Como não quero ficar de mal com o mundo, resolvi ser o menos intolerante e preconceituoso possível.
Mas confesso, não é nada fácil adotar essa atitude, vamos dizer assim, contemplativa.
As coisas que leio, que fico sabendo, são de acabar com a paciência de qualquer um.
Um exemplo é o caso do ciclista paulistano que foi xingado de "comunista" por um motorista, que quase o atropelou pelo simples fato de ele ser ... um ciclista numa cidade que, em certos estratos sociais, tem no ódio o combustível do dia a dia.
Para esse motorista indignado com o fato de existirem pessoas que preferem a bicicleta ao carro para se locomover, o termo "comunista" - ou "petista" - é uma ofensa pior que qualquer outra.
Para mim, porém, ser chamado de "comunista" ou "petista" ou algo similar é um elogio.
Afinal, foi o meu próprio pai, o saudoso capitão Accioly, quem me ensinou que os comunistas eram aqueles sujeitos que lutavam por um mundo menos desigual, mais justo, mais humano, no qual não houvesse a exploração do homem pelo homem, sem pobres ou ricos, entre outras tantas coisas que enaltecem a civilização.
Quanto ao termo "petista", que para o motorista que tentou atropelar o rapaz em sua bicicleta, é um tremendo xingamento, ele não soa, para mim, tão elogioso quanto "comunista", mas quebra o galho para a minha autoestima.
Afinal, foram os petistas quem conseguiram, com a sua social-democracia tropical, diminuir a execrável desigualdade social que marca o Brasil há séculos, além de terem, em apenas uma década, feito o país ser respeitado perante as outras nações como uma potência que deve de ser ouvida sobre todas as questões importantes para o planeta.
Então, é graças a essa minha nova conquista interior, que me permite, antes de tomar qualquer atitude radical, entender as razões do outro, que até compreendo a atitude do motorista indignado com as bicicletas.
Deixando de lado o fato de que ele deveria estar torrando de calor dentro de seu carro, se arrastando a uma velocidade de poucos metros por hora, a gente tem de considerar o fato de que ele, provavelmente, é um pobre coitado que cresceu se informando pelos telejornais da Globo e das outras redes de televisão, foi educado achando que, em nossa sociedade, quem não tem dinheiro é um merda, que acredita que o mundo foi formado em sete dias e o pastor de sua igreja é um sábio, e o Silvio Santos é o exemplo perfeito das virtudes da "meritocracia".
Sem contar que seus pais lhe puseram na cabeça, por terem sido doutrinados por seus avós, que cada um deve saber qual é o seu lugar nesta vida.
Sendo assim, dá para comparar um carro que custa, no mínimo, R$ 40 mil, com uma bicicleta que qualquer um compra por R$ 300?
Sai da frente, rapaz.
Quem você pensa que é?
Motta
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