Será verdade? Entendo: vemos uma notícia na televisão, num jornal, e agora? Como estabelecer se for verdade ou mentira?
Já era um problema décadas atrás, quando na televisão havia só 3 canais e um punhado de rádios com noticiários. Mas hoje? Hoje as fontes de informação multiplicam-se como as estrelas do universo e, obviamente, todas afirmam dizer a verdade.
A cada dia somos bombardeados de notícias e várias versões das mesmas: como raio podemos saber quem mente e quem não?
Muitas vezes, a resposta é esta: confiamos naquelas que parecem ser as vozes mais sérias, com mais autoridade, as mais cultas. Onde trabalham jornalistas, especialistas, pessoas que pesquisam e raciocinam sobre os factos. Talvez capazes de ir além das aparências. Correcto?
Exemplo: Vladimir Putin ajudou Donald Trump nas eleições americanas? Os serviços secretos de Moscovo interferiram, manipularam, condicionaram o resultado? E nós como podemos saber se isso aconteceu ou se não?
Eis que um livro aparece no horizonte como o farol no meio da tempestade: não apenas é apresentado como Bestseller N.1 pelo mundialmente conceituado The New York Times, mas o autor é nada menos de que Luke Harding, o super veterano enviado na Rússia do conceituado The Guardian.
Harding tem um currículo assustador e costuma utilizar fontes usadas também pelos serviços secretos dos Países mais potentes do mundo. Harding licenciou-se no UWC Atlantic College, tem estudado em Oxford; escreveu nas páginas do Daily Mail; viveu em Deli, Berlim, Moscovo, seguiu no terreno as guerras no Afeganistão, no Iraque, na Líbia; recebeu o Prémio James Cameron por causa do seu trabalho; publicou já sete livros.
Wow...
O título da última fadiga dele (o tal Bestseller N.1) diz tudo: "Conluio: encontros secretos, dinheiro sujo e como a Rússia ajudou Donald Trump a ganhar" (Collusion: Secret Meetings, Dirty Money, and How Russia Helped Donald Trump Win).
Ámen.
É precisa mais alguma coisa? Pode existir uma fonte de pesquisa mais profunda, mais documentada, mais aclamada e mais credível do que este livro com relativo autor? Não pode.
E é mesmo neste ponto que surgem os problemas: porque basta pouco para destruir as nossas certezas. Pode bastar um jovem jornalista, tal Aaron Maté, que trabalha numa rede de notícias online, The Real News. Portanto, um jovem jornalista e um simples pedido ao autor do livro: "Onde estão as provas?".
Para quem entende o idioma inglês é simples seguir o link de Youtube e observar a entrevista onde o jovem Maté crucifica sem piedade o pluridecorado Harding. São 28 minutos durante os quais até o espectador reza para que algo aconteça e o massacre seja de alguma forma travado: décadas de carreira deitadas numa sanita, com Maté que puxa o autoclismo. Mete dó.
Para quem não entende o inglês: o homem que deveria ser um campeão do jornalismo investigativo, cujo livro glorificado pelo The New York Times parecia conter as provas finais no escândalo Putin & Trump, é feito em pedaços, aniquilado enquanto murmura, transpira, agita-se na cadeira dele, tentando desviar o discurso para terras absurdas, sem conseguir uma única afirmação que possa fazer lembrar vagamente uma prova. Há alturas em que mais parece gossip do que jornalismo. É muito triste.
E aqui voltamos ao nosso assunto principal: porque se Luke Harding não tivesse aceite a entrevista com The Real News, a informação contida no livro dele e carimbada pelo The New York Times hoje seria tida como fonte suprema no caso Putin & Trump. Seria não apenas um livro mas um facto.
Então, como podemos, nós leitores, saber onde fica a verdade?
A verdade fica precisamente aqui, num lugar muito próximo de todos, muito perto: na nossa cabeça.
A verdade deve ser criada por nós, dia após dia. É preciso recolher informação, o máximo possível, sem esquecer de que estamos apenas a ler "fontes", não "notícias", "versões dos factos" e não "realidade". A notícia surgirá só depois, uma vez reunido cada segmento, filtrado pelo pensamento.
Custa fadiga? Claro que sim. É por isso que hoje estamos a ser bombardeados de "notícias": a ideia é fornecer uma verdade já pronta para o uso, onde não seja preciso esforço nenhum, é só descartar, consumir e ignorar os nossos neurónios que continuam a morrer.
Ipse dixit.
Fonte: Paolo Barnard, Youtube: The Real News - Where's the 'Collusion'?,
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