A Ikea. E quem não conhece a Ikea?
Os Leitores que viverem no Brasil, por exemplo.
Então preparem-se porque cedo ou tarde também aí chegará: Europa, Ásia, Oceânia, África e América do Norte já estão colonizados pelo gigante dos móveis.
Lembro de quando a primeira loja Ikea abriu na minha cidade, em Italia. Grande, clara, com muitos serviços (parque, zona crianças, restaurante, loja de produtos alimentares, alugueres de furgões), até os lápis dava. E depois muitos móveis, um mar de móveis e acessórios. Era possível entrar na Ikea sem uma única cadeira e sair com a casa completamente mobilada. Uma espécie de fast-food dos móveis, mas com qualidade e até preços interessantes.
Os anos passaram e a Ikea permanece igual a si mesma. Só que entretanto começou a despertar os interesses dos mais curiosos. E assim descobre-se que a Ikea também tem o seu lado "escuro".
A marca, por exemplo, é sueca, mas levantem uma tigela de madeira e vejam o que está escrito por baixo: Made in Vietnam. E a dúvida surge espontânea: como é que a Ikea paga as empresas fornecedoras, quanto ganham os trabalhadores que trabalham indirectamente para os ganhos da Ikea?
Um artigo de Le Monde Diplomatique de 2006 colocava em causa a transparência da empresa, indicando a impossibilidade de conhecer a sua real situação financeira consolidadas por causa de "truques" e "disfarces" de propriedade (voltaremos sobre este ponto mais à frente).
Os trabalhadores da Ikea entraram em greve na França, em 2002, após um ano de negociações infrutíferas focadas nos salários e como forma de protesto contra alguns despedimentos considerados injustificados. No Canada, em 2007, as confederações dos trabalhadores obtiveram, depois de várias greves, a modificação dos contratos com os quais os trabalhadores eram sub-pagos. O mesmo aconteceu em Itália no mesmo ano.
Sempre em 2007, a belga Oxfam-Magasins du Monde abriu uma investigação para esclarecer o funcionamento dos produtos Ikea, descobrindo que os trabalhadores subcontratados de algumas fábricas nos Países asiáticos trabalhavam entre 80 e 90 horas semanais e recebiam o salário mínimo legal (na Índia 37 Euros por mês; em Bangladesh 11 € por mês; no Vietnam 43 € por mês), o que nem lhes permitia viver com dignidade.
Embora o mobiliário e os adereços sejam todos concebidos na Suécia, são produzidos por 1.084 fornecedores diferentes, presentes em 53 países. Em particular, apenas 5% da produção ocorre na Suécia, pois o maior fornecedor neste sentido é a China (olha a surpresa...) seguida pela Polónia e pela Italia.
Estes são apenas algumas das manchas no nome Ikea. Depois há a pergunta mais complicada: a quem pertence realmente a Ikea?
Ingvar Feodor Kamprad |
A Ikea é controlada pela holandesa Ingka Segurar, por sua vez de propriedade de uma fundação sem fins lucrativos, a Fundação Stichting Ingka, criada em 1982 pelo mesmo Ingvar Kamprad com a nobre motivação de espalhar o avanço da arquitectura e do design de interiores (que, evidentemente, depois do Aquecimento Global e da fome no mundo é uma da prioridades do planeta).
A fundação é uma das maiores organizações sem fins lucrativos no mundo: mais de 35 biliões de Dólares de activo. É muito design, sem dúvida.
Obviamente, a Ikea versa ao fisco holandês quanto previsto no caso das organizações sem fins lucrativos: 3,5% do imposto. Não só. A estrutura societária também inclui uma outra empresa holandesa, a Inter Ikea Systems (esta com fins lucrativos), que, no entanto, é apenas titular da propriedade intelectual da marca e do "conceito" Ikea.
A totalidade da Inter Ikea Systems pertence a outra empresa ainda, a Inter Ikea Segurar, com sede no Luxemburgo, por sua vez propriedade de uma terceira empresa com sede nas Antilhas Holandesas (conhecido paraíso fiscal), gerido por um misterioso fundo registado em Curaçao.
Tudo isso, lembramos, não é ilegal. Só um pouco estranho, se calhar, mas perfeitamente em linha com as normas internacionais que permitem registar um empresa num País onde taxas e impostos forem mais convenientes. É come se o Leitor trabalhasse numa fábrica perto de casa e pagasse as taxas nas Ilhas Cayman. Compensa? Claro que sim.
Aliás, experimente: torne-se uma empresa sem fins lucrativos, uma espécie de obra pia, e fique com a sede num paraíso fiscal...
Ipse dixit.
Fontes: Affari Italiani, Wikipedia (versão italiana e inglesa), The Guardian