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Um parlamento feminista 

9 de Dezembro de 2018, 12:53 , por Terra Sem Males - | No one following this article yet.
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Como contraponto à lógica de subrepresentatividade que caracteriza os espaços de poder em todo o mundo, participantes do Ella, em La Plata, na Argentina, simularam no início da noite desse sábado (9) o que seria um “Parlamento Feminista”. 

Por Mariana Franco Ramos, La Plata (Argentina), especial para o Terra Sem Males

Representantes do Brasil, da Argentina, da Bolívia, do Chile, do Uruguai e ainda de Portugal apresentaram, por mais de duas horas, suas experiências, apontaram problemas que enfrentam em seus países e propuseram soluções para diminuir a desigualdade de gênero, o racismo e a lesbotransfobia.

A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB), a liderança indígena Sonia Guajajara (PSOL), que disputou a vice-presidência da República na chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL), e a professora Duda Salabert (PSOL), primeira trans a concorrer ao Senado, por Minas Gerais, falaram da realidade brasileira.

Feghali denunciou o “golpe social e midiático” que começou com o impeachment da presidenta eleita Dilma Rousseff (PT), há dois anos, e culminou com a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), até então favorito a ganhar o pleito de 2018. “Lula é um preso político no Brasil. Precisamos de uma grande campanha internacional pela sua libertação”, discursou. A plateia respondeu com gritos de “Lula Livre”.

“Temos um quadro de grande desemprego, com recorte de gênero grave e recorte racial gravíssimo também. As mulheres negras têm menores salários e maior nível de desemprego. A juventude negra é duas vezes e meia mais assassinada do que a juventude branca. Tivemos 4.473 mulheres assassinadas de forma dolosa em 2017. O feminicídio dentro desse número não dá para quantificar porque tem subnotificação, mas é muito elevado”, prosseguiu.

Segundo a parlamentar, a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) é a pior notícia que se poderia ter. “Agora há uma autorização formal institucional protegida por esse fascista”. O público emendou com um coro de “Ele não”.

As mortes de Marielle Franco e Lucía Pérez também foram lembradas. Negra, bissexual, mãe, moradora da favela da Maré e militante de direitos humanos, a vereadora do Rio de Janeiro foi assassinada em 14 de março do ano passado. Os criminosos estavam em um carro que emparelhou com o da parlamentar e efetuaram vários disparos, que também mataram o motorista.

Já a adolescente de 16 anos foi vítima de feminicídio em 8 de outubro de 2016, na cidade de Mar del Plata, após ser drogada e estuprada. O caso foi um dos que motivou a famosa marcha “Ni una menos” [em português, “Nem uma a Menos”]. No mês passado, a Justiça absolveu os três homens que foram a julgamento. Dois deles foram condenados a oito anos de prisão por “porte de entorpecentes para fins de comercialização” e pagarão uma multa de 135 mil pesos [o equivalente a cerca de R$ 13, 4 mil]. O terceiro envolvido acabou solto.

“O cenário é muito difícil e precisamos do aumento da solidariedade internacional, que os movimentos sociais estejam cada vez mais presentes. A Câmara piorou muito com essa eleição, como muitos parlamentos estaduais. Aumentou o número, mas não são mulheres necessariamente feministas. Estamos aí para lutar”, afirmou a deputada.

Salabert lembrou que a expectativa de vida de uma transexual ou travesti no Brasil é de 35 anos e que mais de 90% dessas pessoas não concluíram o Ensino Médio, uma vez que são expulsas de casa e enfrentam preconceito na escola. “Retiraram da gente tudo, até a categoria de humanos”. Mesmo com poucos recursos de campanha, a professora fez história ao receber 351.874 votos. Não foi eleita, porém, teve a maior votação do PSOL em todo o País.

Guajajara destacou a morte de lideranças indígenas ativistas e a grande perda de patrimônio, de riquezas naturais. “A matriz econômica do Brasil sempre expulsou os mais pobres das suas casas. O maior objeto de disputa da política brasileira é a terra. Querem usar esse território para exploração”, denunciou.

Essa negociata, segundo ela, é feita nos três poderes, com medidas que buscam flexibilizar direitos conquistados. “Querem entregar nossas águas e nossos rios, seja para privatização, para as mineradoras… Direito é aquilo que se arranca quando não temos mais escolhas. Vamos à luta!”

O Ella começou na noite de sexta-feira (7) e se estende até segunda-feira (10), com rodas de conversa, atos políticos e culturais e mesas de debate. Mais de três mil mulheres, de toda a América Latina, estão reunidas na Universidade de La Plata, a 70 quilômetros de Buenos Aires, para clamarem, juntas, por “nenhum direito a menos”. A programação completa está disponível aqui.


Fonte: http://www.terrasemmales.com.br/um-parlamento-feminista/