Os textos abaixo foram copiados de dois sites, o pouco conhecido Caos no Sistema e o bastante conhecido Mundo Estranho, da Abril.
Eles tratam do mesmo tema, a Inquisição.
Se o leitor trocar alguns termos, tais como judeus e cristãos-novos por petistas, Santo Ofício por Lava Jato, ou herege por corrupto, verá que a Inquisição renasceu no Brasil.
Outra notável coincidência entre os métodos medievais e os dos nossos justiceiros é que tanto lá atrás como agora, estranhamente, é o acusado que tem de provar a sua inocência, e não o acusador que tem de provar a culpa daquele a quem acusa.
Sem contar a tortura.
Tempos difíceis estes...
Como funcionava a Inquisição
A Inquisição era uma instituição praticamente independente e fazia o papel de polícia da Igreja. Os inquisidores eram figuras que estavam acima da lei comum, sendo-lhes permitido utilizar métodos de tortura para obter confissões.
Quando o inquisidor chegava ao local suspeito de abrigar hereges, ele promulgava o Edito da Graça, garantindo penas leves para aqueles que confessassem sua culpa. Os processos da Inquisição nunca terminavam com total absolvição do réu.
Terminado o prazo previsto para a confissão espontânea, o Edito de Fé era promulgado com o nome de todos aqueles acusados de heresia. As denúncias eram feitas em segredo e o acusado não tinha o direito de saber quem havia feito à acusação.
Os inquisidores liam as acusações para os suspeitos de heresia e exigiam deles a confissão ou a prova da inocência. Diferentemente do sistema judiciário atual, em que cabe ao acusador o ônus da prova, na Inquisição, ficava a cargo do réu provar quer era inocente. Ninguém queria correr o risco de fazer o papel de testemunha de defesa dos acusados e, por sua vez, ser denunciada de cumplicidade.
Caso o réu não confessasse a culpa, os inquisidores iniciavam uma longa sessão de tortura que poderia durar de dia a semanas, até que o torturado chegasse ao seu limite e confessasse a heresia.
Como os hereges eram executados?
O “julgamento” e a tortura aconteciam sempre em segredo nas masmorras das prisões inquisitórias, mas a sentença e a execução dos hereges eram reservadas para um pomposo evento público realizado, geralmente, aos domingos, após a missa, na frente da maior catedral da cidade.
O método mais comum de execução era uma morte lenta e dolorosa na fogueira. Na França, Escócia e Alemanha, os inquisidores atravessavam com madeira verde o corpo dos condenados para prolongar o sofrimento. Enquanto isso, uma população sedenta por sangue delirava enlouquecida numa mistura de sadismo e medo.
Esses espetáculos dominicais da Inquisição atraíam peregrinos que chegavam de regiões longínquas para assistir a cerimônia do começo ao fim.
Nos primórdios, os inquisidores queimavam as casas dos executados para que não sobrassem vestígios do “mal”. Com o passar do tempo, os imóveis passaram a ser vendidos e contribuíam para o grandioso lucro da Igreja.
Na concepção da Igreja, esse tipo de evento era necessário para manter a população controlada e com medo. Nas palavras de um membro do clero:
“É preciso lembrar que o principal escopo do processo e da condenação à morte não é salvar a alma do réu, mas buscar o bem público e aterrorizar o povo. Não resta dúvida de que instruir e aterrorizar o povo com o proferimento das sentenças seja uma boa ação.”
(Do site caosnosistema.com)
O que foi a Inquisição
Também chamada de Santo Ofício, essa instituição era formada pelos tribunais da Igreja Católica que perseguiam, julgavam e puniam pessoas acusadas de se desviar de suas normas de conduta. Ela teve duas versões: a medieval, nos séculos XIII e XIV, e a feroz Inquisição moderna, concentrada em Portugal e Espanha, que durou do século XV ao XIX. Tudo começou em 1231, quando o papa Gregório IX - preocupado com o crescimento de seitas religiosas - criou um órgão especial para investigar os suspeitos de heresia. "Qualquer um que professasse práticas diferentes daquelas reconhecidas como cristãs era considerado herege", afirma o historiador Rogério Luiz de Souza, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atuando na Itália, na França, na Alemanha e em Portugal, a Inquisição medieval tinha penas mais brandas - a mais comum era a excomunhão -, embora a tortura já fosse autorizada pelo papa para arrancar confissões desde 1252. Já sua segunda encarnação surgiu com toda força na Espanha de 1478.Dessa vez, o alvo principal eram os judeus e os cristãos-novos, como eram chamados os recém-convertidos ao Catolicismo, acusados de continuarem praticando o Judaísmo secretamente. "A justificativa desse retorno da Inquisição era a necessidade de fiscalizar a fidelidade desses conversos", diz outro historiador, Nachman Falbel, da Universidade de São Paulo (USP). A verdade é que esses grupos já formavam uma poderosa burguesia urbana que atrapalhava os interesses da nobreza e do alto clero. O apoio dos reis logo aumentou o poder do Santo Ofício, que, para piorar, passou a considerar como heresia qualquer ofensa "à fé e aos costumes". Por exemplo, quem usasse toalhas limpas no começo do sábado ou não comesse carne de porco era acusado de Judaísmo. A lista de perseguidos também foi ampliada para incluir protestantes e iluministas, homossexuais e bígamos.
