho, o seu jeito de fazer uma comunicação voltada para o interesse público, construindo cidadania, promovendo diversidade e pluralidade. Isso é democratização da informação, da cultura. Isso faz pensar, mostra que uma televisão pode ser diferente.

E isso é uma ameaça aos que se sentem donos da informação e da comunicação. O monopólio midiático do país nunca engoliu a criação da Empresa Brasil de Comunicação, tanto é que hoje a nossa experiência de comunicação pública, que ainda estáva na sua primeira infância, está sendo desmontada.

Nestes anos, a luta política de embate ao discurso único dos meios de comunicação privados tem se dado a partir da mídia alternativa, da imprensa do movimento sindical, popular, estudantil, de muitos veículos de comunicação formados por comunicadores populares, dos blogs de opinião, do ativismo realizado nas redes sociais, de coletivos e cooperativas de jornalistas que ousaram trilhar um caminho próprio, longe da redação dos grandes meios de comunicação.
A mídia alternativa tem dado voz aos setores invisibilisados e criminalizados pela mídia hegemônica e feito o enfrentamento ao golpe, defendendo a democracia e direitos.

A ação da comunicação alternativa incomoda muito o monopólio, os partidos de direita e a elite conservadora. Para tentar nos calar, eles se utilizam da Justiça, através de ações que impõe multas econômicas desproporcionais aos meios alternativos. Querem nos calar pela intimidação e pela asfixia econômica, porque ousamos fazer uma narrativa contra-hegemônica dos fatos em curso no país. Temos sofrido a violência moral, física e até a morte de comunicadores no Brasil. A censura econômica e privada é hoje o principal obstáculo à liberdade de expressão no país. Mas se eles pensam que vão nos calar, estão muito enganados.

Neste momento estamos ocupados exigindo o retorno do Minc e a manutenção das políticas públicas de cultura, estamos lutando para impedir o fim da comunicação pública através do desmonte da Empresa Brasil de Comunicação. Temos que defender a mídia alternativa dos ataques que já estão se ampliando. Exemplo disso foi a notícia de que o contrato de patrocínio firmado com a Caixa Econômica para a realização deste evento não será honrado. O Estado não pode patrocinar eventos que discutem a democratização dos meios de comunicação, pior até, que constróem diariamente uma comunicação mais democrácia, mas pode patrocinar os encontros do Instituto Millenium, onde são elaboradas as políticas para retirar os direitos sociais e que reúne a nata do golpe para patrocinar e articular o golpe.

Temos que impedir retrocessos no campo da Internet, tentando barrar projetos de lei que desfigurem uma das poucas conquistas obtidas no campo da comunicação, que foi a aprovação do Marco Civil da Internet.

E, principalmente, temos o desafio de ao lado dos movimentos sociais defender a democracia e denunciar o golpismo em nosso país. Nossa luta está apenas no começo e saíremos vitoriosos. Venceremos.
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Cunha na ONU: Regulação da Comunicação é afronta a democracia

1 de Setembro de 2015, 10:22, por Renata Mielli

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, foi aos Estados Unidos para participar da 4ª Conferência Mundial de Presidentes de Parlamentos, promovida pela União Interparlamentar. A UIP é parte do Sistema ONU, que é formado pelos seis principais órgãos da Organização, bem como por Agências especializadas, Fundos, Programas, Comissões, Departamentos e Escritórios.

Cunha foi para a Conferência em Nova York defender a democracia brasileira.

A democracia brasileira de Eduardo Cunha não convive com qualquer regulação dos meios de comunicação. Ele saiu do Brasil para ir aos Estados Unidos com o objetivo de dar explicitamente este recado.

Em seu discurso, ele ressaltou a existência de uma Constituição Cidadã em nosso país, que construiu as bases para uma democracia representativa. “As soluções apresentadas sempre estão no campo da democracia representativa – a modalidade de governo que consegue intermediar melhor as pluralidades tanto culturais quanto ideológicas.”

