O que diz Zero Hedge? Diz isso: diz que atrás da "revolução" na Ucrânia está George Soros.
Acredito que sim. Aliás: nem sei por qual razão Zero Hedge se dá ao trabalho de publicar um extenso artigo acerca deste assunto.
Que fique claro: a notícia em si é interessante, mas é uma confirmação, não uma surpresa. Do meu ponto de vista, realçar de forma exagerada certos factos é contraproducente.
Explico.
Dito assim, George Soros parece um bilionário aborrecido que, não sabendo como ocupar a vidinha dele, decide ajudar o regime neo-fascista da Ucrânia. É uma visão enganadora. Pegamos nas três cartas que o grupo de hackers CyberBerkut tem revelado: são três escritos (que podem ser lidos no original inglês no artigo de Zero Hedge) de George Soros nos quais, como é óbvio, o acento é posto sobre a situação ucraniana.
Em todos e três os casos, temos Soros que fala em primeira pessoa. Soros e alguns economistas envolvidos nas finanças de Kiev, Soros que tenta influenciar a Federal Reserve, Soros que escreve ao Presidente Poroshenko e ao Primeiro Ministro Yatseniuk, Soros que escreve ao Presidente dos Estados Unidos, Soros que compra um gelado de baunilha (ok, ok: esta fui eu que acrescentei).
Final:
Para recapitular: Soros está a fazer lobby em nome da Ucrânia, empurrando para obter veículos blindados e armas, para opor-se a Putin de todas as maneiras possíveis.
Se forem verdadeiros, e pelos metadados parecem mesmo sê-los, estes documentos mostram que Soros está a tentar contornar os acordos de Minsk (por exemplo, treinar soldados ucranianos sem uma presença tangível da NATO na Ucrânia). Os documentos ligam Nuland [do Departamento de Estado dos EUA, ndt] e Soros e destacam quem realmente puxa os cordéis no Departamento de Estado.
Por último, dado que os documentos não mencionam o que Soros tem em mente para a Ucrânia, é possível usar a imaginação.
Sim, muito bem.
Mas não acham que falta algo?
Que dizer, este parece o enredo dum filme de James Bond, com Soros no papel da Spectre: um bilionário maluco que ameaça desencadear a Terceira Guerra Mundial. E a razão? Esta é a verdadeira pergunta: por qual razão Soros está a fazer isso?
Ou é uma iniciativa pessoal ou Soros é apenas parte dum projecto maior.
É uma iniciativa pessoal? Se for assim, então estamos realmente no enredo estilo 007 & Spectre. Como não sou grande fã de James Bond (prefiro, e muito, Sherlock Holmes), não acredito na iniciativa pessoal e aposto num projecto de mais amplo respiro, onde Soros é apenas a face visível.
Quem fica escondido na sombra de Soros? O Presidente dos Estados Unidos? Nem pensar. A classe política dos EUA? Mesma coisa. Todas estas são pessoas que não têm peso, não mandam, limitam-se a executar as ordens.
Então? Então sobram as únicas pessoas que A) têm dinheiro B) não recebem ordens C) dão ordens. Isso é: a elite financeira.
Agora, pegamos na pergunta que fizemos para Soros e vamos aplica-la no caso da elite financeira: por qual razão estão a fazer isso? Aqui a resposta é incrivelmente complicada. Eu sei, não parece.
Resposta simples para o cidadão que acredita nos telejornais: "A elite financeira norte-americana quer atingir Putin e com ele a Rússia". Como afirmado, esta é a resposta simples, que não requer muito esforço e que fica bem no novo mantra "O Ocidente é mau, o Oriente é que é bom" (não se esqueçam disso: tornou-se um dogma).
Mas há outra resposta, bem mais complexa, que raramente aparece até no mundo da informação alternativa. É uma resposta que não esquece um pequeno pormenor: a elite financeira do Ocidente é a mesma do Oriente. E quem pensar o contrário, bom, lamento mas vive num outro planeta, não no nosso.
Sim, eu sei: os BRICS, o mundo multipolar, a queda do Dólar, o eixo Moscovo-Pequim, etc. etc.
O Leitor, obviamente, está livre de acreditar em tudo isso e até no Pai Natal. É uma questão de escolhas, todas são lícitas.
Mas se, por acaso, o Leitor reparou que estamos sempre a falar do mesmo sistema, o sistema Capitalista; se, por acaso, o Leitor reparou que as dinâmicas financeiras dos BRICS são exactamente as mesmas dinâmicas que funcionam nos Estados Unidos e no Ocidente no geral; se, por acaso, o Leitor tiver a noção de quem ao longo destes últimos anos evitou que o Dólar afundasse e que os Estados Unidos falissem (resposta: a China); se o Leitor tiver presentes estes como muitos outros dados ainda, então irá assumir sem problemas o facto de que a jogada da elite financeira global na Ucrânia é muito, mas muito mais complexa de quanto possa parecer.
Quanto complexa? Eu tenho uma ideia. Mas não quero vos arruinar o resto do dia. Pelo que, marcha atrás e ficamos com a mais simples das versões possíveis: Soros é a Spectre.
Ipse dixit.
Fonte: no texto.