Ato público será realizado na próxima sexta-feira, 26 de outubro, no Centro Cívico, a partir das 9h
As vielas são de barro, com caminhos fragmentados ladeira acima, ruazinha abaixo, mas já se percebe a presença do estado na forma de postes de energia com iluminação pública para além da estrada principal que leva às quatro ocupações consolidadas no bairro Cidade Industrial, em Curitiba.
As famílias chegaram por lá em 2012, formando a Nova Primavera, com as demais, Tiradentes e 29 de Março constituídas em 2015. A última ocupação foi formada ali na região em 2016, a Dona Cida, que reúne 400 famílias e está em risco de desalojamento após decisão judicial de reintegração de posse publicada no dia 17 de outubro de 2018. Juntas, aproximadamente 1,2 mil famílias veem nas ocupações a única forma de ter moradia e, ao mesmo tempo, ter comida na mesa.
“Minha vida melhorou 90% aqui na ocupação, ainda que as principais dificuldades sejam (o acesso) a água e luz”, conta Neia, mãe de três crianças pequenas, moradora da Dona Cida. Ela estava ao lado da mãe, que trabalha na separação de materiais reciclados, e da filha menor, que ainda não conseguiu vaga em creche. “Quando eu pagava aluguel era muito difícil”. Ela explica qual será o destino dessas 400 famílias se houver o despejo determinado pela justiça: “Se houver desocupação, a maioria das pessoas não tem para onde ir. A maioria das pessoas vai pra casa de parentes, porque não tem como emprestar esse dinheiro ou alugar uma casa”.]
A Ocupação Dona Cida, mais recente a ser consolidada, está organizada de forma comunitária: existe uma associação de moradores, que coordena melhorias coletivas: há um parquinho infantil com escorregador, gangorra e torre de escalada, como existe em várias praças de Curitiba, e uma tenda azul para a realização das reuniões, assembleias e eventos festivos.
Juliana, vice-presidente da associação, explica que em um dos terrenos próximos à tenda será construída uma cooperativa para a realização de cursos de capacitação para geração de renda para as mulheres da ocupação. Eles já contam com a promessa de doação de material de construção para erguer o espaço comunitário. “Todo mundo que não tem onde morar, mora aqui. E as pessoas constroem tudo com muita dificuldade. Uns catam papel, alguns vivem de bolsa família”, afirma.
Sergio é o coordenador da ocupação, que possui uma comissão de 12 lideranças que são responsáveis pelo “controle” populacional e por intermediar as ações com o poder público que, na realidade das ocupações, restringe-se à presença de assistentes sociais da prefeitura e ao acesso a atendimento de saúde no posto mais próximo. “A gente veio pra cá porque a gente não tem outro recurso, então pra gente, o que a gente mais queria realmente era ficar aqui”, explica.
Ainda que a decisão judicial de reintegração seja referente a apenas uma das áreas, a insegurança jurídica é motivo de preocupação para todas as 1.200 famílias das demais ocupações. Lilia, moradora da Ocupação Tiradentes, conta que somente nesta, são 300 crianças. “A gente recebe doação de frutas, de verduras, a maioria das crianças frequenta escola e realizam atividades quando não estão na escola. No Natal, nós arranjamos padrinhos, elas escrevem cartinhas para o Papai Noel e no dia da festa todas ganham presente”.
A Tiradentes, localizada ao lado da Dona Cida, fica numa área em disputa com um lixão (de uma massa falida administrada pela empresa Essencis). É possível ver atrás das casas de madeira e lona e de uma pequena floresta, os caminhões de recolhimento de lixo em cima das montanhas de lixo. “Querem tirar as moradias para ampliar o lixão”, explica.
Os moradores das quatro ocupações vão realizar um ato público no Centro Cívico de Curitiba na próxima sexta-feira, 26 de outubro, para denunciar o risco de despejo e tentarem ser recebidos na Prefeitura de Curitiba e no Governo Estadual. A concentração será às 9h00 na Praça da Mulher Nua e do Homem Nu.
A decisão judicial foi determinada em um processo de reintegração que estava parado desde 2016 e que teve como justificativa de retomada reiteradas negativas da Prefeitura, que se manifestou em não ter interesse na desapropriação da área após a posse de Rafael Greca. O Instituto Democracia Popular (IDP) e a Defensoria Pública do Paraná estão atuando no processo com recursos judiciais e articulação junto ao Ministério Público para que seja dada uma solução que não seja a expulsão de 400 famílias sem terem para onde ir.
“A gente veio nas ocupações em solidariedade às pessoas, existem aqui muitas crianças, muitos idosos, e como se dá uma decisão dessas sem saber o que vai ser feito com essas pessoas?”, questiona a presidenta do IDP, Libina Silva Rocha.
O IDP entende que o judiciário deveria considerar as ocupações como um problema social que demanda atuação do poder público em solucionar a falta de moradia e não apenas pelo despejo. “Deveria agir como fomentador do debate e da busca de diálogo, com soluções efetivas não apenas sob o viés da propriedade mas também pelas dificuldades das famílias que vivem nas ocupações”, explica a estudante de Direito Valéria Fiori, que pesquisa a temática das regularizações fundiárias.
Seja solidário, participe!
Ato em defesa das Ocupações por moradia
Dona Cida, Tiradentes, 29 de Março e Nova Primavera
Data: sexta-feira, 26 de outubro de 2018
Horário: 9h00
Local: Centro Cívico de Curitiba
(Concentração na Praça 19 de Dezembro – Mulher Nua e Homem Nu
Saiba mais: Comunidade Dona Cida sofre nova ameaça de despejo
Assembleia dos moradores
Reportagem Paula Zarth Padilha
Edição de vídeo Valéria Fiori
Instituto Democracia Popular