O grifo é meu e considero importante porque esse enfoque de Cunha é o centro de seu pensamento político. O povo, que vive na planície, elege seus representantes que governam do planalto. E nesta relação o povo é apenas um coadjuvante, uma massa que não possui protagonismo para além do voto. Não é à toa a ojeriza que Cunha tem a qualquer forma de participação social e, por isso, proíbe a entrada da plebe na Casa do Povo e joga spray de pimenta em quem tentar “transgredir a ordem”.

Claro que ele não disse nada disso na ONU, imagine. Pelo contrário. Ele poetizou que “democracia sem povo é como jardim sem flores; não tem o que se regar; o que se manter”.

Para Cunha, a liberdade de imprensa é a chave da democracia. E ele fez questão de reproduzir a velha e conveniente confusão conceitual que coloca liberdade de imprensa e liberdade de expressão em pé de igualdade, quase sinônimos. Na visão do atual presidente da Câmara dos Deputados, a garantia da liberdade de imprensa está na ausência de regulação. Ele afirmou diante dos presidentes de parlamentos de todo o mundo que “é fundamental para a democracia a manutenção da liberdade de imprensa - de expressão - e combatermos qualquer forma de censura ou regulação de mídia de qualquer natureza, inclusive econômica”.

E de certa forma ele tem razão.

Como??? Sim, porque se entendermos – como parece que o Cunha entende – que a liberdade de imprensa é a aquela que permite aos veículos de mídia publicar o que quiserem, sem qualquer obrigação de fazer reparações a notícias que violem o direito à intimidade, que violem os direitos humanos e sem qualquer compromisso com o interesse público, para esta liberdade de imprensa quanto menos regras melhor. A ausência de regulação é o ambiente da supremacia dos interesses dos conglomerados econômicos de mídia.

Mas para garantir a liberdade de expressão – que é o direito que todos nós, cidadãos e cidadãs, temos de nos expressar – é indispensável a existência de regras. Como consta do Artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.

O que talvez Cunha não saiba, ou sabe mas ignorou, é que a ONU possui uma Relatoria para Liberdade de Opinião e Expressão que tem recomendações bastante abrangentes e consolidadas sobre a necessidade de se construir um rol de leis e dispositivos institucionais (dentro e fora da estrutura do Estado) que componham um marco regulatório para as comunicações de forma a garantir a diversidade e a pluralidade, impedir a formação de monopólios, proteger as culturas nacionais e regionais, estimular a produção de conteúdo independente, preservar os direitos humanos e tantos outros que seriam necessários muitos caracteres para descrever.

Mas Cunha foi até a ONU para dizer que não cabe na democracia a existência de regras para a atividade de comunicação, nem regulação econômica. O presidente da Câmara fez questão de sublinhar o aspecto econômico para se opor à ideia, defendida pela presidenta Dilma Rousseff durante as eleições, de que é preciso se discutir no Brasil uma regulação econômica para os meios de comunicação que impeça a formação de monopólios.

E isso, nada mais é do que respeitar as diretrizes já existentes no Art. 220 da Constituição Cidadã que Eduardo Cunha foi propagandear nos Estados Unidos. Essa Constituição que cabe ao Congresso Nacional aprovar leis para regulamentar. Ou seja, Cunha viajou 6.520 km (distância estimada entre Brasília e Nova York) para dizer que ele se nega a fazer o serviço para o qual foi eleito – zelar e garantir a aplicabilidade de todos os artigos da Constituição Federal.

Aqui no Brasil a gente já sabia de tudo isso. Ele já mostrou seu “apego” à democracia, já deu declarações bastante enfáticas para dizer que durante o seu mandato nenhum projeto de regulação da mídia será pautado “nem por cima do meu cadáver”, a frase é dele.

Em seu discurso em Nova York ele ressaltou que “os Parlamentos são o foco de resistência que devem zelar por esse combate, a despeito de governos autoritários."

A questão que fica é: e quem defende o povo de parlamentos autoritários que ignoram e rasgam a Constituição? Talvez o povo, aquele que fica na planície ignorada, e que precisa sair às ruas para defender a democracia, impedir retrocessos civilizatórios que estão em curso no parlamento brasileiro, como a proposta de redução da maioridade penal, a institucionalização da corrupção pelo financiamento privado da política, a terceirização das relações de trabalho e desubstruir outras como o debate para ampliar a diversidade e pluralidade nos meios de comunicação.  
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