Trabalhei mais de 40 anos em redações, desde as minúsculas, em jornais de Jundiaí e Campinas, até as paquidérmicas, como a do Estadão das décadas de 80 e 90 do século passado. Em todos esses anos não constatei a publicação de nenhuma notícia ou reportagem que contrariasse a linha editorial do jornal, ou seja, os interesses do patrão.
Argumentar que, por exemplo, a Folha ou o Estadão mantêm articulistas de "esquerda" ou "progressistas" e por isso devem ser considerados veículos de opiniões plurais é abusar do cinismo. Todos sabem que tais artigos são uma gota num oceano de reacionarismo e devem ser vistos muito mais como peças de marketing do que qualquer outra coisa.
Quando falo sobre a ditadura do pensamento único nas redações me refiro ao fato de que nenhum repórter, por mais gabaritado que seja, é capaz de publicar uma matéria que, de alguma forma, atinja, mesmo que minimamente, amigos do patrão, grandes anunciantes, ou mesmo que divirja da ideologia política do dono do jornal.
Acho que não existe na Terra lugar menos democrático que uma redação de jornal.
O diálogo entre chefes e subordinados é tabu nesse ambiente.
O máximo que um repórter pode fazer é sugerir uma pauta, que só vai "tocar" se tiver a concordância da chefia.
Reportagem investigativa virou uma lenda - esses escândalos todos, essas denúncias todas que alimentam o noticiário negativo contra o governo trabalhista, por exemplo, caem no colo dos editores, repórteres ou chefes de reportagem. Muitas vezes vêm praticamente prontas, com documentos e tudo o mais. Muitas vezes o repórter nem checa as informações, acredita piamente na "fonte".
O fato é que não existe, no Brasil, pelo menos, a tão propalada "liberdade de imprensa".
O controle da informação que chega ao público é férreo - só é publicado o que interessa ao dono do jornal.
Quando acabou com a Lei de Imprensa, o STF deu um tiro mortal na única garantia que o cidadão comum tinha de se defender do extraordinário poder da imprensa para assassinar reputações, por meio de matérias caluniosas - ou simplesmente mentirosas.
Hoje, qualquer um que seja vítima de um um canhonaço disparado por um órgão de imprensa tem de se ver às voltas com um sistema judiciário lento, custoso e quase sempre bondoso com os poderosos, o que desestimula a maioria dos demandantes que gostariam de ver a sua honra restituída.
Não existe uma pessoa sequer no Brasil que seja favorável à volta da censura na imprensa.
Isso não significa, porém, que as empresas de comunicação tenham carta branca para publicar mentiras, calúnias ou boatos - obras de ficção, não notícias.
Elas têm um papel social que não permite esse comportamento.
Da mesma forma, é inadmissível que ainda hoje no Brasil emissoras de televisão e de rádio sejam propriedade de parlamentares, que as usam livremente para se eleger ou manter seus currais eleitorais, ou que formem cartéis.
Regular a mídia é um imperativo de qualquer democracia moderna.
A regulamentação é necessária para coibir abusos econômicos e para garantir que a informação seja um instrumento para o desenvolvimento do país e não para mantê-lo mergulhado no atraso e na ignorância.
Motta
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