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O abraço surpresa

25 de Maio de 2015, 21:39 , por Rafael Pisani Ribeiro - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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Licenciado sob CC (by-nc-sa)

Como a vida é cheia de inesperados. Na perda um elemento ocupante de um espaço de tempo parece haver duas opções: se aborrecer ou expandir experiências. Na primeira existe uma série de consquências. Em uma delas, e pode ser considerada a pior, todos o eventos seguintes ficam negativos, e você fica ruminando o evento inesperado durante um longo tempo. É como viver no passado. Não parece haver vantagem nessa reação, exceto se a própria falha ou reclamação gerar prazer ou reforço. Na outra existem algumas semelhanças. O evento negativo acontece, e seu acontecimento gera um problema. Mas a termologia muda. O evento deixa de ser negativo, se torna inesperado, gerando não problemas, e sim problemáticas. Nessa opção o sujeito recebe o impacto do evento inesperado, mas procura retirar dele algum proveito, buscando aprendizados. Várias questões passam a existir nesse momento. Elas se ligam a escolha e também aproveitamento de experiências.

A escolha aparece como importante pela seguinte questão. A problemática pode não ter como origem direta uma escolha, mas sim eventos externos a qual não há controle, eventos inesperados. Portanto nessa ótica há pouca ou nenhuma influência sobre o ocorrido. Por outro lado é possível ser via indireta de uma escolha, que pode dizer diretamente de si, mas também do outro. O que fazer nesse caso? Deixar como foi. Primeiro por se tratar do passado, segundo pela impossibilidade de prever o futuro. A mesma lógica se inclui na falha de projetos ou ideias. Ou o erro te trava ou, tratando da linguagem da Psicologia do trabalho você renormaliza até acertar. Errar pode não significar não acertar na primeira, e sim aceitar o primeiro erro como eterno. Na renormalização os elementos vão se adaptando até uma adequação correta. Chegando a experiência, já é possível narrá-la.

No caminho para meu objetivo vi alguns sujeitos com um cartaz pedindo um abraço, devido ao dia 23/05/2015 ser dia do abraço. Achei interessante, mas não parei, pois já estava atrasado. Chegando a meu destino fui avisado ter chegado demasiadamente em atraso, portanto não pude entrar. Isso me aborreceu, ao menos momentaneamente. Mas decidi não perder viagem. Fui entender qual era a questão daqueles sujeitos diferentes, definidos por alguns como estranhos pedindo abraços. Cheguei até eles e dei o abraço. O ato em si não teve significado, pois buscava algo mais profundo. Subitamente, de surpresa me convidaram a participar.

Surpreso, como uma reação por falta de ação, porém com desejo de aceitar, aceitei. Fiquei um longo tempo só os observando, procurando entender aquilo. Observava a interação entre eles, a forma de abordagem, a reação das pessoas e outros comportamentos. Minha primeira interação foi perguntar a razão daquele ato. A resposta foi simples: “por que não gastar um pouco de seu tempo pensando no outro?”. Questionei se houve algum planejamento, e afirmaram ter sido só uma ideia, logo colocada em prática. De fato, isso foi perceptível ao longo da experiência. Após várias perguntas, ajuda na produção de um cartaz comecei a pensar na ideia de agir.

Parecia difícil, iniciei planejamentos, análises, tentando compreender e copiar seus feitos. Inclusive os elogiei pela espontaneidade. Gradualmente fui me apropriando da experiência. Não havia como copiar, era cada um a sua forma. Só poderia ser genuína, tanto para o praticante quanto para a vítima do abraço se feita com espontaneidade sincera. De ficar sentado, a levantar o cartaz e pedir abraços foi um pulo gradual. Logo estava abraçando. Me coloquei uma meta de 10 abraços e iria embora. Passou tão rápido e logo perdi a conta, efetivamente dava prazer. As reações eram diversas: fuga pelo evento inesperado, negação com efeito positivo, pró atividade em abraçar, passividade junto a espera em receber um abraço. Sempre se encaixavam em alguma dessas.