As punições tornaram-se bem mais pesadas com a instituição da morte na fogueira, da prisão perpétua e do confisco de bens - que transformou a Inquisição numa atividade altamente rentável para os cofres da Igreja. A crueldade dos inquisidores era tamanha que o próprio papa chegou a pedir aos espanhóis que contivessem o banho de sangue. A migração de judeus expulsos da Espanha para Portugal, em 1492, fez com que a perseguição se repetisse com a criação do Santo Ofício lusitano, em 1536. O Brasil nunca chegou a ter um tribunal desses, mas emissários da Inquisição aportaram por aqui entre 1591 e 1767. Calcula-se que 400 brasileiros foram condenados e 21 queimados em Lisboa, para onde eram mandados os casos mais graves. Os inquisidores portugueses fizeram 40 mil vítimas, das quais 2 mil foram mortas na fogueira. Na Espanha, até a extinção do Santo Ofício, em 1834, estima-se que quase 300 mil pessoas tenham sido condenadas e 30 mil executadas.
Na Espanha e em Portugal, a Inquisição abusava da crueldade para punir quem se desviasse da fé católica
1. O JULGAMENTO
A. A CHEGADA DA INQUISIÇÃO
Um grupo de monges do Santo Ofício chegava à aldeia e reunia toda a população na igreja. No chamado Período de Graça, que durava um mês, convidavam os pecadores a admitirem suas heresias. Quem se confessasse, em geral se livrava das penas mais severas
B. AS INVESTIGAÇÕES
Quem não aproveitasse o Período de Graça poderia ser denunciado. Como a Inquisição incentivava a delação, o pânico era generalizado: todos eram suspeitos em potencial. O acusado era convocado a se defender no tribunal
C. A SENTENÇA
O suspeito era interrogado por três inquisidores. Um deles, o inquisidor-mor, dava a sentença final. A defesa era difícil: raramente o réu tinha direito a um advogado. Para arrancar confissões, o Santo Ofício colocava espiões no encalço do suspeito e recorria a tenebrosas práticas de tortura
2. AS TORTURAS
A. ESCALA DE PUNIÇÕES
O inquisidor-mor variava a crueldade dos castigos conforme a heresia. Os mais leves incluíam deixar o acusado acorrentado, sem comer nem dormir por vários dias. Mas os relatos históricos registram outros bem mais dolorosos, como os aparelhos chamados potro e extensão. Para amedrontar os acusados, os carrascos faziam uma demonstração de como funcionavam esses dispositivos. Para abafar os gritos, era comum colocarem colchões nas portas
B. O POTRO
O livro Prisioneiros da Inquisição traz a história de Jean Coustos, mestre da loja maçônica de Lisboa, condenado pelo tribunal. Coustos passou pelos horrores do potro em 1743: "Me prenderam com uma argola no pescoço, um anel de ferro em cada pé e oito cordas que passavam por furos no cadafalso. Ao sinal dos inquisidores, elas foram puxadas e apertadas pelos carrascos. As cordas entravam na carne até os ossos e faziam jorrar sangue. Repetiram a tortura por quatro vezes. Perdi a consciência e fui levado de volta à minha cela sem perceber"
C. A EXTENSÃO
Seis semanas depois, o maçom foi submetido a outra tortura: a extensão. "As cordas, puxadas por um torniquete, faziam com que os punhos se aproximassem um do outro, por trás. Puxaram tanto que as minhas mãos se tocaram. Desloquei os dois ombros e perdi muito sangue pela boca. Repetiram três vezes o mesmo tormento antes de me devolverem à cela". Nos meses seguintes, Coustos ainda sofreu mais uma série de torturas até confessar. Foi condenado a quatro anos de trabalhos forçados em 1744
3. AS SENTENÇAS
A. O AUTO-DE-FÉ
Assim era chamada a cerimônia pública em que se liam as sentenças do tribunal. Os autos-de-fé geralmente ocorriam na praça central da cidade e eram grandes acontecimentos. Quase sempre o rei estava presente. As punições iam das mais brandas (como a excomunhão) às mais severas (como a prisão perpétua e a morte na fogueira)
B. QUEIMADOS VIVOS... OU MORTOS
A execução na fogueira ficava a cargo do poder secular. Se o condenado renunciasse às heresias ao pé do fogo, era devolvido aos inquisidores. Se sua conversão à fé católica fosse verdadeira, ele podia trocar a morte pela prisão perpétua. Quando descobria-se que um defunto havia sido herético, seu cadáver era desenterrado e queimado
C. MARCAS DA HUMILHAÇÃO
Para serem vistos pelo público, os prisioneiros subiam em um palco. Os que eram obrigados a vestir as chamadas marcas de infâmia, como a cruz de Santo André, chegavam a ser agredidos pela multidão. Outros levavam velas e vergastas nas mãos para serem chicoteados pelo padre durante a missa
O MAIS DESUMANO INQUISIDOR
Fanático. Cruel. Intolerante. Nos registros históricos, não faltam adjetivos depreciativos para definir o frei dominicano Tomás de Torquemada (1420-1498), o mais duro inquisidor de todos os tempos. Organizador do Santo Ofício espanhol, ele era confessor e conselheiro dos reis Fernando e Isabel. Em 1483, essa influência rendeu-lhe a nomeação de inquisidor-geral, responsável pelos 14 tribunais na Espanha e suas colônias. Logo de cara, autorizou a tortura para obter confissões, ampliou a lista de heresias e pressionou os reis a substituir a tolerância religiosa pela perseguição aos judeus e aos conversos. Resultado: ao final de sua gestão, mais de 170 mil judeus foram expulsos da Espanha e 2 mil pessoas viraram cinza nas fogueiras.
(Do site Mundo Estranho)