Para economista, carteira verde e amarela para jovens que entram no mercado de trabalho poderá criar castas sem chance de ascensão
Anunciada como uma opção de escolha voluntária, conforme plano de governo do presidente eleito Bolsonaro, a carteira de trabalho verde e amarela será destinada a jovens em seu primeiro emprego no mercado de trabalho. Oficialmente, não há informações sobre como será efetivada a implantação desse novo documento, mas já foi publicada em notícias a versão que essa escolha seria definitiva: ao optar pela verde e amarela, com menos direitos, não haveria como migrar para atual carteira de trabalho azul, com garantias da CLT.
De acordo com o plano de governo, “todo jovem que ingresse no mercado de trabalho poderá escolher entre um vínculo empregatício baseado na carteira de trabalho tradicional (azul) — mantendo o ordenamento jurídico atual, ou uma carteira de trabalho verde e amarela (em que o contrato individual prevalece sobre a CLT, mantendo todos os direitos constitucionais)”.
Esses direitos constitucionais são 34 itens garantidos pelo artigo 7º da Constituição Federal, que estabelece salário mínimo, férias remuneradas, seguro-desemprego, repouso semanal remunerado, 13º salário, FGTS. Esse modelo privilegiaria a redução de custos para os patrões, pois não dá conta da jornada de trabalho e não estabelece encargos, como os previdenciários, e esses detalhes seriam parte da escolha do jovem que entra no mercado de trabalho, que estaria submetido a negociações individuais com seu empregador.
Para o economista e coordenador estadual do Dieese Pablo Diaz, mestre em Tecnologia e Trabalho pela UTFPR, a carteira verde e amarela é uma modalidade do trabalho intermitente. “Provavelmente com o tempo ela será o documento oficial do trabalho intermitente. Então quando você utiliza essa modalidade precarizada de contratação, você consegue apresentar números de emprego. Mas na verdade a pessoa vai estar registrada, contudo sem a remuneração mínima que manda a constituição. Então é uma armadilha essa carteira verde e amarela. E a perspectiva o que é, é criar castas dentro da legalidade em que muitas das pessoas não terão chance nenhuma de ascensão e vão viver no subemprego e nós vamos ver daqui uns anos, já estamos assistindo a porta de entrada desse inferno da desigualdade, nós vamos ver a ampliação (da distância) entre os maiores e menores salários, das melhores e piores condições de emprego”, prevê o pesquisador.
Pablo compara a situação do futuro das relações de trabalho no Brasil com países da Europa que eram conhecidos pelo bem-estar social, como Inglaterra, Portugal e Espanha. “Nós vemos essa prática disseminada nos últimos anos através dessa forma de contratação. Na Alemanha, por exemplo, você teve mini-empregos, que corresponde hoje a 10% de toda a força de trabalho da população economicamente ativa. Eles ganham 400 euros por mês, que pra Alemanha é uma miséria, é um salário de miséria. E quem é o público-alvo? Mulheres. Ao passo que na Espanha, Portugal e Inglaterra, o público é mais amplo, principalmente os jovens”.
Para o economista, essas ações de precarização contra o trabalhador, que terão reflexo imediato nos jovens e a longo prazo poderão alterar de forma definitiva a garantia de direitos, são reflexo de uma equipe de transição de governo despreparada, mas que também prioriza um objetivo só: “concentrar riqueza para o setor financeiro que se auto-intitula mercado”, finaliza.
Criação do FGTS eliminou estabilidade no emprego
Um exemplo de alteração trabalhista que foi implantada como opção por adesão voluntária e que se tornou obsoleta até ser eliminada foi a chamada “estabilidade decenal”, que era a garantia de emprego contra a demissão sem justa causa para trabalhadores com dez anos ou mais de contrato de trabalho com carteira assinada, modalidade que vigorou até 1966.
Em 1967, foi criado o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que se estabeleceu como opção prioritária do trabalhador até que formalmente a estabilidade decenal foi extinta na promulgação da Constituição Federal de 1988.
O FGTS acobertou as contratações de trabalho formal como uma proteção contra o desemprego, já que não era mais obrigação das empresas manter as contratações com estabilidade para o trabalhador.
Por Paula Zarth Padilha
Imagem: adaptação de mídia da Campanha Nacional dos Bancários 2015, para a FETEC-CUT-PR