Questionava as pessoas sobre suas sensações ao negar, e incrivelmente não sabiam dizer. Era algo do desconhecido, apesar de claramente positivo e inesperado, portanto uma sensação estranha. As reações mostravam ser um evento inesperado, algo a se assustar, motivo de alegria ou de negação. De surpresa nos tornamos um grupo e alguns abraços foram marcantes pelos sujeitos e/ou contextos.

Primeiro um sujeito deitado no banco, aparentemente chorando e ouvindo música no fone. Um dos mais “caras de pau” do grupo mostraram o cartaz por cima, fazendo o sujeito levantar e efetivamente dar o abraço, possibilitando um sorriso. Também um grupo de viajantes, sem lugar fixo para dormir fazendo malabaris. Parecia ser seu primeiro contato com outras pessoas, pois foi efetivamente genuíno. Aproveitei a ocasião para aprender a técnica de malabaris com pinos de boliche, ao menos sua teoria. Depois um sujeito que se diria deficiente físico, saindo definitivamente mais alegre, talvez feliz após os diversos abraços. E os pontos de ônibus?

Esses lugares tristes, sem comunicação, tiveram um tom de alegria, criando de forma simples algo fantástica : comunicação entre as pessoas. Depois duas mulheres, tamém vítimas, nos perguntaram se éramos “Engenheiros da Alegria”. Como um mero abraço gera identicação social! Esses foram de fato os mais marcantes, quem dera tivessémos encontrado alguém em situação de rua. Eles devem ter encontrado, pois os larguei antes. O mais incrível de tudo foi a motivação desses sujeitos.

Sua razão para isso não era meramente moralista. Tinha a ver sim com a moral deles, mas não com o moralismo, aquilo que visa incluir o outro em seu modelo mas exclui a si mesmo. Relacionava-se a ver suas crenças, ligadas a meditação e o budismo. Nesse caso o importante não é o meio para a ação, e sim a ação. Seja qual fosse a religião ou ideia para produzi-la, não importa, pois foi um resultado fantástico. Resumiram o ato como uma forma de pensar no outro, mesmo em sua dia a dia. A felicidade genuína. Ironicamente, tais sujeitos se enquadraram nos modelos teóricos de Marx, em termos das relações ideiais do comunismo, isto é, um cumprindo as necessidades do outro, não meramente materiais. Assim como de Gandhi, combatendo violência com não violência, ou melhor evitando violência futura com não violência. E mais ainda, é como se a abordagem tivesse sido planejada. Havia um estímulo sinalizador (cartaz), estímulo verbal (convidar verbalmente) e análise da situação (ir ou não ao abraço. Esperar ou ir) No entanto, se fosse planejado perderia sua genuídade, sua espontaneidade.

Foi certamente marcante. Indiquei o site para tais sujeitos, mais como via de manter contato que própriamente mostrar o site. Espero lerem, e caso o fizerem comentem, assim fico sabendo. Necessitei de escrever este texto por duas razões. Primeiro era improtante descrever o ato, trazer a emoção ligada a ele. Segundo, mostrar como teria perdido essa grande experiência se ficasse só reclamando do atraso. Terceiro, para eterniná-los. Não os sujeitos, mas as significâncias do ato de abraçar, de tanto efeito na vida de diversas pessoas. Quarto, último e principalmente o efeito de nossos comportamentos. O convite feito a eles por min, possibilitou mais vítimas de um abraço e uma transmissão da ideia para um nível maior, a internet. Foi um grande feito, e permitirá ao menos em uma pessoa ter a mesma sensação. Vale salientar as ideias aqui colocadas serem muito mais reflexões da experiência vivida, palavras dos sujeitos criadores e minha mera descrição do evento. Por fim, considerando os diversos resultados na experiência para uma pergunta não obtive respota. Qual o significado de um abraço?

 Lembrem- se de referenciar a fonte caso utilizem algo deste blog. Dúvidas, comentários, complementações? Deixe nos comentários.

 Escrito por: Rafael Pisani

 


Tags deste artigo: paradoxo dos valores

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